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Em defesa do bate-boca

Em sua coluna na “Folha de S. Paulo”, Renata Lo Prête destaca a importância do “bate-boca” durante os debates das eleições 2010: segundo ela, “a mais reveladora forma de expressão dos políticos”. “SAIRÁ FRUSTRADO quem ligar a TV hoje à noite confiante em que, com o início dos debates entre os candidatos, finalmente haverá “discussão de propostas” na campanha presidencial, em substituição ao bate-boca até aqui dominante. Muita gente dá […] Leia mais

DR

Da Redação

Publicado em 5 de agosto de 2010 às 01h44.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 11h29.

Em sua coluna na “Folha de S. Paulo”, Renata Lo Prête destaca a importância do “bate-boca” durante os debates das eleições 2010: segundo ela, “a mais reveladora forma de expressão dos políticos”.

“SAIRÁ FRUSTRADO quem ligar a TV hoje à noite confiante em que, com o início dos debates entre os candidatos, finalmente haverá “discussão de propostas” na campanha presidencial, em substituição ao bate-boca até aqui dominante. Muita gente dá corda a essa expectativa, mas só porque pega mal afirmar o contrário. Seja pela camisa de força das regras, seja pela exiguidade do tempo, debates não se prestam ao exame aprofundado de programas de governo -de resto virtuais.
No evento da Band, cada participante fará dez intervenções, com pouco mais de 16 minutos de microfone no total. Esquadrinhar educação, saúde, segurança e economia nessas frações e ainda se desviar dos tiros dos adversários? Sem chance. Do ponto de vista do conteúdo, o confronto é menos de ideias que de bordões, mais próximo dos 140 caracteres do Twitter que de uma entrevista pingue-pongue.
Além disso, a televisão é o veículo da subjetividade: a fala em si importa menos do que a impressão causada.
No debate inaugural do segundo turno de 2006, Geraldo Alckmin se perdeu não pelo que disse -alguém se lembra?- a Lula, mas sim por ter se mostrado colérico, sempre uma operação de alto risco na TV e ainda mais se praticada por alguém cuja imagem está associada ao bom comportamento.
Por fim, conspira contra a “discussão de propostas” o fato de que as soluções apresentadas pelas principais campanhas são, retirada a espuma, semelhantes.
A ênfase dada tanto por Dilma quanto por Serra ao ensino técnico, para citar um exemplo, deriva do diagnóstico compartilhado de que esse é o único caminho para enfrentar o problema da qualificação e da empregabilidade dos jovens.
A convergência embute ainda um componente conjuntural. Pesquisas mostram que a maioria do eleitorado está satisfeita e quer, no máximo, correções pontuais. A oposição não tem interesse em caracterizar a escolha de 2010 como continuidade x mudança.
Nesse cenário, o bate-boca é mais útil do que sugerem os detratores dessa “forma inferior” de comunicação política. Campanhas não se desenvolvem como seminários. Do Bolsa Família à política externa, muitas vezes é por meio de cotoveladas que temas ditos programáticos acabam por ganhar espaço na agenda.
A “pauta propositiva” é invariavelmente blindada: testada em pesquisas, controlada por assessores e lipoaspirada de tudo o que puder afugentar eleitores e/ou financiadores.
Já o destempero, dentro e fora dos debates, escapa do roteiro da marquetagem, criando a rara oportunidade de descobrir o que o candidato de fato pensa sobre determinado assunto.
Mais: esses episódios não são folclorizados pelo eleitor. Ciro Gomes sabe o preço que pagou por ter dito, em 2002, que o papel de Patrícia Pillar na campanha era o de dormir com ele.
Portanto, longa vida ao bate-boca, a mais reveladora forma de expressão dos políticos.”

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Em sua coluna na “Folha de S. Paulo”, Renata Lo Prête destaca a importância do “bate-boca” durante os debates das eleições 2010: segundo ela, “a mais reveladora forma de expressão dos políticos”.

“SAIRÁ FRUSTRADO quem ligar a TV hoje à noite confiante em que, com o início dos debates entre os candidatos, finalmente haverá “discussão de propostas” na campanha presidencial, em substituição ao bate-boca até aqui dominante. Muita gente dá corda a essa expectativa, mas só porque pega mal afirmar o contrário. Seja pela camisa de força das regras, seja pela exiguidade do tempo, debates não se prestam ao exame aprofundado de programas de governo -de resto virtuais.
No evento da Band, cada participante fará dez intervenções, com pouco mais de 16 minutos de microfone no total. Esquadrinhar educação, saúde, segurança e economia nessas frações e ainda se desviar dos tiros dos adversários? Sem chance. Do ponto de vista do conteúdo, o confronto é menos de ideias que de bordões, mais próximo dos 140 caracteres do Twitter que de uma entrevista pingue-pongue.
Além disso, a televisão é o veículo da subjetividade: a fala em si importa menos do que a impressão causada.
No debate inaugural do segundo turno de 2006, Geraldo Alckmin se perdeu não pelo que disse -alguém se lembra?- a Lula, mas sim por ter se mostrado colérico, sempre uma operação de alto risco na TV e ainda mais se praticada por alguém cuja imagem está associada ao bom comportamento.
Por fim, conspira contra a “discussão de propostas” o fato de que as soluções apresentadas pelas principais campanhas são, retirada a espuma, semelhantes.
A ênfase dada tanto por Dilma quanto por Serra ao ensino técnico, para citar um exemplo, deriva do diagnóstico compartilhado de que esse é o único caminho para enfrentar o problema da qualificação e da empregabilidade dos jovens.
A convergência embute ainda um componente conjuntural. Pesquisas mostram que a maioria do eleitorado está satisfeita e quer, no máximo, correções pontuais. A oposição não tem interesse em caracterizar a escolha de 2010 como continuidade x mudança.
Nesse cenário, o bate-boca é mais útil do que sugerem os detratores dessa “forma inferior” de comunicação política. Campanhas não se desenvolvem como seminários. Do Bolsa Família à política externa, muitas vezes é por meio de cotoveladas que temas ditos programáticos acabam por ganhar espaço na agenda.
A “pauta propositiva” é invariavelmente blindada: testada em pesquisas, controlada por assessores e lipoaspirada de tudo o que puder afugentar eleitores e/ou financiadores.
Já o destempero, dentro e fora dos debates, escapa do roteiro da marquetagem, criando a rara oportunidade de descobrir o que o candidato de fato pensa sobre determinado assunto.
Mais: esses episódios não são folclorizados pelo eleitor. Ciro Gomes sabe o preço que pagou por ter dito, em 2002, que o papel de Patrícia Pillar na campanha era o de dormir com ele.
Portanto, longa vida ao bate-boca, a mais reveladora forma de expressão dos políticos.”

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