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Cortina de fumaça e colapso fiscal

A máquina estatal opera em déficit estrutural e crescente, enquanto a arrecadação bate recordes históricos; nunca se cobrou tanto

 (Jefferson Rudy/Agência Senado/Flickr)

(Jefferson Rudy/Agência Senado/Flickr)

Instituto Millenium
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Instituto Millenium

Publicado em 1 de dezembro de 2025 às 20h47.

*Sergio Lewin

 

O debate político brasileiro é sequestrado quase por completo por narrativas dramáticas sobre ameaças ao Estado de Direito. Porém, enquanto isso, ignora-se a realidade cada vez mais preocupante dos números das contas públicas. Os dados estão à vista, divulgados com ares de normalidade pelo próprio governo.

O rombo das estatais federais atingiu a cifra de R$ 75,7 bilhões, o maior em 25 anos. Somando-se os déficits previdenciários, assistenciais e os prejuízos das empresas públicas, o buraco ultrapassa com folga os R$ 80 bilhões. A máquina estatal opera em déficit estrutural e crescente, enquanto a arrecadação bate recordes históricos; nunca se cobrou tanto. A última investida é a taxação da distribuição de lucros, como se as empresas que os distribuem já não tivessem sido tributadas até o limite. Quanto pior a execução fiscal, maior a pressão tributária para compensar o descontrole.

Nada, absolutamente nada, indica intenção de contenção. O que se vê, ao contrário, é a normalização do desequilíbrio. O ciclo se repete: o gasto sobe, estatais afundam, o déficit explode, o Estado busca mais dinheiro, os juros se tornam impagáveis, a economia emperra. E logo o contribuinte é convocado para pagar a conta.

Enquanto países desenvolvidos tratam as estatais como instrumentos com metas claras e submetidas à disciplina de mercado, o Brasil as transforma em feudos corporativos onde o déficit e a ineficiência se somam de forma explosiva.

Para agravar o quadro, o país gasta cerca de R$ 20 bilhões por ano com supersalários: aproximadamente 53,5 mil servidores recebem acima do teto constitucional — uma anomalia difícil de encontrar em qualquer país sério.

O economista Mancur Olson mostrou que a gênese do Estado é a opção da sociedade em preferir ser roubada por apenas um bandido - que ele chamou de bandido estacionário, do que por uma diversidade de inimigos e agressores. Ocorre que o estado moderno e sobretudo o brasileiro se converteu, ele próprio, em uma coleção de bandidos predatórios, cada qual patrocinado por um grupo de interesse específico. O contribuinte individual não reage porque o custo é difuso; o impacto fiscal é pulverizado pela sociedade em milhões de bolsos.

Enquanto isso, as pressões organizadas, os sindicatos, estatais, corporações públicas, conselhos internos, burocracias estão permanentemente mobilizados.

Nenhum editorial sobre retórica antidemocrática produzirá o mesmo impacto que o déficit estatal crescente.

Nenhuma disputa narrativa ameaça tanto a estabilidade institucional e a saúde econômica e social do país quanto a incapacidade crônica do Estado de gastar com responsabilidade, evitar o desperdício e a corrupção.

Enquanto as cortinas de fumaça seguem a pleno vapor, a realidade econômica vai caminhando para a inviabilidade.

 

*Sergio Lewin é advogado, ex presidente IEE e Instituto liberdade, e fundador da Lexum