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Coreia do Sul e a Lei Marcial: um alerta para as democracias

Crise política expõe riscos às instituições democráticas e traz lições importantes para o Brasil

Episódio expôs as fragilidades políticas do governo da Coreia do Sul (South Korean Presidential Office /Getty Images)
Instituto Millenium

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Publicado em 6 de dezembro de 2024 às 14h21.

A recente tentativa do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, de decretar a Lei Marcial abalou as estruturas políticas do país e chamou a atenção do mundo inteiro. A medida, que rapidamente foi anulada pelo parlamento, levantou debates sobre os limites do poder presidencial e o papel das instituições na hora de defender a democracia.

O episódio expôs as fragilidades políticas do governo e também trouxe impactos significativos para as relações internacionais e a economia sul-coreana.

No Brasil, onde o equilíbrio entre os Poderes também é motivo de preocupação, as lições do caso sul-coreano não podem ser ignoradas. Em entrevista para o Instituto Millenium, o economista e PhD em Relações Internacionais, Igor Lucena, analisa os desdobramentos dessa crise, suas implicações globais e o que devemos aprender para preservar e fortalecer as democracias em tempos desafiadores.

INSTITUTO MILLENIUM: Igor, para contextualizar nossos leitores: o que é a Lei Marcial e ela pode ser um risco às liberdades e direitos humanos?
Igor Lucena: Não há dúvida de que a Lei Marcial é um risco às liberdades e aos direitos humanos. Quando decretada, ela restringe a imprensa, limita atividades civis e interfere em diversos direitos fundamentais. Essa medida só deve ser usada em situações extremas, geralmente quando a sociedade está incapaz de se manter organizada por conta de um inimigo externo ou uma crise de proporções excepcionais. Portanto, ela precisa ser tratada com muita cautela, pois seu mau uso pode gerar consequências gravíssimas.

IM: Yoon Suk Yeol, presidente da Coreia do Sul, decretou a Lei Marcial, mas, em poucas horas, o parlamento não só forçou o presidente a recuar como trouxe todos os holofotes do mundo para o país. O que Yoon Suk pretendia, afinal? Havia alguma estratégia que foi falha, talvez uma tentativa de golpe?

IL: O presidente decretou e trouxe os holofotes para si mesmo, mas foi uma falha. Ele já era acusado de corrupção, já tinha vários problemas. Poderia ter sido uma tentativa de golpe, se os militares tivessem embarcado no projeto, mas parece muito mais uma tentativa de sufocar a oposição, já que ele perdeu eleições nas legislativas, estava sendo investigado, não tinha mais poder no parlamento e estava se tornando basicamente um pato manco.

IM: “Coreia do Sul” e “Lei Marcial” entraram para os trend topics globais. Qual a repercussão mundial da decisão de Yoon Suk e como pode impactar suas relações internacionais?

IL: As repercussões são muito ruins, porque isso dá tração e gás para, por exemplo, a Coreia do Norte e China, que são inimigas do país. Além disso, faz com que os mercados financeiros e a própria economia sul-coreana fiquem abalados, sem falar na democracia sul-coreana, que é respeitada no mundo inteiro, também se abala por uma tentativa de golpe que, vimos dias subsequentes, não teve solução nenhuma.

IM: Para concluir, sabemos que o Brasil enfrenta dificuldades quando o assunto são os Poderes. Desde represálias até manifestações que levaram pessoas para a cadeia – e outras até perderam suas vidas. O que temos a aprender, ou nos preocupar, com o ocorrido no território sul-coreano?

IL: Isso é péssimo para as democracias. Essa situação mostra que muitas vezes políticos querem se agarrar ao cargo e não têm a capacidade política de entender que o seu país está acima de si mesmo. Então, para mim, isso é uma visão muito clara, um anúncio, de que devemos ficar sempre vigilantes. Um aviso de que existem membros da política que colocam seus interesses em cima do país e começam a descredibilizar as instituições. Por sorte, a Coreia do Sul tem uma política de uma maneira geral sólida, instituições sólidas e não durou poucas horas, logo depois a gente assistiu que a população se revoltou. Os militares não aceitaram isso, até mesmo um general do Exército Comandante renunciou ao cargo durante o período de lei marcial porque ele cumpriu durante algumas horas as ordens do presidente e viu que aquela não é uma ordem nitidamente ilegal. Então, a lição que fica é: devemos aprender que muitas vezes as instituições têm que ser mais fortes que as pessoas.

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A recente tentativa do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, de decretar a Lei Marcial abalou as estruturas políticas do país e chamou a atenção do mundo inteiro. A medida, que rapidamente foi anulada pelo parlamento, levantou debates sobre os limites do poder presidencial e o papel das instituições na hora de defender a democracia.

O episódio expôs as fragilidades políticas do governo e também trouxe impactos significativos para as relações internacionais e a economia sul-coreana.

No Brasil, onde o equilíbrio entre os Poderes também é motivo de preocupação, as lições do caso sul-coreano não podem ser ignoradas. Em entrevista para o Instituto Millenium, o economista e PhD em Relações Internacionais, Igor Lucena, analisa os desdobramentos dessa crise, suas implicações globais e o que devemos aprender para preservar e fortalecer as democracias em tempos desafiadores.

INSTITUTO MILLENIUM: Igor, para contextualizar nossos leitores: o que é a Lei Marcial e ela pode ser um risco às liberdades e direitos humanos?
Igor Lucena: Não há dúvida de que a Lei Marcial é um risco às liberdades e aos direitos humanos. Quando decretada, ela restringe a imprensa, limita atividades civis e interfere em diversos direitos fundamentais. Essa medida só deve ser usada em situações extremas, geralmente quando a sociedade está incapaz de se manter organizada por conta de um inimigo externo ou uma crise de proporções excepcionais. Portanto, ela precisa ser tratada com muita cautela, pois seu mau uso pode gerar consequências gravíssimas.

IM: Yoon Suk Yeol, presidente da Coreia do Sul, decretou a Lei Marcial, mas, em poucas horas, o parlamento não só forçou o presidente a recuar como trouxe todos os holofotes do mundo para o país. O que Yoon Suk pretendia, afinal? Havia alguma estratégia que foi falha, talvez uma tentativa de golpe?

IL: O presidente decretou e trouxe os holofotes para si mesmo, mas foi uma falha. Ele já era acusado de corrupção, já tinha vários problemas. Poderia ter sido uma tentativa de golpe, se os militares tivessem embarcado no projeto, mas parece muito mais uma tentativa de sufocar a oposição, já que ele perdeu eleições nas legislativas, estava sendo investigado, não tinha mais poder no parlamento e estava se tornando basicamente um pato manco.

IM: “Coreia do Sul” e “Lei Marcial” entraram para os trend topics globais. Qual a repercussão mundial da decisão de Yoon Suk e como pode impactar suas relações internacionais?

IL: As repercussões são muito ruins, porque isso dá tração e gás para, por exemplo, a Coreia do Norte e China, que são inimigas do país. Além disso, faz com que os mercados financeiros e a própria economia sul-coreana fiquem abalados, sem falar na democracia sul-coreana, que é respeitada no mundo inteiro, também se abala por uma tentativa de golpe que, vimos dias subsequentes, não teve solução nenhuma.

IM: Para concluir, sabemos que o Brasil enfrenta dificuldades quando o assunto são os Poderes. Desde represálias até manifestações que levaram pessoas para a cadeia – e outras até perderam suas vidas. O que temos a aprender, ou nos preocupar, com o ocorrido no território sul-coreano?

IL: Isso é péssimo para as democracias. Essa situação mostra que muitas vezes políticos querem se agarrar ao cargo e não têm a capacidade política de entender que o seu país está acima de si mesmo. Então, para mim, isso é uma visão muito clara, um anúncio, de que devemos ficar sempre vigilantes. Um aviso de que existem membros da política que colocam seus interesses em cima do país e começam a descredibilizar as instituições. Por sorte, a Coreia do Sul tem uma política de uma maneira geral sólida, instituições sólidas e não durou poucas horas, logo depois a gente assistiu que a população se revoltou. Os militares não aceitaram isso, até mesmo um general do Exército Comandante renunciou ao cargo durante o período de lei marcial porque ele cumpriu durante algumas horas as ordens do presidente e viu que aquela não é uma ordem nitidamente ilegal. Então, a lição que fica é: devemos aprender que muitas vezes as instituições têm que ser mais fortes que as pessoas.

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