A Regulação e o Estado Ágil
Uma agência reguladora subserviente ao estado será apenas mais um custo social, sem benefícios.
Publicado em 26 de novembro de 2024 às, 18h58.
Última atualização em 27 de novembro de 2024 às, 09h10.
Em recente matéria na Gazeta do Povo, anuncia-se a intenção da administração Zema em criar uma agência reguladora estadual, a Artemig (Agência de Regulação dos Transportes e Serviços Públicos de Minas Gerais). A despeito do nome abrangente - afinal, muita coisa se enquadra no rótulo de “Serviços Públicos”) - o objetivo é regular o setor de transportes no estado. Segundo o Projeto de Lei 2.967/2024, a nova agência teria sob sua jurisdição os sistemas estaduais de aeródromos, hidrovias, rodovias e transporte ferroviário.
Para aqueles que gostam das discussões acerca de possibilidades de um estado mais ágil e transparente (menos hesitocrático), vale mencionar dois pontos do projeto de lei que são: (i) a exigência de que a agência adote a Análise de Impacto Regulatório (AIR) e; (ii) a adoção do ‘Sandbox Regulatório’, para aperfeiçoamento do setor regulado por meio da testagem de inovações (a matéria da Gazeta cita, por exemplo, a possibilidade de que se teste o ‘pedágio sem cancela’).
Boas regulações - aquelas que mais corrigem falhas de mercado do que as ampliam com as falhas de governo - são responsáveis nas regulações que emitem (por isto usam a AIR) e também são pró-consumidores, o que significa que estimulam a inovação (por isto usam do sandbox para sua testagem). Obviamente, uma AIR pode ser destruída com abordagens que desprezam/minimizam a importância do custo-benefício em prol de análises vazias (geralmente recheadas de adjetivos populares no mundo empresarial e acadêmico…). Em todas as áreas do conhecimento existem charlatães e não é diferente em áreas que exigem regulação governamental. O preço da boa AIR é, parafraseando um dito popular, é a eterna vigilância.
Não é muito diferente no caso do sandbox regulatório. A ferramenta permite o teste de inovações que devem ter como objetivo o aumento do bem-estar dos consumidores dos serviços regulados. Deste modo, o regulador precisa ter bastante discernimento na escolha dos produtos a serem testados, como deve ponderar os ganhos da inovação com relação ao poder de mercado que ela gera para o inovador. Por exemplo, até mesmo as patentes não são eternas.
No mundo ideal, uma agência reguladora só é criada se o benefício para todos é maior que seu custo e o estado de Minas Gerais não se encontra em situação fiscal confortável, motivo pelo qual se admite que, se criada, a Artemig seria ocupada com servidores públicos de outras áreas do governo. O lado preocupante disso é que a independência (ou, se o leitor preferir, a autonomia) da agência pode perder credibilidade. Um sistema regulatório deve funcionar de forma similar ao sistema de pesos e contrapesos na política. Em outras palavras, é preciso que uma agência reguladora não seja subserviente ao estado, senão será apenas mais um custo social, sem benefícios. Aliás, em pesquisa de 2022, o cientista político Carlos Pereira e Érico Santos mostraram evidências de que até mesmo a AIR, muitas vezes, é usada pelos técnicos como meio de se protegerem de interferências que reputar indevidas no processo regulatório. Ou seja, até a ferramenta (AIR) pode ser encarada como uma resposta técnica às pressões políticas. Imagine, então, no caso de uma agência que é apenas mais um braço estatal…
A regulação é sempre um tópico polêmico, mesmo entre liberais. A criação de uma nova agência reguladora estadual é, portanto, a oportunidade para que se possa avançar um modelo regulatório que, de fato, faça mais bem do que mal à economia de Minas Gerais. Será? A conferir.