Exame.com
Continua após a publicidade

6º Colóquio “Cultura, Mercado e Liberdade de Expressão” questiona os limites do Estado na área

O dramaturgo e cineasta Moacyr Góes, o cientista político e secretário de Estado da Justiça e do Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul, Fernando Schüler, e o antropólogo Roberto DaMatta, debateram o tema “Cultura e Liberdade de Expressão”, mediados pelo diretor executivo do Instituto Millenium, Paulo Uebel, no 6º Colóquio “Cultura, Mercado e Liberdade de Expressão”. Schüler levantou a necessidade de disseminar os valores culturais sem que distorções e […] Leia mais

I
Instituto Millenium

Publicado em 8 de dezembro de 2010 às, 13h14.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 10h42.

O dramaturgo e cineasta Moacyr Góes, o cientista político e secretário de Estado da Justiça e do Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul, Fernando Schüler, e o antropólogo Roberto DaMatta, debateram o tema “Cultura e Liberdade de Expressão”, mediados pelo diretor executivo do Instituto Millenium, Paulo Uebel, no 6º Colóquio “Cultura, Mercado e Liberdade de Expressão”.

Schüler levantou a necessidade de disseminar os valores culturais sem que distorções e interferências indevidas (de fundo ideológico ou burocrático) atrapalhem o fluxo. E afirmou que a necessidade de se discutir a liberdade e a cultura hoje no Brasil advém principalmente da urgência em se combater a burocratização e a ineficiência estatais nos processos de fomento à cultura: “Como nós fazemos fluir o sistema de financiamento da cultura no Brasil?”, questionou.

Ele entende que o fluxo nesses processos origina a liberdade no acesso aos financiamentos. “Esse é o sentido que está sendo corrompido no Brasil pela burocracia, as estruturas não funcionam, são elitizadas. A malha estatal representa 90% da malha cultural brasileira e não quer se reformar”, disse.

O cientista político ilustrou o engessamento da cultura no Brasil comentando sobre uma figura lendária no meio, o funcionário público da área: “O violinista funcionário público, desafina no ré, mas continua na orquestra porque tem estabilidade no emprego”, contou.

O secretário, que foi diretor da Fundação Iberê Camargo, acredita que o Brasil já possui um marco de direito administrativo, originário dos anos 1990, e precisa migrar para esse modelo mais aberto e livre. “É preciso pensar em um modelo descentralizante, que dê poder as pessoas”, comentou.

Para o cineasta Moacyr Góes, a cultura brasileira é “dependente feliz do Estado” e, consequentemente, a produção artística do pais é sua refém. “Não há no país, um controle explícito de conteúdo pelo Estado, mas as leis de incentivo regulam a produção cultural. Esse mecanismo de produção vias leis de incentivo matou a figura do produtor cultural, o que existe é a figura do produtor executivo. Criou-se no Brasil uma relação de dependência feliz entre criadores, o que gera um definhamento da liberdade de expressão”, afirmou.

Góes criticou as práticas e leis de financiamento, que segundo ele, estão mal aplicadas e elaboradas, asfixiam a criação artística e criam uma fábrica de projetos, que julga os editais que merecem ou não merecem financiamento. Então, hoje tudo está direcionado a partir de referências dadas pelo Estado. Isso inibe aquilo que é expressão genuína e conservadora, a força motriz da comunicação. Quebra-se aí o diálogo produtivo. Os filmes tem agradar à Ancine, as bancadas. O que entra nesse jogo é a relação entre indivíduo e Estado. O Estado sempre tem uma mão muito pesada e isso interfere na liberdade de expressão enquanto produtora de uma linguagem livre que possa interferir”, disse o dramaturgo.

Para o cineasta, o Brasil também deixa de fora das discussões sobre produção cultural a questão do lucro e a participação do Estado no retorno das obras que financia. “As obras brasileiras são muito impregnadas de cunho ideológico. O produto cultural sempre teve uma aversão a isso, à geração de lucro. A gente vende, tenta vender, mas não admite o lucro, que para gente é resultado da exploração. O parceiro, como é o Estado, participa do prejuízo, mas não do lucro e não existe mecanismo de acesso a quem financia a cultura no pais, que é a população”, afirmou.

Roberto DaMatta participou do debate questionando os limites do Estado: “Trabalhei no Museu Nacional, e sei bem o que é a ‘Estadomania’, ‘Estadofilia’, a ‘Estadopatia’, a ideologia dominante e paralisante de toda a América Latina”, comentou.

O antropólogo também condenou a dependência do cultura ao Estado na produção nacional e a “cultura da dependência”: “O produtor cultural quer ser funcionário público, quer ser amarrado pelo Estado”, disse.

E por fim, DaMatta retornou ao tema da liberdade. “Para nós a liberdade é uma condenação, porque nós não podemos falar da liberdade sem sermos condenados neste país.”