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Sobre estatísticas e real inclusão de mulheres em posições de liderança

Em 2019, 53% das mulheres participava do mercado de trabalho no Brasil – ao final do ano seguinte, esse percentual reduziu-se a 45,8%

Mulheres investidoras (Matthew Leete/Getty Images)
Mulheres investidoras (Matthew Leete/Getty Images)
I
Impacto Social

Publicado em 20 de abril de 2021 às, 10h00.

Última atualização em 20 de abril de 2021 às, 11h21.

A pandemia da covid-19 pegou o mundo todo de surpresa. Muitas são as estatísticas assustadoras, entre elas o impacto negativo sobre a participação das mulheres no mercado de trabalho. Ao final de 2019, 53% das mulheres participava formal ou informalmente do mercado de trabalho no Brasil – estatística que nos posicionava entre a França (50,6%) e a Finlândia (54,8%). Ao final do ano seguinte, esse percentual reduziu-se a 45,8%. Ou seja, diminuição de 14% em um ano - para fins de comparação, a participação dos homens retraiu 8% no mesmo período. Em termos históricos, é como se voltássemos ao ano de 1990. Se o retrocesso é evidente nas ocupações em geral, podemos imaginar algo similar em cargos de liderança. Mas por que a inclusão de mulheres em posições de liderança empresarial ou política é importante?

Artigo de três professoras da UFABC nos apresenta algumas razões. Nele, as professoras Abras, Fava e Kuwahara mostram que os países liderados por mulheres tiveram menos casos de contaminação e morte por covid-19, em virtude, principalmente dos gastos e da cobertura de saúde pública dessas nações. Se os países liderados por homens tivessem o mesmo nível de gastos e cobertura nessa área, o resultado teria sido igual. Não se trata, portanto, de diferenças na velocidade de reação entre governantes homens e mulheres.

Podemos concluir que mulheres gerenciam melhor os gastos públicos? Não necessariamente... O que as pesquisadoras mostram é que a cobertura de serviços de saúde e, consequentemente, os gastos neste setor parecem ter uma correlação forte com a possibilidade de uma mulher ocupar esse cargo. Não precisamos de um teste de causalidade para descobrir a direção do efeito se o que queremos é a possibilidade de países com uma melhor gestão das decisões públicas. Sabemos que o que permite um bom gerenciamento de uma crise pandêmica também foi importante para possibilitar uma mulher ocupar o cargo de líder política.

Essa correlação entre fatores nos remete à questão da inclusão das mulheres no mercado de trabalho e na liderança. Muitas empresas veem a inclusão de mulheres como um potencial avanço. Entretanto, trazer mulheres e não alterar o ambiente empresarial será completamente inócuo – assim como somente eleger uma presidente mulher em um país sem estrutura de saúde adequada não mitigaria os efeitos da covid-19. Não basta contratar mulheres e acreditar que o sistema se adequará automaticamente. O ambiente em si é que faz a diferença.

Uma das possibilidades são políticas de recrutamento direcionadas a grupos específicos (mulheres ou pessoas negras, por exemplo). A entrada de um coorte significativo de pessoas diferentes do padrão estabelecido propicia uma mudança estrutural. Outra possibilidade é conciliarmos políticas de cotas e contratação focadas com ações de empoderamento. Isso evitará que as novas contratações precisem trabalhar em conformidade com o ambiente estabelecido ou encontrem o mesmo cenário das gerações que as antecederam.

A real inclusão – que, como se sabe, não é só convidar para o baile, mas permitir danças em diferentes estilos no mesmo salão – é a que ocasiona os efeitos positivos. Medidas cosméticas que alterem somente as estatísticas, definitivamente, não terão o mesmo impacto.