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Quando a ciência revida: ter formação científica ajudou líderes no combate à Covid-19?

Nos últimos anos, a pandemia do novo coronavírus apresentou-se como um desafio sem precedentes para líderes políticos de todo o mundo

 (fotograzia/Getty Images)
(fotograzia/Getty Images)
I
Impacto Social

Publicado em 22 de março de 2023 às, 08h30.

Por Gabriel Caser dos Passos*

Nos últimos anos, a pandemia do novo coronavírus apresentou-se como um desafio sem precedentes para líderes políticos de todo o mundo. Aqueles que assumiram o cargo de liderança tiveram que lidar com uma crise de saúde pública que exigiu uma tomada de decisão rápida e eficaz. Mas a formação acadêmica dos líderes pode ter ajudado na luta contra a Covid-19? Esse foi o tema investigado em minha dissertação intitulada "Quando a ciência revida - Ter formação científica ajudou líderes no combate à Covid-19?".

Neste estudo, utilizo dados de eleições municipais no Brasil e um desenho de regressão descontínua para avaliar o impacto da eleição de prefeitos (homens e mulheres) com formação STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática, na sigla em inglês) na resposta à Covid-19. Em outras palavras, o trabalho comparara os resultados relativos à Covid-19 de municípios em que candidatos com formação em STEM venceram por margens muito estreitas com aqueles em que os candidatos sem formação em STEM venceram por margens semelhantes. O objetivo era determinar se a eleição de prefeitos com formação em STEM causou melhores resultados em termos de saúde pública.

Os resultados são interessantes e significativos. Cidades que elegeram prefeitos com formação em STEM conseguiram reduzir as mortes e hospitalizações relacionadas à Covid-19. Para atingir tais resultados, um dos mecanismos utilizados nestas cidades com lideranças STEM foi o aumento no número de intervenções não farmacêuticas (INFs), como o uso obrigatório de máscaras e restrições a aglomerações, em comparação com aquelas cidades que não possuíam um prefeito ou prefeita com o mesmo tipo de formação. O trabalho também mostra que esse impacto estimado não se deve a outras características observáveis dos prefeitos, como anos de escolaridade, ideologia ou gênero.

O estudo usou uma amostra principal de 98 municípios e uma amostra maior com mais de 400 cidades para verificar a robustez dos achados. Os resultados apresentam sinais semelhantes, magnitude e são estatisticamente significativos. Isso sugere que líderes com formação em STEM podem ter uma vantagem em situações que exigem tomada de decisão rápida com base em dados e evidências limitados.

Em resumo, este estudo mostra que cidades que elegeram líderes com formação em STEM tiveram melhores resultados na luta contra a Covid-19 em comparação a municípios que elegeram um candidato com ensino superior não-STEM. Isso pode indicar que o investimento em capital humano relacionado à ciência e tecnologia pode produzir externalidades não esperadas, como melhorias na gestão pública. Esses resultados são importantes para a seleção de líderes políticos em situações de emergência e destacam a importância de investir em educação e formação científica também para líderes políticos.

* Gabriel Caser dos Passos é mestre em Políticas Públicas pelo Insper e bacharel em Direito pela USP. Twitter: https://twitter.com/GabrielCaser