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Nós sabemos como preservar a Amazônia

Décadas de experimentação na floresta já mostraram como promover desenvolvimento sustentável. Agora, o mundo todo está disposto a nos apoiar

Amazônia: bioma vira foco de discussões sobre o clima (Andre Deak/Flickr)
MC

Maria Clara Dias

Publicado em 1 de novembro de 2021 às 17h26.

Em tempos de COP26, está todo mundo mais de olho ainda na Amazônia. O motivo? As consequências do desmatamento e das queimadas na maior floresta tropical do planeta não são apenas dos países onde ela está situada, mas de todo o planeta, que depende dela.

As atuais crises hídrica e energética no Brasil são apenas uma prévia do que a destruição do bioma pode causar e, apesar de não faltarem alertas, segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, apenas em setembro, a floresta perdeu, por dia, uma área maior que 4 mil campos de futebol.

A EXAME estará na COP26. Acompanhe as novidades em primeira mão

Ainda não conseguimos chegar num ponto de inflexão onde paramos a destruição e começamos a regeneração de fato, mas precisamos caminhar para lá.

Por sorte, temos bons trabalhos que nos apontam caminhos. Um grupo de mais de 200 cientistas entregou à ONU um alerta, com importantes recomendações para parar o desmatamento. A diretora de ciências do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ane Alencar, faz parte desse grupo de pesquisadores e explica que o documento é um relatório completo que traz, entre outras coisas, algumas proposições sobre para onde podemos ir para garantir o futuro da floresta, baseadas em três grandes pilares.

O primeiro é voltado para a conservação, restauração e remediação de ecossistemas terrestres e aquáticos. Já o segundo diz respeito ao desenvolvimento de políticas de bioeconomia que sejam inovadoras e inclusivas, enquanto o terceiro olha para o fortalecimento da governança e das populações locais. É uma receita completa para o sucesso de um conceito que os pesquisadores chamam de “Amazônia Viva”.

“Precisamos entender que as atividades humanas fazem parte de um processo vivo da floresta, ou seja, não têm valor apenas as atividades econômicas e a geração de riqueza e renda, mas o todo”, afirma Ane Alencar, em entrevista para o novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável, que tratou do assunto.

Ela explica que a Amazônia é um bioma único, formado durante centenas de milhares de anos, e isso em si tem um valor. “A floresta deve ser reconhecida e valorizada por prestar serviços ecossistêmicos, não só para o país ou o continente, mas para o mundo. As atividades econômicas desenvolvidas lá devem apoiar a manutenção da floresta em pé”, detalha.

Ane lembra que a governança precisa favorecer um sistema de participação mais equitativo e diverso para que o conhecimento, seja ele científico ou tradicional, seja valorizado em todos os processos. Fortalecer a relação entre o rural vivo e o urbano também é fundamental, já que grande parte da população da Amazônia hoje vive em centros urbanos. “Por último, reconhecer que a Amazônia é uma meca da diversidade cultural e isso em si tem muito valor”, completa Ane. Essas são boas bases para a criação de um novo modelo de desenvolvimento, mais sustentável.

Qual é o primeiro passo? A sociedade precisa reconhecer que a floresta vale mais em pé do que transformada em pasto. “Eu começo pela sociedade porque é ela quem pode cobrar tanto dos governantes tanto das empresas, setores que precisam estar engajados para viabilizar as mudanças necessárias”, afirma Ane.

As pesquisas sobre o assunto já mostram que essa percepção vem crescendo, mas esses resultados ainda não se transformaram num engajamento efetivo. Esse é o nosso desafio, mas Ane é otimista. “O mundo voltou para um trilho interessante e esse novo rumo, que pensa na redução de emissões (de gases do efeito estufa), vai ajudar a puxar a Amazônia para o caminho da floresta viva”.

A floresta, com sua sabedoria de milhões e milhões de anos, também pode nos ensinar sobre sua própria preservação. Para Ane, uma dessas lições é a de que a diversidade gera riqueza, é ela que move tudo para frente. Outro ensinamento é que cada um tem uma função. Árvores menores, por exemplo, têm um enraizamento mais profundo e acabam trazendo água para outras cujas raízes chegam menos fundo. É assim que precisamos agir, cada ator com suas potencialidades, mas em prol de um objetivo comum.

“Se a gente transforma tudo em uma paisagem de monocultura, perde muito, inclusive a capacidade de resiliência e outras possibilidades de reagir.” Comecemos olhando para a floresta com outros olhos, então. Falamos muito em soluções baseadas na natureza, mas precisamos começar a falar também em estratégias baseadas na natureza. Para manter a floresta viva, não temos que inventar a roda, só olhar para o que ela já construiu e aprender com isso.

*com Angélica Queiroz

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As atuais crises hídrica e energética no Brasil são apenas uma prévia do que a destruição do bioma pode causar e, apesar de não faltarem alertas, segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, apenas em setembro, a floresta perdeu, por dia, uma área maior que 4 mil campos de futebol.

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Ainda não conseguimos chegar num ponto de inflexão onde paramos a destruição e começamos a regeneração de fato, mas precisamos caminhar para lá.

Por sorte, temos bons trabalhos que nos apontam caminhos. Um grupo de mais de 200 cientistas entregou à ONU um alerta, com importantes recomendações para parar o desmatamento. A diretora de ciências do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Ane Alencar, faz parte desse grupo de pesquisadores e explica que o documento é um relatório completo que traz, entre outras coisas, algumas proposições sobre para onde podemos ir para garantir o futuro da floresta, baseadas em três grandes pilares.

O primeiro é voltado para a conservação, restauração e remediação de ecossistemas terrestres e aquáticos. Já o segundo diz respeito ao desenvolvimento de políticas de bioeconomia que sejam inovadoras e inclusivas, enquanto o terceiro olha para o fortalecimento da governança e das populações locais. É uma receita completa para o sucesso de um conceito que os pesquisadores chamam de “Amazônia Viva”.

“Precisamos entender que as atividades humanas fazem parte de um processo vivo da floresta, ou seja, não têm valor apenas as atividades econômicas e a geração de riqueza e renda, mas o todo”, afirma Ane Alencar, em entrevista para o novo episódio do podcast Infraestrutura Sustentável, que tratou do assunto.

Ela explica que a Amazônia é um bioma único, formado durante centenas de milhares de anos, e isso em si tem um valor. “A floresta deve ser reconhecida e valorizada por prestar serviços ecossistêmicos, não só para o país ou o continente, mas para o mundo. As atividades econômicas desenvolvidas lá devem apoiar a manutenção da floresta em pé”, detalha.

Ane lembra que a governança precisa favorecer um sistema de participação mais equitativo e diverso para que o conhecimento, seja ele científico ou tradicional, seja valorizado em todos os processos. Fortalecer a relação entre o rural vivo e o urbano também é fundamental, já que grande parte da população da Amazônia hoje vive em centros urbanos. “Por último, reconhecer que a Amazônia é uma meca da diversidade cultural e isso em si tem muito valor”, completa Ane. Essas são boas bases para a criação de um novo modelo de desenvolvimento, mais sustentável.

Qual é o primeiro passo? A sociedade precisa reconhecer que a floresta vale mais em pé do que transformada em pasto. “Eu começo pela sociedade porque é ela quem pode cobrar tanto dos governantes tanto das empresas, setores que precisam estar engajados para viabilizar as mudanças necessárias”, afirma Ane.

As pesquisas sobre o assunto já mostram que essa percepção vem crescendo, mas esses resultados ainda não se transformaram num engajamento efetivo. Esse é o nosso desafio, mas Ane é otimista. “O mundo voltou para um trilho interessante e esse novo rumo, que pensa na redução de emissões (de gases do efeito estufa), vai ajudar a puxar a Amazônia para o caminho da floresta viva”.

A floresta, com sua sabedoria de milhões e milhões de anos, também pode nos ensinar sobre sua própria preservação. Para Ane, uma dessas lições é a de que a diversidade gera riqueza, é ela que move tudo para frente. Outro ensinamento é que cada um tem uma função. Árvores menores, por exemplo, têm um enraizamento mais profundo e acabam trazendo água para outras cujas raízes chegam menos fundo. É assim que precisamos agir, cada ator com suas potencialidades, mas em prol de um objetivo comum.

“Se a gente transforma tudo em uma paisagem de monocultura, perde muito, inclusive a capacidade de resiliência e outras possibilidades de reagir.” Comecemos olhando para a floresta com outros olhos, então. Falamos muito em soluções baseadas na natureza, mas precisamos começar a falar também em estratégias baseadas na natureza. Para manter a floresta viva, não temos que inventar a roda, só olhar para o que ela já construiu e aprender com isso.

*com Angélica Queiroz

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