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Transforme desafios em oportunidades, afirma Renata Cenni

Na coluna desta semana, conheça a história de Renata Cenni, vice-presidente na WebBeds, baseada nos EUA

Transforme desafios em oportunidades, afirma Renata Cenni  (Editora Global Partners)
Transforme desafios em oportunidades, afirma Renata Cenni (Editora Global Partners)

O caminho para chegar onde estou teve muitos obstáculos. Mas sempre encarei cada um deles como grandes aprendizados, que me ajudaram a crescer e me desenvolver, em diversas vertentes. Tenho orgulho de cada experiência vivenciada e enxergo os desafios como oportunidades para a aquisição de novos conhecimentos. “O que aprendi que posso levar para a vida? Que erros não devo cometer?” – são algumas das perguntas que sempre faço no decorrer da jornada.  

Nasci e cresci na cidade de Jundiaí (SP). A infância, diferente dos dias de hoje, era muito voltada às brincadeiras na rua e ao contato com a vizinhança. Sou a filha caçula de três filhos, e meus pais, Antonio Carlos e Maria Inês, ensinaram desde cedo o valor do respeito ao próximo. Com seus exemplos, mostraram que é essencial reconhecer e valorizar as diferenças, pois cada indivíduo carrega consigo um talento único e especial. Essa compreensão me levou a tratar os seres humanos de maneira singularizada e respeitosa, sempre levando em consideração sua cultura, vivências e personalidade, enxergando em cada interação uma oportunidade de aprendizado e crescimento mútuo. 

Desde sempre, o tema da educação foi tratado com grande seriedade. Meus pais faziam questão de enfatizar que os estudos são a base de tudo, sendo necessário buscar uma formação consistente para se tornar alguém na vida. Perante estes valores rígidos, essa orientação era constantemente salientada.  

Estudei em escola pública até finalizar o Ensino Médio. Durante este período, desenvolvi um grande interesse por Química, e isso me levou a escolher Farmácia como carreira. Assim, ingressei na Universidade São Francisco, em Bragança Paulista (SP), mudando-me para lá aos 18 anos. Ao longo da faculdade, trabalhei como assistente de Química nos laboratórios, o que me permitiu obter uma bolsa parcial. No entanto, decidi não seguir a especialização em Bioquímica, pois o verdadeiro interesse era na farmácia industrial. Para seguir esse caminho, percebi que precisava aprimorar o inglês, que na época era bastante limitado. Foi então que tomei a decisão de trancar a especialização que fazia e migrar para Londres, para atuar como au pair durante um ano, pois visualizei que esta era a oportunidade perfeita para aprimorar o idioma e, consequentemente, abrir novas portas no campo profissional.  

Gerencie a equipe de forma humanizada 

Mudar para Londres foi uma das decisões mais ousadas que tomei na vida, e o plano inicial era ficar apenas um ano. No entanto, essa jornada se estendeu por 13 anos. Durante esse período, além de dominar o inglês, me tornei fluente em espanhol e consegui a cidadania italiana. Consequentemente, também aprendi o idioma, pelo qual sempre me encantei. E a vida no exterior transformou-se em uma verdadeira escola.  

Dentro deste período, realizei muitos trabalhos diferentes. Após três meses atuando em pizzarias, já estava gerenciando uma delas, mesmo sem falar bem o inglês. O próximo passo foi na Embaixada do Brasil, especificamente na Comissão Naval, em que tive a oportunidade de envolver-me com turismo, criando roteiros para os comandantes que visitavam o país. Essa vivência abriu portas para que eu entrasse numa empresa de turismo chamada V.O.W Travel, e, posteriormente, na GTA, onde permaneci por quase 20 anos.  

A GTA foi adquirida pela espanhola Hotelbeds, e foi a partir da fusão das empresas, incluindo a Tourico Holidays, que os desafios começaram a surgir. Em uma cultura corporativa predominantemente masculina, fui a primeira mulher a se tornar diretora regional na América do Norte, em 2021. Fui escolhida por uma consultoria externa, algo que, até então, só ocorria com homens transferidos da Espanha.  

Tenho orgulho de ter conquistado este espaço em um ambiente tão competitivo e dominado por uma cultura rígida. Diria que foi um marco na minha vida. E tudo isso só foi possível porque sempre mantive uma reputação intacta, enfrentando cada desafio com integridade. No mundo corporativo, quanto mais alto o cargo, mais exigente se torna o ambiente. Precisei desenvolver habilidades de liderança, construir uma equipe forte e gerenciá-la sempre de forma muito humanizada. Nunca deixei de lado essa essência humana, algo que sempre foi reconhecido e admirado por aqueles que trabalham comigo. Quando me perguntam se aspiro ser CEO de uma grande empresa, respondo que não. Meu desejo é continuar minha carreira, talvez até abrir algo novo, mas sempre mantendo meus valores. Acredito que as empresas são feitas de pessoas e que, embora possamos nos adaptar ao ambiente, não devemos trocar quem somos apenas para ganhar um título. Para mim, o ser humano é mais importante do que qualquer cargo ou posição. 

Conexões genuínas, grandes impactos 

Uma liderança inspiradora é fundamentada na confiança. Após mais de 15 anos trabalhando em home office, percebo que estabelecer este atributo é crucial para liderar de forma eficaz. Sem isso, qualquer esforço se torna vazio. Além disso, acredito que a humanização no ambiente corporativo é imprescindível, especialmente em tempos em que a separação física é tão evidente e as interações, muitas vezes, se tornam mecânicas e distantes. E são pequenos gestos, como dizer um bom-dia ou perguntar ao colaborador como está o dia dele, que tornam a liderança significativa.  

Frequentemente, as pessoas não estão em busca de soluções prontas. Elas apenas precisam ser ouvidas – um processo quase terapêutico. Quando um líder demonstra genuíno interesse pelo bem-estar da equipe, não só melhora o clima organizacional, como também gera um retorno significativo à empresa. Um funcionário que se sente valorizado e ouvido tem uma participação mais ativa e se torna leal, aumentando seu comprometimento e, por consequência, sua produtividade. 

Possuo uma equipe, composta por membros que me acompanham há muitos anos e refletem esse estilo de liderança. Mantenho a opinião que o novo líder deve investir constantemente em si, não apenas no marketing pessoal, mas também em habilidades práticas essenciais para o sucesso real. O conceito de call to action é vital. É preciso ser criativo e saber balancear a inovação com coerência. Em um mercado tão diverso, ter novas abordagens, errar, aprender com os erros e seguir em frente, desde que tudo esteja alinhado com o orçamento e a estratégia da empresa, é determinante. Esse equilíbrio entre inovação e pragmatismo é o caminho para o êxito do líder corporativo nos tempos atuais. 

Valorize o time e dê espaço para cada um se desenvolver 

Para alcançar resultados extraordinários com os membros da equipe, faço do processo de seleção algo único. Não faço entrevistas tradicionais; em vez disso, conduzo conversas informais como a última etapa no processo de contratação. Confio naqueles que me reportam diretamente para liderar as entrevistas iniciais e identificar candidatos promissores. O currículo é apenas uma formalidade. O mais importante é avaliar se o candidato possui espírito de equipe e disposição para aprender e crescer dentro da organização.  

Atualmente, lidero um time de 56 pessoas, embora já tenha gerenciado times muito maiores no passado. Contudo, optei por conduzir grupos menores, pois valorizo o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Prefiro formar bons profissionais internamente, mesmo que venham de áreas completamente diferentes, e confio na capacidade de se desenvolverem. Geralmente, quando encontram um ambiente que lhes dá espaço para expandir suas habilidades, os resultados são notáveis. Por isso, manter a equipe motivada e comprometida é, para mim, o verdadeiro caminho para o sucesso organizacional. Essa abordagem não só aumenta o retorno sobre o investimento para a empresa, como também cria um ambiente de trabalho onde todos se sentem valorizados e parte de algo maior. 

Liderança é sobre inspirar e ensinar 

Uma das maiores armadilhas que pode prejudicar o desenvolvimento na carreira é a ambição desmedida, muitas vezes alimentada pela inveja e pelo desejo de derrubar os outros. Essa mentalidade, infelizmente, é comum em muitos ambientes organizacionais, onde alguns estão dispostos a sacrificar o crescimento coletivo em prol do sucesso individual. No entanto, a escalada autêntica deve ser alcançada por meio de mérito e reconhecimento, e não às custas de outros. Desde o início da minha carreira, nunca precisei adotar práticas que prejudicassem colegas para avançar. Sempre confiei que meu trabalho seria reconhecido pela qualidade e dedicação.  

Nunca tive medo de perder o emprego ou de ver outro assumir meu cargo. Se alguém deseja alcançar a posição que ocupo, estou mais do que disposta a guiá-lo nesse caminho. Para mim, isso não é uma ameaça, mas sim uma oportunidade de contribuir para o crescimento dos outros. Dentro da empresa, participo ativamente de um programa de mentoria, e, nos últimos dois anos, tive o privilégio de orientar diversos colaboradores de diferentes departamentos, ajudando-os a desenvolver habilidades de liderança e a se prepararem para novos desafios. O feedback que recebo dessas experiências é extremamente positivo, o que reforça minha crença de que a verdadeira liderança consiste em inspirar e ensinar.  

Maternidade: fonte de inspiração para a melhor versão 

Uma das grandes forças que sempre me impulsionaram a buscar mais e a me tornar alguém mais resiliente foi, sem dúvida, o fato de ser mãe. Aos 32 anos, em Londres, tornei-me mãe do Gabriel. E isso se deu em um contexto em que as percepções sobre maternidade no ambiente de trabalho eram, e ainda são carregadas de preconceitos. Lembro-me claramente de estar grávida quando surgiu a oportunidade de ser promovida ao primeiro cargo de gerente. O ano era 2006 e meu chefe, demonstrando o preconceito comum da época, perguntou se eu teria capacidade para assumir tal responsabilidade enquanto estava para me tornar mãe. Sem hesitar, respondi que não apenas tinha plena capacidade para o cargo, como também sabia que o fato de ser mãe não interferiria em minhas habilidades dentro da empresa.  

A maternidade, para mim, nunca foi um empecilho, e sim uma fonte de motivação. E mediante esse empenho constante, alcancei novos patamares de crescimento na carreira. No entanto, é impossível ignorar o rótulo que muitas mulheres enfrentam no mercado de trabalho. A ideia de que “ela é mãe, então talvez seja melhor contratar um homem” é uma mentalidade que, infelizmente, ainda existe. Ser mãe me fortaleceu de maneiras que nunca imaginei. Meu filho, que hoje tem 17 anos, me fez ambicionar ser a minha melhor versão. Queria mostrar-lhe, por meio do meu exemplo, que é possível evoluir e superar desafios, independentemente das circunstâncias. Ele foi uma inspiração, e também a razão concreta para eu continuar buscando mais. Cada vitória e cada passo adiante eu dediquei a ele, porque sabia que estava construindo algo maior para nós dois. Hoje, posso afirmar com convicção que ser mãe me transformou em uma pessoa mais forte, determinada e capaz de enfrentar qualquer desafio que o mundo corporativo apresente. 

Incentive o autocuidado e a busca pela verdadeira motivação  

Para manter a motivação, especialmente nos momentos de dificuldade, é importante cuidar dos que estão ao redor, tanto no ambiente de trabalho quanto em outros aspectos da vida. Além do mais, vale ressaltar que a verdadeira motivação precisa vir de dentro de cada um. Sempre digo que é necessário levantar da cama com um propósito, e isso só é possível quando se é apaixonado pelo que se faz. Passamos muitas horas trabalhando, e isso nos faz pensar que é essencial tratar as pessoas como os talentos únicos que elas são.  

No ambiente de trabalho, reservo tempo semanalmente para conversar com o time em encontros que chamo de “Tempo/Chat with Renata”, pois estou sempre aberta para que me contatem, e não apenas por meio dos meus direct reports. Esses momentos são oportunidades para cada um expressar o que sente, falar sobre o que quer ou não fazer e discutir, de forma saudável, como melhorar o dia a dia de todos. Tento transmitir isso à equipe, incentivando-os a encontrar esse equilíbrio. Hoje em dia, questões de saúde mental são cada vez mais reconhecidas e discutidas, e acredito que pequenos gestos, como encorajar alguém a cuidar de si, têm um impacto muito maior do que apenas cobrar por tarefas pendentes. 

Ame sua essência e rejeite moldes 

Uma das orientações mais valiosas que já recebi como líder veio de um ex-chefe que, atualmente, é presidente de uma grande empresa. Na época, eu trabalhava em Londres e me encontrava em um momento de reflexão, questionando se estava realmente alinhada ao ambiente corporativo. Será que eu precisava mudar meu jeito de ser para me encaixar melhor? Na época, eu achava que meu inglês não era suficientemente bom. Esses pensamentos me assombravam, principalmente porque, durante boa parte da minha trajetória profissional, atuei fora do Brasil, exceto por um período de três anos em que retornei ao país. 

Em uma dessas conversas, ele foi direto ao ponto e disse algo que nunca esqueci: “Não mude. Você não precisa se tornar mais corporativa. O preço de perder quem você é, de deixar sua humanidade de lado, é alto demais e não valerá a pena.” Assim, ele explicou que a minha essência, aquilo que me tornava única, era o meu maior ativo. E percebi que ao tentar me adaptar a um molde corporativo rígido, poderia perder justamente as qualidades que os outros mais apreciavam em mim. Ele me encorajou a continuar sendo autêntica e a carregar comigo essa leveza e humanidade, mesmo em um ambiente no qual, muitas vezes, prevalece a formalidade excessiva. 

Desde então, levo esse conselho como um mantra e nunca o abandonei. É isso que procuro transmitir àqueles que aspiram a ocupar o meu cargo. Sempre digo: “Seja você mesmo”. Não é necessário tentar ser cópia de alguém. O importante é trazer sua própria autenticidade para o papel que deseja desempenhar e, a partir disso, buscar fazer o melhor possível à sua maneira. Cada um possui uma essência única, e é justamente essa individualidade que enriquece qualquer ambiente e fará a diferença na carreira. 

Escolhas sábias, futuro brilhante 

Busque algo que realmente ame fazer, independentemente da profissão que escolheu trilhar. É primordial que o trabalho não apenas o satisfaça, mas também permita manter a qualidade de vida que quer obter. Frequentemente, ouvimos a pergunta sobre como construir um futuro financeiro estável. Concentrar-se excessivamente no dinheiro não é o caminho correto. O que realmente importa é encontrar um equilíbrio entre o que faz e o estilo de vida que deseja levar. O dinheiro tende a seguir naturalmente quando se está dedicado e apaixonado pelo que faz, e quando essa dedicação está alinhada com valores e objetivos. Escolher uma carreira que ama e que também permita uma qualidade de vida adequada é a chave para um futuro satisfatório e financeiramente estável. 

Tenha em mente que o mundo está sempre em busca de inovação, mas, ao mesmo tempo, por trás disso existe o toque humano, uma influência que não pode ser totalmente alterada. Quando pensamos em tecnologias que substituem o contato humano, como os robôs em restaurantes, por exemplo, percebemos que, ao eliminar uma pessoa, também perdemos o atendimento ao cliente, aquela troca que enriquece a experiência. E nada substitui a interação humana.  

Outro ponto importantíssimo é manter uma relação de união com a família. No meu caso, morando em outro país, a relação com eles é algo que valorizo profundamente. Viajo ao Brasil de duas a quatro vezes por ano para poder estar ao lado deles.  

Por fim, tenha certeza de que a combinação de uma boa educação, escolhas profissionais acertadas, um planejamento bem estruturado e uma família unida é a receita para o sucesso. Nunca permita que sua essência seja ofuscada por ninguém. Seja leal aos seus sentimentos e princípios, pois seguir esses passos é a chave para um futuro promissor.