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O que pode mudar a tendência de dólar a 3 reais?

O dólar está derretendo e é difícil encontrar algo capaz de mudar a tendência no curto prazo. É claro que os riscos que põem a incerteza política global no maior patamar dos últimos 20 anos estão no radar do mercado. Os desafios domésticos idem ibidem. Ainda assim, os fantasmas conhecidos não têm conseguido mudar a […]

MARINE LE PEN, CANDIDATA CONSERVADORA NA FRANÇA: se der uma treta, o dólar tende a subir, como em 2012, que também começou tranquilo e favorável / Aziz Taher/ Reuters
MARINE LE PEN, CANDIDATA CONSERVADORA NA FRANÇA: se der uma treta, o dólar tende a subir, como em 2012, que também começou tranquilo e favorável / Aziz Taher/ Reuters
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Celso Toledo

Publicado em 20 de fevereiro de 2017 às, 12h09.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às, 18h42.

O dólar está derretendo e é difícil encontrar algo capaz de mudar a tendência no curto prazo. É claro que os riscos que põem a incerteza política global no maior patamar dos últimos 20 anos estão no radar do mercado. Os desafios domésticos idem ibidem. Ainda assim, os fantasmas conhecidos não têm conseguido mudar a maré.

Ainda vejo a calmaria com desconfiança. Sei que não se deve peitar uma avalanche, mas, pensando em um prazo maior, acredito que pode valer a pena comer a torta pelas beiradas, reforçando um pouquinho o escudo de proteção contra eventuais dissabores. Não é preciso uma faísca muito forte para encrespar o humor do mercado nas condições atuais.

Como explicar o insaciável apetite pelo Brasil em um cenário cheio de avisos?

O real tem sido embalado por três motores: (i) “fundamentos”, (ii) “carrego” e (iii) inércia. O pano de fundo foi pintado pelas barbeiragens da política econômica do governo anterior. Em 2015, ante a perspectiva de colapso econômico, o real só não perdeu mais do que as moedas da Argentina, do Cazaquistão e da Ucrânia, nações atormentadas, respectivamente, por inflação crônica, crise de balanço de pagamentos e guerra. O Brasil ficou “barato”.

A mudança de governo abriu a perspectiva de uma melhora de “fundamentos” que representou o primeiro impulso rumo à normalização. O segundo impulso foi dado pelo “carrego”, termo empregado no mercado para denotar o custo de oportunidade de manter investimentos em uma moeda em detrimento de outra. Apesar de não ser difícil formular um cenário de contornos mais pessimistas para o governo Temer, a queda do risco tornou nosso juro irresistível, capaz de compensar com folga a chance de tropeços.

Depois de um tempo, a inércia fortaleceu a tendência. O sucesso das primeiras apostas no real deu a deixa para novas rodadas na mesma direção, de caráter “técnico” – uma anomalia que exige ginástica para ser explicada, mas que é useira e vezeira em mercados financeiros. As reclamações de Trump contra o dólar forte e a recuperação de preços de commodities ajudaram a montar uma narrativa imbatível a favor da onça pintada: o real está entre as cinco moedas que mais se fortaleceram contra o dólar em 2017.

Qual é o ponto final dessa jornada?

A distância entre o prêmio de risco brasileiro e a média observada em um grupo de países comparáveis caiu de algo entre 250 e 300 pontos no início do ano passado para a faixa entre 100 e 150 pontos atualmente. Até 2012, a diferença foi nula e, entre 2013 e 2014, oscilou entre zero e 50 pontos. Pelo andar da carruagem, não será surpresa se o risco continuar se aproximando do que foi no período anterior aos estertores do governo Dilma. Se isso ocorrer, o dólar pode cair para R$ 2,85, tudo mais constante. A inércia aponta nessa direção.

O que pode desandar o angu?

O mercado parece tranquilo com os perigos sem prazo de validade, como a bomba relógio chinesa, as inconsistências do Euro e o viés pró-dólar da política econômica americana. Quando o humor do mercado está favorável, coisas como essas são usualmente descritas como preocupações “para o ano que vem” – até que vem a “surpresa”. O mundo está crescendo um pouco mais, a liquidez está farta e a hora não é boa para pensar no fim do mundo.

Sendo assim, as ameaças que precisam ser monitoradas mais de perto são as quem têm data marcada. O calendário eleitoral europeu encorpado aparece como grande candidato a vilão. Haverá eleições na Holanda (março), França (maio) e Alemanha (até outubro) e, quem sabe, talvez haja uma também na Itália, cada uma com seu respectivo Donald. Como se isso não bastasse, o enredo promete ser animado também pelo zumbi grego, que resolveu dar as caras novamente.

Falta consenso sobre como prosseguir com o plano de socorro ao país iniciado há quase seis anos. O problema é que não haverá recursos para pagar uma prestação devida em julho sem injeção de dinheiro novo. Se a ajuda vier, será a quarta sobre um montante que soma a bagatela de 260 bilhões de euros. A verdade nua e crua é que a estratégia não está funcionando e a Grécia não tem como pagar a dívida sem mudança significativa dos termos acordados – forma elegante de dizer que é preciso negociar um calote. Esse é o diagnóstico do FMI.

Os burocratas europeus evidentemente sabem que os encargos são impagáveis, mas rejeitam a ideia de aceitar o alívio por razões políticas. Como explicar que parte do dinheiro colocado na Grécia foi para o espaço para populações cansadas dos maus bocados que afligem o continente e propensas a dar uma chance ao populismo nacionalista – que promete soluções radicais para as questões dos refugiados, do terrorismo e da estagnação econômica?

Se o passado serve de guia, os europeus encontrarão novamente uma forma de negar a realidade, empurrando a conta para frente. As condições para equilibrar o ovo estão, no entanto, mais adversas e a chance de idas e vindas é agora maior. Se der uma treta, o dólar tende a subir, como em 2012, que também começou tranquilo e favorável. Admito que este não é o cenário mais provável atualmente, mas um pouco de caldo de galinha não faz mal aos que preferem se resguardar contra ventos que podem mudar a qualquer momento.

Finalizando, não custa lembrar que a batalha da previdência está apenas começando por aqui.

celsonovo