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Um diálogo com a Velhinha de Taubaté e Dom Casmurro

Os indicadores de incerteza global têm diminuído a olhos vistos, apesar dos soluços de praxe. Nesse contexto, a economia brasileira vai ganhando tração e o mercado encontra-se definitivamente no “modo otimista”, ignorando as confusões de Brasília. Pelo andar da carruagem, 2018 será melhor do que a encomenda. Essa visão rósea do futuro é temperada pelo […]

DR

Da Redação

Publicado em 4 de setembro de 2017 às 14h40.

Os indicadores de incerteza global têm diminuído a olhos vistos, apesar dos soluços de praxe. Nesse contexto, a economia brasileira vai ganhando tração e o mercado encontra-se definitivamente no “modo otimista”, ignorando as confusões de Brasília. Pelo andar da carruagem, 2018 será melhor do que a encomenda. Essa visão rósea do futuro é temperada pelo ceticismo dos que veem na calmaria apenas o prenúncio de nova tempestade. Quem tem razão?

Com o intuito de fornecer ao leitor um panorama amplo das visões mais otimistas e pessimistas, a coluna bateu um papo sobre tendências econômicas com dois analistas renomados que costumam olhar a realidade por prismas distintos e que dispensam maiores introduções: a Velhinha de Taubaté e o Sr. Bento de Albuquerque Santiago, mais conhecido por Dom Casmurro.

* * *

Celso Toledo: Obrigado por aceitar o convite. Sei que a agenda de ambos anda concorrida. Sem delongas, proponho começar com o ambiente externo. Os ventos inegavelmente sopram a favor. Dá para confiar que agora vai?

Velhinha de Taubaté: Acabo de voltar do simpósio econômico de Jackson Hole, evento que comecei a frequentar no final dos anos 70 e que reúne anualmente as principais autoridades monetárias, acadêmicos e participantes do mercado para discutir temas de interesse global. A conversa que tive com a Janet (Yelen) e com o Mario (Draghi) teve astral elevado, como não via desde antes da crise de 2008. Concordamos que a retomada cíclica em curso está ganhando ritmo e amplitude, atestando o sucesso das políticas expansionistas aplicadas simultaneamente pelos principais bancos centrais. Daqui para frente tenho convicção de que será só alegria.

Dom Casmurro: O tom com relação à conjuntura foi inegavelmente positivo, mas a ansiedade das autoridades com relação às perspectivas de crescimento de longo prazo, principalmente das economias avançadas, chamou mais a minha atenção. Os Bancos Centrais não têm muito que fazer sobre esse problema – que, de resto, respinga perigosamente na esfera política. O juro real projetado para o período que vai de 2022 a 2027 está muito baixo, girando em torno de 0,7% no mercado mais líquido do mundo, o de títulos do tesouro americano.

VT: E daí?

DC: O crescimento potencial da economia é proporcional ao juro real de longo prazo. Estimativas não muito antigas sugerem que os números são na verdade bem parecidos. Se for assim, dá para ser otimista diante de projeção de crescimento tão magra? Como evitar turbulências se os EUA crescerem menos de 1% no futuro? Diga-se de passagem, se a história serve como guia, há chance substancial de haver uma recessão nos próximos cinco anos. Se ela vier, o FED não terá como abaixar o juro em 300 ou 400 pontos como ele fez nas últimas recessões. O que ele fará?

VT: Entendo o seu ponto, mas de acordo com a mais antiga e tradicional pesquisa com economistas dos EUA, o crescimento deverá continuar girando um pouco acima de 2% de 2018 a 2020. Esse é o potencial estimado pelos profissionais. Além disso, os dados que saíram nas últimas semanas sugerem que o PIB crescerá perto de 3,0% a.a. no terceiro trimestre. Os consumidores americanos estão animados e há também sinais de vida nos investimentos. O desemprego está baixo e caindo, em patamar que vi pela última vez no final de 2000. Para completar a alegria, não há o menor sinal de inflação, o que abre espaço para a política monetária continuar sendo conduzida sem atropelos. A Janet até se permitiu fazer uma gracinha dizendo que normalização das condições será tão emocionante como ver tinta secar em uma parede. Como este cenário pode ser considerado ruim?

DC: As perspectivas de longo prazo são lúgubres. Os economistas profissionais podem dizer o que quiserem, mas os mercados financeiros não estão acreditando. Sei que estimar variáveis que não observamos é uma tarefa inglória, mas fico assustado com a perspectiva de juros reais tão baixos. Além disso, a Janet em breve será substituída. Como será a cabeça do novo chefe? A escolha depende do discernimento de um presidente que parece acreditar em todo tipo de falácia econômica e cujas ações têm solapado a credibilidade do país mais poderoso do mundo. E se ele colocar um macaco para cuidar da loja de cristais? Tanto a Janet quanto o Mario, além de destacarem os perigos do protecionismo para o crescimento de longo prazo, enfatizaram os riscos do afrouxamento de padrões regulatórios quando o preço de vários ativos está na estratosfera.

VT: Você aposta dinheiro nesta visão pessimista?

DC: Sim. Uma aposta tende a dar certo se o crescimento decepcionar e as bolsas caírem ou se a inflação e os juros aumentarem. Perco apenas enquanto perdurar a irracionalidade. Por isso vim para esse encontro guiando um Chevette 79.

VT: Considere esse “novo normal” projetado pelo mercado. Ele não necessariamente é pior – progresso é fazer mais com menos, certo? Neste mundo novo, é preciso ter cautela com a política monetária. Os juros têm mesmo que ser baixos se não há perspectiva de aceleração inflacionária no longo prazo. Qual é a inconsistência?

DC: Então porque o FED fica sinalizando juros bem mais altos do que os de mercado?

VT: Isso é algo que não consigo entender totalmente. Você conhece aquele menino, o Lawrence Summers, sobrinho de dois prêmios Nobel? Ele tem alertado para o fato de que os EUA podem estar em uma “estagnação secular”, como no Japão, após o estouro da bolha nos anos 90. O nome é feio, admito, mas você há de convir que nove anos de crescimento com desemprego perto da mínima histórica deveriam ser bons motivos para estarmos vendo inflação de novo. Pois é, cadê? Você fala em irracionalidade, mas os preços de ativos simplesmente refletem a queda persistente dos juros. Acho que o FED não quer abraçar de vez essa história por conservadorismo.

DC: Aí mora o perigo. Só você mesmo para usar de forma otimista o argumento da “estagnação secular”. O cerne do meu pessimismo está justamente na ocorrência simultânea desses sintomas: apatia com euforia. Vamos pegar o caso do Japão. Quando a bolha estourou e o governo fez tudo que podia para segurar a economia – obras públicas, redução de impostos, capitalização de bancos – o crescimento não voltou. Os bancos transformaram-se em mortos-vivos, a deflação tomou conta e a economia parou. Você dirá que os EUA estão crescendo e que, portanto, não seguem o caminho do Japão. A ausência de inflação explica os juros baixos que, por sua vez, explicam as bolsas caras. No Japão, quando o crescimento minguou, a bolsa caiu e não voltou mais. Por que lá as taxas de desconto menores não impulsionaram os preços dos ativos?

VT: O Summers diz que ninguém consegue identificar uma bolha antes dela estourar e é melhor errar para o lado em que a correção de rumo é mais fácil. A liquidez tem que continuar.

DC: Tudo bem, mas você viu o relatório recente de uma agência de classificação de risco dizendo que a qualidade dos créditos “high yield” encontra-se perto dos piores patamares medidos? Mesmo assim, os spreads não param de cair nessa busca desenfreada por retorno. Vi o filme em 2006, 2007 …

CT: Vamos analisar o contexto doméstico?

DC: Essa farra mundial explica boa parte da calmaria doméstica. Vejam vocês, a Argentina lançou um bônus de 100 anos! A lógica do investidor é apostar no ganho de capital de curto prazo porque duvido que, de repente, alguém tenha passado a acreditar que a nova Argentina não tem nada a ver com a que aplicou tantos calotes nos últimos 100 anos. Com juros negativos no mundo pode até ser um bom negócio. Mas, ainda assim, sinaliza um apetite a emoções que às vezes acaba mal. O Brasil surfa essa onda. É evidente que as coisas melhoraram e devem continuar melhorando na margem. Pudera, nem um consórcio dos maiores vilões da história teria conseguido fazer o estrago que o governo anterior fez em tão pouco tempo. Mas tem chão para dizer que está ficando bom. Não custa lembrar que o eleitor terá que avalizar os remendos amargos e impopulares que o novo governo tenta fazer.

VT: Concordo, mas o eleitor olha para frente. No primeiro trimestre, o PIB voltou a crescer depois de dois anos em queda livre. Tornou a crescer mais um pouquinho no segundo, sugerindo uma retomada mais consistente …

DC: … mas os investimentos ainda estão em franca recessão …

VT: … sim, mas a economia como um todo está se recuperando e, além disso, não há o menor risco de aceleração da inflação no curto prazo, o que abre espaço para o Banco Central afrouxar ainda mais a política monetária. Inflação em queda, crédito voltando aos poucos e atividade melhorando estimularão o povo a votar em um candidato com viés liberal em 2018, que avançará a agenda reformista em curso. De resto, é possível que o principal candidato da oposição não tenha o nome limpo para disputar. Sempre que apostei que o Brasil seria a Argentina do dia seguinte ganhei dinheiro.

DC: Essa visão parece ignorar o fato de que o país está em uma crise que requer uma estratégia de longo prazo para ser solucionada. A Reforma da Previdência, se passar, é apenas o primeiro passo de um ajuste fiscal longo e doloroso. A trajetória de crescimento das despesas obrigatórias testará o teto em pouco tempo. O governo eleito, seja qual for, gastará uma parte relevante de seu capital político para tratar do assunto. É possível ganhar tempo com medidas impopulares como, por exemplo, corrigir o salário mínimo apenas pela inflação passada – mantendo seu valor real. Mas que político terá coragem de fazer isso? Será possível ganhar a eleição sem apelar ao populismo? Se um candidato “liberal” ganhar porque o rival foi impedido de concorrer, não demorará muito para os conflitos voltarem a incomodar, certo?

CT: Mas a premissa de vitória de um candidato liberal implica continuidade do rali dos preços, não?

DC: Por um tempo, porque os fundamentos econômicos frágeis dificultarão a vida de qualquer um que assumir em 2018, lúcido ou “de esquerda”.

VT: Apliquei em uma LTN para 2023 no dia em que o processo de impeachment foi aberto. Estou ganhando 30%. Quanto você quer pelo seu Chevette 79?

CT: Pelo visto, os desdobramentos favoráveis de curto prazo estão dificultando a vida de quem foca o buraco e não o biscoito. Os pessimistas podem até estarem certos, mas do jeito que está quebrarão antes da maré virar para seu lado. Para finalizar, quais são suas projeções de crescimento? O consenso para o Brasil é de uma recuperação lenta para algo em torno de 2,5% no longo prazo. Para o mundo, entre 3% e 4%.

VT: O Brasil se recuperará lentamente para algo em torno de 2,6% no longo prazo e o mundo crescerá entre 3% e 4%. Mas não ficarei surpresa se for melhor do que isso.

DC: Discordo. O Brasil se recuperará lentamente para algo em torno de 2,4% no longo prazo e o mundo crescerá entre 3% e 4%. Mas não ficarei surpreso se for pior do que isso.

CT: Obrigado.

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Os indicadores de incerteza global têm diminuído a olhos vistos, apesar dos soluços de praxe. Nesse contexto, a economia brasileira vai ganhando tração e o mercado encontra-se definitivamente no “modo otimista”, ignorando as confusões de Brasília. Pelo andar da carruagem, 2018 será melhor do que a encomenda. Essa visão rósea do futuro é temperada pelo ceticismo dos que veem na calmaria apenas o prenúncio de nova tempestade. Quem tem razão?

Com o intuito de fornecer ao leitor um panorama amplo das visões mais otimistas e pessimistas, a coluna bateu um papo sobre tendências econômicas com dois analistas renomados que costumam olhar a realidade por prismas distintos e que dispensam maiores introduções: a Velhinha de Taubaté e o Sr. Bento de Albuquerque Santiago, mais conhecido por Dom Casmurro.

* * *

Celso Toledo: Obrigado por aceitar o convite. Sei que a agenda de ambos anda concorrida. Sem delongas, proponho começar com o ambiente externo. Os ventos inegavelmente sopram a favor. Dá para confiar que agora vai?

Velhinha de Taubaté: Acabo de voltar do simpósio econômico de Jackson Hole, evento que comecei a frequentar no final dos anos 70 e que reúne anualmente as principais autoridades monetárias, acadêmicos e participantes do mercado para discutir temas de interesse global. A conversa que tive com a Janet (Yelen) e com o Mario (Draghi) teve astral elevado, como não via desde antes da crise de 2008. Concordamos que a retomada cíclica em curso está ganhando ritmo e amplitude, atestando o sucesso das políticas expansionistas aplicadas simultaneamente pelos principais bancos centrais. Daqui para frente tenho convicção de que será só alegria.

Dom Casmurro: O tom com relação à conjuntura foi inegavelmente positivo, mas a ansiedade das autoridades com relação às perspectivas de crescimento de longo prazo, principalmente das economias avançadas, chamou mais a minha atenção. Os Bancos Centrais não têm muito que fazer sobre esse problema – que, de resto, respinga perigosamente na esfera política. O juro real projetado para o período que vai de 2022 a 2027 está muito baixo, girando em torno de 0,7% no mercado mais líquido do mundo, o de títulos do tesouro americano.

VT: E daí?

DC: O crescimento potencial da economia é proporcional ao juro real de longo prazo. Estimativas não muito antigas sugerem que os números são na verdade bem parecidos. Se for assim, dá para ser otimista diante de projeção de crescimento tão magra? Como evitar turbulências se os EUA crescerem menos de 1% no futuro? Diga-se de passagem, se a história serve como guia, há chance substancial de haver uma recessão nos próximos cinco anos. Se ela vier, o FED não terá como abaixar o juro em 300 ou 400 pontos como ele fez nas últimas recessões. O que ele fará?

VT: Entendo o seu ponto, mas de acordo com a mais antiga e tradicional pesquisa com economistas dos EUA, o crescimento deverá continuar girando um pouco acima de 2% de 2018 a 2020. Esse é o potencial estimado pelos profissionais. Além disso, os dados que saíram nas últimas semanas sugerem que o PIB crescerá perto de 3,0% a.a. no terceiro trimestre. Os consumidores americanos estão animados e há também sinais de vida nos investimentos. O desemprego está baixo e caindo, em patamar que vi pela última vez no final de 2000. Para completar a alegria, não há o menor sinal de inflação, o que abre espaço para a política monetária continuar sendo conduzida sem atropelos. A Janet até se permitiu fazer uma gracinha dizendo que normalização das condições será tão emocionante como ver tinta secar em uma parede. Como este cenário pode ser considerado ruim?

DC: As perspectivas de longo prazo são lúgubres. Os economistas profissionais podem dizer o que quiserem, mas os mercados financeiros não estão acreditando. Sei que estimar variáveis que não observamos é uma tarefa inglória, mas fico assustado com a perspectiva de juros reais tão baixos. Além disso, a Janet em breve será substituída. Como será a cabeça do novo chefe? A escolha depende do discernimento de um presidente que parece acreditar em todo tipo de falácia econômica e cujas ações têm solapado a credibilidade do país mais poderoso do mundo. E se ele colocar um macaco para cuidar da loja de cristais? Tanto a Janet quanto o Mario, além de destacarem os perigos do protecionismo para o crescimento de longo prazo, enfatizaram os riscos do afrouxamento de padrões regulatórios quando o preço de vários ativos está na estratosfera.

VT: Você aposta dinheiro nesta visão pessimista?

DC: Sim. Uma aposta tende a dar certo se o crescimento decepcionar e as bolsas caírem ou se a inflação e os juros aumentarem. Perco apenas enquanto perdurar a irracionalidade. Por isso vim para esse encontro guiando um Chevette 79.

VT: Considere esse “novo normal” projetado pelo mercado. Ele não necessariamente é pior – progresso é fazer mais com menos, certo? Neste mundo novo, é preciso ter cautela com a política monetária. Os juros têm mesmo que ser baixos se não há perspectiva de aceleração inflacionária no longo prazo. Qual é a inconsistência?

DC: Então porque o FED fica sinalizando juros bem mais altos do que os de mercado?

VT: Isso é algo que não consigo entender totalmente. Você conhece aquele menino, o Lawrence Summers, sobrinho de dois prêmios Nobel? Ele tem alertado para o fato de que os EUA podem estar em uma “estagnação secular”, como no Japão, após o estouro da bolha nos anos 90. O nome é feio, admito, mas você há de convir que nove anos de crescimento com desemprego perto da mínima histórica deveriam ser bons motivos para estarmos vendo inflação de novo. Pois é, cadê? Você fala em irracionalidade, mas os preços de ativos simplesmente refletem a queda persistente dos juros. Acho que o FED não quer abraçar de vez essa história por conservadorismo.

DC: Aí mora o perigo. Só você mesmo para usar de forma otimista o argumento da “estagnação secular”. O cerne do meu pessimismo está justamente na ocorrência simultânea desses sintomas: apatia com euforia. Vamos pegar o caso do Japão. Quando a bolha estourou e o governo fez tudo que podia para segurar a economia – obras públicas, redução de impostos, capitalização de bancos – o crescimento não voltou. Os bancos transformaram-se em mortos-vivos, a deflação tomou conta e a economia parou. Você dirá que os EUA estão crescendo e que, portanto, não seguem o caminho do Japão. A ausência de inflação explica os juros baixos que, por sua vez, explicam as bolsas caras. No Japão, quando o crescimento minguou, a bolsa caiu e não voltou mais. Por que lá as taxas de desconto menores não impulsionaram os preços dos ativos?

VT: O Summers diz que ninguém consegue identificar uma bolha antes dela estourar e é melhor errar para o lado em que a correção de rumo é mais fácil. A liquidez tem que continuar.

DC: Tudo bem, mas você viu o relatório recente de uma agência de classificação de risco dizendo que a qualidade dos créditos “high yield” encontra-se perto dos piores patamares medidos? Mesmo assim, os spreads não param de cair nessa busca desenfreada por retorno. Vi o filme em 2006, 2007 …

CT: Vamos analisar o contexto doméstico?

DC: Essa farra mundial explica boa parte da calmaria doméstica. Vejam vocês, a Argentina lançou um bônus de 100 anos! A lógica do investidor é apostar no ganho de capital de curto prazo porque duvido que, de repente, alguém tenha passado a acreditar que a nova Argentina não tem nada a ver com a que aplicou tantos calotes nos últimos 100 anos. Com juros negativos no mundo pode até ser um bom negócio. Mas, ainda assim, sinaliza um apetite a emoções que às vezes acaba mal. O Brasil surfa essa onda. É evidente que as coisas melhoraram e devem continuar melhorando na margem. Pudera, nem um consórcio dos maiores vilões da história teria conseguido fazer o estrago que o governo anterior fez em tão pouco tempo. Mas tem chão para dizer que está ficando bom. Não custa lembrar que o eleitor terá que avalizar os remendos amargos e impopulares que o novo governo tenta fazer.

VT: Concordo, mas o eleitor olha para frente. No primeiro trimestre, o PIB voltou a crescer depois de dois anos em queda livre. Tornou a crescer mais um pouquinho no segundo, sugerindo uma retomada mais consistente …

DC: … mas os investimentos ainda estão em franca recessão …

VT: … sim, mas a economia como um todo está se recuperando e, além disso, não há o menor risco de aceleração da inflação no curto prazo, o que abre espaço para o Banco Central afrouxar ainda mais a política monetária. Inflação em queda, crédito voltando aos poucos e atividade melhorando estimularão o povo a votar em um candidato com viés liberal em 2018, que avançará a agenda reformista em curso. De resto, é possível que o principal candidato da oposição não tenha o nome limpo para disputar. Sempre que apostei que o Brasil seria a Argentina do dia seguinte ganhei dinheiro.

DC: Essa visão parece ignorar o fato de que o país está em uma crise que requer uma estratégia de longo prazo para ser solucionada. A Reforma da Previdência, se passar, é apenas o primeiro passo de um ajuste fiscal longo e doloroso. A trajetória de crescimento das despesas obrigatórias testará o teto em pouco tempo. O governo eleito, seja qual for, gastará uma parte relevante de seu capital político para tratar do assunto. É possível ganhar tempo com medidas impopulares como, por exemplo, corrigir o salário mínimo apenas pela inflação passada – mantendo seu valor real. Mas que político terá coragem de fazer isso? Será possível ganhar a eleição sem apelar ao populismo? Se um candidato “liberal” ganhar porque o rival foi impedido de concorrer, não demorará muito para os conflitos voltarem a incomodar, certo?

CT: Mas a premissa de vitória de um candidato liberal implica continuidade do rali dos preços, não?

DC: Por um tempo, porque os fundamentos econômicos frágeis dificultarão a vida de qualquer um que assumir em 2018, lúcido ou “de esquerda”.

VT: Apliquei em uma LTN para 2023 no dia em que o processo de impeachment foi aberto. Estou ganhando 30%. Quanto você quer pelo seu Chevette 79?

CT: Pelo visto, os desdobramentos favoráveis de curto prazo estão dificultando a vida de quem foca o buraco e não o biscoito. Os pessimistas podem até estarem certos, mas do jeito que está quebrarão antes da maré virar para seu lado. Para finalizar, quais são suas projeções de crescimento? O consenso para o Brasil é de uma recuperação lenta para algo em torno de 2,5% no longo prazo. Para o mundo, entre 3% e 4%.

VT: O Brasil se recuperará lentamente para algo em torno de 2,6% no longo prazo e o mundo crescerá entre 3% e 4%. Mas não ficarei surpresa se for melhor do que isso.

DC: Discordo. O Brasil se recuperará lentamente para algo em torno de 2,4% no longo prazo e o mundo crescerá entre 3% e 4%. Mas não ficarei surpreso se for pior do que isso.

CT: Obrigado.

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