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A economia patina, mas deve melhorar

Para um país que há pouco experimentou uma das recessões mais profundas de sua história, é tranquilizador constatar algum progresso

PORTO DE SANTOS: o país só andará para frente se o governo se propuser a fazer o que até hoje vinha se mostrando impossível politicamente | Gerrmano Lüders /  (Gerrmano Lüders/Exame)
PORTO DE SANTOS: o país só andará para frente se o governo se propuser a fazer o que até hoje vinha se mostrando impossível politicamente | Gerrmano Lüders / (Gerrmano Lüders/Exame)
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Celso Toledo

Publicado em 28 de janeiro de 2019 às, 16h13.

A economia não bate um bolão, longe disso. De acordo com o indicador mensal computado pelo Banco Central para tomar o pulso dos negócios, o Brasil produziu em novembro passado apenas 1,9% mais do que no ano anterior. A estimativa da FGV é ainda mais borocoxô. A fundação calcula crescimento de apenas 1,5% na mesma base de comparação.

Para piorar, a situação continuou malparada em dezembro, pois o consenso entre os economistas é de que o PIB do último trimestre teria se expandido 1,7% em relação a 2017. Se for assim, a economia estaria crescendo na ponta em ritmo de apenas 1% ao ano – e olhe lá.

Para um país que há pouco experimentou uma das recessões mais profundas de sua história, é tranquilizador constatar algum progresso. Ok, mas cumpre perguntar se já não seria a hora de estarmos sentindo uma brisazinha mais forte roçando o rosto. Afinal, apesar das turbulências recentes, a economia mundial ainda está bem.

Em condições normais de temperatura e pressão a resposta seria afirmativa, pois recessões operam tipicamente como apagões: os negócios despencam quando falta energia, mas voltam com força após a normalização, mantendo-se um ritmo relativamente acelerado até que a situação pré-crise seja novamente atingida.

Essa trajetória parecida com a letra V deveria ter descrito a saída da recessão de 2015/16 porque a causa do problema foi eliminada com o impeachment. Quando a orientação da política econômica mudou, seria de se esperar que houvesse uma retomada mais ligeira. Hoje sabemos que isso não ocorreu, mas antes de diagnosticar um problema mais sério, a boa notícia é que 2017 e 2018 não foram propriamente anos “normais”.

O governo Temer praticamente acabou após o episódio das gravações. Justamente quando as coisas pareciam estar se arrumando, a reforma da previdência parou de avançar, a economia tropeçou e o ônus da crise econômica caiu no colo do governo. A disputa eleitoral de 2018 migrou para os extremos e até o último minuto não era possível descartar o cenário de uma recaída heterodoxa caso o PT ganhasse.

Isso gerou forte insegurança acerca do caminho que o país trilharia a partir de 2019, impedindo que a ociosidade gigantesca criada pela recessão fosse preenchida com a rapidez que seria usual.

Agora a história é outra, pois o governo que assumiu tem o diagnóstico correto e promete adotar uma política econômica inteligente. Sob essas condições, crescer deve ser algo menos difícil no curto prazo. Mas há ainda uma pegadinha.

Quando um governo adia reformas estruturais para evitar os custos políticos, a consequência usual é condenar o país a permanecer na situação em que se encontra – ou seja, comprometem-se as perspectivas de longo prazo. Trata-se de opção que é ruim para a sociedade, mas que pode fazer sentido para governantes apenas interessados em se reeleger. Além disso, empurrar o progresso com a barriga atende aos interesses dos grupos que lucram com o atraso, geralmente muito mais barulhentos e organizados do que a massa que ganharia com as reformas.

O Brasil tem dançado esse samba nas últimas décadas, acomodando as demandas infinitas da sociedade por meio da ampliação do tamanho do Estado e da dívida pública, perpetuando um quadro de ineficiência, desperdício, injustiça e roubalheira.

Se não tivéssemos cometido os equívocos colossais que produziram a última recessão, talvez fosse possível continuar empurrando o ajuste de contas com a barriga, mas a parca margem que ainda existia se evaporou com a Nova Matriz Econômica. Hoje a complacência não é mais uma opção. Evitar as reformas implica o caos econômico em prazo não muito longo.

Sendo assim, decisões que normalmente seriam mais relevantes por conta de seus desdobramentos de longo prazo hoje têm relevância no curto prazo. Se o governo não for bem sucedido em convencer os agentes econômicos de que fala sério quando diz que fará as reformas necessárias e, principalmente, não demonstrar capacidade de aprová-las, o cenário desastroso que se desenhará para o futuro contaminará o desempenho presente.

O enorme exército de desempregados e a capacidade produtiva inutilizada são fontes potenciais de crescimento não inflacionário no curto prazo se e somente se houver confiança de que a trajetória da dívida pública não será explosiva.

A economia está ainda patinando porque os agentes aguardam sinais mais explícitos de que o governo está disposto a enfrentar o vespeiro das reformas. O país só andará para frente se o governo se propuser a fazer o que até hoje vinha se mostrando impossível politicamente. Em outras palavras, cabe ao governo escolher se a ociosidade existente é algo realmente cíclico ou a imagem do novo normal.