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Precisamos de uma cerveja para atletas?

Em Setembro a Ambev lançou a Skol Ultra. Ela é uma cerveja puro malte, com uma quantidade de carboidratos menor e menos calorias e álcool do que uma cerveja pilsen tradicional. Parece, portanto, que ela tem um potencial de achar o seu lugar no mercado. Certamente existem pessoas que apreciariam esta oferta. Vale lembrar que cervejas com um posicionamento de baixo teor de carboidratos e calorias, ou as cervejas “Light”, […] Leia mais

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Branding, Consumo e Negócios

Publicado em 25 de novembro de 2015 às, 14h45.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 07h49.

Em Setembro a Ambev lançou a Skol Ultra. Ela é uma cerveja puro malte, com uma quantidade de carboidratos menor e menos calorias e álcool do que uma cerveja pilsen tradicional. Parece, portanto, que ela tem um potencial de achar o seu lugar no mercado.

Certamente existem pessoas que apreciariam esta oferta. Vale lembrar que cervejas com um posicionamento de baixo teor de carboidratos e calorias, ou as cervejas “Light”, possuem um alto nível de consumo nos EUA. Sendo assim, pode-se entender que, com uma boa distribuição e comunicação, ela pode ter sucesso por aqui.

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Embalagens da nova cerveja Skol Ultra, patrocinadora das Olimpíadas do Rio 2016

Oferecer o produto original com menos substancia nociva é bastante comum para produtos de bens de consumo, se iniciando com os refrigerantes sem açúcar nos anos 70. É tão comum que o filósofo Slavoj Zizek deu a isso um nome curioso: “hedonismo envergonhado”. Para ele, as pessoas querem sempre ter acesso aos benefícios do consumo, mas preferem se ele for desprovido de suas características nocivas.

Mas a Ambev não parou por aí. Ela preferiu criar um posicionamento e uma ocasião de consumo um pouco, digamos, inusitada. Ela posicionou sua cerveja para atletas “não oficiais”, elegendo como seu momento de consumo aquele posterior à prática esportiva.

Ainda que pesquisas possam indicar que este é um momento de consumo interessante para algumas pessoas, a cerveja já é amplamente consumida no Brasil. É usada em grandes festas, em celebrações privadas, para relaxar depois do trabalho, para acompanhar o happy hour, a ida a praia, ou o jogo de futebol. Os brasileiros bebem na rua, nos bares, em casa, em postos de gasolina. Bebem quando podem e quando não podem. Será que tentar criar mais um momento de consumo para cerveja, desta vez associada à prática esportiva, é necessário?

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A Skol Ultra, sendo distribuída após a prática esportiva na corrida “Corra pra Night”, no estado de MG

Tendemos a perceber atividade física e consumo de cerveja como questões negativamente correlacionadas. Ou seja, atividade física possui relação com esforço, dedicação, saúde, empenho, e portanto, produtos que tenham este tipo de associação tendem a atrair mais consumidores neste momento. Cervejas são associadas à diversão, hedonismo, amizade, paquera, noite, festas, o que é distante do momento de atividades esportivas.

Isso não significa que pessoas que fazem esportes não bebam cerveja. Mas apenas que estes consumos estão associados a diferentes momentos e situações. Quando se procura juntar momentos negativamente correlacionados, o que se consegue é criar dissonância na percepção do consumidor. Isso pode até levar à um maior impacto da comunicação, mas não necessariamente significa um maior potencial de negócios.

No entanto, há ainda outro fator a se levar em consideração. Como qualquer outra empresa que detém uma verba expressiva de comunicação, a Ambev é capaz de influenciar comportamentos e hábitos. Para o bem e para o mal. A empresa possui uma série de importantes iniciativas para o consumo consciente do álcool, e até uma cartilha para pais conversarem com seus filhos sobre bebidas alcoólicas (veja aqui). No seu site corporativo, a empresa diz “norteamos nossas práticas pelas premissas da OMS”.

Será que a Organização Mundial de Saúde recomenda o consumo de bebida alcoólica após a prática esportiva?

Caso a Ambev continue associando a Skol Ultra ao consumo após atividades físicas, quais seriam as consequências se essa estratégia fosse bem sucedida? Que todos bebessem duas latas de cerveja Skol Ultra após finalizar a sua atividade física? Isso seria positivo para a sociedade? Isso seria endossado pela OMS?

Recentemente, o Conar decidiu pela suspensão da campanha da Skol Ultra. A decisão foi tomada de maneira unânime pelos seus conselheiros. Foi uma decisão acertada. O código do Conar, em seu capítulo específico sobre bebidas alcoólicas, veta a associação entre o consumo de bebidas alcoólicas e praticas esportivas. E era isso justamente o que fazia a Skol Ultra.

A empresa parece ter acatado a decisão, uma vez que o filme da campanha está fora do ar no seu canal oficial do Youtube, e a veiculação do filme parece ter sido suspensa. No entanto, a sua página de internet continua sustentando o mesmo posicionamento de consumo da cerveja associada à prática esportiva, sob o mote “A cerveja oficial dos atletas não oficiais”.

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Reprodução do Site da Skol Ultra, acessado em 25/11/15

Mesmo com a proibição do Conar, o posicionamento da cerveja continua o mesmo, e a comunicação continua sendo feita para o consumidor, ainda que de maneira menos intensa.

Será que os ganhos que a empresa está tendo com a venda deste produto específico compensa o dano que ele pode causar para a reputação da companhia?

A Ambev é uma empresa espetacular. Conquistou o mundo da cerveja, é verdadeiramente uma empresa brasileira global, e motivo de orgulho para os brasileiros. Mas para continuar sendo uma empresa admirada, é preciso que ela mantenha a sua reputação inquestionável, com princípios éticos sólidos. E ser ético vai além do simples “seguir a lei”. Significa ter práticas e discursos responsáveis e contribuir para a sociedade tanto quanto se contribui para os seus acionistas. E me parece que esta contribuição não está acontecendo quando se associa cerveja à prática esportiva.