A Coca Cola traz felicidade? Como as marcas vendem emoção?
Falar que as marcas devem proporcionar sensações e emoções é lugar comum no branding e publicidade contemporânea. Constantemente vejo artigos de publicitários e planejadores enfatizando a importância sobre o que os consumidores devem sentir após serem impactados por uma marca. Mas antes de perseguir a venda de emoções devemos fazer uma reflexão: por que os consumidores compram emoção? Vivemos hoje a necessidade de tornar as coisas um pouco mais espetaculares. […] Leia mais
Publicado em 24 de abril de 2015 às, 11h43.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 08h05.
Falar que as marcas devem proporcionar sensações e emoções é lugar comum no branding e publicidade contemporânea. Constantemente vejo artigos de publicitários e planejadores enfatizando a importância sobre o que os consumidores devem sentir após serem impactados por uma marca. Mas antes de perseguir a venda de emoções devemos fazer uma reflexão: por que os consumidores compram emoção?
Vivemos hoje a necessidade de tornar as coisas um pouco mais espetaculares. Sem entrar nos meandros filosóficos que levaram a este pensamento, o impacto que ele hoje tem na sociedade e no consumo é que todas as ações que tomamos devem ter algo de entretenimento. Ou seja, nós, como consumidores, não aceitamos mais que um produto nos entregue algo puramente funcional, ele deve ser dotado de emoções que iremos sentir durante seu consumo. A Coca-Cola não pode ser apenas um elemento funcional que nos faça extinguir a sede, mas algo que se transforme num pequeno evento cotidiano, que no momento de consumo traga à vida um traço de espetáculo que ela antes não possuía.
Portanto, bebida não é agua, comida não é pasto. Tudo deve trazer, além de atributos funcionais, elementos sensoriais que me façam sentir certas emoções quando estou comendo e bebendo. E fazemos isso continuamente no nosso cotidiano. Ao escolher um lugar para almoçar, muito mais do que escolher o cardápio, escolhemos a sensação que queremos ter ao nos alimentarmos. Da mesma maneira, ao escolher uma bebida, quero saber qual a sensação que eu terei durante e após o consumo, adicional aquela de saciar a sede.
É por isso que compramos emoções. A sociedade, quando exige esta espetacularização do consumo, leva a uma reação dos empresários e executivos, que atendem a este desejo como se fosse uma ordem – o cliente tem sempre razão. E procuram nas suas técnicas de marketing maneiras de proporcionar emoções e sensações. Mas como as marcas, então, vendem emoções? Ou ainda, é possível vender emoções engarrafadas?
Nossos neurotransmissores nos equipam com a possibilidade de sentir sensações através de estímulos. No passado, estes estímulos sempre eram reais, como o potencial perigo de um predador. Hoje, aprendemos a manipular essas sensações através de estímulos fictícios, como em parques de diversão, que nos dão a sensação do perigo sem estarmos de fato expostos a eles. Nós também somos capazes de sentir outros tipos de sensações, que foram necessárias para nossa sobrevivência como espécie. Uma delas é o prazer e satisfação que temos ao estarmos próximos de bebês. Ao ver uma criança, nos sentimos automaticamente mais felizes.
Um pequeno experimento provou isso no passado. Um estudo foi feito com a seguinte manipulação: foi criado um questionário para medir o nível de felicidade das pessoas. Estes questionários foram dados a grupos de pessoas para que respondessem em salas diferentes. Uma das salas não continha nenhum estímulo. Em outra sala, os respondentes foram expostos a uma grande foto de um bebê. Consistentemente, as pessoas que estavam na sala com a foto respondiam os questionários dizendo que estavam mais felizes do que as pessoas da outra sala. Independentemente de estarem de fato felizes ou não, ou dos problemas e dificuldades que individualmente tinham, o grupo exposto ao bebê sorrindo respondiam estarem mais felizes, em média. A conclusão, fugindo das tecnicalidades e limitações de um estudo como este, é que ser exposto a bebês traz felicidade.
Mas esta sensação de felicidade foi programada no nosso DNA. Afinal, se não gostássemos de bebês como sociedade, dificilmente teríamos sobrevivido, dado as dificuldades e o tempo que leva um bebê humano para se tornar autossuficiente. Mas como isso se aplica às marcas? Ou, como a Coca-Cola traz felicidade?
A Coca-Cola, desde os anos 60 nos diz que ela traz felicidade. De papais-noéis sorridentes a músicas alegres. De famílias de ursos se ajudando a adolescentes se divertindo juntos. De ações virais mostrando pessoas felizes a máquinas de abraços. E claro, o reforço do slogan “abra a felicidade”. Fomos condicionados por anos de publicidade e exposição à marca Coca-Cola que ela traz felicidade ao ser consumida. O resultado disso? Um condicionamento que, em pequena medida, nos faz mais felizes quando somos expostos à marca Coca-Cola em comparação a outros refrigerantes. Não significa que ela consiga nos tirar de uma situação de tristeza, mas ela, em pequena escala, assim como a foto de um bebê, pode levar as pessoas a se sentirem levemente mais felizes do que antes da exposição ou do consumo do refrigerante.
O exemplo da Coca Cola é bastante emblemático – uma das marcas mais valiosas do mundo, com um enorme histórico e penetração próximo de 100% na população brasileira. Mas qualquer marca pode, de alguma maneira, levar seus consumidores a sentirem certas sensações, justamente aquelas que elas planejam criar.
Isso não significa que somos completamente manipuláveis pela publicidade, ou que existe um complô para que sejamos. Afinal, a necessidade destas sensações surgiu dos próprios consumidores, que hoje as utilizam para diferenciar produtos muitas vezes tecnicamente idênticos. Também temos discernimento, conhecimento e esclarecimento o suficiente para perceber e negar falsas promessas, sejam elas funcionais ou emocionais. Mas não conseguimos ser imunes aos sentimentos. Afinal, somos humanos.