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Após avanços na COP26, agora é preciso ação

Acordo sobre as regras do mercado regulado de carbono representa um avanço histórico da COP26, mas novas etapas devem ser iniciadas

Walter Schalka, presidente da Suzano (Leandro Fonseca/Exame)
Walter Schalka, presidente da Suzano (Leandro Fonseca/Exame)
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Blog da Exame

Publicado em 20 de novembro de 2021 às, 11h32.

Por Walter Schalka*

O acordo sobre as regras do mercado regulado de carbono representa um avanço histórico da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), encerrada no último dia 13, em Glasgow. Uma vez colocado em prática, será um passo relevante em direção a um sistema global de investimentos em descarbonização.

Trata-se de um resultado que merece ser celebrado, assim como outros anúncios importantes realizados durante a COP26, sobretudo por ser consequência de uma forte atuação da sociedade civil para que fosse alcançado. Porém, não podemos desconsiderar que a combinação de todos os compromissos formalizados pelo conjunto de países durante a COP26 ainda é insuficiente para manter a elevação da temperatura média global no patamar de 1,5oC em relação aos níveis pré-industriais. E é o cumprimento desta meta que determinará o êxito dos esforços mobilizados para o enfrentamento da crise climática, com redução de danos nas condições de vida desta e das próximas gerações.

A proposta aprovada para o mercado regulado de carbono proporciona maior transparência, segurança e credibilidade ao sistema, com duas etapas de aprovação. A primeira, com a discricionariedade do país, de validar ou não o projeto climático. Na segunda etapa, a iniciativa passa por auditoria internacional, a ser conduzida pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC).

Na medida em que o número de projetos aprovados é limitado, os créditos de carbono a serem negociados no mercado regulado tendem a adquirir significativa valorização. O resultado é o levantamento de recursos financeiros em escala e prazo necessários para o investimento em projetos de redução de emissões de carbono, com impactos sociais positivos nas regiões onde serão desenvolvidos.

Ao mesmo tempo, quando pensamos no futuro, o crédito de carbono deixará de ter valor já que, esperamos, a questão climática terá sido endereçada com uma importante mudança na matriz elétrica mundial e nos transportes.

Resolvemos uma questão histórica, e o Brasil apresentou uma evolução importante em seu posicionamento durante a COP26, ao fazer concessões em temas que impunham limitações para a busca de consensos. Ainda no início do encontro, o país anunciou uma nova NDC, com a antecipação da neutralidade das emissões para 2050, antes prevista para 2060, e a redução da emissão de carbono de 43% para 50% até 2030. No âmbito dos acordos assinados, se comprometeu com metas de redução das emissões de gás metano e de zerar o desmatamento até 2030. Esses são alguns dos avanços alcançados na COP26, que certamente terão importantes impactos ambientais, sociais e econômicos no futuro.

Outros temas relevantes, contudo, tiveram avanços aquém do desejável, como a renovação do compromisso ainda não alcançado por países desenvolvidos de destinarem US$ 100 bilhões anuais em projetos de descarbonização de nações mais pobres. Apesar do posicionamento brasileiro, de exigir melhor relação entre disponibilidade de recursos e execução de projetos de descarbonização, não houve definições concretas sobre valores e prazos no acordo final da COP26.

A padronização das métricas para medição das NDCs, de importância fundamental, avançou pouco, apesar do trabalho desenvolvido pela Science Target Based Initiatives de mobilizar empresas na adoção de metas baseadas na ciência para redução de suas emissões de gases de efeito estufa.

O compromisso com a diminuição do uso de combustíveis fósseis alcançou o resultado possível, considerando a resistência de países que são grandes produtores de petróleo ou consumidores de carvão, e cujas economias ainda são altamente dependentes desses insumos. De qualquer modo, o relatório final da COP26 aponta, de forma inédita, para a necessidade de redução do uso de fontes não eficientes de energia, como uma meta a ser atendida em um futuro próximo. Há, portanto, ainda muito a ser discutido e almejado até a COP27, em 2022.

Negociações multilaterais, como as realizadas na COP26, são extremamente complexas porque envolvem a busca pelo consenso entre quase 200 países, todos com poder de veto. As mudanças, portanto, ocorrem de forma gradual, principalmente em temas mais sensíveis. Esse é um jogo que somente termina quando as emissões globais de carbono estiverem estabilizadas em um patamar que assegure a manutenção do aquecimento médio do planeta em 1,5oC.

Portanto, encerrado o evento em Glasgow, o mundo tem agora uma série de etapas a serem iniciadas para que as conquistas alcançadas na COP26 não fiquem no papel. O mesmo vale para o Brasil, com uma extensa e complexa agenda interna a ser construída. Será necessário o amadurecimento de uma série de políticas públicas voltadas para a pauta climática, principalmente a que cria o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões.

As discussões ocorridas durante a COP26 deixaram claro que este é apenas um avanço, entre outros que precisarão ser alcançados futuramente, e que o planeta precisa de ações imediatas, efetivas e contínuas por parte de governos, empresas e consumidores. Afinal, ou todos nós ganhamos ou todos nós perdemos com as decisões e ações estabelecidas agora.

 

*Walter Schalka é presidente da Suzano.