Projeto promove o cultivo de hortaliças em lajes de Paraisópolis
O "Horta na Laje" tem como objetivo incentivar a alimentação saudável, a sustentabilidade e a economia dentro da comunidade paulistana
Marina Demartini
Publicado em 2 de junho de 2017 às 05h55.
Última atualização em 2 de junho de 2017 às 05h55.
São Paulo – O cinza do concreto e o marrom dos tijolos estão prestes a ganhar o verde das plantas em Paraisópolis, comunidade na zona sul paulistana. As lajes dos cerca de 120 mil habitantes que lá vivem devem ganhar hortaliças em breve, graças ao projeto “Horta na Laje”.
A iniciativa teve início nesta semana com a implantação de uma horta comunitária na laje da União dos Moradores de Paraisópolis. Criado a partir de uma parceria entre o Instituto Stop Hunger e a Associação das Mulheres de Paraisópolis, o “Horta na Laje” terá a participação direta de 500 pessoas no cultivo das hortaliças na União dos Moradores.
O objetivo final é oferecer cursos de técnicas de plantio em vasos para que moradores da comunidade cultivem alimentos em suas casas. “Não temos espaço na horizontal, mas temos muito espaço de sobra na vertical, são milhares de quilômetros de lajes na comunidade”, falou a EXAME.com o presidente do Instituto Escola do Povo Gilson Rodrigues.
A ideia, segundo Fernando Cosenza, presidente do Instituto Stop Hunger, ligado a Sodexo , é formar e capacitar os moradores para que tenham uma alimentação mais saudável. “Muitas pessoas não se alimentam bem na comunidade não só porque falta dinheiro para comprar hortaliças, que geralmente são caras, mas também pela falta de acesso a esses produtos”, explica Cosenza em entrevista a EXAME.com.
A inspiração para a criação do “Horta na Laje” veio de outro projeto do Instituto, o “Programa Hortaliças”. Nessa iniciativa, estudantes de agronomia da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (Unesp) ganham bolsas de estudo para trabalharem em hortas comunitárias. Todos os alimentos produzidos são doados para outras organizações sociais.
A Unesp, aliás, irá auxiliar o projeto na comunidade com o oferecimento de cursos de técnicas de plantio aos moradores. As aulas serão realizadas bimestralmente e serão ministradas por Arthur Bernardes, professor de agronomia da universidade. A EXAME.com, Bernardes conta que os cursos irão englobar assuntos relacionados ao cultivo de hortaliças, como adubação, irrigação e todo o cronograma de plantio.
Para o professor, o “Horta na Laje” traz os princípios da segurança alimentar e da integração familiar. “Ao plantar em suas lajes, as famílias irão se alimentar do que plantam, o que facilita o acesso e diminui gastos”, explica. “Além disso, tem a ideia do trabalho coletivo, em que cada um tem que fazer um pouco para as hortaliças crescerem saudáveis.”
Economia sustentável
Outro foco do projeto é transformar Paraisópolis em uma comunidade sustentável. “Queremos reaproveitar o que já foi usado, como água e terra”, diz Rodrigues, do Instituto Escola do Povo. No futuro, o projeto deve trabalhar com a compostagem.
Rodrigues adiciona que a promoção da sustentabilidade também está relacionada com a aproximação da comunidade com a natureza. “Paraisópolis é uma comunidade de origem nordestina, um povo acostumado a mexer com a terra. Queremos que essas pessoas voltem a ter um contato mais próximo com a natureza a partir do plantio.”
Já Fernando Cosenza espera que, em breve, os moradores criem uma economia própria dentro da comunidade com a troca dos alimentos que serão cultivados nas lajes. “Enquanto um planta apenas alface, outro irá cultivar apenas agrião, permitindo a rotação desses alimentos entre as pessoas e promovendo o trabalho coletivo.”
Empoderamento feminino
Para Elizandra Cerqueira, presidente da Associação das Mulheres de Paraisópolis, o projeto vai além da sustentabilidade ou da alimentação saudável. “O 'Horta na Laje' é uma oportunidade para as mulheres da comunidade gerarem renda a partir da troca ou venda alimentos”, diz em entrevista a EXAME.com.
Segundo Cerqueira, a associação promove um projeto de gastronomia , em que as mulheres são ensinadas a cozinhar para buffets e incentivadas a empreender no ramo. “Com as hortas, elas poderão utilizar os alimentos colhidos para a criação de pratos. Assim, as moradoras poderão oferecer um serviço sem precisar gastar com a matéria-prima”, explica.
Atualmente, 53% da população de Paraisópolis é composta por mulheres, sendo que 20% delas são chefes de família, de acordo com a associação. “Por isso, o projeto deve beneficiar as mulheres que precisam sustentar seus filhos, ao mesmo tempo que providencia uma alimentação saudável”, diz a presidente. “Além disso, uma mulher que tem educação, trabalho e se sente empoderada, dificilmente irá aceitar viver em uma situação de violência.”