Não existe um único "gene gay", de acordo com ampla análise de DNA
Realizado por pesquisadores da Europa e dos Estados Unidos, estudo analisou meio milhão de perfis de DNA
AFP
Publicado em 29 de agosto de 2019 às 18h40.
Última atualização em 29 de agosto de 2019 às 18h49.
Como tamanho ou inteligência, a atração sexual não é definida apenas por um gene, mas é o resultado da complexa interação entre várias regiões do genoma e fatores ambientais difíceis de identificar.
Essa é a conclusão de uma análise realizada em meio milhão de perfis de DNA como parte de um gigantesco estudo de pesquisadores da Europa e dos Estados Unidos publicado na revista Science nesta quinta-feira.
Seus autores esperam enterrar a noção, popularizada nos anos 90, da existência de um "gene gay " todo-poderoso que determina a sexualidade da mesma forma como a cor dos olhos é definida.
"Descobrimos que é efetivamente impossível prever o comportamento sexual de um indivíduo a partir de seu genoma", disse Ben Neale, membro do MIT e do Broad Institute de Harvard, uma das várias organizações envolvidas no trabalho.
A orientação sexual tem um componente genético, dizem os pesquisadores, confirmando estudos anteriores menores, particularmente com gêmeos.
Mas o efeito é mediado por uma miríade de genes. "Não existe um único gene gay, mas sim a contribuição de muitos pequenos efeitos genéticos espalhados pelo genoma", disse Neale.
Além disso, há fatores ambientais: como uma pessoa é criada na infância, onde vive como adulto, etc.
Tomemos, por exemplo, a altura: o componente genético é indiscutível e está ligado à altura dos seus pais. Mas outros fatores como nutrição durante a infância desempenham um papel importante.
O mesmo vale para a probabilidade de você ter um ataque cardíaco. Certos genes levam a uma predisposição para doenças cardíacas, mas estilo de vida e dieta são, em última análise, mais significativos.
A nova análise estatística revelou cinco pontos em nossos cromossomos, chamados loci, que parecem intimamente ligados à sexualidade, embora cada um individualmente tenha uma influência "muito pequena".
Acontece também que um desses marcadores está associado à perda de cabelo, o que sugere um vínculo com a regulação dos hormônios sexuais.
Acredita-se que esses cinco marcadores possam ser apenas o começo, com outros milhares aguardando para ser descobertos no futuro.
Fah Sathirapongsasuti, cientista da empresa 23andMe que contribuiu para o estudo com os perfis de clientes que se voluntariaram para participar, acrescentou: "A genética definitivamente desempenha um papel, no entanto, é possivelmente minoritário - e há um efeito ambiental não explicado que você nunca pode identificar exatamente qual é".
A maior parte dos dados veio, contudo, do Biobank do Reino Unido, principalmente de pessoas brancas, entre indivíduos que responderam à pergunta: você teve relações sexuais com uma pessoa do mesmo sexo?
Controvérsia
Os pesquisadores estavam cientes da sensibilidade em torno do assunto, e dois dos coautores mencionaram que eles próprios são gays.
A fim de evitar serem mal interpretados, eles também consultaram grupos LGBTQ sobre a melhor maneira de comunicar suas descobertas, que eles resumiram no site geneticsexbehavior.info.
O GLAAD, grupo de defesa LGBTQ, elogiou o trabalho, dizendo que ele "fornece ainda mais evidências de que ser gay ou lésbica é uma parte natural da vida humana".
Em 1993, um estudo genético em 40 famílias afirmou ter identificado o gene Xq28 como definidor da orientação sexual, mas a nova análise refuta isso.
Um número produzido pelo estudo é propenso a causar confusão. Os cientistas escreveram: "Quando analisamos todos os marcadores genéticos comuns juntos, eles capturam entre 8% e 25% das diferenças individuais no comportamento sexual do mesmo sexo".
Mas esse número é um conceito estatístico usado pelos cientistas ao estudar populações, e não se aplica em nível individual.
O resultado também desafia a noção de sexualidade como um continuum, conforme proposto pela Escala de Kinsey, que descreve a atração de uma pessoa em uma escala de exclusivamente heterossexual a exclusivamente homossexual.
"A genética sugere que é uma simplificação excessiva supor que quanto mais alguém é atraído pelo mesmo sexo, menos ele se sente atraído pelo sexo oposto", escreveram os autores.