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Evolução da jabuticaba: Como revolucionar o mercado de consórcios

É preciso redesenhar a experiência do consorciado, incluindo as diversas “travas” e “penalizações” do produto para atrair pessoas

Players discutem como potencializar e melhorar o produto por meio da tecnologia (AlexRaths/Thinkstock)

Players discutem como potencializar e melhorar o produto por meio da tecnologia (AlexRaths/Thinkstock)

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Publicado em 29 de setembro de 2021 às 16h31.

Última atualização em 29 de setembro de 2021 às 16h34.

Por Pedro Amoroso Lima*

Se você der um Google, vai descobrir que o mercado de consórcios foi inventado no Brasil na década de 60. Embora tudo indique que de fato nasceu aqui, a verdade é que o modelo já existia há muito tempo com algumas variações (das quais, sem dúvida, a mais curiosa foi o luxuoso clube de compra de relógios Patek Philippe sediado no Rio de Janeiro no início do século passado). Fato é que esta “jabuticaba” é hoje uma das verticais mais relevantes do setor financeiro brasileiro, movimentando mais de R$ 160 bilhões de crédito anualmente, e é sem dúvida, um dos produtos mais complexos e criativos da topografia financeira brasileira.

Na mesma pesquisa, provavelmente encontrará tanto críticas como elogios, igualmente fervorosos, em relação ao consórcio, nos levando ao questionamento: como evoluirá esta jabuticaba?

Diferente de cartões de crédito, investimentos e empréstimos, não existem exemplos em mercados mais avançados de como poderia ser o futuro do consórcio. Esta falta de referência impediu uma evolução na mesma velocidade dos serviços financeiros mais básicos que encontramos na prateleira de qualquer neobank, tanto do ponto de vista de tecnologia embarcada como de experiência.

Para entendermos para onde vai o produto devemos partir dos primeiros princípios, entendendo o problema que o consórcio endereça.

A alma do consórcio é o financiamento coletivo. Participantes formam um grupo e se comprometem a poupar em conjunto ao longo de um prazo predeterminado. À medida que poupam, o dinheiro agregado é emprestado pelo grupo aos membros para comprar o bem de interesse, seja este um carro, casa, caminhão ou celular. Se tudo correr bem, ao final do prazo todos do grupo atingem o objetivo de compra. Hoje estes grupos são organizados por administradoras de consórcio que cobram uma taxa dos consorciados e regulados pelo Banco Central.

Do ponto de vista do consorciado participante, ele inicia como um poupador, pagando uma parcela para o grupo todos os meses, e eventualmente se torna devedor do grupo, quando recebe acesso ao crédito para comprar o bem desejado.

Mas por que as pessoas aderem a estes grupos de consórcio? Não seria mais fácil, até mais barato, poupar dinheiro em uma conta poupança ou qualquer outro instrumento de investimento e, após acumular uma entrada, se financiarem para comprar o bem de interesse? Hipóteses ocupam um largo universo que variam de “ignorância plena” a “sagacidade” dos consorciados.

Na minha opinião, a razão mais mal compreendida, que também é uma das mais importantes para entender como deve evoluir este produto, está fundada na economia comportamental: fazemos consórcio porque o produto nos ajuda a atingir objetivos de poupança extremamente desafiadores.

Feliz ou infelizmente, nós, seres humanos, não somos 100% racionais e disciplinados, e isto fica evidente quando analisamos nossos padrões de poupança. Por mais que tenhamos objetivos de longo prazo que requerem disciplina financeira, mesmo antes da pandemia, mais de 70% dos brasileiros relatavam não ter economizado nada nos últimos 12 meses. Boa parte das pessoas vive sem nenhum colchão de segurança. O mesmo acontece de forma abrangente no mundo inteiro, independente de cultura, renda, idade ou qualquer outro fator demográfico.

E como administrar esta característica distintivamente humana quando ela nos atrapalha a atingir nossos objetivos mais importantes? Uma forma, imortalizada pelo vencedor do Prêmio Nobel de Economia Richard Thaler como “nudges”, seria implementar mudanças no design do nosso dia-a-dia ou dos produtos e serviços que consumimos, para nos influenciar a adotarmos o comportamento desejado: pagamos academias para “nos forçarmos” a fazer exercício, rasgamos o cartão de crédito para não gastarmos mais do que ganhamos, e também aderimos a consórcios para pouparmos todo mês por mais difícil que seja.

As “travas” e “penalizações” impostas aos consorciados que param de pagar suas parcelas mensais são os aspectos mais criticados do consórcio mas são também o seu ponto mais inovador e que devem de alguma forma ser preservados. É o que leva 70% dos consorciados a conseguirem poupar quantias significativas de forma consistente ao longo de um dado ano, enquanto a maioria da população global sofre para economizar qualquer parte de sua renda. Ao perceber que o consórcio é em sua essência uma ferramenta para nos influenciar a poupar mais, fica mais fácil enxergar como podemos potencializar e melhorar este produto usando tecnologia.

Acredito que como players nesta indústria, devemos pensar em como redesenhar a experiência do consorciado, incluindo as diversas “travas” e “penalizações” do produto, para aumentar ainda mais a probabilidade de atingir seu objetivo de poupança e aquisição. As ferramentas utilizadas para atingir este objetivo serão em grande parte as mesmas utilizadas para revolucionar uma longa lista de indústrias nas últimas décadas.

Devemos utilizar modelos de dados para determinar as características ideais de um consórcio — parcelas, prazos, créditos e outras “opcionalidades” — para cada pessoa, buscando maximizar a probabilidade de sucesso. Devemos alavancar redes sociais de forma inteligente para criar incentivos adicionais para estimular a disciplina de poupança ao longo da longa jornada do consorciado. Devemos reconstruir a experiência digital de forma a simplificar, dar maior transparência e possibilidade de customização aos consorciados em relação ao produto. E, por fim, devemos conectar os diferentes players do mercado de forma fluida — administradoras, consorciados, mercado de capitais entre outros stakeholders — para garantir taxas competitivas, compatíveis com risco, e permitir customização das características financeiras de cada consórcio.

Após três anos empreendendo e participando deste segmento, estamos convencidos de que, como aconteceu em tantas outras indústrias, a tecnologia impulsionará a transformação do consórcio, levando a um produto ainda melhor do ponto de vista dos consorciados. Vemos esta intenção e energia em virtualmente todos os players do setor, sejam eles novos entrantes como a Consorciei, ou incumbentes. Em breve, quem sabe, exportaremos esta jabuticaba financeira para o mundo.

*Pedro Amoroso Lima é sócio-diretor e um dos fundadores da Consorciei, fintech que tem a missão de ajudar milhões de brasileiros consorciados a atingirem seus objetivos financeiros

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