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Tentativa de golpe de Estado: o que diz o inquérito da PF sobre plano para manter Bolsonaro no poder

Relatório da PF indicia Bolsonaro e 36 aliados por tentativa de golpe de Estado; documento aponta evidências que incluem mensagens, registros públicos e planejamento de ações clandestinas

DORAL, FLORIDA - FEBRUARY 03: Far-right former Brazilian President Jair Bolsonaro speaks during the Turning Point USA event at the Trump National Doral Miami resort on February 03, 2023 in Doral, Florida. Bolsonaro has been staying in Orlando since leaving Brazil two days before the inauguration of President Luiz Inácio Lula da Silva. (Photo by Joe Raedle/Getty Images) (Joe Raedle/Getty Images)
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 26 de novembro de 2024 às 18h30.

Lives para disseminação de desinformação, manipulação das Forças Armadas e a invasão da sede dos três Poderes são episódios apontados pela Polícia Federal (PF) em relatório com conexão com a suposta organização criminosa que tentou Golpe de Estado e abolir o Estado democrático de direito.

Segundo a PF, o relatório baseou-se em diversas evidências,como mensagens de texto, registros de entradas em prédios públicos, dados de celulares, gravações de reuniões ministeriais e até informações obtidas em aplicativos de transporte, como o Uber.

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Veja a íntegra do relatório final da Polícia Federal de 884 páginas.

Nesta terça-feira, 26, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, retirou o sigilo do documento e encaminhamento do relatório final da Polícia Federal à Procuradoria-Geral da República (PGR).

O relatório indiciou Bolsonaro e mais 36 pessoas, incluindo aliados do ex-presidente, pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

No documento, a PF afirma que Bolsonaro "planejou atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva dos atos da organização criminosa que buscava realizar um golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direto".

Em entrevista coletiva na segunda-feira, 25, Bolsonaro negou qualquer trama de golpe de Estado, mas disse que a decretação de Estado de Sítio chegou a ser estudada por membros de seu governo, em 2022.

O relatório aponta que evidências mostram uma tentativa sistemática e coordenada de abolir o Estado Democrático de Direito. O esquema, segundo os investigadores, envolveu políticos, militares, servidores públicos e influenciadores digitais, que utilizaram estratégias diversificadas para alcançar seu objetivo: a manutenção do grupo político no poder.

A PF afirma que embora o plano não tenha se concretizado, as ações tiveram consequências graves para a democracia brasileira, resultando em atos de violência e desestabilização institucional.

Ações da organização criminosa que tentou o Golpe de Estado, segundo a PF

Campanha para desacreditar o processo eleitoral

Desde 2019, Bolsonaro e seus aliados construíram e propagaram a narrativa de que o sistema eletrônico de votação era vulnerável a fraudes, mesmo sem qualquer evidência. A ação se intensificou após a derrota no segundo turno das eleições de 2022, quando relatórios falsos elaborados por servidores da ABIN e pelo Instituto Voto Legal (IVL) foram usados como justificativa para questionar a segurança das urnas eletrônicas.

Segundo a PF, militares também desempenharam papel central, disseminando informações falsas em redes sociais para estimular uma ruptura institucional.Dados fraudulentos produzidos por integrantes da ABIN, sob ordens de Alexandre Ramagem e Augusto Heleno, foram usados para alimentar o discurso de fraude.

Pressão sobre as Forças Armadas

Outro foco das investigações foi a tentativa de cooptação de comandantes das Forças Armadas. Bolsonaro e aliados ofereceram cargos, disseminaram desinformação e organizaram manifestações para pressionar os militares a apoiar o golpe.

Reuniões foram realizadas com oficiais de forças especiais, e uma "Carta ao Comandante do Exército" foi elaborada para incitar os militares a aderirem ao plano. A carta foi vazada pelo influenciador Paulo Figueiredo, que também atacou publicamente comandantes que resistiram à ideia de intervenção militar.

Mesmo diante da resistência de líderes como o General Freire Gomes, mensagens e visitas de Braga Netto e outros integrantes do grupo buscaram intensificar a pressão para garantir a adesão do Exército ao golpe.

Minuta do decreto golpista

Segundo a PF, o núcleo jurídico de Bolsonaro, liderado por Filipe Martins, elaborou um decreto para instaurar um Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), justificando a intervenção militar. A minuta foi apresentada em reunião no Palácio da Alvorada, mas a resistência de comandantes do Alto Comando impediu o avanço.Ainda assim, Bolsonaro continuou incitando apoiadores e reafirmou, publicamente, sua autoridade como chefe supremo das Forças Armadas.

Plano para matar Lula, Alckmin e Moraes

A investigação identificou documentos que indicam o planejamento de ações clandestinas para o dia seguinte ao golpe, como a criação de um gabinete de crise e o assassinato de opositores, incluindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes.Segundo a PF, a mobilização de apoiadores foi essencial para criar um clima de instabilidade que justificasse a intervenção militar.

Atos antidemocráticos

Mesmo após o fracasso do golpe em dezembro de 2022, o grupo manteve a mobilização de apoiadores, financiando manifestações e incitando atos de violência contra as instituições democráticas.Essas ações culminaram nos ataques às sedes do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do STF em 8 de janeiro de 2023.

Além disso, a PF apontou que membros da organização atuaram para obstruir as investigações sobre os atos golpistas após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

Veja os núcleos de atuação para tentativa de golpe de Estado

1. Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral: responsável por produzir e disseminar notícias falsas sobre a lisura das eleições, para estimular a população a protestar em frente a quartéis militares e criar um ambiente propício para o golpe.

Integrantes: MAURO CESAR BARBOSA CID, ANDERSON TORRES, ANGELO MARTINS DENICOLI, FERNANDO CERIMEDO, EDER LINDSAY MAGALHÃES BALBINO, HÉLIO FERREIRA LIMA, GUILHERME MARQUES ALMEIDA, SERGIO RICARDO CAVALIERE DE MEDEIROS e TÉRCIO ARNAUD TOMAZ

2. Núcleo Responsável por Incitar Militares à Aderirem ao Golpe de Estado: focado em atacar militares em posição de comando que se opunham ao golpe, utilizando influenciadores com autoridade perante a "audiência" militar.

Integrantes: WALTER SOUZA BRAGA NETTO, PAULO RENATO DE OLIVEIRA FIGUEIREDO FILHO, AILTON GONÇALVES MORAES BARROS, BERNARDO ROMÃO CORREA NETO e MAURO CESAR BARBOSA CID.

3. Núcleo Jurídico: encarregado de elaborar a base jurídica para o golpe, incluindo minutas de decretos que atendessem aos interesses do grupo.

Integrantes: FILIPE GARCIA MARTINS PEREIRA, ANDERSON GUSTAVO TORRES, AMAURI FERES SAAD, JOSE EDUARDO DE OLIVEIRA E SILVA e MAURO CESAR BARBOSA CID

4. Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas: responsável por planejar e executar as ações golpistas, incluindo a mobilização, logística e financiamento de militares em Brasília.

Integrantes: SERGIO RICARDO CAVALIERE DE MEDEIROS, BERNARDO ROMÃO CORREA NETO, HÉLIO FERREIRA LIMA, RAFAEL MARTINS DE OLIVEIRA, ALEX DE ARAÚJO RODRIGUES e CLEVERSON NEY MAGALHÃES.

5. Núcleo de Inteligência Paralela: dedicado à coleta de informações que pudessem auxiliar na tomada de decisões do então Presidente Jair Bolsonaro, incluindo o monitoramento de autoridades, como o Ministro Alexandre de Moraes, para capturá-las durante o golpe.

Integrantes: AUGUSTO HELENO RIBEIRO PEREIRA, MARCELO COSTA CAMARA e MAURO CESAR BARBOSA CID.

6. Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e Apoio a Outros Núcleos: composto por militares de alta patente que utilizavam sua influência para incitar apoio aos demais núcleos e endossar as ações golpistas.

Integrantes: WALTER SOUZA BRAGA NETTO, ALMIR GARNIER SANTOS, MARIO FERNANDES, ESTEVAM THEOPHILO GASPAR DE OLIVEIRA, LAÉRCIO VERGÍLIO e PAULO SÉRGIO NOGUEIRA DE OLIVEIRA”.

Acompanhe tudo sobre:Jair BolsonaroPolícia FederalSupremo Tribunal Federal (STF)

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