Ministros Luís Roberto Barroso, atual presidente do TSE (à esquerda), e Alexandre de Moraes, que irá presidir a Corte em 2022: caça às fake news (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Alessandra Azevedo
Publicado em 27 de dezembro de 2021 às 06h00.
Se as redes sociais serão imprescindíveis na estratégia para as eleições 2022, assim também será o trabalho nos bastidores para monitorar a enxurrada de conteúdo online.
Juntos, só os candidatos à Presidência têm mais de 60 milhões de seguidores nas principais plataformas e geram bilhões de interações e visualizações todos os meses, um volume que só tende a aumentar com a chegada do ano eleitoral.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está na linha de frente desse debate. Da lista de movimentações que a Justiça Eleitoral tem feito antes do pleito do ano que vem, um destaque recente foi o julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão, por disparos em massa de notícias falsas no WhatsApp em 2018.
Os ministros absolveram a chapa ao entenderem que, embora tenha acontecido o disparo, não há provas suficientes da gravidade dos atos.
Mas, na mesma ocasião, a Corte deixou claro que a tolerância em 2022 será menor ao decretar a inelegibilidade por oito anos do deputado estadual Fernando Francischini (PSL-PR) pela divulgação de informações falsas sobre a urna eletrônica.
O ministro Alexandre de Moraes, que será presidente do tribunal a partir de agosto, também discursou afirmando que não vai permitir que grupos organizados tentem “novamente desestabilizar as eleições”.
“Temos hoje não somente um precedente mas um entendimento majoritário do TSE de que a difusão de fake news do candidato gera perda de mandato”, diz Antonio Carlos de Freitas Júnior, doutor em direito constitucional e eleitoral pela Universidade de São Paulo (USP).
Sociedade civil e empresas também se prepararam para o cenário de guerra pré-eleitoral. Procurados pela EXAME, o grupo Meta e o Google, donos das maiores redes sociais do Brasil, afirmaram estar trabalhando de perto com o TSE.
O app de mensagens WhatsApp, destaque negativo em 2018, afirma que o número de mensagens “frequentemente encaminhadas” caiu 70% depois da implementação de restrições ao compartilhamento.
A companhia diz também que, nas eleições de 2020, encorajou políticos a não usarem mecanismos ilícitos de disparos em massa, e tem uma dezena de processos abertos contra empresas que vendem esse serviço.
“Foi fundamental ter tido pela primeira vez uma proibição expressa de disparo automatizado de mensagens na legislação eleitoral”, disse o WhatsApp em nota.
Facebook e Instagram, do mesmo grupo, lançaram um rótulo nas postagens de políticos para que eleitores acessem informações oficiais.
Na eleição municipal, o grupo Meta calcula ter removido mais de 140.000 peças que violavam termos de uso e rejeitado 250.000 impulsionamentos de posts que não deixavam claro serem anúncios eleitorais.
O Google, dono do YouTube, passou a bloquear ou desmonetizar conteúdos sobre tratamento da covid-19 que fogem do consenso científico, como incentivo ao uso da hidroxicloroquina, e diz que tem ampliado o monitoramento para as eleições e destacado fontes confiáveis nas buscas.
Apesar dos aperfeiçoamentos, a prática em ano eleitoral será mais complexa, com novas formas de espalhar conteúdos e outras plataformas entrando no radar, do Telegram ao TikTok.
“Jogo sujo sempre haverá, os grupos sempre vão achar uma brecha”, diz Caio Machado, cofundador do Instituto Vero, de combate à desinformação, e pesquisador da Universidade de Oxford.
“As principais empresas mudaram bastante a postura nos últimos anos, o que é positivo. Agora precisam seguir trabalhando para melhorar os processos e a transparência.”
Outro fator que pode aparecer como novidade é o chamado “PL das Fake News” (2.630/2020), que imporia novas medidas de regulação e transparência na moderação de conteúdo online — indo além do que aponta hoje o Marco Civil da Internet, de 2013.
Criticado no início por ameaças à privacidade dos usuários, o texto sofreu alterações e hoje é visto como mais maduro, diz Machado. Mas, para passar a valer antes das eleições, o projeto de lei precisaria ser aprovado até julho. Ainda não há acordo para que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), paute o texto em plenário.
O candidato à Presidência com maior presença online é o presidente Jair Bolsonaro, com 40 milhões de seguidores nas principais plataformas abertas (Twitter, Facebook, Instagram e YouTube). O presidente tem quase quatro vezes mais seguidores do que Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, fora da internet, lidera as pesquisas.
Em 2018, a internet foi crucial para a campanha de Bolsonaro. O candidato com mais tempo de televisão era Geraldo Alckmin (então no PSDB), com 5 minutos e 32 segundos em cada bloco de propaganda eleitoral. Mesmo assim, sem grande projeção na internet, o tucano teve apenas 5% dos votos válidos.
Já Bolsonaro, com 8 segundos de televisão, chegou a 46% dos votos válidos no primeiro turno.
Desde então, Bolsonaro ainda se mostra como o candidato com maior capacidade de engajar as redes, como tem feito ao longo do mandato. O presidente também terá mais tempo de televisão em 2022, após se filiar ao PL, contraste com o então nanico PSL que o abrigou no último pleito.
Mas é certo que fatores que levaram à eleição atípica em 2018, com a campanha de Bolsonaro feita basicamente em redes sociais, não estão mais presentes, afirma o especialista em marketing político Marcelo Vitorino. “Naquela época, Bolsonaro foi muito bem porque as pessoas queriam uma ruptura política”, diz.
Os opositores também deverão estar mais atentos à presença digital. Sergio Moro, que pouco havia aparecido nas redes desde que deixou o governo, voltou a ganhar seguidores desde que se lançou candidato.
Lula, por sua vez, teve picos de interações e menções em momentos como sua viagem à Europa e a participação no videocast Podpah — o episódio gerou 7,5 milhões de visualizações em três dias e fez o petista ganhar mais de 130.000 seguidores na sequência, como mostrou levantamento da consultoria Bites.
Assim, em 2022, os candidatos se preparam para balancear redes sociais com estratégias tradicionais, da televisão à campanha nas ruas. Do outro lado, sociedade civil, Justiça e plataformas estarão mais vigilantes do que nunca.
Este trecho foi adaptado da reportagem "Debates que vão orientar as urnas", publicada na edição 1.235 da EXAME. Clique aqui para ler a matéria completa e assine por menos de R$ 11/mês para ter acesso ilimitado aos melhores conteúdos de economia, negócios, política e carreira.