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Moro diz que desistiria de pacote se Câmara tirar trechos sobre corrupção

O ministro da Justiça fala em audiência no Senado para esclarecer pontos de seu pacote anticrime, promessa de campanha de Bolsonaro

Moro no Senado: ministro explica aos parlamentares sobre seu projeto na área da Segurança Pública (Agência Senado/Divulgação)
AB

Agência Brasil

Publicado em 27 de março de 2019 às 13h42.

Última atualização em 27 de março de 2019 às 15h45.

Brasília — O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro , disse nesta quarta-feira (27) que prefere desistir do pacote anticrime se a Câmara dos Deputados tentar retirar a corrupção do texto.

O ministro participa agora de uma audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado para apresentar seu pacote anticrime.

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"Nenhum deputado ou deputada me solicitou a retirada das previsões da corrupção do projeto. Eu, particularmente, se houvesse uma solicitação dessa espécie, eu jamais concordaria. Os três temas estão relacionados. Eu preferiria retirar o projeto. É preciso dar uma resposta aos anseios da sociedade em relação a esses três temas em conjunto", afirmou aos senadores.

Assista a participação do ministro da Justiça

Moro também voltou a defender que a lei determine a execução da prisão em segunda instância, algo que defende desde quando era juiz da Operação Lava Jato.

"Sei que é um tema controvertido, respeito as opiniões em contrário, mas o fato é que, se o processo penal não chega ao fim em tempo razoável, de nada adianta nós elevarmos penas de crimes, tornarmos os sistemas mais rigorosos, se não há perspectiva real de aplicação da lei", afirmou Moro, durante audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

Segundo Moro, no pacote de Lei anticrime, que está tramitando na Câmara dos Deputados, há previsão "de uma maneira clara", de execução provisória em segunda instância, com base em quatro precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2016.

O ministro disse que há previsão na proposta para que, em crimes dolosos contra a vida, como homicídio e feminicídio, haja a execução da sentença na primeira instância.

A proposta se baseia em precedentes da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que, interpretando o princípio da soberania dos vereditos dos tribunais do júri, entendeu que não é necessário aguardar nem o trânsito em julgado, nem o julgamento da apelação no caso de julgamentos por júri.

"Isso tem um impacto muito significativo nessa criminalidade mais grave, que ainda é o crime contra a vida: o homicídio e o feminicídio", disse.

O ministro afirmou que está aberto ao diálogo e a aperfeiçoamentos sugeridos pelos parlamentares em relação ao pacote anticrime, que traz três projetos de lei.

Segundo Moro, o foco da proposta é "o endurecimento em relação à criminalidade mais grave".

As propostas modificam os Códigos Penal e de Processo Penal em assuntos como regras de legítima defesa, prisão após condenação em segunda instância e regulamentação de instrumentos de investigação. "Estamos abertos a sugestões, críticas e aprimoramentos" afirmou.

Violência

Ao falar das ações já adotadas pelo governo, Moro destacou a transferência de líderes da facção Primeiro Comando da Capital (PCC) de unidades prisionais de São Paulo para penitenciárias em outros estados e apontou iniciativas que devem começar a funcionar nos próximos meses como o Programa Nacional de Enfrentamento à Criminalidade Violenta.

O programa é um projeto-piloto interministerial para tentar reduzir os índices de criminalidade no país. Na prática, o governo federal irá fazer convênios com estados e municípios para atuar nas cidades com altos índices de crimes violentos.

A ideia é que o projeto-piloto seja iniciado no segundo semestre e ajude a quebrar os círculos de violência. Inicialmente cinco municípios, com índices de criminalidade elevados, sejam escolhidos inicialmente.

Forças policiais

O ministro destacou o aumento de 525% no número de policiais federais que investigam políticos e demais autoridades com foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal. A ampliação foi de oito para 42 agentes que atuam no Serviço de Inquéritos Especiais da Polícia Federal, que investigam também senadores.

Ele também citou o reforço das forças-tarefas e equipes policiais da Lava Jato em Curitiba, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília. Os dados foram apresentados pelo ministro em uma espécie de balanço das primeiras ações em sua gestão no ministério.

As delegacias da PF responsáveis pelo combate a corrupção nos quatro Estados tiveram incrementos que variam entre 83%, caso do Paraná, e 21%, caso de Brasília. O incremento em São Paulo foi de 25% e no Rio de Janeiro, 34%. O número médio de policiais nessas unidades passou a 48. Antes, eram 35.

Além disso, Moro destacou a duplicação na equipe do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), de 31 para 64 pessoas. "O Coaf estava um pouco negligenciado em gestões anteriores."

A equipe passou de 31 para 64. Tudo por conta daquela gordura que conseguimos cortar com a unificação de dois ministérios (o da Justiça e o da Segurança Pública)", disse Moro. O comentário foi também uma defesa à junção das duas pastas - questionada por alguns parlamentares.

O Coaf foi responsável pelo relatório, que apontou movimentações atípicas na conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor do hoje senador Flavio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República, Jair Bolsonaro.

Flávio Bolsonaro estava presente na sessão, em que Moro disse não pretender "tornar o Coaf um órgão policial". "O Coaf é órgão de inteligência, e não de investigação. Não há plano de tornar o Coaf um órgão policial."

Fronteiras

Sobre as fronteiras o ministro adiantou que Foz do Iguaçu (PR) será a primeira cidade brasileira a receber um centro de integração para cuidar da segurança de fronteira.

Lá, por se tratar de uma cidade com tríplice fronteira, haverá um projeto-piloto com um grupo de trabalho de órgãos estaduais e federais para enfrentar o contrabando e o tráfico de armas e drogas.

"Os recursos são limitados. Temos que trabalhar esses recursos com inteligência e operações integradas", disse.

Maioridade penal

Na audiência, Moro se posicionou favorável à redução na maioridade penal, "em alguns casos", mas ressaltou que a questão não está sendo discutida no âmbito do Ministério da Justiça. "Eu acho que, para crimes graves, poder-se-ia reduzir a idade para 16 anos ou se poderia pensar, como alternativa, em ampliar o período de internação na legislação ordinária atual", explicou.

Segundo ele, a questão tem de ser construída e debatida juntamente com o Congresso. "Mas é uma questão presente e as pessoas, em geral, reclamam por um posicionamento do governo e do Congresso", reconheceu.

Abuso de autoridade

No Senado, Moro declarou não ser contrário a lei de abuso de autoridade, embora à época em que foi apresentada pelo então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), a proposta tenha sido interpretada como um freio à atuação dele como juiz da Operação Lava Jato. "É preciso analisar os projetos existentes, para que o remédio não seja excessivo", avaliou.

Ainda segundo Moro, nenhuma autoridade está acima da lei. "Se houve abuso, se houve erros, também hão de ser punidos. Há que apenas serem analisados os termos da legislação", ressaltou.

Sergio Moro lembrou aos senadores que em 2016 participou de um debate no plenário da Casa sobre o assunto. Na época, como juiz, ele disse que o texto do projeto era muito largo. "Poder-se-ia criminalizar a decisão, por exemplo, judicial contrária a uma das partes que fosse eventualmente caracterizada como abusiva ou a ação do policial, mesmo sendo ela legítima. Nós temos uma lei de abuso de autoridade e pode-se reformá-la, mas vamos analisar os termos", disse.

Armas

Sobre o decreto do presidente Jair Bolsonaro que trata do porte de armas, Moro lembrou que o presidente havia prometido na campanha eleitoral flexibilizar o Estatuto do Desarmamento, e cumpriu. "Houve uma flexibilização, por decreto, bastante ponderada. Tanto, que isso levou a críticas tanto daqueles que eram favoráveis a uma flexibilização maior como daqueles que eram contrários a qualquer flexibilização", afirmou.

Segundo Moro o decreto tratou apenas de posse de arma em residência e de posse de arma de uso não restrito. "Não há um grande incremento na circulação de armas no país, mas houve um atendimento de anseios de pessoas que, muitas vezes, se sentem mais protegidas tendo a posse de uma arma de fogo em casa", avaliou acrescentando que foi uma posição razoável.

"Eu acho que tem que se respeitar a posição dessas pessoas, essas ansiedades. Ainda que muitos não queiram ter, alguns querem, muitos querem, e foi uma resposta a esse tipo de solicitação", defendeu.

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