Foto mostra mulheres na Marcha das Vadias, em São Paulo, em 2014 (Kelsen Fernande/Fotos Públicas)
Da Redação
Publicado em 30 de maio de 2015 às 19h17.
Centenas de mulheres participaram hoje (30) da 5ª Marcha das Vadias em São Paulo, reivindicando principalmente a legalização do aborto e o fim do encarceramento feminino.
Segundo as manifestantes, é preciso ampliar o debate sobre ser ou não favorável ao aborto, entendendo que a criminalização não impede que as pessoas continuem abortando o que implica no comprometimento da saúde da mulher.
"A Marcha das Vadias luta basicamente contra a criminalização e culpabilização das mulheres pela violência que elas sofrem, em especial, a sexual. Este ano, especificamente, resolvemos pautar a questão da legalização do aborto porque temos um congresso extremamente conservador e que já expressou que isso não vai entrar na pauta. Estamos aqui para dizer que vai", disse a psicóloga Isabel Bernardes, integrante do movimento, em entrevista à Agência Brasil.
Segundo ela, cada mulher tem o direito de decidir sobre fazer ou não um aborto. "E mais do que isso. É necessário uma real política de efetividade dos direitos sexuais e reprodutivos para que o aborto fosse, de fato, a última opção e não um remédio duro de tomar"
Isabel Bernardes entende que legalizar o aborto não é obrigar as mulheres a fazer aborto.
“Ninguém vai ser obrigado a fazer o aborto porque está legalizado. Deve-se deixar as pessoas que não querem, não podem ou não acreditam nesse projeto de vida, [dar à luz] decidir não seguir adiante com uma gravidez. Legalizar o aborto é dar oportunidade para quem não pode pagar [ fazer], porque quem pode pagar faz, mas sem risco de morrer", destacou a psicóloga.
Uma das manifestantes, de 31 anos de idade, que chamamos de Joana para preservar a sua identidade, disse à reportagem ter feito dois abortos. O primeiro, quando tinha 23 anos.
Para isso, segundo ela, mesmo sabendo dos riscos, comprou por iniciativa própria um medicamento abortivo que custa em torno de R$ 100 ou R$ 200 cada comprimido.
"Utilizei a medicação na minha casa e segui as instruções de cartilhas que encontrei na internet. Usei, aguardei um tempo para fazer efeito, e tive hemorragia. Nas duas vezes eu estava entre sete ou oito semanas [de gravidez]. E eu sabia que teria que procurar um hospital depois. Mas eu sabia disso porque eu tive acesso à informação. Nas duas vezes passei por curetagem [no hospital]".
Joana disse ainda que, no hospital, não falou ao médico sobre ter provocado o aborto por temer consequências. "Não falei nada. Nem que estava grávida. Contei que tinha sofrido uma hemorragia e que estava com dor".
"É urgente no Brasil legalizar o aborto. As mulheres morrem porque elas não têm acesso à informação, praticam o aborto de forma absolutamente sem informação. Muitas mulheres morrem porque tomam o remédio e depois não procuram o hospital para fazer a curetagem. Outras fazem de forma pior, perfurando o útero com agulha de tricô. Ou tomam drogas das quais não sabem a origem, risco que eu também corri”, destacou.
Para a manifestante, o ideal é que toda mulher pudesse fazer o aborto pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
"As mulheres pobres correm muitos riscos. Quem tem R$ 4 mil ou R$ 5 mil vai para Moema [bairro de classe média alta de São Paulo] e faz da forma mais segura e limpa possível. E sai de lá tranquila. Quem não tem ou vai parar em uma clínica sem nenhuma estrutura ou vai parar na mão de uma curiosa ou vai tentar fazer como eu fiz, em casa e sozinha, correndo muitos riscos porque eu tenho a absoluta convicção de que a maioria das mulheres não tem acesso a essa informação que eu tive na internet", disse Joana.
Depois da concentração no vão-livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp) onde confeccionaram cartazes e entoaram cânticos sobre o aborto, entre eles, um que fazia referência ao Uruguai, com o seguinte refrão: “O Uruguai já legalizou, Brasil, a sua hora chegou”, as manifestantes seguiram em caminhada pela Avenida Paulista e Rua Augusta, com destino à Praça Roosevelt, no centro da cidade. Lá, ao encerrar o ato, elas sentaram em círculo e cada uma deu um depoimento sobre o aborto.
As manifestantes estimaram que o ato reuniu cerca 2 mil pessoas. A Polícia Militar calculou em torno de 100 pessoas.