Jovair, o azarão da Câmara?
Enquanto Rodrigo Maia (DEM-RJ) articula com líderes, deputado concentra a campanha em deputados insatisfeitos, dissidentes dos blocos e menos influentes
Raphael Martins
Publicado em 14 de janeiro de 2017 às 06h42.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h26.
Em ano de eleição no Congresso, o recesso é mais curto em Brasília — pelo menos para os congressistas em campanha. No Senado, as águas são calmas. Há tempos foi articulado entre senadores que o sucessor de Renan Calheiros (PMDB-AL) seria Eunício Oliveira (PMDB-CE) e tudo parece caminhar para uma escolha sem surpresas. Na Câmara é que o bicho pega.
São quatro os candidatos. O atual presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) é franco favorito. Rogério Rosso (PSD-DF), uma espécie de líder informal do Centrão, lançou sua candidatura há meses, mas perdeu força dentro de sua própria bancada por articulação de Gilberto Kassab — ministro de Michel Temer que prefere manter Maia. André Figueiredo (PDT-CE) faz uma candidatura simbólica. Nesse cenário, a grande incógnita é o cirurgião dentista Jovair Arantes, 65 anos, deputado no sexto mandato na Câmara.
Maia leva vantagem por ser o homem do governo na Câmara —ainda que o Planalto não confesse. “Eu vou ser um de 513. Nós vamos governar essa casa juntos”, disse em seu discurso da vitória. De fato, Maia colocou em ordem a bagunça deflagrada pela crise do ex-presidente Eduardo Cunha. Retomou alguma confiança de seus pares, conduziu as votações pedidas pelo governo e fez avançar as reformas.
Pesa também contra Maia um imbróglio jurídico – pela Constituição, ele não pode se candidatar à reeleição. Seus adversários foram ao Supremo Tribunal Federal, mas o caso tende a ser decidido internamente pela Câmara. A EXAME Hoje ele não comentou sobre o assunto ou sua estratégia de defesa caso venha a ser impedido.
O estilo de negociação de Maia faz conexão sempre com os líderes, deixando centenas de deputados achando que podiam influenciar mais. Por opositores, é acusado de fazer as vontades de Temer em detrimento de uma agenda independente da Câmara e também de acelerra demais os processos de votação para entregar os prazos estipulados pelo governo, fazendo com que deputados de menor expressão sintam-se preteridos. Certa forma, o democrata contraria a promessa que fez ao assumir de que seria “um de 513.” E, numa Câmara com 513 interesses em jogo, isso pode pesar.
Jovair vai por essa brecha. Enquanto Maia articula sua campanha de “cima para baixo”, o goiano faz caminho inverso, concentrando a campanha em deputados insatisfeitos, dissidentes dos blocos e menos influentes. É um filme antigo em Brasília – aquele em que emerge um rei do baixo clero para fazer justiça com os renegados. “Quero dar previsibilidade e transparência à Casa, para mostrar à sociedade como é que funcionamos. Quero melhorar a imagem da Câmara”, diz o candidato Jovair Arantes a EXAME Hoje.
A grande questão no Planalto é saber até que ponto Jovair representa um risco. “É difícil que Jovair tenha força, ou queira atrapalhar os planos do governo. No pior dos casos, o governo acomoda o PTB com cargos, seja a Secretaria de Governo ou Ministério do Trabalho”, afirma Wagner Parente, cientista político e diretor da consultoria Barral M Jorge. “Articulando direito, ele pode ser um bom plano B, com fortalecimento do Centrão. Será preciso, porém, fazer um rearranjo ministerial para acomodar os interesses desses deputados”.
Além de reforçar a todo momento o imbróglio jurídico de Maia, o plano do petebista Jovair é levar a campanha ao segundo turno, onde unificará votos com os adversários Rosso e Figueiredo. “Chegando ao segundo turno, sabemos que vamos vencer”, diz um aliado de Jovair. Um líder do Congresso endossa a tese: “Se houver segundo turno, a vitória do Jovair fica muito provável”.
Alguns alvos são importantes na briga e o exemplo máximo é o PT. Ainda que o partido esteja relativamente quebrado em correntes de pensamento, a liderança da terceira maior bancada da Casa não descarta votar em nenhum dos quatro deputados possíveis. Leva os votos quem lhes garantir a Primeira Secretaria da Mesa Diretora e tiver chance real de vitória. “Nosso objetivo é a posição na Mesa proporcional ao nosso tamanho. Precisamos de peso para influenciar nas votações e o cargo é importante na disputa política nestes dois anos, que será intensa”, afirma Carlos Zarattini, líder do PT na Câmara. “Não temos predileção por Maia ou Jovair. Ambos atuaram contra o governo da Dilma e vão fazer o jogo do governo”.
O exemplo mostra também como ideologias políticas e a posição das legendas têm papel pouco importante na eleição. Vota-se muito mais de acordo com o prospecto futuro de poder interno no Congresso e até mesmo por relações pessoais. Entra aqui o exemplo do PSDB. Os tucanos seguem sem posição firme. Antiga aliada do DEM, partido de Maia, a bancada considera a opinião de quadros importantes do estado de Goiás —como o governador Marconi Perrillo —, que são simpáticos a um mandato de Jovair.
Como Maia tem a predileção de aliados de José Serra e Aécio Neves, Jovair foi a São Paulo nesta sexta-feira 13 para uma reunião com o governador Geraldo Alckmin (PSDB) para apresentar suas ideias e trazer sua parcela de votos tucanos na Câmara. Para aliados do governador, o sucesso da empreitada dependerá do compromisso que o deputado firmar com os tucanos. Ainda que seja, em tese, aliado de alas que são contra a Reforma da Previdência, como o Solidariedade, alguns dirigentes do PSDB dizem estar preocupados apenas com o compromisso com as medidas de ajuste, não descartando votos a Jovair se ele vestir a camisa reformista.
“A reforma em si não é pauta de campanha. O assunto é o funcionamento da Casa, o respeito absoluto à individualidade dos parlamentares”, afirma Jovair. “O regimento é arcaico e será mudado para acelerar as votações, mas sem desrespeitar a representatividade dos parlamentares. Meu mandato não terá atropelos e sessões eternas”. Cumpridas as promessas do candidato, sessões na calada da noite, como a que modificou as Dez Medidas Contra a Corrupção no dia 30 de novembro, e discussões aceleradas, como durante a votação da PEC do teto de gastos, em 25 de outubro, não voltarão a acontecer. Duas claras menções ao que assessores de Jovair chamam de “erros de procedimento” de Rodrigo Maia.
Para estes assessores, o apoio ao goiano gira em torno de 200 deputados. Maia fala que tem 350. A Câmara tem 513 deputados votantes. A eleição está marcada para o dia 2 de fevereiro.