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Jair Bolsonaro renova concessão de grandes emissoras, incluindo a Globo

A Constituição brasileira estabelece que cabe à União explorar diretamente ou mediante concessão os serviços de rádio e TV

O presidente Jair Bolsonaro sanciona a Lei Complementar 420, que cria a Empresa Simples de Crédito (ESC), em cerimônia no Palácio do Planalto (Valter Campanato/Agência Brasil)
Drc

Da redação, com agências

Publicado em 20 de dezembro de 2022 às 19h33.

Última atualização em 21 de dezembro de 2022 às 06h41.

O presidente Jair Bolsonaro editou na terça-feira, 20, um decreto que renova, por 15 anos, a contar de outubro de 2022, as concessões das outorgas de televisão, em tecnologia digital, da Rede Globo (Globo Comunicação e Participações S.A.), nos municípios do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Brasília, de Belo Horizonte e do Recife.

Também foram renovadas, pelo mesmo período, as concessões da Rádio e Televisão Bandeirantes de Minas Gerais Ltda., no município de Belo Horizonte, e da Rádio e Televisão Record S.A., no município de São Paulo.

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Segundo comunicado emitido pela Secretaria-Geral da Presidência da República, as emissoras cumpriram uma série de requisitos e tanto a área técnica quanto a Consultoria Jurídica do Ministério das Comunicações se manifestaram favoravelmente às renovações de outorgas.

Pela Constituição Federal, cabe ao Poder Executivo analisar a concessão e renovação de outorgas de radiodifusão, que depois são submetidas ao Congresso Nacional, que delibera sobre os pedidos. A não renovação das outorgas dependem do voto de, no mínimo, dois quintos dos parlamentares no Congresso Nacional (Senado e Câmara dos Deputados), em votação nominal.

A informação foi divulgada inicialmente pela coluna do jornalista Lauro Jardim. Segundo assessores e auxiliares, o presidente quis ser 'pragmático' e fez o ato antes que seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva, tivesse a oportunidade de fazê-lo.

O presidente Jair Bolsonaro também editou mais oito decretos para tornar sem efeito concessões para a exploração de serviço de televisão educativa, porque as entidades requisitantes não apresentaram os documentos solicitados para a formalização dos contratos. O governo federal não informou para quais canais as outorgas deixaram de ser concedidas.

Como funciona a concessão de rádio e TV?

A Constituição brasileira estabelece que cabe à União explorar diretamente ou mediante concessão os serviços de rádio e TV. Isso significa que aquele empresário detentor de uma concessão de rádio ou de televisão não é o dono daquele negócio, mas está apenas autorizado a explorá-lo por tempo determinado — dez anos no caso do rádio e 15 no caso da TV. Conforme explica o consultor legislativo Marcus Martins, especialista em comunicações, o concessionário está, portanto, sujeito à fiscalização do poder público.

"Qual é a lógica da concessão? A concessão é uma licença que o Estado dá para um serviço do qual ele é o titular. Então, o Estado por impossibilidade ou opção, ele cede essa titularidade para um privado e esse privado tem de arcar com essas responsabilidades públicas da concessão. Então, é evidente, que essa característica da concessão de rádio e TV abre o caminho para que seja uma atividade cuidadosamente regulada"

Em todo o mundo, o rádio e a TV têm sido tratados como concessões públicas, desde a sua origem. Isso porque os sinais transmitidos por essas emissoras se propagam pelo chamado "espectro eletromagnético". É pelo espectro que trafegam não apenas os sinais de rádio e TV mas também os sinais de todas as comunicações por rádio, dos telefones celulares, das transmissões de dados sem fio, entre outros. O professor Othon Jambeiro da Universidade Federal da Bahia esclarece que o espectro eletromagnético é um bem público, como são as reservas de minérios e os rios, por exemplo.

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"Esse espectro eletromagnético não pode ser usado desordenadamente, porque se não houver um ordenamento e uma distribuição de seu uso pelos países, haveria a interferência nas ondas eletromagnéticas e uma emissora interferiria na outra e não se teria jamais condição de se ouvir bem qualquer emissora. Então, elas são concessão porque esse espectro eletromagnético precisa ser administrado e ele é considerado bem público, ou seja, propriedade do ser humano universalmente, conseqüentemente propriedade daqueles que representam o ser humano em cada nação. No caso do Brasil, a parte do espectro eletromagnético que é destinada ao Brasil pela UIT é um bem público do povo brasileiro. Para ser utilizado, precisa ser concedido e ele é concedido a partir de estudos técnicos que estabelecem as várias faixas que devem ser utilizadas pelos diversos serviços".

No início de outubro, venceram as concessões de 28 emissoras de TV, dentre elas, Globo, Record e Bandeirantes. O momento foi considerado simbólico pelos movimentos sociais na luta pela democratização dos meios de comunicação. Manifestações foram organizadas em 16 capitais brasileiras pela Coordenação dos Movimentos Sociais, que reúne entre outras entidades a CUT, o MST, a UNE e a Marcha Mundial de Mulheres. O representante da CUT no movimento, Antonio Carlos Spis, explica que o mote da campanha, "Concessões de Rádio e TV, quem manda é você" busca esclarecer a população sobre o caráter público das concessões.

"Numa campanha de sensibilização da sociedade nesse sentido. Ela não tem consciência não, ela é dominada pelos sinais públicos através das novelas da Globo, dos programas de auditório do SBT e de outras emissoras e ela vai sendo induzida de que ela está assistindo a um programa de televisão. Ela não percebe que aquela concessão é ela própria que dá, a partir do Congresso Nacional. Ela não se sente com poder. Ela respeita os poderosos e se esquece que os poderosos construíram seu poder através de um sinal público que ela concedeu. No caso da Globo, desde a ditadura, que se transformou nesta grande teia nacional de comunicação: a maior rede aberta, a maior rede fechada, a maior internet, a maior rede de rádio. Então, ela respeita o poder que chega até a casa dela e em hipótese alguma tem um mínimo de informação ou de sentimento de que ela pode exigir uma grade mais cultural, que ela pode exigir um direito de resposta em um momento específico, infelizmente não há esse sentimento na sociedade"

Vencidas as concessões, elas devem ser renovadas pelo Executivo com a aprovação do Legislativo. A Constituição determina que o Congresso Nacional terá 45 dias para apreciar os atos de outorga, mas a burocracia e o trâmite por vários órgãos do poder público costumam atrasar essa análise em anos. Especialistas e o movimento social criticam o fato de a renovação ser praticamente automática e pedem mais rigor nesse processo.

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