Embaixador brasileiro diz que acredita na conclusão das eleições haitianas
Processo eleitoral no Haiti foi interrompido devido às suspeitas de fraude no primeiro turno
Da Redação
Publicado em 20 de janeiro de 2011 às 06h12.
Porto Príncipe - O embaixador do Brasil no Haiti, Igor Kipman, disse que a chegada do ex-presidente Jean-Claude Duvalier - Baby Doc - a Porto Príncipe causa "frisson” mas que se mantém confiante de que o país caribenho conseguirá concluir seu processo eleitoral, interrompido por suspeitas de fraude no primeiro turno.
“Sou um otimista”, disse o embaixador. “Acho que até a semana que vem deve ser anunciado o resultado oficial e não vejo nenhum motivo, no curto prazo e nem a médio prazo, para que haja instabilidade. Estamos estimando um segundo turno no dia 20 de março”, disse Kipman.
A primeira votação ocorreu em 28 de novembro de 2010 e o segundo turno deveria ter sido realizado no último domingo (14). Depois de enfrentar protestos diante da divulgação do resultado, as autoridades haitianas decidiram esperar por uma análise feita pela Organização dos Estados Americanos (OEA), que foi entregue esta semana ao Comitê Eleitoral Provisório (CEP), órgão que tem o poder de acatar ou rejeitar as recomendações feitas pela comunidade internacional.
O relatório, apresentado pela Comissão Especial de Verificação da OEA, identificou
“irregularidades significativas” e recomendou que sejam feitas novas votações. Caso o CEP decida pela realização do segundo turno, a OEA recomendou substituir o candidato governista Jude Celestin por Michel Martelly, que disputaria a presidência do país com a primeira colocada, a candidata de oposição Mirlande Manigat.
Kipman minimizou os efeitos da presença de Duvalier no país e disse que considera “remota”, mas não impossível, a anulação do processo eleitoral em curso. “O CEP, diante de todos esses percalços e opiniões divergentes, pode decidir anular as eleições. Aí parte-se para um novo processo, abrem-se novas inscrições”, explicou o embaixador.
Dessa forma, seria aberta a brecha para que Duvalier possa entrar na disputa. O ex-ditador haitiano chegou ao país no domingo (16) e disse que voltava para “ajudar” na reconstrução do país, arrasado pelo terremoto do ano passado. Já o advogado de Duvalier, Reynold George, declarou que ele tem pretensões políticas e que tem todo o direito de exercer de novo o poder no Haiti. “Um político nunca morre”, declarou George.
O mandato do atual presidente, René Préval, termina no próximo dia 7 de fevereiro, mas há um entendimento de que ele pode postergar sua saída para o dia 14 de maio, quando completam cinco anos a contar do dia de sua posse.
Além disso, Préval conseguiu aprovar no Congresso uma lei que lhe permite permanecer o tempo que for necessário para que o processo eleitoral seja concluído. O limite para essa lei, no entanto, é o dia 14 de maio. “Não é novidade esse atraso nas eleições. Isso aqui é uma coisa recorrente. Em 2005, as eleições foram postergadas quatro vezes”, comentou Igor Kipman.
Na terça-feira (17), Duvalier foi indiciado pela Justiça haitiana por assassinatos, corrupção, roubo, desvio de dinheiro público durante seu governo. Mesmo enfrentando acusações, ele tem o apoio de parte da população. Muitos simpatizantes são ex-militares que atuaram durante o governo de Duvalier.
Baby Doc herdou o poder em 1971, com a morte do pai, François Duvalier, conhecido como Papa Doc. Quando assumiu, tinha 19 anos. A milícia ligada à família Duvalier é conhecida como os Tonton Macoutes e é acusada de ter exterminado 30 mil pessoas e desaparecido com cerca de 15 mil.
A simpatia ao ex-ditador, na opinião do embaixador brasileiro, tem uma motivação pragmática. “Há sempre essa saudade do tempo do governo dele. As pessoas têm essa perspectiva de que no governo de Duvalier havia energia 24 horas por dia, havia mais segurança”, reconhece o embaixador que minimizou os efeitos de sua volta. “Ele chegou no domingo, hoje [ontem, 19] já é quarta-feira e não houve grandes manifestações de rua ou violência. Eu acredito que isso não deve ocorrer”, analisou Kipman.