Bizarro caso de suposto ritual satânico no RS era "uma farsa"
Polícia chegou a prender cinco suspeitos com base em uma história inventada em Novo Hamburgo (RS)
Luiza Calegari
Publicado em 8 de fevereiro de 2018 às 15h02.
Última atualização em 8 de fevereiro de 2018 às 16h17.
São Paulo – Nos primeiros dias de 2018, o Rio Grande do Sul ficou chocado com uma história macabra: duas crianças argentinas teriam sido mortas e esquartejadas em um suposto ritual satânico em Novo Hamburgo, no Vale dos Sinos, leste do estado.
Ao que parece, no entanto, a história inteira era uma invenção: a Polícia Civil teve que libertar cinco suspeitos presos (ainda havia dois foragidos) e agora a investigação do caso voltou "à estaca zero", segundo afirmou o delegado Rogério Baggio em uma entrevista coletiva nesta quarta-feira (7).
O caso nem sempre esteve nas mãos dele. O delegado Moacir Fermino estava conduzindo a investigação com base em uma “revelação divina”, que teria mostrado a ele quais testemunhas ouvir, segundo o site do jornal gaúcho Zero Hora.
Quando voltou das férias, um dia antes do previsto, segundo o jornal Correio do Povo, Rogério Baggio reassumiu a investigação.
Ontem, ele anunciou que a polícia teria que recomeçar tudo do princípio, porque duas testemunhas ouvidas por Fermino tinham sido pagas para contar uma história falsa.
Ainda de acordo com o Baggio, a hipótese de ritual satânico não foi totalmente descartada, mas, por enquanto, sem nenhum embasamento. "O que tínhamos é mentira, uma farsa", afirmou ele.
Entenda o caso
Tudo começou quando foram encontrados membros de duas crianças, em agosto de 2017, espalhados pela cidade de Novo Hamburgo. Exames mostraram se tratar de um menino, com idade de 8 a 10 anos, e uma menina, que teria de 10 a 12 anos, ainda de acordo com o Zero Hora.
Surgiu, então, a hipótese de que as crianças seriam argentinas, porque suas digitais e DNA não constavam na base de dados de pessoas desaparecidas no Brasil. Mas o principal indício para essa hipótese era de que um dos suspeitos foragidos era argentino.
A linha de investigação da história era a seguinte: dois empresários, Paulo Ademir Norbert da Silva e Jair da Silva, teriam encomendado um ritual satânico para trazer mais prosperidade aos seus negócios.
Eles teriam, então, sido apresentados ao bruxo Sílvio Fernandes Rodrigues, que teria cobrado 25 mil reais pelo ritual, e exigido duas crianças do mesmo sangue para sacrifício.
Além do argentino Jorge Adrian Alves, os empresários e seus familiares teriam participado do ritual, renegando a Deus e venerando o diabo, e teriam sacrificado as crianças.
Duas testemunhas que participaram do ritual teriam passado as informações para o delegado Fermino (ele se referia a essas pessoas como "profetas"). Esses depoimentos formaram a base da investigação, que levou a um templo satânico em Gravataí.
Foram encontrados, no templo, uma capa e uma máscara que teriam sido usados no ritual, segundo o depoimento das testemunhas.
No entanto, era tudo mentira. O delegado, Rogério Baggio, descobriu que uma pessoa tinha pagado os informantes para contar essa história, e prometido moradia, alimentação e o pagamento mensal do Protege, programa estadual que presta assistência a testemunhas.
Essa pessoa foi presa preventivamente, mas o delegado afirmou que não podia revelar sua identidade porque isso prejudicaria a investigação. Segundo ele, a pessoa confessou o crime após ser presa. As crianças mortas continuam sem identificação.
Em relação ao delegado Moacir Fermino, o que teve a "revelação divina" e conduziu as investigações que levaram ao templo satânico, a Polícia Civil informou apenas que ele foi afastado do caso.
Na coletiva de ontem, o delegado Baggio afirmou que Fermino seria investigado, mas a Polícia Civil não confirma essa informação a EXAME.