Jair Bolsonaro: em entrevista, presidente eleito afirmou que veículos de imprensa que se comportarem de "maneira indigna" podem não receber recursos do governo federal (Ricardo Moraes-Pool/Getty Images)
AFP
Publicado em 31 de outubro de 2018 às 20h26.
Associações de jornalistas repudiaram o tom agressivo do presidente eleito, Jair Bolsonaro, contra meios de comunicação do país, assim como os violentos ataques físicos de simpatizantes dele a jornalistas.
A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, em espanhol) expressou nesta quarta-feira, 31, em um comunicado a sua "preocupação" com as declarações de Bolsonaro. "Nos preocupa que o presidente eleito não trace uma distinção entre governo e Estado, ao manifestar que usaria a administração pública para punir os veículos que o incomodarem", afirmou a presidente da entidade, María Elvira Domínguez.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) manifestou anteriormente a sua "apreensão" diante das ameaças de Bolsonaro de punir a imprensa "que se comportar dessa maneira indigna" com cortes de publicidade institucional, segundo afirmou na segunda-feira durante entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo.
Bolsonaro, que venceu as eleições derrotando Fernando Haddad, do PT, travou uma batalha direta com o jornal Folha de S.Paulo, que publicou recentemente uma reportagem sobre o uso ilícito do WhatsApp para disparar mensagens com propaganda eleitoral e "fake news". A briga com a Folha é antiga. No começo do ano, Bolsonaro questionou uma reportagem que denunciava desvios de dinheiro com a contratação de uma funcionária fantasma para a equipe do então deputado federal.
Já vitorioso, se disse a favor da liberdade de imprensa, mas reiterou as suas ameaças ao jornal. "Por si só, esse jornal se acabou (...) No que depender de mim, a imprensa que se comportar dessa maneira indigna não terá recursos do governo federal", advertiu o capitão do Exército na reserva.
"Eventuais inconformismos com noticiário de veículos de comunicação não podem ser confundidos com inaceitáveis retaliações a jornais por meio de uso de verbas publicitárias oficiais", assinalou na terça-feira o presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Marcelo Rech, em comunicado.
"Acostume-se", respondeu, nesta quarta-feira, 31, a Folha de S.Paulo a Bolsonaro em seu editorial. "Este jornal vigiará os próximos lances em situação confortável, pois não depende de propaganda federal", acrescentou. O editorial da Folha também adverte que os veículos "não deixarão de escrutinar o exercício do poder porque seus detentores de turno resolveram adotar a tática da intimidação".
No Twitter, surgiu uma onda de apoio ao jornal e a vários de seus repórteres atacados por partidários de Bolsonaro nas redes sociais. O movimento virtual foi seguido de anúncios espontâneos de assinatura ao meio de comunicação, em uma ação similar à registrada nos Estados Unidos após a eleição de Donald Trump como presidente.
Seguidores de Bolsonaro despejaram seu ódio nas redes sociais contra jornalistas que expressaram ou publicaram informações contrárias ao presidente de extrema direita.
ONGs como a Human Rights Watch e a Repórteres Sem Fronteiras alertaram na semana passada sobre o aumento de ataques físicos e ameaças. A Abraji já coletou 141 casos de ameaças e violência contra jornalistas durante a campanha eleitora, que serão comunicados à Organização dos Estados Americanos e à ONU.
A Associação de Correspondentes Estrangeiros de São Paulo denunciou "inúmeros relatos de colegas que têm sido assediados física e moralmente nas ruas das principais cidades brasileiras, no momento em que exerciam suas coberturas". O comunicado pede a Bolsonaro que respeite o compromisso constitucional com a liberdade de imprensa e exija o mesmo de seus partidários e eleitores.