Michel Temer (PMDB) (Lailson Santos)
Raphael Martins
Publicado em 12 de maio de 2016 às 06h42.
Última atualização em 1 de agosto de 2017 às 14h32.
São Paulo — Michel Temer (PMDB) assume interinamente nesta quinta-feira (12) a presidência da República no lugar de Dilma Rousseff (PT).
A troca de cargo é resultado da votação no Senado Federal que admitiu hoje o pedido de impeachment da presidente, por 55 votos a favor e 22 contra. Para dar prosseguimento ao processo eram necessários ao menos 40 parlamentares favoráveis ao impedimento.
Dessa forma, a chefe de Estado está oficialmente afastada do cargo enquanto aguarda julgamento por um período máximo de 180 dias.
Confira abaixo um perfil do presidente interino do Brasil e como ele chegou ao cargo.
Michel Miguel Elias Temer Tulia, 75 anos, nasceu na cidade de Tietê, interior de São Paulo.
Caçula de oito irmãos, é filho de Miguel Elias Temer Lulia e March Barbar Lulia, dois libaneses que deixaram o país natal para viver no Brasil. No vilarejo de Btaaboura, no Líbano, a rua principal se chama “Michel Tamer”.
Quando criança, Temer sonhava em ser pianista. Como não havia professores na cidade, o jeito foi se contentar com a datilografia. O curso lhe rendeu o primeiro diploma.
“Eu dedilhava as teclas da máquina de escrever como se fossem de piano. Com isso, aprendi a datilografar usando os dez dedos.”, disse Temer em um perfil publicado na revista Piauí em 2010. Nessa época, começou a pensar na carreira de escritor.
Na adolescência, Temer se mudou para a capital paulista para concluir o, então, colegial. Ao final, ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no Largo São Francisco, repetindo o feito de seus quatro irmãos mais velhos.
O primeiro contato de Temer com a política foi na universidade. No primeiro ano do curso, se tornou segundo-tesoureiro do Centro Acadêmico. Em 1962, se candidatou a presidente da entidade, mas perdeu a eleição. Afastou-se do movimento estudantil com o início da ditadura militar.
Durante todo o período da ditadura militar, o novo presidente dedicou-se à carreira de professor universitário e advogado, sem exercer cargos públicos. A filiação de Temer ao PMDB veio apenas em 1981, aos 41 anos.
Tornou-se servidor público dois anos depois, quando foi indicado ao cargo de procurador-geral do Estado de São Paulo pelo então governador André Franco Montoro.
Logo foi alçado a secretário de Segurança Pública em 1984, onde substituiu o jurista Miguel Reale Jr., que hoje assina o pedido de impeachment que o conduz à chefia do Executivo Federal. Ficou conhecido por instaurar os Consegs (Conselhos Comunitários de Segurança) e primeira Delegacia da Mulher do país.
Por outro lado, defendia pautas conservadoras como a redução da maioridade penal, criticava manifestações de trabalhadores rurais e pregava a ampliação da atuação da Rota no Estado. Sua gestão ficou marcada por elevados índices de violência.
Em 1986, licenciou-se da pasta por uma vaga de deputado federal, em mandato que marcou presença na Assembleia Nacional Constituinte.
Eleito como suplente, Temer autoproclamou sua contribuição como “de posição moderada, sóbria e pelo grande conhecimento de direito constitucional”, segundo sua biografia.
No início dos anos 1990, o peemedebista volta à cadeira da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo com mais destaque. Além de derrubar índices de violência, Temer foi responsável por apaziguar a crise desencadeada na corporação depois do massacre do Carandiru, durante a gestão do governador Luiz Antônio Fleury Filho.
De 1993 em diante, foi eleito para nada menos que seis mandatos como deputado federal pelo PMDB de São Paulo. Sua melhor marca nas urnas foi de mais de 252 mil votos, nas eleições de 2002.
Com a fama de conciliador que adquiriu na SSP e talento para o bastidor da política, em três oportunidades foi escolhido presidente da Câmara dos Deputados.
O cargo é o terceiro na linha de sucessão da presidência, que hoje ocupa no lugar de Dilma Rousseff. Enquanto deputado, assumiu o cargo interinamente por duas vezes: de 27 a 31 de janeiro de 1998 e em 15 de junho de 1999.
Dentro do partido, Temer foi indicado à presidência da sigla em 2001 e dali nunca saiu até este ano, quando se licenciou da posição logo após o partido anunciar o desembarque do governo Dilma, uma estratégia para que não fosse obrigado a renunciar à vice-presidência da República.
O cargo de vice-presidente, inclusive, foi resultado de negociações entre ele e Lula para montar a chapa que elegeria Dilma Rousseff como presidente pela primeira vez, em 2010.
Na época, Temer declarou que trabalharia “nos limites da Constituição”. “Quando ocupo um cargo, cumpro a tarefa Constitucional. Serei extremamente discreto, como convém a um vice”, disse.
A chapa se manteve unida até recentemente, quando uma carta escancarou ao público o racha entre os partidos.
Em dezembro de 2015, quase uma semana após Eduardo Cunha aceitar o pedido de impeachment de Dilma Rousseff, Michel Temer enviou à presidente uma carta-desabafo em que diz se sentir um “vice decorativo”.
Em 17 parágrafos, ele expõe suas mágoas, repassa situações vividas pelos dois e diz que Dilma não confia em sua figura. “É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo”, escreve logo no início.
“Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas”, diz em outro trecho.
No final da carta, uma frase dá o tom do que viria daí para a frente: “Sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção”.
O documento foi um dos sinais mais contudentes de que o casamento entre PT e PMDB chegaria ao fim. Em março deste ano, o partido de Temer desembarcou oficialmente do governo Dilma Rousseff.
Em 2012, Temer resolveu se aventurar no universo literário com a publicação do livro de poemas “Anônima Identidade” (Topbooks). A obra, segundo o próprio Temer, foi toda escrita em guardanapos de papel durante as idas e vindas de avião entre São Paulo (SP), seu reduto eleitoral, e Brasília (DF), na época em que cumpria expediente na Câmara dos Deputados.
Os versos falam sobre amor e lembranças da juventude, mas em alguns momentos lembram seus conflitos políticos e o fim da relação com Dilma Rousseff.
“Embarque” é um dos exemplos: “Embarquei na tua nau/ Sem rumo. Eu e tu./ Tu, porque não sabias/ Para onde querias ir./ Eu, porque já tomei muitos rumos/ Sem chegar a lugar nenhum".
No Direito, é autor de "Elementos de Direito Constitucional" (Malheiros Editores), que está na 24ª edição.
Desde o rompimento, Temer passou a usar sua habilidade de articulador para angariar votos pró-impeachment. Fez-se um cabo de guerra entre ele e Lula para trazer para si seguidores.
Com a votação do processo de impeachment na Câmara dos Deputados e devida vitória de Temer, analistas políticos já consideravam o governo Dilma como derrotado e a ascensão do vice, iminente.
Dali em diante, o próprio vice passou a desenhar seu governo e especular prováveis reformas e nomes para ocupar ministérios. No banco de apostas, alguns nomes vem, outros vão, mas estão certos Henrique Meirelles para a Fazenda, Eliseu Padilha para Casa Civil e Romero Jucá (com suas acusações no âmbito da Operação Lava Jato) para o Planejamento.
O instituto Datafolha apontou em abril que a rejeição ao então vice-presidente unia tanto movimentos favoráveis como contrários ao impeachment.
A pesquisa foi tomada em manifestações das duas correntes de pensamento e refletiram que 68% dos pró-impedimento acreditavam em um governo Temer ruim ou péssimo. Entre os contrários à deposição de Dilma, 88% pensam da mesma maneira.
Trabalham contra ele as citações por dois delatores (Delcídio do Amaral e Júlio Camargo) do esquema de corrupção na Petrobras, que indicam recebimento de propinas pelo então vice-presidente por ser “padrinho” de diretores que operavam os delitos.
Segundo a Folha de S. Paulo, os procuradores do Paraná também encontraram uma mensagem no celular de Léo Pinheiro, da OAS, que cita pagamento de R$ 5 milhões a Temer, em denúncia apresentada pela Procuradoria Geral da República contra Eduardo Cunha. Temer nega todas as acusações.
Por fim, o presidente interino enfrentou condenação recente pelo Tribunal Regional Eleitoral, além de pagamento de multa de R$ 80 mil por doações acima do limite legal. Ele figura agora no hall dos “ficha suja”.
A sanção, porém, não o impede de assumir o cargo de presidente. Significa, apenas, que só poderá concorrer em novas eleições se o TSE revogar a decisão ou se passarem oito anos estabelecidos de inelegibilidade.
A condição, certa forma, acaba favorecendo o presidente para costurar seu novo governo, já que aliados exigem que ele não concorra a reeleição em 2018.