Instagram: as pessoas passam muito tempo, o que o torna propício para o ativismo (AFP/AFP)
Karla Mamona
Publicado em 3 de outubro de 2020 às 20h03.
Última atualização em 3 de outubro de 2020 às 21h19.
Fotos artísticas do pôr do sol e sorvetes estão perdendo espaço para conteúdos mais engajados no Instagram nos dez anos de lançamento do aplicativo, que coincide com tempos de protestos por justiça social, crise climática e pandemia.
Fundado em 2010 por Kevin Systrom e Mike Krieger, em dois anos o aplicativo foi vendido para o Facebook por 1 bilhão de dólares, desde então cresceu rapidamente, após inicialmente atrair a atenção do público com seus filtros de imagem e ferramentas fáceis de edição e compartilhamento de fotos.
Porém, fotos lúdicas, que já foram uma marca registrada do Instagram, são cada vez mais vistas como fora do tom em um momento em que pessoas estão "perdendo empregos, ficando doentes, isoladas e deprimidas, e ainda por cima há os protestos do BLM (Black Lives Matter) e tudo que está acontecendo com as eleições nos EUA", argumentou Rebecca Davis.
Em 2016, ela criou o perfil "Rallyandrise", dedicado a ajudar as pessoas a se engajarem politicamente. "Não que não haja tempo e lugar para fotos bonitas, mas talvez as pessoas estejam tentando encontrar um equilíbrio", disse ela. O número de seguidores da moradora de Nova York mais do que dobrou nos últimos meses, chegando a 24 mil.
Em maio, manifestações eclodiram em todos os EUA depois do compartilhamento nas redes sociais de um vídeo em que um homem negro algemado, George Floyd, agoniza enquanto um policial se ajoelha em seu pescoço por mais de cinco minutos, em Minneapolis.
Simultaneamente, a pandemia fez com que as pessoas se isolassem em casa e passassem mais tempo do que nunca on-line. Ofuscando tudo isso, há ainda a controversa eleição presidencial de novembro.
"As pessoas estavam desesperadas por conselhos e orientação para fazer algo", disse Davis. Petições online, arrecadação de fundos e mobilização tornaram-se a norma e o Instagram foi o terreno principal para essa tendência.
A ex-candidata à Presidência dos EUA Hillary Clinton e a celebridade Kourtney Kardashian estão entre as várias figuras públicas que usaram o Instagram para colocar em foco questões raciais, emprestando suas contas a afro-americanos notáveis por 24 horas.
"O Instagram é a nossa maior e mais eficaz plataforma quando se trata de fazer com que os usuários levem a cabo os links de ação", explicou Emily Patterson, gerente de mídias sociais da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU), referindo-se a fazer as pessoas clicarem para assinar petições, organizar protestos ou entrar em contato com membros do Congresso. "Ele tem o público que estamos tentando alcançar."
O recurso Stories do Instagram permite que os usuários mostrem uma sequência de imagens, como por exemplo um dia inteiro protestando. E o aplicativo também aumentou sua gama de ferramentas de compartilhamento.
Para movimentos políticos, o Instagram tem um público cobiçado de jovens adultos, desde adolescentes até pessoas na casa dos 30 anos, se conectando com seus amigos e pares.
"No Facebook, não são só amigos e comunidades escolhidas, mas também seus pais, colegas de quarto, ex-parceiros - uma ampla coleção de todo mundo que alguém já conheceu", disse Patterson. "Então as pessoas não entram em alguns assuntos profundamente importantes para elas nessa plataforma".
Além disso, o Instagram é onde as pessoas passam muito tempo, o que o torna propício para o ativismo. Os resultados são comprovados, de acordo com Patterson.
A ACLU recebeu reclamações de advogados norte-americanos sobre "o quanto eles odiavam as pessoas os confrontando a partir das redes sociais" sobre a separação de crianças imigrantes de seus pais na fronteira com o México, e a maioria dos casos acontecia no Instagram, afirmou Patterson.
A adolescente sueca Greta Thunberg, ativista da crise climática, reuniu jovens de todo o mundo usando o Instagram. O aplicativo focado em imagens cai como uma luva para o ativismo ambiental, sensibilizando as pessoas a agir com imagens de partir o coração, como os coalas queimados nos incêndios australianos.
O imunologista Dr. Noc, 27, disse que poucas pessoas vão ao Instagram para se educarem, então é preciso surpreendê-las com conhecimento. "As pessoas preferem informações curtas com legendas, que sejam fáceis de digerir e também divertidas", disse Noc, que usa sua conta para explicar a covid-19 e a pandemia.
De olho no futuro, Noc acha, na verdade, que seu crescimento foi mais explosivo no TikTok, plataforma de compartilhamento de vídeos curtos. Ele suspeita que seu sucesso se deve ao fato de que não há tantas pessoas postando sobre imunologia por lá.
Ele passa horas fazendo vídeos para seus 200 mil seguidores do TikTok e os republica no Instagram, onde tem menos seguidores.
No dinâmico mundo da tecnologia, o Instagram celebra seu 10º aniversário com sua vantagem política agora sob ameaça do novato em ascensão.