Marketing das competências e fluência em inglês favorecem concorrentes do Brasil
Consultor que já mediou mais de US$ 360 bilhões em contratos de offshoring diz que clientes não pensam no Brasil na hora de terceirizar seus serviços de tecnologia
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h38.
O consultor americano Greg Blount é um dos maiores especialistas mundiais em transferência de projetos de tecnologia para outros países, o chamado offshoring. Sócio da TPI, consultoria que já mediou mais de 360 bilhões de dólares em contratos de offshoring, Blount diz que o Brasil ainda precisa investir em marketing e que há um longo caminho a percorrer. Ele concedeu a seguinte entrevista por e-mail a EXAME.
EXAME - Há um mantra muito repetido pelos empresários de tecnologia brasileiros de que o país tem o que há de melhor em algumas tecnologias corporativas, especialmente em finanças. Apesar disso, as empresas brasileiras não conseguiram fazer o marketing dessa experiência para as grandes corporações dos países ricos. Existe a percepção de que o Brasil é uma boa alternativa para projetos de offshoring? Qual seria a abordagem mais sensata para "vender" as empresas do país?
Greg Blount - O Brasil, hoje, não está no mapa da terceirização quando se pensa em contratar uma empresa global. Talvez haja um ou outro artigo na imprensa sugerindo o país como destino, mas, na realidade, quando os clientes consideram terceirizar seus serviços de tecnologia, não pensam no Brasil. Outros países fizeram seu marketing muito melhor.
EXAME - A maior parte das exportações indianas vêm de "fábricas de software". Aqui se acredita que não valha a pena competir com a Índia nesse jogo, pois eles têm custos mais baixos e podem trabalhar com projetos muito maiores. A estratégia ideal seria buscar o próximo nível na escala de valor, vendendo o desenho e o conhecimento de negócios embutidos nos projetos. O senhor concorda? Os indianos não estão mais bem posicionados para tentar o mesmo, uma vez que já têm relacionamento com os clientes?
Blount - A Índia já subiu na cadeia de valor... Eles fazem serviços de alto nível de terceirização de processos de negócios, arquitetura de sistemas, gerenciamento de infra-estrutura e diversos outros. Se o Brasil tentar fugir das áreas em que a Índia tem força, vai ficar muito para trás e não vai conquistar mercado. Considere que só este ano a Índia vai aumentar em 5 bilhões de dólares suas receitas de exportação. O Brasil precisa atacar os pontos centrais de sucesso dos indianos, valorizando as suas vantagens, como um mercado interno maior, melhores competências (embora não esteja tão certo disso), mesmo fuso horário, um ambiente econômico muito melhor etc.
EXAME - Além da Índia, que outros países competem com o Brasil, e por quê?
Blount - Os do Leste Europeu, Rússia, Malásia, Filipinas, México, Canadá, Irlanda, Espanha... e muitos outros. Mas estes são os principais. Fizeram um marketing melhor de suas competências é simples assim. Têm um nível superior no domínio da língua inglesa, o que é obrigatório para fazer negócios de grande porte nos Estados Unidos e na Europa (80% do mercado global).
EXAME - Por favor, indique três pontos fortes e três pontos fracos da indústria brasileira de tecnologia da informação.
Blount - Pontos fortes: um bom mercado interno e, portanto, competência; mesmo fuso horário; ótimo ambiente de negócios.
Pontos fracos: questão tributária, barreira da língua e criminalidade (tanto a que é percebida quanto o problema real).
EXAME - Qual foi a importância da Nasscom, a organização que coordena os esforços de exportação indianos, na história de sucesso da Índia? Não existe uma estratégia semelhante no Brasil. Uma campanha unificada e concentrada é fundamental para o sucesso?
Blount - A Nasscom foi central e decisiva para o sucesso indiano, que não ocorreria sem a entidade e os incentivos fiscais oferecidos às companhias. Outro fator importante foi o timing: as empresas do país estavam no lugar certo, na hora certa e tinham as qualidades certas quando surgiu a oportunidade do bug do milênio.