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Cimed, a empresa do barulho: os planos da farmacêutica para chegar aos R$ 5 bilhões em receitas

Com marketing agressivo e parcerias inovadoras, a Cimed reinventou o mercado de genéricos e a relação com o ponto de venda. Até onde o jeitão onipresente da família consegue levar a farmacêutica?

Isabela Rovaroto
Isabela Rovaroto

Repórter de Negócios

Publicado em 23 de maio de 2024 às 06h00.

Última atualização em 23 de maio de 2024 às 10h44.

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Karla Marques Felmanas e João Adibe Marques, da Cimed: marketing pautado num dia a dia compartilhado nas redes sociais. (Leandro Fonseca /Exame)

A rotina de João Adibe Marques, o CEO e rosto mais público da farmacêutica Cimed, é acelerada como o dia a dia da companhia de 3 bilhões de reais em receitas. Adibe costuma ter um faro apurado sobre como dar sua contribuição aos temas que estão no noticiário. Em 4 de maio ele estava na festa exclusiva promovida pela cantora Madonna após o show para 1,6 milhão de fãs na praia de Copacabana. O evento, inclusive, teve o lançamento de um hidratante labial da marca Carmed, um sucesso de vendas da Cimed, estilizado com o logotipo da turnê da cantora pop.

Dois dias depois, num país chocado com a enchente de grandes proporções no Rio Grande do Sul, Adibe anunciou a doação de 1 milhão de reais em medicamentos ao estado, entre outras ações. Em pouco menos de 24 horas, outro grande anúncio: ele foi escolhido pela Confederação Brasileira de Futebol para ser o chefe da delegação brasileira nos próximos jogos da seleção, um feito raro para alguém fora do métier da cartolagem.

Tudo isso pôde ser acompanhado quase em tempo real pelo Instagram, onde ele tem mais de 3,5 milhões de seguidores. Ali, o lado pessoal e o profissional de Adibe viram uma coisa só. A programação começa às 5 da manhã, com a publicação da sua agenda para o dia, seguida por dezenas de stories ou registros no feed sem um filtro específico.

Cabem no espaço desde comentários sobre as campanhas de vendas da Cimed até cenas dos exercícios físicos ou retratos de viagens a destinos paradisíacos com a mulher, Cinthya Marques. “O brasileiro gosta de quem mostra a cara para vender produtos, de quem conta uma história”, diz Adibe sobre a exposição da própria imagem. “Estou aqui para contar boas histórias.”

Evento da Cimed para 7.000 pessoas em São Paulo: farmacêutica está acostumada aos grandes números (CIMED/Divulgação)

O alvoroço gerado por Adibe nas redes sociais faz parte de uma estratégia responsável por uma fase de ouro da Cimed. De 2017 para cá, o faturamento da companhia sediada em São Paulo triplicou. Neste ano, deve crescer mais de um terço, para 4 bilhões de reais. Tudo isso fez a empresa saltar do 36o lugar para o segundo em volume de vendas de produtos genéricos no Brasil, só atrás da goiana Neo Química.

Em boa medida a guinada foi puxada pelo sucesso do Carmed. Lançado de maneira despretensiosa há nove anos, quase como uma cópia do americano Carmex, o hidratante labial ganhou uma repaginada no ano passado depois de uma parceria com a indústria de guloseimas Fini dar ao hidratante um sabor típico de chiclete. Seguidos por parcerias com influencers adolescentes, como as atrizes Larissa Manoela e Maisa, o produto virou um hit na rede social TikTok, a preferida dessa geração. Em 12 meses, a venda do produto cresceu dez vezes, para impressionantes 320 milhões de reais. No fim do ano passado, uma live de 20 minutos resultou em 40 milhões de reais em vendas do produto.

"Oi, tchurma"

O boom Carmed multiplicou por cinco o volume mensal de vendas de hidratantes labiais no Brasil, para uma média de 5 milhões de unidades, segundo a consultoria especializada IQVIA. “O Carmed conquistou uma verdadeira legião de fãs e virou um item colecionável”, diz Karla Marques Felmanas, irmã de Adibe e vice-presidente da Cimed. “Os clientes têm um Carmed na bolsa, no carro, em casa, da mesma maneira que carregam um chiclete para todo lugar.”

Nas redes sociais, Karla é o rosto do Carmed e, à sua maneira, segue os passos do irmão na hiperatividade online. Com 1,3 milhão de seguidores no Instagram, outros 832.000 no TikTok, a executiva de 46 anos virou uma referência para jovens da geração Z. Assim como Adibe, ela compartilha ali momentos de sua rotina, como treinos de pilates, visitas às fábricas da Cimed ou exibição de seus looks.

Entre uma coisa e outra, Karla conversa com os seguidores sobre maneiras de usar os produtos da Cimed, em especial as dezenas de Carmed com texturas e sabores diferentes lançados nos últimos meses. A maneira própria de ela iniciar os papos — “Oi, tchurma” — acabou virando um bordão e foi parar no título da autobiografia lançada em março. Hoje, os irmãos executivos chamam mais atenção nas redes sociais do que a própria Cimed. Pouco mais de 294.000 seguem a farmacêutica no Instagram.

A desinibição de Adibe e Karla ajudou e muito a forjar uma cultura corporativa forte na Cimed, um dos maiores desafios para qualquer empresa numa era de cacofonia generalizada por causa das redes sociais. Uma das fortalezas da farmacêutica são os mais de 1.200 vendedores dedicados a rodar o Brasil atrás de farmácias dispostas a revender Cimed. Poucas empresas do setor têm uma força de vendas própria — o comum é o vendedor ter amostras de várias farmacêuticas.

A estratégia vem do berço. João de Castro Marques, pai de Adibe e Karla, contou com vendedores dedicados à expansão da Hornoterápica, uma pequena farmacêutica do Cambuci, bairro da região central de São Paulo, comprada em 1977 com apenas seis produtos no portfólio. O afinco no contato com farmacêuticos abriu mercados para a companhia cujo nome mudou para Cimed na virada dos anos 2000.

Mais de um lançamento por semana

Atualmente, de uniforme amarelo, os vendedores da empresa fazem entre 7.000 e 10.000 visitas por dia, boa parte delas a farmácias de pequeno porte não raro fora do radar das concorrentes. Como fazer todo mundo falar a mesma língua? Toda semana, o próprio Adibe usa as suas redes sociais como palco para lives com os vendedores para dar as orientações sobre as campanhas. Ele mesmo dá o pitch a ser usado em campo. “Cabe a nós ensinarmos como o dono da farmácia pode trabalhar esses produtos no canal de venda”, diz Adibe. “Esse é o trabalho do vendedor do futuro.”

A atenção à narrativa foi parte fundamental para a empresa reduzir o risco de tirar uma ideia do papel. O portfólio da Cimed tem hoje mais de 600 produtos entre remédios, suplementos, cosméticos e até acessórios para o sexo. Só em 2023 foram 83 lançamentos, mais de um por semana. Alguns vieram da linha K-Med, de lubrificantes, vibradores, camisinhas e brinquedos eróticos. “Estamos num país conservador”, diz Adibe. “Pedi aos vendedores para pararem de gracinhas ao falar de sexo. Ou eles levam a sério a conscientização dos clientes sobre bem-estar sexual ou não vão vender nada.”

Nas contas dele, o primeiro carregamento de 10.000 acessórios da linha K-Med esgotou em 15 dias. “Os vendedores conseguiram apresentar os novos produtos para as farmácias, que até então não viam ali oportunidade de dinheiro novo”, diz Marcelo Grasso, presidente da Fecofar, federação de sete redes farmacêuticas de pequeno e médio porte. “É onde a Cimed faz a diferença.”

Somada à força de venda engajada, a diretoria da Cimed dedica boa parte do tempo a pensar maneiras de deixar a marca em evidência no ponto de venda. Trabalho nessa frente não falta: em dez anos, o Brasil ganhou 10.000 farmácias. Hoje, são 90.000 pontos de venda de medicamentos no país, segundo o Conselho Federal de Farmácias. Apenas 26% delas pertencem a alguma das dez maiores redes do país.

Sem intermediários para chegar ao varejo

Para chegar à imensidão de empreendedores donos de farmácias, desde os anos 1990 a Cimed investiu numa logística própria. Hoje, a empresa tem 24 centros de distribuição em todas as regiões, além de frota própria para reduzir o risco de faltar estoque na ponta. Dessa maneira, cobre 90% das farmácias do país. Adibe gosta de frisar em público que a Cimed é a única farmacêutica a levar produtos diretamente ao varejo sem intermediários, como distribuidores regionais.

Assim, o lançamento de um Carmed, por exemplo, chega às gôndolas do país inteiro em questão de dias, e não de semanas, como é o comum nesse mercado. Mais do que isso: dá à empresa um poder de barganha imenso num varejista pequeno, distante dos grandes centros, e quase sempre carente de novidades nas gôndolas. O layout de uma farmácia nesses locais costuma lembrar o de um postinho de saúde: as prateleiras só têm remédios. “A vocação da Cimed é dar acesso aos varejistas a produtos e marcas até então inacessíveis”, diz Adibe. “Ganhamos o jogo na farmácia com a nossa estrutura verticalizada.”

As atrizes Larissa Manoela e Maisa: live das duas sobre o Carmed vendeu 40 milhões de reais em 20 minutos (CIMED/Divulgação)

Nos próximos meses, a atenção ao ponto de venda deve ser elevada a outro patamar. Adibe quer ampliar o financiamento de pequenos varejistas. Pelo projeto, a farmácia só paga à Cimed após a venda do produto, sem comprometer o próprio capital de giro enquanto o item está na gôndola.

Em paralelo, Adibe planeja aproveitar o espaço das farmácias como pequenos centros de distribuição para facilitar a entrega das vendas da loja virtual da Cimed. A prática deve começar com itens de maquiagem e cosméticos que estão na esteira de lançamentos para este ano. “O que encarece o modelo de venda direta ao consumidor final, hoje, é o custo logístico”, diz ele.

A máquina de vendas seria muito menos azeitada sem um investimento pesado em marketing. É mais uma peculiaridade da Cimed. Salvo exceções como Aspirina, Dipirona, Viagra ou, agora, Ozempic, normalmente poucos consumidores lembram de cabeça o nome comercial de remédios que não fazem parte do seu consumo habitual. Tendo isso em vista, as farmacêuticas apostam numa imagem corporativa forte.

Frescor na comunicação

A Cimed aposta nas marcas. Só em 2023, a companhia investiu 100 milhões de reais em marketing. (A conta exclui gastos com a gestão das redes sociais de Adibe e Karla.) Até 2017, o marketing da companhia focava eventos esportivos. Por mais de uma década a Cimed patrocinou um time de vôlei homônimo sediado em Florianópolis, além de ter uma presença forte na competição automobilística Stock Car, onde também estão concorrentes como Eurofarma e EMS.

Desde então, boa parte da verba publicitária tem sido usada para dar destaque ao portfólio. Além do Carmed e do K-Med, estão no rol de marcas da Cimed bem posicionadas no mercado o antigripal Cimegripe, o suplemento vitamínico Lavitan e os cremes Calamed, contra assaduras e lesões causadas pela longa exposição ao sol.

Em comum a elas está certo frescor na comunicação. O logotipo das marcas, por exemplo, abusa de cores fortes como rosa ou vermelho e fontes joviais pouco usadas em concorrentes. Para isso, os fundadores costumam interagir com designers para pegar referências. Um deles, o ítalo-brasileiro radicado em Nova York Giovanni Bianco, um dos responsáveis pelo visual das cantoras Anitta e Madonna, assinou a capa do livro lançado por Karla em março.

Ao mesmo tempo, a Cimed apostou na associação com produções da tevê e do streaming para falar diretamente ao consumidor final. As vitaminas Lavitan, por exemplo, patrocinam um quadro do programa Domingão com Huck, da TV Globo. A linha K-Med fechou uma parceria com a série Sex Education, da Netflix. “Produtos comuns se tornam marcas fortes com a Cimed, o que agrega valor ao produto e aquece a categoria”, diz João Branco, um dos maiores especialistas em marketing no país, com passagens pelo gigante Procter & Gamble e pela cadeia de fast food McDonald’s. Atualmente, ele faz parte do conselho da Cimed.

Adibe em programas da TV Globo: aporte de 100 milhões de reais em marketing em 2023 (CIMED/Divulgação)

Com o barulho causado por uma operação inteira voltada para vendas, a aposta de Adibe e Karla para o futuro da Cimed é entrar em novas categorias de produtos. Em maio, os dois comemoraram a captação de 600 milhões de reais numa emissão de debêntures voltadas, sobretudo, para a aquisição de empresas para expansão do portfólio da farmacêutica. No radar estão negócios em higiene e beleza e na categoria de produtos para bebês. Em dezembro de 2023, a Cimed comprou a catarinense R2M, líder na categoria de lenços umedecidos com vendas anuais de 7 milhões de unidades das marcas Bebê Limpinho e Snow Baby.

Ainda neste ano, a Cimed quer vender xampus e condicionadores infantis e, mais para a frente, ter capacidade para fabricar chupetas, mamadeiras e outros itens bem distantes do escopo de uma farmacêutica. “Com o aumento da participação no mercado de baby care vai ser possível explorar o canal alimentar”, diz ele, fazendo referência a supermercadistas e atacarejos. “Eles concentram 60% do mercado infantil, e ainda não atuamos com eles.”

A busca por rentabilidade

Para isso, o projeto de uma nova fábrica em Minas Gerais, focada em itens de higiene e beleza, está saindo do forno. Em outros canais, a ideia é repetir a estratégia de lançamentos relâmpago de produtos, em sintonia com o que o público busca. Trata-se de uma receita que agrada até mesmo a quem é grande no varejo. “Enquanto outras farmacêuticas levam até seis meses para fazer um lançamento, a Cimed mobiliza novas campanhas em semanas, às vezes em dias”, diz Renan Vieira Barbosa, diretor comercial de medicamentos da Pague Menos e Extrafarma, para quem a correria compensa. “Eles levam novos consumidores para as lojas.”

Por trás da estratégia da Cimed de crescer para além do DNA de farmacêutica está a busca por rentabilidade. Assim como as concorrentes, a Cimed é beneficiada pela expansão no consumo de medicamentos genéricos no Brasil, cuja alta de 13,5% no ano passado levou o setor a um faturamento recorde de 118 bilhões de reais. Mesmo assim, as margens enxutas têm forçado o setor a buscar alternativas. “As farmacêuticas nacionais estão optando por aumentar a força no ponto de venda em busca de mais rentabilidade com novos produtos, em especial nas categorias de higiene pessoal e de dermocosméticos”, diz Nelson Mussolini, presidente da Sindusfarma, a associação das fabricantes de medicamentos.

Enchentes no Rio Grande do Sul: farmacêutica doou 1 milhão de reais em remédios ao estado (Mateus Bonomi/Anadolu/Getty Images)

Em meio a tantas novidades, alardeadas com estridência nas redes sociais, muita gente na Faria Lima faz perguntas sobre o futuro da empresa. Ela abrirá o capital na bolsa? E quando? Como ficam temas como a sucessão e a governança numa empresa tão centrada nas figuras de Adibe e Karla?

Os dois costumam falar abertamente sobre os assuntos sem franzir a testa. O plano de um IPO está em gestação na companhia há pelo menos cinco anos, mas ainda continua no papel, nas palavras de Adibe, pela falta de “um propósito” maior — a aquisição de um negócio grande a ponto de demandar um caixa indisponível por outras fontes do mercado ou, então, a necessidade de ter mais gente envolvida no negócio.

Por ora, nada disso é relevante. “Estamos preparados para qualquer janela, temos governança para isso, mas não é a nossa prioridade no momento”, diz ele (veja entrevista abaixo). Como parte de uma guinada para ter mais vozes além de Adibe e Karla, ambos colocaram os filhos no dia a dia da operação. Adibe Marques, primogênito de Adibe, é diretor comercial. Juliana Marques Felmanas, de Karla, é diretora de novos negócios da companhia.

"Missão 3 bi"

Além disso, a companhia trouxe gente graúda do mercado financeiro. Presidido há dois anos pelo engenheiro mineiro Nicola Calicchio, executivo com passagens pelo banco Morgan Stanley, pelo plano de saúde Intermédica (atualmente Grupo Notredame Intermédica) e pela consultoria global McKinsey, onde foi CEO da operação brasileira, o conselho da Cimed passou por mudanças recentes e se tornou mais parrudo.

Em janeiro, José Roberto Lettiere, responsável por toda a reestruturação da companhia nos últimos anos, deixou o cargo de CFO para ocupar integralmente uma cadeira no conselho de administração e ser líder dos comitês de finanças, fusões e aquisições. No lugar dele ficou Fausto Neto, executivo com 20 anos de experiência em finanças e operações de fusões e aquisições em empresas como AB InBev, controladora da Ambev, e nos bancos Goldman Sachs e Merrill Lynch.

Mesmo fora da bolsa, há três anos a Cimed produz relatórios financeiros seguindo os moldes do mercado de capitais. Os balanços mostram uma empresa cujo lucro saltou 248% em 2023, chegando a 248 milhões de reais. Na conta para o resultado estão, entre outras coisas, o engajamento dos executivos e funcionários nas redes sociais no que eles chamaram de “missão 3 bi”, atingida em dezembro do ano passado. A meta agora é chegar aos 5 bilhões de reais de receitas em 2025. Adibe tem confiança de que também contará essa boa história. “Depois virão os 7 bi, os 9 bi, e assim por diante”, diz ele. Quem o acompanha nas redes sociais que aguarde. 


Uma história de 47 anos

Como a Cimed deixou o passado de uma farmacêutica convencional para virar um negócio de 3 bilhões de reais com remédios, vitaminas e produtos de beleza

1. João Adibe Marques na sede da empresa no bairro do Cambuci, em São Paulo. | 2. Time de vôlei da Cimed: marketing esportivo deu lugar a investimentos nas próprias marcas. | 3. Laboratório Hornoterápica, no Cambuci, região central de São Paulo: embrião de um negócio bilionário. | 4. Stock Car: competição automobilística foi uma das apostas esportivas da Cimed. | 5. Fábrica da Cimed em Pouso Alegre (MG): investimento de 450 milhões de reais para dar conta da demanda. (Arquivo CIMED/Divulgação)

1977 - João de Castro Marques, pai de João Adibe e Karla, compra a Hornoterápica S.A., um laboratório modesto na capital paulista que começou com apenas seis produtos no portfólio

1991 -  Abertura de um centro de distribuição em Goiânia, o primeiro fora de São Paulo, e início da presença nacional da companhia

2004 - Entrada no mercado de medicamentos genéricos, hoje responsáveis por 47% das vendas

2005 - Começa a estratégia de marketing associada ao esporte com o patrocínio do time de vôlei Super Imperatriz, de Florianópolis. Dez anos mais tarde, investe na seleção brasileira de futebol

2015 - Numa guinada para além dos genéricos, lança a linha de hidratantes labiais Carmed

2017Chega a 1 bilhão de reais em faturamento puxado por investimentos em vitamínicos e produtos de beleza

2018 - Primeira geração sai do negócio. Os irmãos João Adibe e Karla assumem os postos de CEO e vice-presidente, respectivamente

2021 - Atinge os 2 bilhões de reais de faturamento,  vira uma S.A. e passa a divulgar os resultados da empresa tendo em vista um possível IPO

2023 - Investe 450 milhões de reais em sua segunda fábrica de Pouso Alegre (MG) e vê um “boom” nas vendas do Carmed após parcerias com a Fini, de guloseimas, e influenciadores

2024 - Depois de conquistar jovens com a linha Carmed, aposta na linha Milimetric Pro, de produtos para procedimentos estéticos


600 milhões de reais para crescer

A visão de João Adibe para a Cimed pular da terceira para a primeira posição entre as maiores farmacêuticas do país | Isabela Rovaroto

João Adibe Marques: “Somos uma farmacêutica com foco na rentabilidade do varejista e acessibilidade do povo” (Leandro Fonseca/Exame)

João Adibe Marques, CEO da Cimed, fala rápido sobre os planos para o futuro. Ele tem pressa. Ainda em 2024, a empresa que ele comanda quer ampliar a presença no mercado infantil, explorar mais o canal de vendas diretas — o antigo porta a porta. Com 600 milhões de reais em caixa após uma emissão de debêntures divulgada no início de maio, ele vê espaço para comprar mais empresas nos próximos meses. Diretamente de Nova York, onde participou de uma batelada de reuniões com investidores, Adibe Marques conversou com a EXAME sobre a rota traçada por ele para tornar a Cimed a maior indústria farmacêutica do Brasil.

Com um portfólio de mais de 600 produtos, quais são as próximas apostas da Cimed?

Vamos aumentar a nossa participação no mercado de baby care. A Cimed já é líder na categoria de pomada de assadura e, com a aquisição da maior fabricante brasileira de lencinhos umedecidos, nós definitivamente colocamos o pé nesse mercado. Em 2024 vamos começar a fabricação de xampu e condicionador infantil, além de acessórios, como chupeta e mamadeira. Entramos apostando forte também na parte de estética. Nos próximos dois anos queremos alavancar o portfólio de produtos da linha Milimetric Pro, principalmente desenvolvendo novos fornecedores e novos princípios ativos, o que não é tão simples e depende da aprovação da Anvisa.

Tudo isso ficará para 2024?

Sim. Para o último trimestre do ano, o plano é acelerar a marca de produtos infantis João e Maria, que vai contar com xampu, condicionador, sabonete líquido e lavanda. Com a transferência de linhas e criação de uma fábrica só para essa categoria, nossa expectativa é produzir 2,5 milhões de frascos por mês. O mercado de baby care no Brasil é de 36 bilhões de reais, e queremos nos tornar a marca número 1, o que não depende só das vendas, e sim de investimento fabril.

As novidades vão demandar expansão das fábricas da Cimed?

Praticamente tudo que produzimos é vendido. Temos duas fábricas que não conseguem atender todo o varejo independente. Planejamos abrir uma nova fábrica em Minas Gerais, para aumentar a capacidade de produção de itens de higiene e beleza, entre eles os lencinhos. Outra aposta para o último trimestre é a venda porta a porta de perfumes e maquiagem, categorias que eu não tenho ainda.

Há um plano para ir além das farmácias e explorar novos canais?

Cerca de 60% dos produtos de baby care no Brasil são vendidos no canal alimentar de que eu não participo. Vamos entrar com a linha João e Maria e levar produtos do portfólio da Cimed, como repelente e sabonete íntimo, para esse novo mercado. Vamos entrar em grandes varejistas neste ano e, por meio do nosso canal de distribuição, vamos atender pequenas perfumarias e supermercados. A Cimed tem 1.200 vendedores que podem ser multiplicadores. Hoje eles vendem os produtos para farmácias. A ideia é usar esses pontos de venda como pequenos centros de distribuição para venda direta ao consumidor final.

Um dos diferenciais da Cimed é a presença em pequenas farmácias, muitas delas independentes. Dá para aumentar a relevância desses pontos de venda?

A Cimed atende 90% dos 90.000 pontos de venda espalhados pelo Brasil. Apenas 26.000 são de grandes e médias redes. Estamos escalando um projeto chamado Foguete Amarelo. A plataforma tem uma prateleira infinita criada para atender as farmácias que estão fora do radar, aquelas que faturam menos de 50.000 reais por mês. A maior dor desse empreendedor é a falta de capital de giro para poder avançar. Nosso objetivo é que o varejista independente só pague pelo produto quando conseguir vendê-lo. Assim, ele passa a ser um vendedor da minha mercadoria, e não só um comprador, e a Cimed consegue ampliar o mix de produtos no ponto de venda. O projeto já foi testado em dez farmácias independentes, e queremos chegar a 1.000 até o final do ano. O potencial é de 10.000 lojas.

Um dos produtos que mais se destacaram no último ano foi a linha de hidratante labial Carmed. Como será o futuro da marca?

O Carmed se tornou uma experiência. Depois do Carmed Madonna, que foi distribuído gratuitamente no dia do show, vamos lançar três sabores doces: chocolate, brigadeiro e leite condensado. Trabalhamos com lançamentos para estimular o consumo desse produto, que se tornou colecionável e líder de categoria. Era um mercado de 1 milhão de unidades, agora é um mercado de 5 milhões. Nosso desafio é educar os consumidores sobre a importância do protetor labial e sempre trazer novidades para essa linha.

A Cimed captou 600 milhões de reais em debêntures neste ano. Há uma nova aquisição no radar?

Não posso dar detalhes, mas já estamos com o dinheiro no caixa. Captamos com a menor taxa do setor de saúde. Melhoramos nosso rating, diminuímos nossa taxa de captação e endividamento. Brasileiro tem de comprar de brasileiro.

Podemos esperar um IPO da Cimed na próxima janela do mercado?

Ainda não. Estamos preparados para qualquer janela, temos governança para isso, mas não é a nossa prioridade no momento. Tenho mostrado aos investidores nos últimos anos os diferenciais da Cimed. Somos uma farmacêutica  com DNA de consumo com foco na rentabilidade do varejista e na acessibilidade do povo. Apostamos em fusões e aquisições para nos tornarmos a maior indústria farmacêutica do Brasil.


Richard Branson, a inspiração

A Cimed tem como referência a Virgin, do bilionário que construiu um império do zero e que aposta na inovação para crescer | Isabela Rovaroto

O bilionário Richard Branson, fundador da Virgin: rosto visível das empresas que fundou e referência para Adibe (Todd Owyoung/NBC/Getty Images)

A grande inspiração de João Adibe para se tornar um CEO que personifica a Cimed nos mais diversos canais é o bilionário Richard Branson, do Grupo Virgin. Com postura de rockstar, Branson construiu um império global do zero, com mais de 40 empresas em 35 países. De gravadora de música a companhia aérea, passando por turismo espacial e banco digital. Aos 73 anos, sua fortuna é avaliada em 2,6 bilhões de dólares.

O britânico começou a empreender nos anos 1970, quando criou uma varejista de discos por correspondência e, na sequência, entrou oficialmente para o mundo da música. Dos Sex Pistols aos Rolling Stones passaram pela Virgin Records. De lá para cá, o empresário diversificou seu portfólio e criou dezenas de empresas com o nome “Virgin”, todas conhecidas por adotarem uma postura mais pop e inovadora.

Com forte presença no setor de turismo e lazer, o Grupo Virgin sentiu os efeitos da pandemia de covid-19. A companhia aérea Virgin Atlantic entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos para proteger seus ativos de credores. E a empresa de foguetes Virgin Orbit, que abriu o capital em 2021 avaliada em 4 bilhões de dólares, faliu em 2023 e vendeu seus ativos.

O sucesso da companhia deve muito à imagem pública do próprio Branson, que aposta em ações de marketing ousadas e tem como hobby uma obsessão por quebrar recordes mundiais, incluindo a travessia mais rápida do Atlântico e uma série de viagens oceânicas de balão e kitesurf. O bilionário tem mais de 40 milhões de seguidores nas redes sociais, nas quais compartilha questões que vão desde empreendedorismo até meio ambiente, aventura e propósito.

Branson e futuramente João Adibe têm um desafio comum: a sucessão. “Se a marca foi construída toda na imagem do CEO, qual é a capacidade do próximo em fazer parte dessa história?”, questiona Erica Bamberg, professora de marketing da Fundação Dom Cabral. “Quem vai suceder a atual liderança deve ser incluído na comunicação com o público.”

No Grupo Virgin e na Cimed, a próxima geração já está dentro da operação. Dois dos três filhos de Branson trabalham na companhia. No caso da Cimed, os filhos de João Adibe e Karla atuam em diversos setores da companhia. Adibe Marques é diretor comercial e Juliana Felmanas é diretora de inovação e novos negócios. Repetir o sucesso dos pais em negócios cada vez mais diversos será um desafio e tanto.


A fórmula da Cimed

A estratégia da farmacêutica  para triplicar o faturamento em cinco anos

Show da Madonna no Rio de Janeiro: palco para o lançamento de mais uma versão de Carmed (Kevin Mazur/WireImage for Live Nation/Getty Images)

1. Lançamentos em série

O desafio: a empresa precisava ampliar o portfólio para reduzir a dependência dos genéricos, um mercado estagnado no Brasil, e ampliar a recorrência de vendas às pequenas farmácias

O que fez: criou rotinas para integrar os times internos com donos de farmácias para entender oportunidades de novos produtos

O resultado: em 2023, a farmacêutica lançou 83 produtos — praticamente um por semana. Hoje são mais de 600 produtos


2. Marketing pesado

O desafio: encontrar um diferencial entre concorrentes globais com produtos inovadores e com tíquete médio elevado

O que fez: apostou numa comunicação maciça, com participação na tevê aberta, a exemplo de novelas, além de redes sociais e em collabs com outras marcas e influenciadores

O resultado: só no ano passado, a empresa investiu 100 milhões de reais em marketing. Em dez anos, passou do 36o para o segundo lugar entre as maiores farmacêuticas do Brasil


3. Marcas fortes

O desafio: garantir boas vendas, e ter lucro, mesmo atuando com produtos genéricos e de margens reduzidas

O que fez: investiu em destaque para marcas como o vitamínico Lavitan e o hidratante labial Carmed tanto na publicidade quanto no ponto de venda

O resultado: faturamento recorde e lucro de 248 milhões de reais, alta de 248% em um ano


4. Rotina para vendedores

O desafio: aumentar a presença em farmácias de pequeno porte e em regiões distantes dos grandes centros, onde a concorrência é menor

O que fez: criou um time de 1.200 vendedores focados em pequenas redes de farmácia. Desde 2017, o próprio João Adibe faz lives semanais para engajamento em campanhas comerciais — e eventuais ajustes de rota

O resultado: com produção e distribuição dos remédios feitas por time próprio, a empresa conseguiu chegar a 90% das 90.000 farmácias do país


5. Esportes e novos públicos

O desafio: tornar marcas de remédios populares com alta regulamentação do mercado farmacêutico

O que fez: patrocinou clubes de diversos esportes, como o time de vôlei Super Imperatriz, de Florianópolis, e os times de futebol Palmeiras e Cruzeiro, além de ser patrocinador da seleção brasileira de futebol desde 2015

O resultado: a Cimed se torna mais popular e alcança um público ligado a esportes. O CEO João Adibe Marques, por exemplo, vai ser o chefe da delegação nos próximos dois amistosos da seleção brasileira

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