Revista Exame

Nova rival de uma das principais gestoras do país já é bilionária

Ex-executivos da ARX, uma das principais gestoras de fundos do Brasil, fundaram às pressas a Truxt e captaram R$ 1,8 bilhão em menos de um mês

Garcia (à esq.) 
e Tovar: 13 dos 18 funcionários da Truxt vieram da ARX (André Valentim/Exame)

Garcia (à esq.) e Tovar: 13 dos 18 funcionários da Truxt vieram da ARX (André Valentim/Exame)

GN

Giuliana Napolitano

Publicado em 30 de junho de 2017 às 05h59.

Última atualização em 30 de junho de 2017 às 14h27.

São Paulo — Comparar-se com os outros faz parte da natureza humana — e quem trabalha no mercado financeiro costuma levar essa característica ao limite. O Brasil tem uma enormidade de 16 000 fundos de investimento e quase 600 gestores estão na batalha diária para lucrar, mas apenas um punhado deles consegue entregar rendimentos consistentes e superar os juros de mercado ao longo dos anos. Entre os melhores, muitos estão fechados para novas aplicações, o que deixa os investidores com ainda menos opções. Quem não quer entregar suas poupanças a Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde, que rendeu 14 000% na última década? Mas querer não basta nesse caso, já que o fundo não aceita novos investidores há anos. Há, assim, um descompasso entre a quantidade de dinheiro disponível para investir (que só cresce) e o número de gestores tidos como capazes de dar altos retornos ao longo do tempo. De vez em quando, um desses sujeitos resolve mudar de gestora e coloca, em sua porta, aquela plaquinha que todos querem ver: aceita-se dinheiro novo. E o dinheiro começa a fluir.

É o que tem acontecido com a Truxt, gestora de recursos fundada por dois executivos que, até abril, comandavam a ARX, empresa de investimentos controlada pelo banco americano BNY Mellon. Os executivos José Alberto Tovar e Bruno Garcia saíram de lá no dia 2 de maio e um mês depois fundaram a Truxt. A abertura da gestora foi tão corrida que nem o escritório, que ficará no Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro, está pronto. Os 18 funcionários (13 deles vindos da ARX) estão ocupando um espaço provisório na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, e fazendo algumas reuniões no apartamento de Tovar, em Ipanema (onde foi feita a foto desta reportagem). Ainda assim, em quase um mês de operação, a Truxt captou 1,8 bilhão de reais. Apenas 24% de todas as gestoras do país (incluindo as que pertencem aos grandes bancos) têm mais que esse patrimônio, segundo um levantamento da empresa de análise financeira Morningstar. Um dos fundos multimercado está fechado para novos investimentos. A Truxt tem outros dois fundos multimercado e um de ações.

Antes de fundar a Truxt, Tovar e Garcia estavam negociando com o BNY Mellon a criação de uma gestora que teria o banco como sócio. Os fundos da ARX seriam transferidos para essa gestora, cujo comando ficaria com os dois executivos. Seria um movimento semelhante ao do próprio Stuhlberger, que negociou sua saída do banco Credit Suisse para criar, em 2015, a gestora Verde, que tem cerca de 30 bilhões de reais de patrimônio e o banco suíço como sócio. O plano era fundar a gestora em agosto e, por isso, Tovar e Garcia já estavam procurando um novo escritório. Segundo pessoas que acompanharam o processo, o BNY Mellon interrompeu as negociações de forma abrupta. No dia 2 de maio, Tovar e Garcia decidiram deixar o banco e foram quase enxotados, nesse mesmo dia, pelo Mellon. Mal tiveram tempo de se despedir da equipe (os executivos e o banco não comentam). Decidiram, então, acelerar o plano e montar a gestora no início de junho, do jeito que deu. “Corremos para ter uma alternativa para oferecer aos clientes que queriam continuar conosco“, diz Tovar.

O ponto forte de Tovar, Garcia e equipe são os fundos multimercado, em especial, os long and short, cuja estratégia é apostar na alta de algumas ações e na queda de outras por meio de operações no mercado futuro. “Eles trocam de setores de forma bastante ativa, o que dá bons resultados, especialmente em momentos em que a bolsa não tem uma tendência clara de valorização ou baixa”, diz Otávio Vieira, sócio da assessoria financeira Taler. Um levantamento feito pelo Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostra que os fundos multimercado da ARX renderam 23% em 12 meses e quase 90% em cinco anos, enquanto a média do setor ficou em 14% e 70%, respectivamente. Um dos fundos de maior rentabilidade nos últimos 12 meses é o multimercado Extra, que rendeu 27% ao apostar principalmente na queda dos juros combinando títulos de prazos diferentes. Num prazo mais longo, o melhor resultado é o de outro multimercado, o Long and Short offshore, que rendeu 228% do CDI em dez anos (quando o histórico é convertido em reais). Os fundos de renda variável que só compram ações, porém, renderam menos do que a média de mercado em cinco anos.

Apesar do histórico encorajador, alguns assessores financeiros ainda não estão indicando os fundos da Truxt a clientes. “Eles ainda estão montando o escritório e contratando pessoas, então é claro que a energia não está concentrada apenas na gestão. Preferimos esperar para ver como será o desempenho dos fundos nos próximos meses”, diz um deles. Enquanto isso, a equipe que ficou na ARX, ainda sob o controle do BNY Mellon, está se reorganizando. Foram contratados sete profissionais e a estratégia dos fundos, segundo Rogério Poppe, novo diretor executivo da gestora, foi mantida. “Concorrência faz parte. Há muitos fundos similares no mercado e nosso trabalho é ter um desempenho melhor”, diz Poppe. De 2 de maio a meados de junho, a ARX perdeu 3,2 bilhões de reais de patrimônio, quase tudo o que havia sido captado nos cinco primeiros meses do ano, segundo a FGV. “É natural que alguns clientes saquem seu dinheiro quando há uma mudança de equipe. Mas vamos recuperar esses recursos.” A ARX tem 10 bilhões de reais de patrimônio.

Hoje, há poucas diferenças no cenário projetado por ARX e Truxt. As duas acreditam que a queda dos juros vai continuar e beneficiar a economia, mas que a retomada será lenta em razão do aumento da incerteza política. “Se alguma reforma passar, será mais tímida do que esperávamos no passado”, diz Garcia. “A esperança agora é a eleição de 2018. Esperamos que o novo presidente retome a agenda de reformas.” Ambas estão fazendo investimentos mais conservadores: comprando títulos de renda fixa de curto prazo e aplicando pouco em bolsa nos fundos multimercado. No mercado de ações, há algumas divergências. Para a Truxt, as maiores oportunidades estão nos setores de bancos, consumo, energia elétrica e varejo. Entre os papéis preferidos estão os da varejista Renner, da empresa de calçados Arezzo e da operadora de turismo CVC — que, segundo Garcia, fizeram cortes durante a crise, tornaram-se mais eficientes e, em razão do fechamento de concorrentes na recessão, podem crescer com menos competição. Já a ARX prefere os setores industrial, de concessões públicas e shoppings, que se beneficiam mais da queda dos juros e da retomada da economia, na opinião da gestora. Quem acertar começará a corrida na frente.

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