Revista Exame

É preciso ser sustentável, sim, mas de forma prudente com os custos

É preciso manter cuidado sobre custos e benefícios da sustentabilidade, com um olhar otimista sobre a tecnologia

 (Victor Moriyama/Bloomberg //Getty Images)

(Victor Moriyama/Bloomberg //Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 19 de novembro de 2021 às 06h00.

Sustentabilidade” é um termo incrivelmente popular usado para sinalizar a virtude de alguém no discurso público contemporâneo, mas é uma base fraca para uma política pública sensível. É o termo que transmite a visão de um biólogo sobre a economia, sem nada da prudência favorecida pelos economistas.

O biólogo Paul R. Ehrlich deu conselhos excepcionalmente imprudentes em seu livro de 1968, The Population Bomb (“A bomba populacional”, numa tradução livre do inglês), em que sugeriu que a humanidade caminhava para uma escassez aguda de recursos e fome em massa. O que aconteceu em vez disso foi que a renda mundial continuou a crescer, como tem sido há dois séculos, e todos os sinais indicam que continuará crescendo. O pessimismo tem sido um mau futurólogo.

Como o historiador britânico Thomas Macaulay profeticamente perguntou em 1830: “Com base em que princípio, quando não vemos nada além de melhorias ao nosso redor, esperamos nada menos do que deterioração à nossa frente?”. Era uma boa pergunta na ocasião, e é uma ainda melhor hoje. Fundamentalistas ambientais que insistem que “desta vez é diferente” estão desafiando tanto a lógica quanto a evidência histórica.

Em termos de renda real (corrigida pela inflação), o índice de “melhorias atrás de nós” tem sido de cerca de 2% ao ano em média. Pode não parecer muita coisa, mas é uma taxa que produz resultados estonteantes no longo prazo. Significa que nossos netos em 2100 estarão em situação mais de quatro vezes melhor do que a nossa atual.

Assim, a prudência econômica estabelece que alguns recursos, como o petróleo, deveriam ser usados tanto quanto fosse lucrativo no custo atual de oportunidade de extração, além de uma taxa de carbono para os derramamentos. Outros recursos, como a madeira de lei, deveriam ser usados hoje com um elevado índice “insustentável”, porque valerão relativamente menos para nossos muito mais ricos netos. Negar aos pobres de hoje madeira para construir suas casas (ou a renda da derrubada de árvores) em nome das gerações futuras não é ético. De fato, é o equivalente a tirar dos pobres para dar aos ricos.

Rendimentos à parte, outra consideração crucial envolve tecnologia. A maior parte do papo sobre “sustentabilidade” atual é baseada em nosso conhecimento atual e pobre do futuro. Na década de 1960, futurologistas previram que teríamos carros voadores a esta altura. Não temos, mas temos muitas outras coisas que eles jamais poderiam imaginar. A famosa observação do roteirista de Hollywood William Goldman sobre quais filmes farão sucesso com as audiências do futuro vale igualmente para o futuro da tecnologia: “Ninguém sabe nada”.

O motivo é simples. Se soubéssemos, já saberíamos o que saberemos no próximo ano mas não sabemos hoje. Essa contradição básica não pode ser deixada de lado pelo desespero quanto a “vendavais” econômicos, e certamente não pelo princípio da precaução, que afirma que não devemos adotar novos produtos ou processos cujos efeitos plenos sejam desconhecidos. Um nome melhor seria princípio Oblomov, em referência à história russa de 1859 em que um nobre incapaz de ações decisivas simplesmente passa o dia deitado.

Qualquer um que pense que conhece o futuro deve bancar o que fala. Se você acha que uma falta de sustentabilidade levará à escassez de certos recursos, deve estar disposto a apostar tudo nos mercados futuros em que essas commodities são negociadas.

Em sua defesa, Ehrlich bancou o que dizia. Em 1980, ele e o economista Julian Simon fizeram uma famosa aposta. Ehrlich escolheu cinco recursos (cobre, cromo, níquel, estanho e tungstênio) cujos preços (corrigidos pela inflação) ele imaginou que subiriam durante a década de 1980, e Simon apostou com ele 10.000 dólares que os preços na verdade cairiam.

Simon estava apostando na observação econômica, prudente e elementar, de que, se algo se torna mais escasso, há um incentivo maior para buscar mais daquilo ou para bolar alguma saída da escassez. Se acontece uma escassez imobiliária em uma cidade, o dinheiro inteligente constrói mais casas para atender à demanda ampliada (a menos que as regras de planejamento urbano atrapalhem no caminho, como infelizmente é o caso em muitos lugares hoje).

Porém, mais importante, Simon estava apostando na criatividade das pessoas livres. É esse fator que explica o surpreendente grande enriquecimento dos últimos dois séculos, em que padrões de vida de países como Finlândia e Japão melhoraram em chocantes 3.000%.

Carregamento de madeira na Amazônia, em Santarém: recurso em debate (Ricardo Beliel/Brazil Photos/Getty Images)

Devemos esse progresso à difusão gradual da ideia liberal articulada em 1776 por ­Thomas Jefferson e, separadamente, por Adam ­Smith: a saber, que todas as pessoas são criadas igualmente. Os liberais daquele período não prometiam igualdade de oportunidades ou resultados; eles prometiam liberação da coerção humana (aqui, o proprietário de escravos ­Jefferson não bancou o que dizia). Eles imaginaram, e então começaram a criar, uma sociedade em que pessoas comuns poderiam “tentar a sorte” sem pedir permissão para ninguém.

Aqueles que responderam ao desafio construíram o mundo em que vivemos hoje. Eles o fizeram não com investimentos ou exploração, mas por meio de inovação, definida de modo mais amplo. Seus feitos podiam ser modestos, como uma mulher abrindo um salão de beleza em seu bairro ou uma mulher pobre mudando para a Califórnia atrás de trabalho. E eles podiam ser tão influentes quanto os de um nobre alemão (Wilhelm von Humboldt) inventando a universidade moderna, um jardineiro francês (Joseph Monier) inventando o concreto armado, um caminhoneiro da Carolina do Norte (Malcom McLean) inventando contêineres para frete ou uma enfermeira sueca (Aina ­Wifalk) inventando o andador moderno.

Simon apontou que de fato não existe tal coisa como um “recurso”. O “recurso definitivo”, nas palavras dele, é a engenhosidade humana, que vem sendo liberada gradualmente desde 1776. Elementos raros de terra eram só sujeira interessante até as pessoas começarem a usá-los para construir computadores. Óleo escorrendo do solo era um mero estorvo agrícola até as pessoas aprenderem a fazer querosene com ele.

No fim, Ehrlich perdeu a aposta e pagou. Os preços das cinco commodities tinham caído em 1990. A prudência ganhou do tipo de sustentabilidade defendido por biólogos e adolescentes suecos. Para nos mantermos prudentes sobre custos e benefícios, precisamos ouvir os engenheiros e os economistas. Temos de ser razoavelmente otimistas quanto aos avanços tecnológicos, como o recém-anunciado método de uso da bactéria E. coli para transformar plástico usado em essência de baunilha (de todas as coisas).

Como pessimistas de carteirinha, a maioria dos ativistas da sustentabilidade não quer ouvir tais coisas. Para eles, otimistas que têm confiança no potencial de técnicas modestas de geoengenharia — como a de deixar todas as estradas brancas para refletir o sol — são o grande Satanás do dia. Assim como economistas como o ganhador do Nobel William D. Nordhaus, que destaca que, porque nós obviamente teremos capacidades tecnológicas aprimoradas no futuro, poderemos contar com tecnologias melhores de captura de carbono em vez de puxar o freio na civilização industrial que guarda a chave de nossa salvação.

É necessário sermos prudentes e razoáveis, não sustentáveis e patologicamente precavidos.

 

(Arte/Exame)


(Publicidade/Exame)

Acompanhe tudo sobre:exame-ceoMeio ambienteSustentabilidade

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025