Os sócios de OGrupo (da esq. para a dir., em sentido horário): Carla Mayumi, Eduardo Fraga, Rony Rodrigues, João Paulo Cavalcanti, Cristina Brand e Lucas Mello. Até hoje eles não têm nem cartão de visita (Germando Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h40.
Rony Rodrigues tem a vida que pediu a Deus. Trancou a faculdade de turismo logo no primeiro ano, vira e mexe viaja para a Europa e mora sozinho em um confortável apartamento na badalada região do Itaim, em São Paulo, onde passa a maior parte do dia de pijama em frente ao computador. Quando sai de casa, de calça jeans e camiseta surrada, é para encontrar os amigos numa roda de chope e falar sobre carros, roupas e tecnologia. Frequentemente, essas reuniões ocorrem em torno da piscina de sua casa, recém-adquirida nos Jardins, e para onde ele deve se mudar definitivamente nas próximas semanas. Melhor: para ter essa vida, o gaúcho Rodrigues ganha dinheiro. Aliás, cada vez mais dinheiro, vindo de clientes como Fiat, Itaú, Unilever e Olympikus. Aos 30 anos, ele é um dos fundadores da agência Box1824, especializada em pesquisa de mercado e tendências de consumo.
Nascida em uma garagem no bairro de Vila Ipiranga, em Porto Alegre, em 2003, a empresa esteve por trás da concepção de design do novo Uno neste ano e do lançamento de uma linha de sabonetes com a marca Lux à base de chocolate e outras guloseimas, sucesso de vendas nos países emergentes. Em novembro, Rony Rodrigues e seus cinco sócios decidiram dar uma guinada na Box. Queriam que a cara da empresa combinasse mais com a dimensão dos negócios. Seguindo o exemplo de grupos como a agência Africa, de Nizan Guanaes, eles decidiram criar uma holding para englobar suas outras três agências: a Aquiris, de games; a LiveAd, de publicidade; e a TalkInc, de pesquisas na web. E, da forma nada humilde que caracteriza a geração Y, batizaram-na OGrupo. “Esses garotos vêm chacoalhando o mercado de publicidade no Brasil”, diz Fernand Alphen, diretor nacional de planejamento da F/Nazca, uma das principais agências de propaganda do país. “Hoje, todas as grandes empresas querem trabalhar com eles.”
A razão do entusiasmo em torno da Box é tão simples quanto reveladora. Ao longo dos últimos anos, esses empresários — dos seis sócios, cinco deles são formados em publicidade — especializaram-se em conhecer um tipo de consumidor cada vez mais estratégico para as empresas: os jovens na faixa de 18 a 24 anos (daí o 1824 ao lado do nome Box, até hoje o maior negócio da holding). Todos os meses, eles fecham cerca de 20 contratos envolvendo projetos voltados para esse público — outros 20 são recusados. “Criamos maneiras de evitar que as marcas envelheçam”, diz Rodrigues. “E isso inclui pensar fora da caixa o tempo inteiro. Não é um trabalho de escala.” Foi esse espírito irreverente que permitiu à Box1824 conquistar seu primeiro cliente. Em 2004, a fabricante de calçados Olympikus pediu à agência DCS uma pesquisa de mercado que apontasse o que a garotada desejava num tênis. Rodrigues, que trabalhava no atendimento da conta, respondeu prontamente que a DCS não oferecia esse serviço — mas dispôs-se, ele próprio, a realizá-lo.
Para isso, juntou-se a dois amigos, os publicitários Lucas Mello e João Paulo Cavalcanti — eles formaram um trio de aspirantes a empresários, sem sede e sem cartão de visita. Juntos, eles reuniram alguns conhecidos, solicitaram um desenhista à Olympikus, munido de materiais de várias cores e tipos, e passaram a visitar lugares onde certamente encontrariam os alvos para a pesquisa: universidades, shopping centers e parques. Com as opiniões recolhidas, sugeriram um protótipo que serviu de base para o lançamento do Tube, até hoje o tênis mais vendido da Olympikus. “Na época, enchíamos o peito para contar que éramos diferentes
por opção”, diz Mello. “Mas a verdade é que não tínhamos absolutamente nada estruturado.”
A despeito da precariedade do negócio, não demorou para que a Box1824 chamasse a atenção de outras grandes empresas, interessadas no cada vez mais poderoso consumidor jovem. Naquele mesmo ano, Rodrigues foi convidado a participar de uma concorrência mundial na Unilever para apontar as tendências de consumo nos mercados emergentes — e venceu. Como não dispunha de escritórios espalhados no mundo inteiro, disparou uma série de e-mails a amigos e parentes no exterior, recrutando “pesquisadores” — jovens antenados, moradores de 12 países emergentes, que costumam frequentar baladas e conhecer muita gente. Foi justamente essa rede global de contatos que seduziu os executivos da Unilever.
Os “pesquisadores” identificaram, por exemplo, que havia demanda para produtos de higiene que utilizassem alimentos. Com essa ideia em mãos, Rodrigues viajou para a França. Lá visitou os seis restaurantes mais sofisticados do país para descobrir quais os ingredientes mais “quentes” da estação. Nascia, assim, o novo sabonete Lux à base de chocolate, a primeira de outras nove linhas de produtos lançadas pela Unilever em países emergentes.
Foi com casos assim que um cliente chamou outro e OGrupo tornou-se um negócio de 40 milhões de reais e 200 funcionários. A imagem rebelde continua a ser cultivada como uma espécie de patrimônio da empresa. Não há, por exemplo, uma sede fixa para a holding: as reuniões são realizadas nos escritórios das quatro agências ou em bares e baladas. Até hoje nenhum funcionário tem cartão de visita — os contatos são fornecidos por meio de post-its rabiscados à mão. É um comportamento que, pelo menos à primeira vista, fascina algumas empresas, mas assusta outras. Em 2004, os executivos da operadora de telefonia celular Claro estranharam quando descobriram que as entrevistas com adolescentes — que culminaram na criação do festival Claro Que É Rock, extinto em 2005 — eram realizadas num quarto alugado em um hotel no baixo Augusta, região do centro de São Paulo célebre pela grande quantidade de prostíbulos. O aluguel era barato. E os sócios da Box tinham a convicção de que os jovens ouvidos adorariam a nostalgia que o lugar evocava. (Mesmo incomodada, a Claro levou a pesquisa adiante.)
Em dezembro do ano passado, a corretora Souza Barros contratou a LiveAd para criar um projeto de difusão do investimento em ações entre o público jovem. A agência criou, então, uma bolsa de valores virtual. Mas, em vez de negociar ações de empresas, o público fazia transações envolvendo a reputação dos políticos candidatos às eleições de 2010. De março para cá, mais de 10 000 pessoas participaram do projeto, alvo de 1 milhão de comentários no Twitter. A ação rendeu à LiveAd um Leão de Prata no Festival de Cannes, na França. “No começo, não gostamos muito daquela turma toda tatuada, vestindo camiseta surrada”, diz Carlos Souza Barros, diretor-presidente da Souza Barros. “Mas eles nos surpreenderam.” Em breve, OGrupo ganhará duas novas empresas: uma consultoria de inovação e outra de moda e estilo, em parceria com a ex-sócia da Daslu Donata Meirelles. “Nosso desafio é continuar mantendo um espírito jovem”, diz Rodrigues. “Eu mesmo, na maior parte do tempo, não me vejo como um empresário, mas como alguém que acorda, dá dez passos e já começa a trabalhar.”