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Governo japonês está em busca do Elon Musk oriental

O Japão está decidido a deixar para trás um histórico medíocre na criação de startups. E já tem resultados positivos.

Elon Musk: o líder japonês é fã do Vale 
do Silício (Jordan Strauss/Getty Images)

Elon Musk: o líder japonês é fã do Vale do Silício (Jordan Strauss/Getty Images)

RS

Raphaela Sereno

Publicado em 13 de abril de 2017 às 05h55.

Última atualização em 13 de abril de 2017 às 12h55.

Tóquio — É perda de tempo tentar encontrar Tóquio nos rankings das regiões e cidades com os melhores ecossistemas para o desenvolvimento de startups. Nas listas, sempre encabeçadas pelo Vale do Silício, costuma haver várias cidades americanas, como Nova York e Boston; metrópoles europeias, como Londres e Berlim; chinesas, como Pequim e Xangai; Tel-Aviv, em Israel; Bangalore, na Índia; e até São Paulo. Mas nada do Japão. É essa situação que o governo japonês parece disposto a mudar. O primeiro-ministro Shinzo Abe, fã de empreendedores como Elon Musk, fundador da fabricante de carros elétricos Tesla, não se cansa de dizer que o Japão precisa aprender com o Vale do Silício. Para melhorar o ambiente de negócios, o governo diminuiu nos últimos anos as dificuldades e os -custos para a abertura de novas empresas — e já há alguns sinais encorajadores. O número de empresas fundadas por egressos de universidades praticamente dobrou desde 2008. Na Universidade- de Tóquio, o aumento foi de 57%; na de Kyoto, de 31%.

Lena Okajima, doutora em astronomia pela Universidade de Tóquio, poderia ter seguido uma carreira acadêmica ou começado a trabalhar numa grande empresa japonesa, como é comum no Japão. Mas ela tinha um sonho. Em 2001, com 22 anos, teve a ideia de comercializar estrelas cadentes. Mais precisamente, provocar no céu um efeito semelhante, com partículas disparadas de um satélite, e exibi-las em shows numa versão futurista de fogos de artifício. Em 2011, depois de acabar sua formação acadêmica e trabalhar no banco americano Goldman Sachs, Lena finalmente abriu a Sky Canvas, cujo nome expressa a pretensão de pintar o céu como a tela de um quadro. Seu sócio, Kei Oda, também é ex-funcionário do Goldman. “Antes eu vendia títulos. Agora vendo estrelas”, diz. A empresa já recebeu 6 milhões de dólares de investidores, tem dez funcionários em tempo integral, três em meio período e ainda conta com o apoio de cerca de 25 pesquisadores de quatro universidades. A Universidade de Tohoku desenvolve o satélite, a de Teikyo ajuda a construir sua estrutura interna, a Metropolitana de Tóquio calcula a órbita e a de Nihon ajuda a desenvolver a liga metálica das esferas que entrarão na atmosfera queimando e produzindo o efeito da estrela cadente. Esse apoio das universidades é sinal de que os japoneses tentam copiar o modelo que deu certo nos Estados Unidos e depois em Israel, países em que as melhores instituições de ensino superior tiveram um papel fundamental no aparecimento de empreendedores de sucesso. Os testes estão sendo realizados no túnel de vento da agência espacial japonesa — outra contribuição do setor público.

Na linha de frente dos novos empreendedores japoneses nem tudo é alta tecnologia com base em engenharia, a grande tradição do setor produtivo do país. Também há aplicativos. A CureApp recebeu 3,4 milhões de dólares de fundos de capital de risco e de universidades para desenvolver um app para fumantes que estão tentando largar o vício. Uma enfermeira virtual dá dicas ao longo do dia sobre como evitar acender um cigarro. A empresa deverá receber a licença da agência de saúde para a comercialização do produto em 2019, mas neste ano já planeja criar uma filial na Califórnia para acelerar o desenvolvimento do aplicativo. Outra startup, a Chihou Sousei Network, montou uma logística voltada para pescadores. Quando o carregamento de peixes chega à costa, é transportado por avião até um centro de processamento próximo ao Aeroporto de Haneda, em Tóquio. De lá, os peixes são distribuídos para restaurantes da cidade e de toda a Ásia.

O sucesso dessas empresas é crucial para quebrar a resistência cultural dos japoneses a empreender, o que talvez seja a maior barreira ao surgimento de startups no país. “O Japão é uma sociedade muito hierárquica e avessa ao risco”, afirma Julian Birkinshaw, professor de estratégia e empreendedorismo na London Business School e um dos maiores especialistas em ambientes de negócios propícios a startups. Mais da metade dos japoneses admite que o medo de falhar os impede de começar um negócio — nos Estados Unidos, o percentual é de 33%; no Brasil, de 36%. O status social de empreendedores é mais baixo no Japão do que na maioria das economias ricas. Se os sócios Lena e Oda conseguirem promover uma chuva de estrelas cadentes na abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020, é provável que mais jovens comecem a acreditar em seus sonhos.

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