Revista Exame

A nova firma: como empresas adaptam escritórios para a volta ao presencial

Empresas reformam ou abrem escritórios para atrair os funcionários de volta. Só que o ambiente de trabalho ganhou um jeitão bem diferente

Escritório do banco Agibank em Campinas, no interior paulista: 20 milhões de reais num espaço com luz e ventilação naturais (Leandro Fonseca/Exame)

Escritório do banco Agibank em Campinas, no interior paulista: 20 milhões de reais num espaço com luz e ventilação naturais (Leandro Fonseca/Exame)

Luísa Granato

Luísa Granato

Publicado em 16 de setembro de 2021 às 05h06.

Após mais de um ano de home office, o avanço paulatino da vacinação motiva uma porção de empresas a convidar os funcionários de volta aos escritórios. Em algumas, o ambiente vai estar bem diferente do deixado em março do ano passado. Reformas vêm adaptando os locais de trabalho às necessidades criadas pela pandemia, como baias afastadas para respeitar o distanciamento social e espaços de descompressão de funcionários. Há ainda escritórios novinhos saindo do papel já com uma cara diferente para evitar surtos de covid-19 na retomada.

Nas contas da Tétris, escritório de arquitetura da multinacional de espaços corporativos JLL, 100% dos projetos feitos no ano passado foram de reformas. Antes da pandemia, essa fatia era de metade (a outra vinha de novos escritórios). Neste ano, 60% dos projetos serão de reformas. A seguir, quatro tendências da retomada aos escritórios. 

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O VERDE APARECEU

Em algumas empresas, a pandemia tirou do papel mudanças de porte. Em março, o banco gaúcho Agibank inaugurou um escritório em Campinas, no interior paulista, para acomodar funcionários interessados no trabalho híbrido (o home office segue liberado). A um custo de 20 milhões de reais, a área de 19.000 metros quadrados tem espaços abertos, com luz e ventilação naturais, e um terraço ao ar livre.

“A sustentabilidade foi um pilar essencial”, diz Lucas Aguiar, diretor do Agibank. A guinada verde combinou com a localização do escritório, o Parque Corporativo Bresco, um condomínio nos arredores do Aeroporto de Viracopos rodeado de Mata Atlântica e com sistemas próprios de tratamento de esgoto, programas de controle de fauna e flora e estações para carregar carros elétricos.

 


Corredor do escritório da Kuehne+Nagel em São Paulo: cores vibrantes e jeitão de casa dentro do trabalho (Leandro Fonseca/Exame)

AS SALAS SUMIRAM

Há certo tempo, a liderança do braço brasileiro da Kuehne+Nagel, multinacional suíça de logística, queria eliminar as salas individuais do escritório da empresa em São Paulo. A pandemia não só motivou a derrubada geral das paredes como também motivou a criação de um sistema rotativo para marcação de mesas de trabalho. Todo funcionário deve reservar uma baia pelos canais digitais da empresa antes de cada jornada.

Tudo isso para facilitar a colaboração entre funcionários de áreas diferentes até então isolados pelo home office. E, em alguma medida, facilitar a interação entre funcionários de níveis hierárquicos diferentes — afinal, a troca de ideias entre alguém da presidência e algum analista pode trazer pontos de vista completamente diferentes sobre os desafios de uma empresa. “É o fim das barreiras para um novo modelo de trabalho”, diz Eduar­do Razuck, presidente da empresa no Brasil.

Por trás da reforma estava a intenção de dar ao ambiente de trabalho uma cara de casa. Boa parte dos espaços carrega cores vivas, como verde e laranja, em alta na decoração de ambientes residenciais. Texturas incomuns ao ambiente de trabalho, como tecidos, revestem  algumas superfícies, numa tentativa dos arquitetos responsáveis pela obra de fazer os funcionários sentir o conforto do lar enquanto trabalham.

A mudança, considerada bem-vinda pelos funcionários da empresa no Brasil, trouxe um desafio: como manter a concentração (e o distanciamento) num espaço aberto? Para minimizar o risco de o barulho do escritório quebrar o clima intimista, os espaços das baias de trabalho são intercalados com salas de reuniões e cabines individuais.

A reserva desses espaços segue a lógica geral por ali: nada é de ninguém e tudo deve ser reservado com antecedência. Funcionários são lembrados a todo momento dos protocolos sanitários em vigor. No fim das contas,  como numa residência, alguma regra deve prevalecer para as coisas funcionarem.


Ponto de encontro da sede da farmacêutica Merck, em São Paulo: espaço do cafezinho ganhou importância (Leandro Fonseca/Exame)

A COPA CRESCEU

“Aspiracional”. é assim que Felipe Dourado, gerente de recursos humanos da farmacêutica Merck no Brasil, define como os escritórios precisam ser num mundo pós-home office. Afinal, a empresa precisa atrair as pessoas e convencê-las a sair de casa. Para isso, a alemã Merck aproveitou que estava de portas fechadas durante boa parte da pandemia e decidiu reformar o escritório principal da empresa na capital paulista, na região da Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini.

“O escritório agora é para o momento do cafezinho, que permite resolver um tema em 5 minutos, permite trazer associados, e com isso o networking pode voltar. Há também um conceito de acolhimento, de poder fazer reuniões de equipe para revisar metas trimestrais, por exemplo. Ele serve para acolhimento psicológico e para criar segurança psicológica”, diz Dourado. A maioria dos funcionários da farmacêutica ainda está em trabalho remoto, mas as obras do escritório estão prontas.

No futuro, o modelo será híbrido e a ideia é que as pessoas passem 30% do tempo nele e 70% em casa. Dos 1.400 funcionários no Brasil, 500 são administrativos. Com a mudança para o modelo híbrido, a empresa devolveu um andar do prédio. Para o gerente sênior, o objetivo do escritório pós-pandemia é manter a cultura viva das empresas, garantir o networking e a melhor recepção de novos funcionários. Por isso, não faz sentido ir totalmente para o formato remoto.

“A gente passa a ter um escritório mais inteligente, com menos posições de trabalho, já que as pessoas vão menos vezes. Temos agora mais salas de reuniões, um conceito mais colaborativo. Com a reforma, criamos um ambiente mais acolhedor, mais convidativo para as pessoas se sentirem mais à vontade.” Por isso, a estrutura de cafeterias dentro do escritório ganhou espaço — a ideia é retomar o tête-à-tête corporativo. De adaptação a novos tempos a Merck entende: a empresa foi fundada há mais de 350 anos na Alemanha e opera em 66 países. 


Escritório da empresa de tecnologia Qintess, em São Paulo: salas de descompressão, sala de ioga, espaço de música e até galeria de arte (Leandro Fonseca/Exame)

A ARTE ENTROU

Nenhuma curva ou cor é uma mera escolha estética no novo escritório da Qintess, empresa brasileira de tecnologia, em São Paulo. O projeto foi o resultado de três ­hackatons com escritórios de arquitetura para trazer ideias inovadoras. Os ganhadores levaram uma premiação de 30.000 reais. Depois, o escritório de arquitetura AKMX assumiu a execução da obra. Cada detalhe foi escolhido segundo os conceitos de neuroarquitetura, uma vertente dedicada à relação entre ambiente físico e bem-estar. A presença de curvas, da cor roxa e de obras de arte no ambiente quer estimular a criatividade e a inovação.

“Queremos repensar o escritório para os tempos de trabalho híbrido”, diz Rogério Dias, líder da Qintess dedicado aos assuntos de recursos humanos. Em 6.300 metros quadrados, divididos em cinco andares, mesas compartilhadas querem facilitar a troca de ideias entre departamentos. Um andar inteiro está dedicado à convivência e à descompressão, com salas de ioga, espaço de música, estúdio de gravações, café, lactário e sala de jogos.

Quando a pandemia passar de vez, a ideia é essa área ser liberada para visitantes, numa espécie de coworking. Nos planos está também uma galeria de arte. Por ora, funcionários podem vislumbrar uma escultura de um astronauta — a ideia é dar uma pegada nerd ao ambiente. No momento, a maioria dos funcionários faz home office, e o retorno gradual está sendo definido com a liderança do negócio, mantendo o modelo híbrido de trabalho, mesmo com essa abertura.

“A ideia é que seja gradual, muito embora alguns colaboradores já usem o espaço para se conectarem com o universo da empresa, e até mesmo como um fator ligado à saúde mental deles”, diz Dias. “Como a estrutura corporativa conta com um open space para reuniões ou coworking, esperamos que toda essa funcionalidade, conforto e sustentabilidade gerem um sentido de bem-estar nesse retorno.”  

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