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Prepare-se para 2011

Não vão faltar oportunidades de crescimento em 2011, mas só vão aproveitá-las as pequenas e médias empresas que garantirem funcionários, insumos e recursos

Ricardo Cunha e Cláudio Grando, da Audaces (Eduardo Marques/Tempo Editorial/EXAME PME)
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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h48.

Desta vez ninguém vai poder reclamar que as expectativas para 2011 não são boas para as pequenas e médias empresas. Economistas e analistas que trabalham com projeções de dados calculam que a economia brasileira crescerá algo em torno de 4,5% — um índice alto, principalmente quando se leva em consideração que a expansão neste ano também se mantém em patamares elevados. Boa parte do crescimento deve vir de setores em que a demanda está particularmente aquecida, como petróleo, construção, varejo e beleza (veja reportagem na pág. 66). “O momento é excelente para pequenas e médias empresas inseridas nessas e em outras cadeias de produção”, diz Arnaldo Rocha, da consultoria Deal Maker. A ressalva: só vão aproveitar as melhores oportunidades aquelas que se planejarem. Para os negócios emergentes, o próximo ano vai colocar especialmente à prova a solidez de três pilares do planejamento — recursos, suprimentos e gente. “Mesmo com uma fila de pedidos, a empresa para se faltar uma dessas três coisas”, diz Rocha. A boa notícia é que ainda dá tempo de tomar providências. As próximas páginas trazem o que exatamente pode ser feito e exemplos de empreendedores que estão preparando sua empresa para não ficar para trás em 2011.

Para que não faltem braços

Veja também

O que uma pequena ou média empresa pode fazer agora para não perder funcionários importantes para a concorrência em 2011

Quais serão os principais desafios de uma pequena ou média empresa em 2011 com relação a pessoal?

A economia aquecida já está obrigando muitos pequenos e médios negócios a enfrentar o que se apelidou de “apagão de talentos”. Se o PIB crescer em torno de 4,5%, como se prevê, encontrar mão de obra vai ficar cada vez mais difícil, mesmo pagando salários maiores. Ao mesmo tempo, será preciso resistir ao assédio de concorrentes aos bons profissionais que já estão na empresa. “Está faltando gente tanto para trabalhar no chão de fábrica quanto para tarefas administrativas”, diz o consultor Paulo Apsan.

O que fazer agora para manter os funcionários sem onerar demais a folha de pagamentos?

Melhorar os benefícios oferecidos pela empresa,como plano de saúde e de aposentadoria, pode ajudar. “Para muitos trabalhadores,especialmente os menos qualificados, o pacote de benefícios pode ser decisivo”, diz Apsan. Cada vez mais pequenas e médias empresas oferecem benefícios como esses aos funcionários, à medida que bancos, seguradoras e operadoras de planos de saúde e de previdência têm criado produtos para elas, tornando esses serviços mais acessíveis. Nas pequenas e médias empresas que já contam com convênios, é possível negociar planos de assistência médica mais completos. “Há muitas operadoras pretendendo crescer no mercado formado por pequenos e médios negócios”, diz Daniela Mendonça, da consultoria Milliman. “A concorrência tem tornado as negociações mais fexíveis.”

E se não houver como cobrir as ofertas salariais feitas a funcionários estratégicos?

Um número crescente de pequenas e médias empresas cria programas de remuneração variável para manter os funcionários-chave — como bônus para quem atingir metas ou participação nos lucros. Para que um programa desse tipo dê certo, é preciso um método que não leve o funcionário a se esforçar apenas por sua área, mas pela empresa toda. Nos últimos meses, o mineiro Fausto Borba, de 44 anos, definiu critérios para avaliar a produtividade dos funcionários de sua empresa, a Espetinhos Mimi, que faz churrasquinhos para eventos, para a rede de lanchonetes da marca e para os quiosques Chopp Brahma, da AmBev. O objetivo é estender a remuneração variável, que já funciona nas áreas comercial e financeira, para toda a empresa. “Em 2011, 20% da remuneração total vai depender do desempenho”, diz Borba. Em julho, ele ficou preocupado quando vários funcionários receberam propostas de emprego na região da cidade paulista de Vinhedo, onde a Espetinhos Mimi está. Com previsão de 20 milhões de reais em receitas para 2010, a empresa tem a meta de crescer 40% no próximo ano. “Não posso perder ninguém”, diz Borba.


Como se preparar para atender aos aumentos repentinos na demanda sem elevar os custos fixos com mão de obra?

Empreendedores devem começar agora a prever em que períodos do próximo ano pode haver picos na demanda. É o que está fazendo o paulista Sergio Molina, de 37 anos, dono da C+E, de Barueri, na Grande São Paulo, que faz enfeites e decorações para shopping centers. Mais de 30 novos shop pings estão para ser inaugurados em 12 estados, o que deve ajudar a C+E a obter em 2011 receitas de 20,5 milhões de reais — 15% mais que neste ano. As coisas na C+E costumam aquecer em agosto, quando começa a fabricação de bolas, árvores, trenós e outros enfeites de Natal. Até outubro, o ritmo de trabalho mais que dobra. “Neste ano foi mais difícil conseguir mão de obra temporária do que normalmente”, diz Molina. “Imagine em 2011.” Para não correr o risco de parar a linha de montagem por falta de gente, ele criou uma espécie de programa de intercâmbio com 14 empresas parceiras que montam as decorações nos shoppings. Em agosto de 2011, cada uma — incluindo as situadas fora de São Paulo — vai enviar ao menos três funcionários a Barueri. “Assim garanto metade do pessoal temporário de que posso precisar”, diz Molina.

Para não faltar nada

Quais pontos negociar agora com os fornecedores para não faltar matérias-primas no próximo ano

Por que há risco de faltar insumos em 2011?

Com o aquecimento dos negócios, a produção de muitas empresas se aproxima da carga máxima. De acordo com um levantamento recente da Fundação Getulio Vargas, a capacidade ociosa da indústria vem caindo constantemente desde fevereiro do ano passado. “Em alguns setores, já começam a surgir dificuldades no abastecimento de matérias-primas”, diz Bráulio Borges, economista chefe da consultoria LCA. “O aumento na demanda deve empurrar muitos preços para cima em 2011.” Pequenas e médias empresas que não se planejarem agora para garantir o material necessário no próximo ano podem pagar caro pela matéria-prima — sobretudo em compras emergenciais, aumentando custos e comprometendo margens de uma hora para a outra. A outra opção também não é boa: atrasar as entregas, sujeitando a empresa a multas e desgastes no relacionamento com os clientes.

Como garantir que nada falte à produção no próximo ano?

Uma alternativa ao alcance dos donos de pequenas e médias empresas é propor aos fornecedores contratos de um ou dois anos, com previsões de quando a matéria-prima precisa ser recebida. Esse tipo de acordo ajuda o fornecedor a programar a própria produção, reduzindo riscos de imprevistos.

O que uma pequena ou média empresa pode propor para diminuir a pressão dos fornecedores em 2011?

Empreendedores que já tenham definido suas metas de expansão para o próximo ano podem usar as projeções de aumento nas compras para negociar agora preços melhores e prazos de pagamento mais longos. Foi o que fez o paulista Alexandre Müller, de 38 anos, com os fornecedores da Lual, fabricante de refrescos em pó, sobremesas, barras de cereais e misturas para bolos localizada em Itu, no interior de São Paulo. Entre abril e junho, ele convidou os principais fornecedores para uma rodada de reuniões. Nos encontros,  Müller dizia como pretende fazer a Lual obter em 2011 receitas 25% maiores que os 70 milhões de reais previstos para 2010. Depois, mostrava planilhas com projeções do aumento nas compras de matérias-primas. “A promessa de aumentar as compras foi um bom argumento para convencer os fornecedores a baixar os preços”, afirma Müller. “Consegui descontos de até 25% para as compras do ano que vem.”

Por que é tão estratégico negociar já os preços que serão pagos aos fornecedores em 2011?

De um modo geral, empresas de todos os tamanhos estão trabalhando com uma expectativa de crescer algo entre 15% e 20%. Dependendo do setor ou da região, os planos podem ser mais agressivos ainda, com metas em torno de 50%. “A disputa por espaço nas prateleiras dos supermercados vai ser feroz”, diz Müller. Sem tanta pressão na compra de suprimentos, é possível para a Lual ter mais controle dos custos — o que pode garantir alguma folga nas margens para enfrentar o maior poder de barganha das grandes redes de varejo sobre seus fornecedores ao longo do próximo ano. No caso da Lual, a estratégia também inclui fundir quase dez marcas numa só. “Quando há muita concorrência, a negociação com o varejo fica mais fácil com uma linha de produtos mais ampla”, afirrma Müller.

É possível evitar surpresas desagradáveis no próximo ano?

Poucos fornecedores estariam dispostos a se comprometer a não cobrar mais em 2011, já que também eles estarão sendo apertados por suas cadeias de suprimentos. Mas é possível sível que concordem em estabelecer regras de como e quando renegociar preços, o que já ajuda uma pequena ou média empresa a se precaver. Alguns fabricantes de ingredientes usados pela Lual definiram em contrato datas para reajuste e indicadores que serão usados na remarcação. De que forma um contrato que não evita o aumento do preço cobrado pelo fornecedor pode ser bom? Para uma pequena ou média empresa em crescimento, que lida com pedidos cada vez mais frequentes e maiores, planejar-se para enfrentar um problema pode ser mais importante do que evitá-lo. Nas negociações deste ano, Müller seguiu um sistema que vem usando nos últimos dois anos nos contratos com fornecedores de açúcar, obtendo bons resultados para a Lual. Ele estabelece com as usinas um conjunto de indicadores — variação do dólar, índices econômicos e cotações do produto nas bolsas, por exemplo — para compor uma fórmula que define hoje o reajuste de amanhã. “Sei calcular quanto cada fornecedor vai cobrar pelo açúcar no próximo ano”, afirma Müller. “Dá tempo de absorver o impacto dos aumentos nos custos e estudar como repassar uma parte para os clientes.”


E se, ao procurar fornecedores agora, uma pequena ou média empresa não encontrar mais quem possa atendê-la a preços que caibam nos custos?

Empresas que usam insumos disponíveis em outros países devem prospectar agora a possibilidade de fechar contratos com fornecedores internacionais. “Há boas oportunidades no exterior para comprar insumos mais baratos do que no Brasil”, diz Marcos Paulo Carvalho, da Controlcorp, consultoria para pequenas e médias empresas de Belo Horizonte. Sobretudo nos Estados Unidos e na Europa, ainda há fabricantes com muita capacidade ociosa — mas é importante negociar agora, porque a tendência é que essas empresas retomem volumes maiores de produção  ao longo do ano que vem, conforme a economia de seus países se reaqueça depois do balde de água fria da crise financeira de 2008. Nesses casos, é preciso veri car se vale a pena arcar com eventuais aumentos nos custos com logística e correr o risco de mudanças no câmbio que sejam desfavoráveis ao real. “Neste momento, o dólar está relativamente barato”, diz Carvalho. “Mas isso pode mudar sem aviso prévio.”

Muitas grandes empresas estão planejando crescer agressivamente em 2011. É possível fugir da disputa com elas pelos mesmos fornecedores?

Uma solução é procurar fornecedores sem a quali cação necessária e ajudá-los a desenvolver as condições para atender a empresa. É o que estão fazendo os catarinenses Cláudio Grando e Ricardo Cunha, ambos de 41 anos, donos da fabricante de sofwares e de máquinas para confecções Audaces, de Florianópolis. Neste ano, eles estão selecionando 25 pequenas metalúrgicas e fabricantes de peças plásticas no sul do país para torná-las capazes de produzir componentes de que a Audaces precisa para seus equipamentos de corte de tecidos. Em alguns casos, engenheiros da Audaces passam uma temporada na fábrica de um fornecedor em desenvolvimento para ensiná-lo a detectar problemas e resolvê-los. “Eles podem car lá alguns dias ou semanas”, afirma Grando. “Muitas vezes, o que falta são processos de controle de qualidade ou algum ajuste no maquinário.” Em vários casos, a Audaces garante a compra da produção para que eles consigam financiamentos de longo prazo para adquirir novos equipamentos. As máquinas de corte respondem por quase 70% das receitas da Audaces, estimadas pelo mercado em 30 milhões de reais neste ano. “Temos projeções otimistas de crescer 80% no ano que vem”, diz Grando. “Não podemos correr o risco de parar a produção por falta de peças.

Para não ficar sem dinheiro

Como uma pequena ou média empresa pode garantir desde já os recursos necessários para investir na expansão no próximo ano

Por que é tão importante decidir logo de onde virão os recursos para crescer em 2011?

Não são poucos os pequenos e médios empresários que, para não perder oportunidades num período aquecido como o que se vislumbra para 2011, aumentam as instalações da fábrica, contratam mais gente e abrem filiais. Mas o crescimento acelerado pode ser muito traiçoeiro. “Quem não planejar os investimentos pode repentinamente se ver sem capital de giro”, diz Arnaldo Rocha, da Deal Maker, consultoria de estratégia para pequenas e médias empresas. “Isso pode acontecer mesmo que as vendas estejam aumentando.”

É melhor buscar linhas de crédito de longo prazo agora ou somente no próximo ano?

O crédito para pequenas e médias empresas já aumentou bastante desde o começo do ano. Nos três maiores bancos privados — Itaú,Unibanco, Bradesco e Santander — os empréstimos e financiamentos para essa fatia do mercado atingiram 173 bilhões de reais no primeiro semestre, 11% mais em relação ao mesmo período do ano passado. De janeiro a junho, o BNDES liberou para pequenos e médios negócios 20,8 bilhões de reais, 23% mais que nos primeiros seis meses de 2009. “O crédito para pequenas e médias empresas deve continuar aumentando no próximo ano, mas em ritmo mais lento”, afirma o economista Bráulio Borges, da LCA Consultoria. “Também é pouco provável que os juros caiam significativamente.” Em qualquer um dos casos, é preciso cuidado antes de recorrer a empréstimos de curto prazo — os juros cobrados pelos bancos estão quase tão altos quanto no final de 2008.

Quais as vantagens em negociar agora com os bancos para garantir limites de crédito préaprovados para 2011?

As linhas de crédito mais vantajosas para pequenas e médias empresas em crescimento são as subsidiadas pelo governo. Os prazos de pagamento  podem chegar a cinco anos — o dobro da média de espera nos bancos privados — no caso de empréstimos para investimentos em máquinas, veículos, infraestrutura e outros itens necessários à produção. Para conseguir o dinheiro é preciso apresentar projetos que comprovem o destino do investimento. Em casos mais complexos, o estudo da papelada pelos técnicos pode levar meses. “Quem deixar para a última hora corre o risco de não conseguir recursos a tempo de investir para 2011”, diz Carvalho, da Controlcorp. O empreendedor Alexandre Castro Naves, de 40 anos, já tem um limite de crédito pré-aprovado de 1 milhão de reais para investir na expansão de sua empresa, a distribuidora Castro Naves, na cidade mineira de Uberlândia, que vende produtos de limpeza, artigos de papelaria e suprimentos de informática para grandes empresas. Para 2011, Castro Naves pretende aumentar em 15% as vendas, que devem fechar em 15 milhões de reais até dezembro. “Nossos clientes estão contratando mais funcionários e expandindo”, diz ele. “As encomendas já começaram a aumentar.”

Também é preciso se apressar se a preferência for receber dinheiro de investidores em vez de tomar empréstimos?

Estima-se que os fundos de capital de risco tenham hoje cerca de 3 bilhões de reais para colocar em pequenas e médias empresas brasileiras — seis vezes mais do que há cinco anos. Além disso, a recente onda de fusões e aquisições trouxe como resultado muitos empreendedores com dinheiro e experiência acumulada dispostos a investir em negócios emergentes. Nos dois casos, é bom começar logo as tratativas para contar com o dinheiro a tempo. “Avaliar uma empresa e definir o tamanho do investimento pode levar meses”, diz Rocha, da Deal Maker. Desde agosto, o empreendedor Luis Carlos Nacif, de 48 anos, e seu sobrinho Felipe Nacif, de 32, vêm negociando com dois fundos interessados em participar da empresa deles, a Microcity. Situada na cidade mineira de Nova Lima, a Microcity aluga microcomputadores e servidores de redes de comunicação para grandes empresas. Quando o dinheiro dos investidores entrar, os Nacif vão usá-lo para comprar concorrentes. “Duas aquisições podem ser fechadas nos primeiros meses de 2011”, diz Luis Carlos. É com a compra de outras empresas que a família pretende dobrar, no próximo ano, as receitas da Microcity, que devem chegar a 70 milhões de reais em 2010.

Ainda dá tempo de abrir o capital na bolsa no próximo ano?

Se a empresa atender pelo menos às principais exigências do Bovespa Mais — o pedaço da bolsa de valores dedicado a emissões de até 100 milhões de reais —, há boas chances de fazer um IPO no segundo semestre de 2011. Entre as exigências mais importantes constam balanços auditados (ou que possam ser auditados no curto prazo) e conselho de administração com pelo menos três cadeiras, por exemplo. “Se não há nada, talvez não dê para colocar a casa em ordem a tempo de abrir o capital em 2011”, diz Tereza Kaneta, da MZ Consult, especializada em relações com investidores. As pequenas e médias empresas que já adotam ao menos parte das práticas consideradas importantes pelo mercado podem aproveitar o restante deste ano para os ajustes que faltam e para fazer um plano para a aplicação dos recursos que serão levantados. “Pode-se já começar a divulgar números gerais do balanço no site para indicar ao mercado a maturidade do negócio”, diz Tereza. Segundo ela, deve-se trabalhar com a perspectiva de 12 meses entre tomar a decisão de abrir o capital e o dia da oferta inicial de ações para evitar muita correria. “Os advogados e bancos de investimento devem ser contratados com seis meses de antecedência da data da abertura de capital”, diz Tereza.

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