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Franqueados nota 10

As estratégias de quem cresce com múltiplas franquias - e o que eles têm a ensinar a qualquer empreendedor

Fátima Afonso e sua irmã Ana Maria, donas de 15 lojas franqueadas de quatro redes diferentes (Daniela Toviansky)
DR

Da Redação

Publicado em 6 de junho de 2012 às 15h52.

São Paulo - Nos últimos anos, as franquias vivem um momento de inédito crescimento no Brasil. Segundo dados da Associação Brasileira de Franchising, o faturamento das redes cresceu a uma média anual de 13,5% desde 2001, chegando a 89 bilhões de reais no ano passado.

À medida que o sistema se consolida, surge um contingente de empreendedores dispostos a liderar não uma, mas várias lojas — uma forma de crescer dentro do próprio modelo de negócios. "Faz parte das estratégias das redes concentrar mais unidades nas mãos de seus melhores franqueados", diz o consultor Marcelo Cherto.

O fenômeno beneficia tanto franqueados quanto franqueadores. "Há estudos que demonstram que franquias concedidas a quem já opera outras unidades tendem a ter melhor desempenho", diz Francine Lafontaine, professora na escola de negócios da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos.

Na prática, ocorre uma espécie de seleção natural dos empreen­dedores. Os mais capazes para administrar um negócio, reduzir custos e aumentar a rentabilidade ganham condições de crescer abrindo novas lojas. É o caso dos franqueados que aparecem nesta reportagem. Há histórias como a de Miquéias Carvalho, que cresce ao comprar franquias em dificuldades e ao aplicar um choque de gestão para recuperá-las.


Ou o de Jomar Góes Nunes, que aproveita os ganhos de escala para abrir várias unidades. A multiplicação dos superfranqueados no Brasil é a repetição de um fenômeno que já ocorreu em mercados maduros, como os Estados Unidos, onde há empresas como a NPC International Inc., que opera 1.143 lojas da rede Pizza Hut.

Mais do que apontar uma tendência, os homens e as mulheres de negócios retratados nas próximas páginas são protagonistas de casos exemplares nas áreas de gestão e de estratégia. A visão que tiveram ou as medidas que adotaram os tornaram referência dentro de suas redes. A experiência deles pode ser inspiradora — não só para quem quer ter uma franquia mas para aqueles que buscam alternativas de crescimento para suas empresas.

1Ele vende chá-mate na terra da água de coco

O engenheiro agrônomo Jomar Góes Nunes, de 43 anos, teve a coragem de desafiar o senso comum que dizia que vender uma bebida como o mate em pleno Nordeste brasileiro era o caminho certo para o fracasso. Nunes é dono de seis lojas do Rei do Mate em Salvador, na Bahia, e no ano passado faturou 3 milhões de reais com um negócio inicialmente desacreditado.

"Hoje, ele é um dos nossos campeões em rentabilidade", diz João Batista da Silva Júnior, diretor de franquias do Rei do Mate. “A lucratividade de suas lojas é 20% maior que a média da rede."

Para crescer com franquias, Nunes aproveitou uma das principais características desse modelo de expansão — a possibilidade de abrir várias unidades sem precisar aumentar muito os custos administrativos. Depois da quarta loja, passou a concentrar a gestão de todas as unidades num escritório central.


"Como as redes têm processos de gestão padronizados, o franqueado pode cuidar de várias lojas ao mesmo tempo com a mesma estrutura administrativa", afirma a consultora Claudia Bittencourt, especializada em franquias. "Nem sempre, no entanto, os donos das unidades aproveitam essa oportunidade para crescer mais."

Sua transformação em franqueado exemplar deu-se após um período difícil de conhecimento dos hábitos do consumidor e adaptação dos produtos ao mercado. Ao abrir sua primeira loja, em 2004, Nunes não tinha experiência no varejo . Seu negócio era produzir café e criar gado e cavalos em duas fazendas da família no interior da Bahia.

"Era uma época ruim e eu estava desanimado", diz. "O preço do café estava baixo e havia uma seca muito forte." Nunes estava à procura de uma atividade mais rentável quando um irmão sugeriu que ele abrisse uma franquia do Rei do Mate, marca que havia conhecido num shopping de Salvador.

"Entrei em contato com os executivos da rede e comecei a negociar a abertura de uma unidade", afirma ele. Em pouco tempo, no entanto, Nunes descobriu que o chá-mate e seus derivados, um dos principais produtos da rede no Sul e no Sudeste, eram rejeitados pelos baianos.

Os sete meses que se seguiram à abertura da primeira loja foram assustadores. "De cada dez pessoas a quem oferecíamos uma degustação das bebidas, sete recusavam", diz Nunes. Ele chegou a achar que havia rasgado os 250.000 reais investidos na unidade de 58 metros quadrados.

O negócio só começou a vingar quando Nunes percebeu que, para crescer, teria de se adaptar. Embora a rede se chamasse Rei do Mate, decidiu investir na degustação de outros produtos do cardápio, como lanches e bebidas à base de café.


"Só aos poucos, à medida que os clientes começaram a voltar, é que insisti no chá", diz ele. Hoje Nunes divide a administração do grupo de lojas com a mulher, a psicóloga Ana Silva Pires, de 36 anos, responsável principalmente pela gestão da área de recursos humanos. Os vaticínios de fracasso se tornaram uma promessa de crescimento. "Vou abrir mais quatro lojas nos próximos anos", diz Nunes.

2Sucesso nas cidades emergentes no interior do Brasil

Há pouco mais de dez anos, os empreendedores Milton Takabayashi e sua mulher, Kiyomi Ide, ambos de 47 anos, estavam à procura de um bom lugar para viver. Na época, os dois voltavam de uma temporada de oito anos no Japão, onde se conheceram trabalhando em fábricas de autopeças e de alimentos.

"Tínhamos guardado algum dinheiro e queríamos investir num negócio próprio", afirma Takabayashi. Sua dúvida era onde, exatamente, se estabelecer para começar uma vida nova. A recifense Kiyomi não gostava da ideia de morar em São Paulo, cidade natal de Milton.

"Queríamos um lugar com as facilidades parecidas com as de uma metrópole, mas onde não tivéssemos tantas preocupações com trânsito e com segurança", diz ele. "Além disso, claro, buscávamos um bom mercado para abrir uma empresa."

A procura por um local onde encontrassem boas perspectivas de negócios sem abrir mão da qualidade de vida os levou para o interior do país.

Depois de avaliar dezenas de cidades, eles acabaram se estabelecendo em Londrina, no norte do Paraná. A cidade não só reunia as características desejadas como também ficava próxima a outros municípios semelhantes, para onde poderiam estender seus negócios. Foi lá que, em 2001, Takabayashi e Kiyomi abriram seu primeiro negócio — uma unidade da rede de franquias de comida asiática Jin Jin Wok.


No interior, eles encontraram um mercado em expansão, com custos menores do que nas grandes metrópoles. Segundo Takabayashi, uma loja num shopping do interior paranaense tem custos de aluguel, condomínio e fundo de propaganda até 30% menores que numa capital como São Paulo .

A primeira unidade aberta pelo casal, a Jin Jin no Shopping Catuaí, em Londrina, faturou no ano passado cerca de 2,5 milhões de reais. "Takabayashi e Kiyomi estão entre os campeões de venda na rede", diz Jae Ho Lee, fundador da rede Jin Jin. "Com custos menores, eles também estão entre os franqueados mais rentáveis." Em 2011, as franquias do casal, que em conjunto empregam 100 pessoas, faturaram 10 milhões de reais.

Ao avançar rumo às cidades menores, Takabayashi e Kiyomi acabaram seguindo uma tendência do varejo do país. Segundo um balanço feito pela Associação Brasileira de Lojistas de Shopping em parceria com o Ibope Inteligência, dois terços dos 113 shopping centers em construção no Brasil atualmente estão fora das capitais, impulsionados pelo crescente poder de consumo da população que vive nas pequenas cidades.

Hoje, Takabayashi e Kiyomi são donos de oito unidades franqueadas de três marcas diferentes — seis restaurantes Jin Jin, uma loja de bijuterias da rede Morana e uma unidade da rede de alimentação Roasted Potato. Quase todas as unidades ficam em cidades do interior do Paraná, como Londrina, Maringá e Foz do Iguaçu. A exceção é uma loja Jin Jin localizada em Curitiba, no Shopping Barigui.

3O negócio dele é arrumar franquias em frangalhos

O empreendedor Miquéias Carvalho, de 30 anos, vem se transformando num salvador de franquias em dificuldade. Em 2008, ele trabalhava como diretor de uma escola em Santo André, no ABC paulista, quando recebeu uma proposta para se tornar empreendedor. Dois empresários da cidade de Mogi das Cruzes, donos de uma escola profissionalizante de cabeleireiros da rede Embelleze, propuseram-lhe sociedade no negócio.


“Eles estavam em dificuldades por não entender bem como conduzir a gestão de uma escola”, afirma Carvalho. "Em um ano e meio de atividade, acumularam prejuízos e não sabiam como reverter a situação."  Como ele já tinha alguma experiência nesse setor, aceitou o desafio e investiu 30.000 reais para entrar na sociedade. Ao chegar, seu primeiro trabalho foi fazer um diagnóstico da situação.

"A escola tinha muitos problemas básicos de gestão, e os funcionários, com salários atrasados, estavam desmotivados", diz Carvalho. "Vi uma grande oportunidade de fazer diferença. Sabia o que era preciso para melhorar a situação." Carvalho mapeou os problemas e estabeleceu metas.

Em dois meses, conseguiu organizar a parte financeira: propôs um aporte dos sócios para levantar capital de giro e equilibrar as finanças, adotou práticas como o registro do fluxo de caixa diário, fez previsões de entradas e impôs reduções de gastos. Depois foi a hora de olhar para as vendas.

"O mais difícil nessa fase era fazer com que os funcionários acreditassem no negócio. Eles ouviam minhas propostas e falavam que nada daquilo daria certo. Chegaram a me dizer que a escola estava amaldiçoada", diz Carvalho. Para motivar o pessoal, além de regularizar os pagamentos, Carvalho reuniu os funcionários para explicar as mudanças que faria e mostrar como elas ajudariam a melhorar os resultados.

Em 2009, após o choque de gestão, a unidade faturou 690 000 reais, um crescimento de 126% em relação ao ano anterior. A recuperação da escola chamou a atenção da franqueadora, que passou a oferecer outras unidades problemáticas aos sócios. No fim de 2010, eles compraram a unidade de Guaianases, bairro na zona leste de São Paulo próximo a Mogi das Cruzes.

Depois adquiriram as unidades do Jaçanã, na região norte da cidade, e escolas nos municípios de Itaquaquecetuba e Suzano. As escolas custaram em média 100.000 reais cada uma, cerca de metade do que custariam unidades financeiramente saudáveis.


"A lógica é semelhante à de alguns fundos de capital de risco, que procuram negócios capengas visando ao lucro potencial ao arrumar a casa", diz Leslie Charm, professor de empreendedorismo no Babson College. Em 2012, primeiro ano com as cinco escolas em funcionamento, a expectativa de faturamento de Carvalho e seus sócios é de 3 milhões de reais.

4Roupas para toda a família, o ano todo

Na última década, a empreendedora Fátima Afonso, de 43 anos, e sua irmã Ana Maria, de 40, superaram um dos principais desafios no setor de moda — as oscilações nas vendas durante o ano, o que pode ser catastrófico para o fluxo de caixa. Elas são donas de 15 lojas franqueadas de quatro redes diferentes.

Para compor seu grupo de lojas, Fátima e Ana Maria abriram unidades de marcas que têm picos de vendas em momentos distintos do ano. As duas comandam oito unidades da Hering, três de meias e roupas íntimas da Lupo, duas de sandálias Havaianas e duas de roupas infantis PUC, que juntas faturaram 13 milhões de reais em 2011.

A loja da Hering no Shopping Santa Cruz, na zona sul de São Paulo, está entre as 20 campeãs de vendas do Brasil desde 2004. "Camisetas e sandálias vendem mais no verão, e as meias da Lupo têm mais saída no inverno. E criança precisa de roupa nova o ano todo", diz Fátima. Há riscos, porém, nesse tipo de diversificação.

"A gestão dos negócios pode se tornar complexa demais e nem todas as redes de franquias permitem que os franqueados tenham lojas de marcas diferentes", diz o consultor Batista Gigliotti.

5De vendedor ambulante a rei do chope na praia

Dia de praia com sol de rachar, com a temperatura de 40 graus à sombra. Eis o clima ideal para o empreendedor carioca Rafael Feitosa, de 30 anos — se for Carnaval ou Réveillon, com milhares de turistas lotando hotéis e disputando espaço na areia das praias do Rio de Janeiro, melhor ainda.


Dono de uma frota de 70 carrinhos de Chopp Brahma, uma das principais marcas da cervejaria Ambev, Feitosa chega a vender 30.000 litros de chope por dia nas ruas do Rio de Janeiro. "Para mim, quanto mais quente, melhor", diz ele.

Hoje, Feitosa é um dos principais microfranqueados da Ambev no país. No ano passado, suas receitas com os carrinhos chegaram a 700.000 reais. Como empreendedor, ele conseguiu um feito raro.

O modelo de microfranquia, definido como uma franquia de investimento máximo de 50 000 reais, é concebido para ser tocado por uma única pessoa, geralmente alguém que não tem capital suficiente para abrir um negócio mais robusto. "Raramente compensa manter várias microfranquias, pois elas preveem custos baixos e uma taxa de retorno bastante apertada", diz a consultora Ana Vecchi.

Feitosa, portanto, está longe de ser um microfranqueado típico. Para crescer com esse modelo, ele buscou inspiração num tipo de relação bastante comum entre os vendedores ambulantes, que compram seus produtos de um grande distribuidor e saem revendendo pelas ruas com algum lucro.

Era um modelo de atuação que Feitosa conhecia bem. Nascido numa comunidade em Madureira, zona norte do Rio, ele começou a trabalhar aos 12 anos. "Eu saía de casa com uma caixa de isopor cheia de água e refrigerante para vender no ponto de ônibus", diz ele.

No caso dos carrinhos, Feitosa contrata ambulantes autônomos com registro na prefeitura do Rio de Janeiro, a quem cede uniforme e empresta os carrinhos da Ambev. "Eu vendo a eles o barril de chope e forneço o gelo e o gás carbônico necessários para a bebida", diz.

"Eles tiram o lucro da diferença entre o que eu cobro por barril e o preço do chope que o consumidor paga." Para tornar o negócio mais interessante, Feitosa oferece prêmios como cestas básicas, eletroeletrônicos e barris de chope aos melhores vendedores. Para aumentar seus resultados, também procurou diminuir custos que outros microfranqueados dos carrinhos costumam ter.


Em vez de comprar com um fornecedor local, por exemplo, ele passou a produzir seu próprio gelo. "O investimento na máquina de gelo e numa câmara fria, de 70.000 reais, foi recuperado em menos de oito meses", diz Feitosa.

A ideia de investir nos carrinhos surgiu em 2009, quando ele percebeu o potencial de crescimento que teria vendendo chope gelado sob o sol carioca. Feitosa já era dono de uma distribuidora de bebidas e de uma distribuidora de jornais (somados, seus negócios, que incluem outra franquia da Ambev , o Quiosque Chopp Brahma, faturaram 3 milhões de reais em 2011).

Na época, ele negociou com a Ambev a compra de 20 carrinhos e a exclusividade para vender chope nas praias da zona sul do Rio. Ao fim do primeiro ano, a frota de chopeiras sobre rodinhas já era de 40, e o faturamento registrado até dezembro foi de 200.000 reais.

6Crescimento sem sair da velha vizinhança

Os engenheiros Daniel Uemura, de 36 anos, e Simone Hayashi, de 37, são os maiores franqueados da Influx, rede de escolas de idiomas com sede em Curitiba. Com cinco escolas sob seu comando, eles faturaram 3,5 milhões de reais no ano passado.

Todas as unidades foram abertas na Grande São Paulo, nas cidades de Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul e Guarulhos - e, por enquanto, eles não pretendem ir mais longe. "Já começo a achar Guarulhos distante demais", diz Uemura. "Para ir até lá, é preciso atravessar a cidade de São Paulo e acabo perdendo horas no trânsito."


Aproveitar as oportunidades que surgem num grande mercado concentrado numa pequena região foi a  opção dos sócios para crescer com franquias. A ideia de abrir escolas de idiomas surgiu quando o casal ainda cursava engenharia em São Bernardo do Campo.

"Durante a faculdade, eu dava aulas de inglês e percebi que a região do ABC paulista tinha uma grande demanda", diz ele. Depois de formados, os dois trabalharam durante três anos em empresas de telecomunicações, como Net, Nokia e Motorola. "Guardávamos 1.000 reais por mês para, um dia, abrirmos nosso próprio negócio", afirma Simone.

Em 2000, eles investiram 40.000 reais para abrir uma escola de inglês da rede Wisdom em São Caetano do Sul. Dois anos depois, inauguraram a segunda unidade. Em 2004, decidiram romper com a Wisdom e transferir suas escolas para a Influx. Há dois anos, Simone e Uemura abriram mais duas franquias.

A proximidade geográfica permite aproveitar melhor os investimentos em marketing, concentrando a publicidade na região. Eles também veem vantagens no aproveitamento dos funcionários. "Quando um professor falta, é mais fácil deslocar alguém de uma cidade vizinha para cobrir a ausência", diz Uemura.

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São Paulo - Nos últimos anos, as franquias vivem um momento de inédito crescimento no Brasil. Segundo dados da Associação Brasileira de Franchising, o faturamento das redes cresceu a uma média anual de 13,5% desde 2001, chegando a 89 bilhões de reais no ano passado.

À medida que o sistema se consolida, surge um contingente de empreendedores dispostos a liderar não uma, mas várias lojas — uma forma de crescer dentro do próprio modelo de negócios. "Faz parte das estratégias das redes concentrar mais unidades nas mãos de seus melhores franqueados", diz o consultor Marcelo Cherto.

O fenômeno beneficia tanto franqueados quanto franqueadores. "Há estudos que demonstram que franquias concedidas a quem já opera outras unidades tendem a ter melhor desempenho", diz Francine Lafontaine, professora na escola de negócios da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos.

Na prática, ocorre uma espécie de seleção natural dos empreen­dedores. Os mais capazes para administrar um negócio, reduzir custos e aumentar a rentabilidade ganham condições de crescer abrindo novas lojas. É o caso dos franqueados que aparecem nesta reportagem. Há histórias como a de Miquéias Carvalho, que cresce ao comprar franquias em dificuldades e ao aplicar um choque de gestão para recuperá-las.


Ou o de Jomar Góes Nunes, que aproveita os ganhos de escala para abrir várias unidades. A multiplicação dos superfranqueados no Brasil é a repetição de um fenômeno que já ocorreu em mercados maduros, como os Estados Unidos, onde há empresas como a NPC International Inc., que opera 1.143 lojas da rede Pizza Hut.

Mais do que apontar uma tendência, os homens e as mulheres de negócios retratados nas próximas páginas são protagonistas de casos exemplares nas áreas de gestão e de estratégia. A visão que tiveram ou as medidas que adotaram os tornaram referência dentro de suas redes. A experiência deles pode ser inspiradora — não só para quem quer ter uma franquia mas para aqueles que buscam alternativas de crescimento para suas empresas.

1Ele vende chá-mate na terra da água de coco

O engenheiro agrônomo Jomar Góes Nunes, de 43 anos, teve a coragem de desafiar o senso comum que dizia que vender uma bebida como o mate em pleno Nordeste brasileiro era o caminho certo para o fracasso. Nunes é dono de seis lojas do Rei do Mate em Salvador, na Bahia, e no ano passado faturou 3 milhões de reais com um negócio inicialmente desacreditado.

"Hoje, ele é um dos nossos campeões em rentabilidade", diz João Batista da Silva Júnior, diretor de franquias do Rei do Mate. “A lucratividade de suas lojas é 20% maior que a média da rede."

Para crescer com franquias, Nunes aproveitou uma das principais características desse modelo de expansão — a possibilidade de abrir várias unidades sem precisar aumentar muito os custos administrativos. Depois da quarta loja, passou a concentrar a gestão de todas as unidades num escritório central.


"Como as redes têm processos de gestão padronizados, o franqueado pode cuidar de várias lojas ao mesmo tempo com a mesma estrutura administrativa", afirma a consultora Claudia Bittencourt, especializada em franquias. "Nem sempre, no entanto, os donos das unidades aproveitam essa oportunidade para crescer mais."

Sua transformação em franqueado exemplar deu-se após um período difícil de conhecimento dos hábitos do consumidor e adaptação dos produtos ao mercado. Ao abrir sua primeira loja, em 2004, Nunes não tinha experiência no varejo . Seu negócio era produzir café e criar gado e cavalos em duas fazendas da família no interior da Bahia.

"Era uma época ruim e eu estava desanimado", diz. "O preço do café estava baixo e havia uma seca muito forte." Nunes estava à procura de uma atividade mais rentável quando um irmão sugeriu que ele abrisse uma franquia do Rei do Mate, marca que havia conhecido num shopping de Salvador.

"Entrei em contato com os executivos da rede e comecei a negociar a abertura de uma unidade", afirma ele. Em pouco tempo, no entanto, Nunes descobriu que o chá-mate e seus derivados, um dos principais produtos da rede no Sul e no Sudeste, eram rejeitados pelos baianos.

Os sete meses que se seguiram à abertura da primeira loja foram assustadores. "De cada dez pessoas a quem oferecíamos uma degustação das bebidas, sete recusavam", diz Nunes. Ele chegou a achar que havia rasgado os 250.000 reais investidos na unidade de 58 metros quadrados.

O negócio só começou a vingar quando Nunes percebeu que, para crescer, teria de se adaptar. Embora a rede se chamasse Rei do Mate, decidiu investir na degustação de outros produtos do cardápio, como lanches e bebidas à base de café.


"Só aos poucos, à medida que os clientes começaram a voltar, é que insisti no chá", diz ele. Hoje Nunes divide a administração do grupo de lojas com a mulher, a psicóloga Ana Silva Pires, de 36 anos, responsável principalmente pela gestão da área de recursos humanos. Os vaticínios de fracasso se tornaram uma promessa de crescimento. "Vou abrir mais quatro lojas nos próximos anos", diz Nunes.

2Sucesso nas cidades emergentes no interior do Brasil

Há pouco mais de dez anos, os empreendedores Milton Takabayashi e sua mulher, Kiyomi Ide, ambos de 47 anos, estavam à procura de um bom lugar para viver. Na época, os dois voltavam de uma temporada de oito anos no Japão, onde se conheceram trabalhando em fábricas de autopeças e de alimentos.

"Tínhamos guardado algum dinheiro e queríamos investir num negócio próprio", afirma Takabayashi. Sua dúvida era onde, exatamente, se estabelecer para começar uma vida nova. A recifense Kiyomi não gostava da ideia de morar em São Paulo, cidade natal de Milton.

"Queríamos um lugar com as facilidades parecidas com as de uma metrópole, mas onde não tivéssemos tantas preocupações com trânsito e com segurança", diz ele. "Além disso, claro, buscávamos um bom mercado para abrir uma empresa."

A procura por um local onde encontrassem boas perspectivas de negócios sem abrir mão da qualidade de vida os levou para o interior do país.

Depois de avaliar dezenas de cidades, eles acabaram se estabelecendo em Londrina, no norte do Paraná. A cidade não só reunia as características desejadas como também ficava próxima a outros municípios semelhantes, para onde poderiam estender seus negócios. Foi lá que, em 2001, Takabayashi e Kiyomi abriram seu primeiro negócio — uma unidade da rede de franquias de comida asiática Jin Jin Wok.


No interior, eles encontraram um mercado em expansão, com custos menores do que nas grandes metrópoles. Segundo Takabayashi, uma loja num shopping do interior paranaense tem custos de aluguel, condomínio e fundo de propaganda até 30% menores que numa capital como São Paulo .

A primeira unidade aberta pelo casal, a Jin Jin no Shopping Catuaí, em Londrina, faturou no ano passado cerca de 2,5 milhões de reais. "Takabayashi e Kiyomi estão entre os campeões de venda na rede", diz Jae Ho Lee, fundador da rede Jin Jin. "Com custos menores, eles também estão entre os franqueados mais rentáveis." Em 2011, as franquias do casal, que em conjunto empregam 100 pessoas, faturaram 10 milhões de reais.

Ao avançar rumo às cidades menores, Takabayashi e Kiyomi acabaram seguindo uma tendência do varejo do país. Segundo um balanço feito pela Associação Brasileira de Lojistas de Shopping em parceria com o Ibope Inteligência, dois terços dos 113 shopping centers em construção no Brasil atualmente estão fora das capitais, impulsionados pelo crescente poder de consumo da população que vive nas pequenas cidades.

Hoje, Takabayashi e Kiyomi são donos de oito unidades franqueadas de três marcas diferentes — seis restaurantes Jin Jin, uma loja de bijuterias da rede Morana e uma unidade da rede de alimentação Roasted Potato. Quase todas as unidades ficam em cidades do interior do Paraná, como Londrina, Maringá e Foz do Iguaçu. A exceção é uma loja Jin Jin localizada em Curitiba, no Shopping Barigui.

3O negócio dele é arrumar franquias em frangalhos

O empreendedor Miquéias Carvalho, de 30 anos, vem se transformando num salvador de franquias em dificuldade. Em 2008, ele trabalhava como diretor de uma escola em Santo André, no ABC paulista, quando recebeu uma proposta para se tornar empreendedor. Dois empresários da cidade de Mogi das Cruzes, donos de uma escola profissionalizante de cabeleireiros da rede Embelleze, propuseram-lhe sociedade no negócio.


“Eles estavam em dificuldades por não entender bem como conduzir a gestão de uma escola”, afirma Carvalho. "Em um ano e meio de atividade, acumularam prejuízos e não sabiam como reverter a situação."  Como ele já tinha alguma experiência nesse setor, aceitou o desafio e investiu 30.000 reais para entrar na sociedade. Ao chegar, seu primeiro trabalho foi fazer um diagnóstico da situação.

"A escola tinha muitos problemas básicos de gestão, e os funcionários, com salários atrasados, estavam desmotivados", diz Carvalho. "Vi uma grande oportunidade de fazer diferença. Sabia o que era preciso para melhorar a situação." Carvalho mapeou os problemas e estabeleceu metas.

Em dois meses, conseguiu organizar a parte financeira: propôs um aporte dos sócios para levantar capital de giro e equilibrar as finanças, adotou práticas como o registro do fluxo de caixa diário, fez previsões de entradas e impôs reduções de gastos. Depois foi a hora de olhar para as vendas.

"O mais difícil nessa fase era fazer com que os funcionários acreditassem no negócio. Eles ouviam minhas propostas e falavam que nada daquilo daria certo. Chegaram a me dizer que a escola estava amaldiçoada", diz Carvalho. Para motivar o pessoal, além de regularizar os pagamentos, Carvalho reuniu os funcionários para explicar as mudanças que faria e mostrar como elas ajudariam a melhorar os resultados.

Em 2009, após o choque de gestão, a unidade faturou 690 000 reais, um crescimento de 126% em relação ao ano anterior. A recuperação da escola chamou a atenção da franqueadora, que passou a oferecer outras unidades problemáticas aos sócios. No fim de 2010, eles compraram a unidade de Guaianases, bairro na zona leste de São Paulo próximo a Mogi das Cruzes.

Depois adquiriram as unidades do Jaçanã, na região norte da cidade, e escolas nos municípios de Itaquaquecetuba e Suzano. As escolas custaram em média 100.000 reais cada uma, cerca de metade do que custariam unidades financeiramente saudáveis.


"A lógica é semelhante à de alguns fundos de capital de risco, que procuram negócios capengas visando ao lucro potencial ao arrumar a casa", diz Leslie Charm, professor de empreendedorismo no Babson College. Em 2012, primeiro ano com as cinco escolas em funcionamento, a expectativa de faturamento de Carvalho e seus sócios é de 3 milhões de reais.

4Roupas para toda a família, o ano todo

Na última década, a empreendedora Fátima Afonso, de 43 anos, e sua irmã Ana Maria, de 40, superaram um dos principais desafios no setor de moda — as oscilações nas vendas durante o ano, o que pode ser catastrófico para o fluxo de caixa. Elas são donas de 15 lojas franqueadas de quatro redes diferentes.

Para compor seu grupo de lojas, Fátima e Ana Maria abriram unidades de marcas que têm picos de vendas em momentos distintos do ano. As duas comandam oito unidades da Hering, três de meias e roupas íntimas da Lupo, duas de sandálias Havaianas e duas de roupas infantis PUC, que juntas faturaram 13 milhões de reais em 2011.

A loja da Hering no Shopping Santa Cruz, na zona sul de São Paulo, está entre as 20 campeãs de vendas do Brasil desde 2004. "Camisetas e sandálias vendem mais no verão, e as meias da Lupo têm mais saída no inverno. E criança precisa de roupa nova o ano todo", diz Fátima. Há riscos, porém, nesse tipo de diversificação.

"A gestão dos negócios pode se tornar complexa demais e nem todas as redes de franquias permitem que os franqueados tenham lojas de marcas diferentes", diz o consultor Batista Gigliotti.

5De vendedor ambulante a rei do chope na praia

Dia de praia com sol de rachar, com a temperatura de 40 graus à sombra. Eis o clima ideal para o empreendedor carioca Rafael Feitosa, de 30 anos — se for Carnaval ou Réveillon, com milhares de turistas lotando hotéis e disputando espaço na areia das praias do Rio de Janeiro, melhor ainda.


Dono de uma frota de 70 carrinhos de Chopp Brahma, uma das principais marcas da cervejaria Ambev, Feitosa chega a vender 30.000 litros de chope por dia nas ruas do Rio de Janeiro. "Para mim, quanto mais quente, melhor", diz ele.

Hoje, Feitosa é um dos principais microfranqueados da Ambev no país. No ano passado, suas receitas com os carrinhos chegaram a 700.000 reais. Como empreendedor, ele conseguiu um feito raro.

O modelo de microfranquia, definido como uma franquia de investimento máximo de 50 000 reais, é concebido para ser tocado por uma única pessoa, geralmente alguém que não tem capital suficiente para abrir um negócio mais robusto. "Raramente compensa manter várias microfranquias, pois elas preveem custos baixos e uma taxa de retorno bastante apertada", diz a consultora Ana Vecchi.

Feitosa, portanto, está longe de ser um microfranqueado típico. Para crescer com esse modelo, ele buscou inspiração num tipo de relação bastante comum entre os vendedores ambulantes, que compram seus produtos de um grande distribuidor e saem revendendo pelas ruas com algum lucro.

Era um modelo de atuação que Feitosa conhecia bem. Nascido numa comunidade em Madureira, zona norte do Rio, ele começou a trabalhar aos 12 anos. "Eu saía de casa com uma caixa de isopor cheia de água e refrigerante para vender no ponto de ônibus", diz ele.

No caso dos carrinhos, Feitosa contrata ambulantes autônomos com registro na prefeitura do Rio de Janeiro, a quem cede uniforme e empresta os carrinhos da Ambev. "Eu vendo a eles o barril de chope e forneço o gelo e o gás carbônico necessários para a bebida", diz.

"Eles tiram o lucro da diferença entre o que eu cobro por barril e o preço do chope que o consumidor paga." Para tornar o negócio mais interessante, Feitosa oferece prêmios como cestas básicas, eletroeletrônicos e barris de chope aos melhores vendedores. Para aumentar seus resultados, também procurou diminuir custos que outros microfranqueados dos carrinhos costumam ter.


Em vez de comprar com um fornecedor local, por exemplo, ele passou a produzir seu próprio gelo. "O investimento na máquina de gelo e numa câmara fria, de 70.000 reais, foi recuperado em menos de oito meses", diz Feitosa.

A ideia de investir nos carrinhos surgiu em 2009, quando ele percebeu o potencial de crescimento que teria vendendo chope gelado sob o sol carioca. Feitosa já era dono de uma distribuidora de bebidas e de uma distribuidora de jornais (somados, seus negócios, que incluem outra franquia da Ambev , o Quiosque Chopp Brahma, faturaram 3 milhões de reais em 2011).

Na época, ele negociou com a Ambev a compra de 20 carrinhos e a exclusividade para vender chope nas praias da zona sul do Rio. Ao fim do primeiro ano, a frota de chopeiras sobre rodinhas já era de 40, e o faturamento registrado até dezembro foi de 200.000 reais.

6Crescimento sem sair da velha vizinhança

Os engenheiros Daniel Uemura, de 36 anos, e Simone Hayashi, de 37, são os maiores franqueados da Influx, rede de escolas de idiomas com sede em Curitiba. Com cinco escolas sob seu comando, eles faturaram 3,5 milhões de reais no ano passado.

Todas as unidades foram abertas na Grande São Paulo, nas cidades de Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul e Guarulhos - e, por enquanto, eles não pretendem ir mais longe. "Já começo a achar Guarulhos distante demais", diz Uemura. "Para ir até lá, é preciso atravessar a cidade de São Paulo e acabo perdendo horas no trânsito."


Aproveitar as oportunidades que surgem num grande mercado concentrado numa pequena região foi a  opção dos sócios para crescer com franquias. A ideia de abrir escolas de idiomas surgiu quando o casal ainda cursava engenharia em São Bernardo do Campo.

"Durante a faculdade, eu dava aulas de inglês e percebi que a região do ABC paulista tinha uma grande demanda", diz ele. Depois de formados, os dois trabalharam durante três anos em empresas de telecomunicações, como Net, Nokia e Motorola. "Guardávamos 1.000 reais por mês para, um dia, abrirmos nosso próprio negócio", afirma Simone.

Em 2000, eles investiram 40.000 reais para abrir uma escola de inglês da rede Wisdom em São Caetano do Sul. Dois anos depois, inauguraram a segunda unidade. Em 2004, decidiram romper com a Wisdom e transferir suas escolas para a Influx. Há dois anos, Simone e Uemura abriram mais duas franquias.

A proximidade geográfica permite aproveitar melhor os investimentos em marketing, concentrando a publicidade na região. Eles também veem vantagens no aproveitamento dos funcionários. "Quando um professor falta, é mais fácil deslocar alguém de uma cidade vizinha para cobrir a ausência", diz Uemura.

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