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Diversificar ou manter o foco num único produto?

A Touch Watches vem crescendo ao vender relógios descolados para jovens consumidores emergentes. Agora seus sócios se perguntam se é o momento de lançar outros produtos

Marcelo Di Giorgio e Marcelo Amado, donos da fabricante de relógios Touch Watches. (Marcelo Correa)
DR

Da Redação

Publicado em 1 de maio de 2011 às 08h00.

Aprimeira vez que os sócios Marcelo Di Giorgio, de 42 anos, e Marcelo Amado, de 37, venderam relógios juntos foi no começo dos anos 90. Recém-saídos da faculdade, eles passavam uma temporada de intercâmbio na ilha de Mallorca, na Espanha, quando conseguiram um trabalho como representantes de uma pequena fábrica local que pertencia a um relojoeiro suíço.

“Enchíamos um furgão com relógios e saíamos vendendo para as lojas à beira-mar”, diz Di Giorgio. “Eram peças baratas que muitos turistas compravam como suvenir.” Quase duas décadas depois, Di Giorgio e Amado estão vivendo uma espécie de volta ao passado. Há dois anos, eles criaram a Touch Watches, fabricante de relógios com sede no Rio de Janeiro.

No ano passado, a empresa faturou 42 milhões de reais — suas vendas são feitas numa rede de 64 lojas franqueadas, a maioria em shopping centers. Com produtos que custam a partir de 60 reais, seu principal público é formado por jovens e consumidores emergentes, que veem na marca uma alternativa barata para comprar relógios descolados e coloridos — os produtos da Touch Watches são inspirados nas peças da suíça Swatch, uma das primeiras relojoarias a tentar unir preço baixo a design moderno.

“Percebemos que estava surgindo no Brasil um perfil de consumidor parecido com o que encontrávamos quando vivíamos na Espanha”, diz Di Giorgio. “São consumidores ávidos por comprar, mas que, ao mesmo tempo, não encontravam relógios bonitos e que coubessem em seu orçamento.”

Para produzir seus relógios, os sócios da Touch Watches montaram uma cadeia internacional de fornecedores. Os mecanismos que movem os ponteiros são comprados no Japão e enviados a Shenzen, na China, onde um fabricante chinês produz pulseiras e mostradores e outro faz a montagem completa do relógio.

O design é feito por profissionais espanhóis que eles conheceram na década de 90, quando moravam em Mallorca e vendiam relógios pelas ruas. “Temos boa parte de nossa produção na China para diminuir os custos”, afirma Amado. Pelo menos uma vez por mês, um dos sócios viaja a Shenzen para acompanhar de perto a montagem.

Agora os donos da Touch Watches vêm se preparando para começar uma nova etapa. Nos próximos meses, eles vão inaugurar uma fábrica em Manaus, onde pretendem produzir relógios mais caros, que devem chegar ao mercado com preços acima de 200 reais. “É possível ser competitivo fabricando esse tipo de peça no Brasil graças aos incentivos da Zona Franca”, afirma Di Giorgio. “Mas as linhas mais baratas continuarão sendo montadas na China.”


Os sócios já investiram 6 milhões de reais na nova fábrica e agora precisam tomar uma decisão importante para o futuro dos negócios. Para aproveitar melhor a capacidade de produção que terão em Manaus, eles avaliam se chegou o momento de diversificar seu catálogo, passando a fabricar outros tipos de acessórios, como óculos escuros e bijuterias.

Com mais produtos, Di Giorgio e Amado acreditam que seria possível acelerar a expansão ao vender mais para quem já compra seus relógios. Eles temem, no entanto, perder o foco ao mudar agora o que está dando certo e dispersar energias. “A venda de relógios vai indo muito bem”, diz Di Giorgio. “Pode ser mais seguro concentrar nossos esforços num produto que já conhecemos bem.”

Deixar tudo como está e manter o foco nos relógios também tem seus ris­cos. O principal deles é deixar passar a oportunidade de lançar novos pro­dutos num momento de mercado aque­cido. Sem novos acessórios, os do­nos da Touch Watches temem ter de fazer um esforço maior para continuar crescendo, acelerando a abertura de novas lojas e correndo o risco de co­meçar a atuar em mercados nos quais sua marca ainda não é conhecida.

Para uma reflexão sobre as duas alternativas, Exame PME ouviu Raul Randon, fundador da Randon — a empresa nasceu nos anos 50 produzindo freios em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, e cresceu ao diversificar a produção de implementos rodoviários.

Outro ponto de vista é do empreendedor Eduardo Casarini, dono da Flores Online, site de comércio eletrônico que começou vendendo flores e arranjos na internet para depois ampliar sua linha de produtos com presentes e chocolates. Também deu seu parecer o consultor Sérgio Bernardes, sócio da Insight, empresa de consultoria do Rio de Janeiro. Veja o que eles disseram.

Manter o foco nos relógios
Eduardo Casarini, dono da Flores Online

Diversificar a linha de produtos é o tipo de decisão que exige muita reflexão. Acho arriscado que uma empresa nova, como a Touch Watches, trilhe esse caminho agora. Para lançar outros produtos, seus donos provavelmente teriam de criar outras marcas e, com isso, podem dispersar recursos que seriam importantes para fortalecer o negócio principal.

A Flores Online existe há 13 anos e só agora estamos pensando mais seriamente em explorar outros produtos além da entrega de flores em domicílio. Antes de lançar óculos escuros e bijuterias, acredito que Di Giorgio e Amado devem cuidar bem das vendas de relógios para manter a rentabilidade da empresa e fazer caixa. Assim, bem mais tarde, eles terão capital para investir no marketing de novos produtos, quem sabe até contratando artistas famosos para divulgar a marca.


Avaliar os riscos primeiro
Sérgio Bernardes, sócio da consultoria Insight

Os donos da Touch Watches devem evitar um tipo de atitude muito comum entre os empreendedores, que é o excesso de otimismo. Eles estão colhendo bons resultados com os relógios, mas isso não significa que vão alcançar o mesmo sucesso com os produtos que pretendem lançar. Cada mercado tem suas próprias características, e o que deu certo com os relógios pode não se repetir com óculos escuros e bijuterias.

Antes de tomar uma decisão como essa, Di Giorgio e Amato precisam avaliar melhor quais são os riscos da diversificação e quem são os concorrentes que terão de enfrentar — algo que exige muito estudo e paciência. Já há competidores importantes nesses setores, o que pode obrigar a Touch Watches a reduzir as margens, prejudicando a rentabilidade da empresa.Também seria necessário investir em design, como os empreendedores fizeram com os relógios, o que não custa pouco.

Além disso, os investimentos em marketing para o lançamento de um novo produto teriam de vir das receitas que a empresa tem com os relógios — ou seja, seria preciso tirar dinheiro de uma atividade que já vem gerando caixa para investir em outra em que os resultados ainda são incertos. Diversificar pode ser uma boa oportunidade, desde que a empresa esteja muito bem preparada para seguir esse caminho.

Diversificar para crescer
Raul Randon, fundador da Randon

Os empreendedores da Touch Watches estão abrindo uma fábrica, e essa é a hora certa de diversificar a produção. Se eles pensam em fabricar óculos escuros, que o façam. O Brasil é um país ensolarado e tenho certeza de que vai vender bastante. Sou sempre a favor de quem tem coragem de lançar novos produtos e entrar em mercados em que ainda não atua, porque foi o que eu fiz e deu certo.

A Randon nasceu em 1949 como uma pequena oficina mecânica. Em pouco tempo, comecei a fabricar eixos para caminhões e reboques. Mas a empresa só deu um salto de crescimento quando decidi explorar mercados relacionados, exatamente como pretende fazer a Touch Watches. Hoje, a Randon fatura mais de 3 bilhões de reais ao ano produzindo equipamentos e veículos para transporte de carga. Isso só foi possível porque diversificamos a produção.

Costumo dizer que o negócio da Randon é produzir tudo que tenha rodas. Di Giorgio e Amado devem fazer o mesmo, nem que precisem buscar recursos fora da empresa para sustentar os investimentos, como eu mesmo fiz nos anos 70, quando tomei empréstimos para fazer a Randon crescer. Acredito que essa será uma decisão melhor do que deixar a fábrica ociosa.

Caso os empreendedores decidam vender só relógios, vai chegar o dia em que esse mercado ficará saturado e não haverá mais como crescer. Di Giorgio e Amado precisam pensar no futuro e, desde já, começar a montar as estratégias para um dia transformar a Touch Watches em uma grande empresa. Eu confio tanto no poder da diversificação que levo isso até para meus investimentos fora da Randon — tanto que hoje sou sócio de vários outros negócios, como vinícolas e um laticínio onde produzo queijos do tipo grana padano na Serra Gaúcha.

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Aprimeira vez que os sócios Marcelo Di Giorgio, de 42 anos, e Marcelo Amado, de 37, venderam relógios juntos foi no começo dos anos 90. Recém-saídos da faculdade, eles passavam uma temporada de intercâmbio na ilha de Mallorca, na Espanha, quando conseguiram um trabalho como representantes de uma pequena fábrica local que pertencia a um relojoeiro suíço.

“Enchíamos um furgão com relógios e saíamos vendendo para as lojas à beira-mar”, diz Di Giorgio. “Eram peças baratas que muitos turistas compravam como suvenir.” Quase duas décadas depois, Di Giorgio e Amado estão vivendo uma espécie de volta ao passado. Há dois anos, eles criaram a Touch Watches, fabricante de relógios com sede no Rio de Janeiro.

No ano passado, a empresa faturou 42 milhões de reais — suas vendas são feitas numa rede de 64 lojas franqueadas, a maioria em shopping centers. Com produtos que custam a partir de 60 reais, seu principal público é formado por jovens e consumidores emergentes, que veem na marca uma alternativa barata para comprar relógios descolados e coloridos — os produtos da Touch Watches são inspirados nas peças da suíça Swatch, uma das primeiras relojoarias a tentar unir preço baixo a design moderno.

“Percebemos que estava surgindo no Brasil um perfil de consumidor parecido com o que encontrávamos quando vivíamos na Espanha”, diz Di Giorgio. “São consumidores ávidos por comprar, mas que, ao mesmo tempo, não encontravam relógios bonitos e que coubessem em seu orçamento.”

Para produzir seus relógios, os sócios da Touch Watches montaram uma cadeia internacional de fornecedores. Os mecanismos que movem os ponteiros são comprados no Japão e enviados a Shenzen, na China, onde um fabricante chinês produz pulseiras e mostradores e outro faz a montagem completa do relógio.

O design é feito por profissionais espanhóis que eles conheceram na década de 90, quando moravam em Mallorca e vendiam relógios pelas ruas. “Temos boa parte de nossa produção na China para diminuir os custos”, afirma Amado. Pelo menos uma vez por mês, um dos sócios viaja a Shenzen para acompanhar de perto a montagem.

Agora os donos da Touch Watches vêm se preparando para começar uma nova etapa. Nos próximos meses, eles vão inaugurar uma fábrica em Manaus, onde pretendem produzir relógios mais caros, que devem chegar ao mercado com preços acima de 200 reais. “É possível ser competitivo fabricando esse tipo de peça no Brasil graças aos incentivos da Zona Franca”, afirma Di Giorgio. “Mas as linhas mais baratas continuarão sendo montadas na China.”


Os sócios já investiram 6 milhões de reais na nova fábrica e agora precisam tomar uma decisão importante para o futuro dos negócios. Para aproveitar melhor a capacidade de produção que terão em Manaus, eles avaliam se chegou o momento de diversificar seu catálogo, passando a fabricar outros tipos de acessórios, como óculos escuros e bijuterias.

Com mais produtos, Di Giorgio e Amado acreditam que seria possível acelerar a expansão ao vender mais para quem já compra seus relógios. Eles temem, no entanto, perder o foco ao mudar agora o que está dando certo e dispersar energias. “A venda de relógios vai indo muito bem”, diz Di Giorgio. “Pode ser mais seguro concentrar nossos esforços num produto que já conhecemos bem.”

Deixar tudo como está e manter o foco nos relógios também tem seus ris­cos. O principal deles é deixar passar a oportunidade de lançar novos pro­dutos num momento de mercado aque­cido. Sem novos acessórios, os do­nos da Touch Watches temem ter de fazer um esforço maior para continuar crescendo, acelerando a abertura de novas lojas e correndo o risco de co­meçar a atuar em mercados nos quais sua marca ainda não é conhecida.

Para uma reflexão sobre as duas alternativas, Exame PME ouviu Raul Randon, fundador da Randon — a empresa nasceu nos anos 50 produzindo freios em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, e cresceu ao diversificar a produção de implementos rodoviários.

Outro ponto de vista é do empreendedor Eduardo Casarini, dono da Flores Online, site de comércio eletrônico que começou vendendo flores e arranjos na internet para depois ampliar sua linha de produtos com presentes e chocolates. Também deu seu parecer o consultor Sérgio Bernardes, sócio da Insight, empresa de consultoria do Rio de Janeiro. Veja o que eles disseram.

Manter o foco nos relógios
Eduardo Casarini, dono da Flores Online

Diversificar a linha de produtos é o tipo de decisão que exige muita reflexão. Acho arriscado que uma empresa nova, como a Touch Watches, trilhe esse caminho agora. Para lançar outros produtos, seus donos provavelmente teriam de criar outras marcas e, com isso, podem dispersar recursos que seriam importantes para fortalecer o negócio principal.

A Flores Online existe há 13 anos e só agora estamos pensando mais seriamente em explorar outros produtos além da entrega de flores em domicílio. Antes de lançar óculos escuros e bijuterias, acredito que Di Giorgio e Amado devem cuidar bem das vendas de relógios para manter a rentabilidade da empresa e fazer caixa. Assim, bem mais tarde, eles terão capital para investir no marketing de novos produtos, quem sabe até contratando artistas famosos para divulgar a marca.


Avaliar os riscos primeiro
Sérgio Bernardes, sócio da consultoria Insight

Os donos da Touch Watches devem evitar um tipo de atitude muito comum entre os empreendedores, que é o excesso de otimismo. Eles estão colhendo bons resultados com os relógios, mas isso não significa que vão alcançar o mesmo sucesso com os produtos que pretendem lançar. Cada mercado tem suas próprias características, e o que deu certo com os relógios pode não se repetir com óculos escuros e bijuterias.

Antes de tomar uma decisão como essa, Di Giorgio e Amato precisam avaliar melhor quais são os riscos da diversificação e quem são os concorrentes que terão de enfrentar — algo que exige muito estudo e paciência. Já há competidores importantes nesses setores, o que pode obrigar a Touch Watches a reduzir as margens, prejudicando a rentabilidade da empresa.Também seria necessário investir em design, como os empreendedores fizeram com os relógios, o que não custa pouco.

Além disso, os investimentos em marketing para o lançamento de um novo produto teriam de vir das receitas que a empresa tem com os relógios — ou seja, seria preciso tirar dinheiro de uma atividade que já vem gerando caixa para investir em outra em que os resultados ainda são incertos. Diversificar pode ser uma boa oportunidade, desde que a empresa esteja muito bem preparada para seguir esse caminho.

Diversificar para crescer
Raul Randon, fundador da Randon

Os empreendedores da Touch Watches estão abrindo uma fábrica, e essa é a hora certa de diversificar a produção. Se eles pensam em fabricar óculos escuros, que o façam. O Brasil é um país ensolarado e tenho certeza de que vai vender bastante. Sou sempre a favor de quem tem coragem de lançar novos produtos e entrar em mercados em que ainda não atua, porque foi o que eu fiz e deu certo.

A Randon nasceu em 1949 como uma pequena oficina mecânica. Em pouco tempo, comecei a fabricar eixos para caminhões e reboques. Mas a empresa só deu um salto de crescimento quando decidi explorar mercados relacionados, exatamente como pretende fazer a Touch Watches. Hoje, a Randon fatura mais de 3 bilhões de reais ao ano produzindo equipamentos e veículos para transporte de carga. Isso só foi possível porque diversificamos a produção.

Costumo dizer que o negócio da Randon é produzir tudo que tenha rodas. Di Giorgio e Amado devem fazer o mesmo, nem que precisem buscar recursos fora da empresa para sustentar os investimentos, como eu mesmo fiz nos anos 70, quando tomei empréstimos para fazer a Randon crescer. Acredito que essa será uma decisão melhor do que deixar a fábrica ociosa.

Caso os empreendedores decidam vender só relógios, vai chegar o dia em que esse mercado ficará saturado e não haverá mais como crescer. Di Giorgio e Amado precisam pensar no futuro e, desde já, começar a montar as estratégias para um dia transformar a Touch Watches em uma grande empresa. Eu confio tanto no poder da diversificação que levo isso até para meus investimentos fora da Randon — tanto que hoje sou sócio de vários outros negócios, como vinícolas e um laticínio onde produzo queijos do tipo grana padano na Serra Gaúcha.

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