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Marcopolo prevê queda de 5% nas vendas em 2009 por crise do crédito

Crise dificulta o planejamento para o próximo ano; até agora empresa descarta reajustes para compensar alta do dólar

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.

Nos últimos dias 8 e 9 de outubro, dez diretores da gaúcha Marcopolo, uma das maiores fabricantes de ônibus do planeta, com sede em Caxias do Sul, na serra gaúcha, reuniram-se para fazer o planejamento para o próximo ano. Apesar de a semana ter sido de verdadeiro caos econômico e insanidade global, o paulista José Rubens De La Rosa, principal executivo da empresa, decidiu não adiar a reunião. “Era um bom momento para sentarmos e tentar trocar idéias de forma racional”, diz De La Rosa. E foi exatamente isso que ele fez ao discursar para seus executivos. “Não quero negligenciar a importância dessa crise, mas todo mundo tomou café da manhã hoje. Todo mundo consumiu. Haverá setores mais e outros menos afetados. Nós estamos tentando prever quanto seremos afetados. Mais que o setor de alimentos, mas menos que o de luxo, por exemplo. Quem está desesperado, movendo o dinheiro de um lado para o outro, é gente do mercado financeiro. É outro mundo. Nós somos industriais. Se houver flutuações, e elas acontecerão, acabarão se compensando ao longo do tempo, porque a necessidade do nosso produto e da renovação de frotas vai continuar existindo. Isso é o mais importante."

Foi considerada a hipótese de que créditos ficarão mais restritos e isso afetará um pouco a velocidade das vendas e até reduzi-las no próximo ano. Foram levantadas as necessidades de compra de cada mercado. Os empresários de ônibus compram porque precisam, porque faz sentido econômico renovar a sua frota. “Alguém pode dizer que ele pode adiar essa compra. Sim, mas ele já faz isso. Ele já compra quando está no limite, no sentido econômico. E ele precisa financiamento? Sim, alguns precisam. Dos que utilizam, quais vão enfrentar restrições?”

Depois, foram feitos contatos com todos os mercados onde a empresa atua. Ao colocarem na conversa executivos da empresa na China, ouviram deles que a instrução do governo chinês é para que o povo consuma. Que é hora do povo puxar a economia. “A China não vai parar. Talvez, em vez de crescer 10%, vai crescer 8%. Mas não vai parar”, disse De La Rosa. A Argentina também segue normal. Os bancos lá não são agentes importantes de financiamento.

Segundo De La Rosa, os clientes fazem seus próprios financiamentos fora do sistema bancário.
O único mercado em que a Marcopolo está presente e houve paralisação completa de negócios foi o da Rússia. Um mercado ainda muito novo para a fabricante de ônibus e que ainda não tem participação relevante nos negócios da empresa. E a avaliação é de que, do mesmo jeito que isso aconteceu de uma hora para outra, a retomada também deve ocorrer de uma hora para outra já que a necessidade de ônibus existe, ela não desapareceu. 

Após dois dias de análises e discussões, chegaram a alguma conclusão? “Não há conclusão absoluta”, diz De La Rosa. “Em qualquer cenário, algum impacto haverá. Achamos que, no próximo ano, as vendas vão ser 5% inferiores às desse ano que foi um bom ano, com crescimento de 16%.”

O principal motivo para isso é a certeza de que o crédito ficará mais restrito e haverá um impacto momentâneo. “O cliente não compra no primeiro semestre, mas compra no segundo. Alguns param, outros continuam”, diz De La Rosa. Também ficou decidido que a diretoria vai esperar o término do auge da crise para sentir o tamanho do impacto. “A base do nosso planejamento não pode ser um cenário de bolsa parada e dólar oscilando sem parar. Se fosse, fecharíamos as portas. A visão do industrial é que o produto que a gente faz é necessário. Se acreditamos nisso, então podemos ter flutuações na demanda, mas num momento vamos voltar a vendê-lo.”

O executivo admite que foi muito mais complicado discutir planejamento este ano. “Nós combinamos que vamos rever tudo que fizemos nesses dois dias daqui a 40 dias antes de entregar para os acionistas”, diz. “Não planejamos que o mundo vai acabar. Somos materialistas e não financistas. Meu produto é tangível. O produto é necessário, faz sentido econômico e, portanto, deveremos encontrar soluções que permitam financiá-lo em cada região. Vai ser mais difícil? Vai, mas vamos encontrar maneiras.”

A empresa ainda não percebeu nenhuma repercussão nos seus negócios. O agente principal de crédito no Brasil é o Finame, responsável por 60% a 70% do que se vende. O resto são recursos dos próprios clientes. Nada indica que o Finame não continuará ativo. Os bancos que repassam o Finame podem se preocupar com a inadimplência, mas é uma indústria reconhecidamente ótima pagadora de suas contas. Hoje, 45% da receita da Marcopolo é em dólar. A fabricante gaúcha de carrocerias encerrou 2007 com receita líquida de 2,1 bilhões de reais – recorde na história da companhia, um crescimento de 21,6% sobre 2006 (este ano está crescendo 16%). O lucro líquido também foi recorde, alcançando 132 milhões de reais. As oscilações do dólar ainda não impactaram a empresa. Os insumos são, na medida do possível, comprados localmente. Além disso, De La Rosa questiona: “Que sentido faria um vendedor de alguma coisa chegar hoje aqui hoje e começar a falar em reajuste? Quem garante que o dólar vai ficar nesse patamar? Não é momento de ninguém falar em reajuste de nada. Ao contrário, se houver recessão, pode ser que se discuta desconto e não aumento.” 

De La Rosa acha graça quando escuta as pessoas falando que o mundo vai entrar em recessão e o crescimento global vai cair dois ou três pontos. “Porque o meu negócio teria que cair 20%? Se cair 5%, como estou prevendo, já é uma recessão.”

A discussão teve espaço até para enxergar onde haverá oportunidades. “Por que não podemos pensar que vamos ter mais empregos no Brasil porque vamos importar menos?”, pergunta De La Rosa. Para ele, o dólar terá equilíbrio entre 1,90 e 2,00 reais, o que permitirá às empresas voltarem a trabalhar de forma adequada. “O dólar a 1,50 também estava ruim. Quem sabe agora não vou preservar empregos aqui? O turismo interno vai aumentar. Vou vender mais ônibus”. Além disso, ele lembra que, no Brasil, apenas 30% da economia é baseada no crédito e a inadimplência interna está baixa. Em outros países é muito mais. Portanto, há espaço para expansão de crédito. “No final da reunião ainda brincamos: amanhã o sol vai nascer às seis e quinze da manhã, como todos os dias. E se a bolsa parar? Nossos empregados continuarão lá na fábrica soldando e pintando os ônibus do mesmo jeito”, diz De La Rosa.

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