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Como a Dabi Atlante, a número 1 do mercado nacional de equipamentos odontológicos, conquistou clientes cativos em mais de 70 países

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h16.

Até alguns anos atrás, para atuar no comércio exterior os executivos brasileiros precisavam cumprir alguns requisitos básicos, como o domínio de línguas estrangeiras, um bom nível cultural e disponibilidade para fazer viagens prolongadas pelo mundo afora. "Na atual situação política do mundo, é preciso muito mais do que isso", diz Antônio S.P. Lima, gerente de exportação da Dabi Atlante, de Ribeirão Preto, o maior fabricante de gabinetes e equipamentos odontológicos do país. "Hoje, é necessário também uma boa dose de coragem." Lima estava de passagem pela Índia havia poucas semanas quando a explosão de duas bombas deixou mais de 50 mortos em Bombaim. No ano passado, visitava a Indonésia quando terroristas fizeram uma carnificina numa discoteca em Bali. Os imprevistos da mãe natureza também costumam cobrar sorte extra. Meses atrás, escapou ileso do terremoto que atingiu a região de Ancara, na Turquia, onde se encontrava. Na semana passada, teve de mudar seu roteiro durante uma viagem à Ásia devido a um tufão que varria Hong Kong e Taiwan.

"Para expandir as vendas lá fora, não tem jeito. É preciso buscar os clientes onde eles estão", diz Lima, falando pelo telefone de seu quarto num hotel em Cingapura. "Não dá para crescer sentado no escritório em Ribeirão Preto." Há dois anos e meio, ele deixou a área de comércio exterior da Scania para trabalhar na Dabi Atlante, a pioneira de um pólo de fabricantes de equipamentos odontológicos surgido em Ribeirão, no noroeste de São Paulo, nas últimas décadas. Sua contratação e a de outros dois gerentes de área faziam parte de um esforço consistente da companhia de conquistar mercados lá fora. Consolidava-se, assim, uma mudança radical na cultura de uma empresa que, a exemplo da maioria dos negócios criados no país, crescera sem dar maior importância às oportunidades do comércio exterior. Não que a Dabi Atlante deixasse de colocar seus produtos em outros países, sobretudo nos vizinhos sul-americanos. Mas a prioridade desde sua criação, em 1946 -- inicialmente com o nome de Dabi --, por Pedro Litch, zelador de um prédio em Ribeirão Preto, de origem alemã e com vocação de mecânico, era atender as imensas potencialidades de um mercado doméstico em expansão.

A partir de meados da década de 50, a empresa de Litch expandiu os negócios rapidamente graças a um aporte de capital feito por um dos ramos da família Biaggi, tradicionais produtores de cana-de-açúcar e usineiros da região e hoje controladores da Dabi. Mais tarde, com a incorporação, no início da década de 70, da concorrente Atlante, de São Paulo, a empresa tornou-se a número 1 num mercado que movimenta 180 milhões de reais por ano no Brasil. No mundo, as receitas dos setor sobem para 700 milhões de dólares anuais.

Os resultados da estratégia colocada em ação para chacoalhar a área internacional têm sido expressivos. Há apenas dez anos, as exportações da empresa não passavam de 1,8 milhão de dólares. Neste ano, devem chegar a 6,5 milhões de dólares, algo entre 20% e 25% do faturamento total -- em 1998, a participação das vendas externas era de apenas 10%. Desde que colocou o pé na estrada, Lima incluiu em sua rotina quatro viagens internacionais por ano -- cada uma com duração de 45 dias, em média. Nessa última rodada, aproveitou para visitar 16 países. "Como os custos de uma viagem são muito altos, é preciso diluí-los mediante o maior aproveitamento possível." Gabinetes e instrumentos periféricos produzidos na fábrica em Ribeirão Preto -- uma construção com pilares de concreto e paredes envidraçadas de ares modernos -- equipam universidades e clínicas particulares na Inglaterra, França, Indonésia, Arábia Saudita, Rússia, Vietnã e outros 70 países. Desses, 40 foram conquistados nos últimos dois anos. No ano passado, Lima recebeu um prêmio pela marca dos 200 consultórios entregues a uma faculdade de odontologia da cidade de Ludhiana, na Índia.

"A resposta tem sido espetacular, mas a meta agora não é tanto ampliar a nossa presença lá fora, mas sim ganhar participação maior nesses mercados", diz José Miranda da Cruz Neto, diretor-superintendente da Dabi Atlante. Na Rússia, por exemplo, a empresa fechou no ano passado um contrato para equipar unidades de odontologia do Hospital Central de Moscou e da Universidade de Bashkirskij, na Sibéria. A companhia brasileira já é a líder de mercado no país da vodca e do caviar. Na Índia, a Dabi conquistou a vice-liderança. "Queremos ter lá fora a mesma relevância que temos no mercado interno", diz Cruz Neto.

Como a Dabi Atlante conseguiu resultados tão relevantes em tão pouco tempo? As razões são variadas. Uma delas diz respeito a uma vantagem estrutural -- estar localizada no Brasil, o segundo maior mercado odontológico do mundo depois do dos Estados Unidos. São 140 000 dentistas ativos e 150 faculdades de odontologia. A China, com seu 1,4 bilhão de habitantes, possui apenas 30 000 desses profissionais. O dinamismo do setor permitiu à Dabi Atlante ganhos de escala que redundaram em vantagens decisivas na hora de vender seu produto, tais como custos competitivos, capacidade de inovação tecnológica e ganhos de produtividade. Já os concorrentes europeus, embalados pelos vastos subsídios de seus governos, acabaram produzindo linhas de equipamentos sofisticados e caros demais, o oposto do produto brasileiro, que consegue em grande medida aliar bom desempenho a preços moderados.

"Para conquistar e manter o cliente lá fora, é fundamental conhecer suas necessidades", diz Cruz Neto. Algumas delas podem ser banais, como aconteceu numa venda recente a Cuba. Grande parte dos dentistas da ilha de Fidel Castro é constituída de mulheres, que costumam manter as unhas das mãos longas e pintadas. Na hora de regular a altura do encosto da cadeira, elas costumavam quebrá-las. O jeito foi, na partida seguinte, adaptar o mecanismo de ajuste ao tamanho da vaidade das cubanas.

É conhecida na Dabi a aventura que foi tentar vender seus primeiros gabinetes dentários à Rússia. Na falta de melhor método para divulgá-los, um distribuidor da Sibéria carregou um caminhão com os equipamentos recebidos do Brasil e saiu pelas estradas da região visitando possíveis clientes. Quando alguém da empresa mencionou a possibilidade de uso do sistema de mala direta, o distribuidor arregalou os olhos com cara de espanto. Nunca tinha ouvido falar em tal coisa. "O consistente apoio técnico e de serviços oferecido pela Dabi Atlante transformou-se na coluna vertebral de sua bem-sucedida estratégia de vendas", diz Tamaz Manasherov, diretor da Uni-Dent International, distribuidor dos produtos brasileiros na Rússia. Ele cita como acertos da Dabi a estreita cooperação que mantém com sua empresa de distribuição, entre os quais flexibilidade de adaptar produtos às necessidades locais, apoio promocional e financiamento das vendas.

Para melhor atender o exterior, os executivos da Dabi Atlante promoveram uma pequena revolução interna. Marketing de relacionamento e cuidados com o pós-venda passaram a ser tratados como prioridade (veja quadro). "Descobrimos o óbvio", diz Cruz Neto. "Para comprar um equipamento que deve durar 15 anos, o cirurgião-dentista precisa ser amparado por uma rede de assistência técnica qualificada e atenciosa." Para aprofundar o processo de "aculturação" de uma mentalidade fechada para uma mentalidade internacional, a empresa também investiu em treinamento de pessoal. Uma das primeiras providências foi disseminar o uso do inglês e do espanhol por todos os departamentos.

Mas a principal mudança foi mesmo de atitude. "Antes, ficávamos ao sabor das oportunidades que iam surgindo no nosso caminho", afirma Cruz Neto. Ou seja, as vendas não eram obra de um esforço consistente de exportação. Para repetir o velho chavão aplicado às exportações brasileiras em geral, os produtos com o selo Dabi Atlante costumavam ser "comprados" e não "vendidos". Hoje, estão nos gabinetes de dentistas de metade do planeta porque alguém foi lá vendê-los.

RECEITA PARA TER SUCESSO LA FORA
Como a Dabi Atlante conseguiu abrir mercado em mais de 70 países
* Classifique os mercados em A, B e C de acordo com seu potencial de negócios.
Só aborde países B depois de concluída a estruturação dos mercados A.
* Não improvise. Contrate especialistas em vendas externas.
* Respeite o óbvio. Os responsáveis pela área externa precisam falar pelo
menos três línguas estrangeiras.
* Escolha bem seu distribuidor. Nada mais danoso do que designar um representante
com a imagem errada no mercado. Negocie metas de venda e deveres mútuos
relacionados a marketing, serviços e logística.
* Internacionalizar é estar lá. Não basta tirar um pedido e delegar o
esforço de venda ao distribuidor. O relacionamento com os clientes é responsabilidade
de quem exporta.
* Desde a primeira venda, é preciso encantar no serviço e no desempenho
do produto. A maior taxa de fracasso na abertura de mercados está relacionada
a problemas como irregularidade na entrega e na qualidade do produto.
* Montar uma estrutura de assistência técnica é crucial. Faltar um parafuso
em Curitiba é um problema bem mais simples de resolver do que se a falta
fosse no Azerbaijão.
* Embora adaptar o produto ao gosto do cliente seja essencial para uma
venda bem-sucedida, cuidado. O excesso de flexibilidade eleva os custos
de produção e dificulta o controle de qualidade.

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