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Ceticismo cerca fusão entre Varig e TAM

O anúncio do acordo para a criação de uma nova empresa aérea que seria o embrião de uma fusão entre Varig e TAM foi recebido com ceticismo por diversos observadores e especialistas desse mercado. Apesar das declarações do presidente do Cade de que, apesar de complexa, a fusão seria possível, o verdadeiro empecilho ao negócio […]

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h16.

O anúncio do acordo para a criação de uma nova empresa aérea que seria o embrião de uma fusão entre Varig e TAM foi recebido com ceticismo por diversos observadores e especialistas desse mercado. Apesar das declarações do presidente do Cade de que, apesar de complexa, a fusão seria possível, o verdadeiro empecilho ao negócio pode ser a resistência da Fundação Rubem Berta, a controladora da Varig.

Foi um ótimo teatro , disse um dos participantes da reunião desta quinta-feira, 6 de fevereiro, em Brasília, na qual foi anunciado o acordo entre a Varig e a TAM, resumindo o ceticismo com que o projeto de fusão está sendo avaliado. E não faltam razões para desconfianças. Para boa parte do mercado, o objetivo da proposta é apenas garantir mais tempo para as duas empresas e para o próprio governo encontrarem uma solução definitiva para o problema.

Em primeiro lugar, as análises apontam que essa possibilidade de negócio, estimulada pelo governo, surgiu unicamente porque a Varig chegou a um ponto de total falta de opção. A maior empresa nacional do setor de transporte aéreo exibe hoje um quadro patético. Nele se combinam inadimplência com credores, como os bancos e as empresas que fazem o leasing dos aviões, dívidas com o governo e atrasos nas obrigações trabalhistas corriqueiras, incluindo o não pagamento do último 13º dos funcionários.

No total, o endividamento da empresa está próximo de 2,8 bilhões de reais, com patrimônio líquido negativo de 1,5 bilhão de reais. É uma situação trágica , diz um consultor de gestão. Não aceitar o acordo proposto pelos credores em novembro foi quase um suicídio. Os controladores da Varig se recusaram a ceder o poder e preferiram apostar que o novo governo não iria deixar a empresa morrer.

A Fundação Rubem Berta (FRB) é dona de 87% do capital da empresa. Na Fundação, as cartas são dadas por um colegiado próximo de 250 participantes -- funcionários e ex-funcionários da Varig. A FRB na verdade não representa o interesse de todos os funcionários , diz o consultor. Ela representa apenas um grupo que não vê a mudança de controle como alternativa, porque significaria para eles a perda de poder e até do emprego. Para esses membros da Fundação, entregar o controle teria o mesmo efeito que deixar a companhia morrer.

Isso explicaria o comportamento praticamente suicida que a FRB vem mantendo em relação às soluções propostas para tirar a Varig do buraco. Também explica porque há tanto descrédito cercando o anúncio do acordo. Para os analistas mais céticos, esse passo seria outra manobra postergatória do grupo controlador da Varig -- o acordo prevê seis meses de avaliações, auditorias e negociações até chegar ao ponto da formalização da nova empresa.

Com isso, a Fundação ganharia tempo perante os credores e fornecedores para tentar buscar uma outra saída que não comprometesse seu domínio. No começo eles devem até mostrar boa vontade em colaborar, mas, na hora de assinar, os representantes da Fundação vão acabar achando motivos para enrolar o máximo e cair fora, como fizeram com os credores , diz o consultor.

As razões e o risco da TAM

Diante desse cenário, por que a TAM está entrando nessa? Segundo os observadores mais próximos à companhia fundada pelo Comandante Rolim, a união de seus ativos com os da Varig seria uma solução para a alta ociosidade dos seus vôos. Entre as grandes empresas aéreas brasileiras, a TAM tem apresentado a pior taxa de ocupação. Segundo os dados do Departamento de Aviação Civil, foram ocupados em 2002 apenas 9,3 milhões dos 14,9 milhões de assentos oferecidos pela TAM uma taxa de 53%.

Em janeiro deste ano, a ocupação caiu mais ainda, para 50%. (O grupo Varig registrou 59%, e a Vasp, 60%). A TAM, com a tradição de cobrar preços mais altos por serviços melhores, foi a mais afetada pela entrada no mercado da Gol, com seus custos mais baixos e tarifas mais em conta. A Gol teve 62% de assentos ocupados em 2002 e, em janeiro deste ano, melhorou seu índice para 64%.

Mesmo a Gol, que por seu lado está próxima de receber um sócio (com a venda de algo próximo de 25% de seu capital ao grupo americano de investimento AIG), não apresenta uma situação confortável. A proporção de assentos ocupados considerada ideal para viabilizar as empresas brasileiras é de no mínimo 67%.

Além de sofrer o ataque da Gol, a TAM sentiu o efeito dos acidentes e incidentes recentes com seus Fokker 100. Esses problemas levaram a companhia a cortar rotas em que os vôos saíam mais vazios. Mesmo enxugando a malha, porém, a tendência de queda na taxa de ocupação não foi revertida.

Com isso, a expecativa de analistas do mercado é que o balanço anual da TAM mostre números muito negativos. Até setembro do ano passado, a empresa acumulava um prejuízo de 620 milhões de reais. Até aqui, a TAM tem mantido os compromissos em dia, mas está pressionada pela necessidade de uma solução urgente para o seu problema operacional. A TAM está correndo um risco muito grande , diz um consultor. Se a fusão for bem feita, de forma independente, com foco na redução de custos e aproveitando o melhor das duas empresas, pode ser a salvação. Mas, se a Fundação Rubem Berta tiver influência na nova empresa e a empresa for nivelada pela ineficiência da Varig, os custos subirão e ela será inviabilizada.

Mesmo para a obtenção de melhorias operacionais, a justificativa principal da fusão, existem vários obstáculos a serem transpostos. Internamente, há uma certa equivalência de linhas: a Varig opera 67 cidades e a TAM, 48. A nova empresa passaria a deter 74% do mercado. Para o processo ser aprovado no Cade, teria que haver uma mudança na lei, já que, pelas regras atuais, uma empresa pode ter, no máximo, 50% do mercado. No lado dos fornecedores, também surgem problemas. A Varig opera com os aviões da Boeing e a TAM com os da Airbus. Nesse caso teria que haver uma escolha sobre qual das duas fabricantes iria sobreviver.

O padrinho José Dirceu

Então, qual seria a razão de o governo estar apadrinhando esse movimento? Segundo um executivo de uma das empresas, a intenção é ganhar tempo até que haja uma solução definitiva para o problema. A idéia da fusão partiu do ministro da Casa Civil, José Dirceu, amigo do presidente da TAM, Daniel Mandelli. Dirceu teria ouvido de Mandelli um relato dramático sobre a situação da TAM e pediu então, aos ministros, que estudassem uma saída conjunta para as duas empresas. Para o governo, é indispensável que um país com as dimensões do Brasil tenha uma companhia aérea forte. Entregar a aviação brasileira a uma empresa estrangeira geraria enormes perdas de divisas. Foi então que se pensou na saída da fusão.

Na avaliação do mercado, no prazo de seis meses previsto para as duas empresas se fundirem, muita coisa vai acontecer. Até lá, as duas ganharão tempo para negociar suas dívidas com o governo: Infraero, Petrobras Distribuidora e Banco do Brasil. As pressões para pagamento das dívidas vão diminuir , diz um executivo de uma delas.

Nesse período, o BNDES ganhará tempo para pensar em um programa de socorro às duas companhias.

Esse é, porém, um dos aspectos mais delicados a ser enfrentados pelo governo. Dentro do próprio banco há divergências sobre liberar empréstimos para a Varig sem que a companhia apresente um plano consistente de reestruturação. O presidente do banco, Carlos Lessa, porém, não pensa de forma tão radical. Ele já defendeu que o banco desempenhe o papel de hospital de empresas. O parecer dos técnicos do banco é que só se libere dinheiro para a Varig com o compromisso de a Fundação Rubem Berta abrir mão do controle.

Mas quem ocuparia esse espaço? O governo já deixou claro que não permitirá que a participação estrangeira nas empresas aéreas brasileiras ultrapasse 25%, percentual máximo permitido em todo o mundo. A Varig teria que se abrir para o mercado mas nenhum acionista estaria disposto a colocar dinheiro em uma empresa cuja administração é considerada desastrosa. Com a TAM atolada também em graves problemas financeiros, os executivos da Varig ganharam fôlego para dizer que o problema não é de gestão, mas de mercado, com a crise do 11 de setembro. Se a TAM, apontada como modelo de gestão, está com sérios problemas de caixa, dizem eles, a Varig não pode ser acusada de estar em crise em razão da má administração.

Um ex-integrante do conselho da Varig avalia que este não é mais o momento para fazer uma fusão, já que as duas empresas estão cheias de problemas. O sonho acalentado pelo fundador da TAM, o comandante Rolim Amaro, morto há dois anos em um acidente aéreo, era criar uma holding para gerir as duas empresas, que continuariam separadas. A Varig, porém, nunca aceitou esse controle compartilhado. Eis o que afirma o ex-integrante do conselho da Varig: O que as duas empresas querem agora com essa história de fusão é criar uma cortina de fumaça até que se encontre uma solução para seus graves problemas financeiros. Elas querem, na verdade, é receber ajuda do governo. Se daqui a seis meses elas estiverem encontrado uma saída financeira, a idéia de fusão desaparece. Caso contrário, deverá surgir uma outra solução mágica para camuflar o problema .

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