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Brasileiro precisa entender que Petrobras não pode ser a única responsável por preço, diz especialista

Para professor Edmar Almeida, da PUC-Rio, fim do monopólio no refino com a venda das refinarias poderia aliviar pressão política sobre a companhia

Caminhão de combustíveis: companhia é responsável por mais de 98% do refino (Diego Vara/Reuters)

Victor Sena

Publicado em 19 de fevereiro de 2021 às 16h08.

Última atualização em 19 de fevereiro de 2021 às 16h17.

A pressão do presidente Jair Bolsonaro sobre a Petrobras e sobre seu comandante, Roberto Castello Branco, é uma consequência da pressão popular sobre o aumento do preços dos combustíveis desde o início do ano. Essa é a visão do professorEdmar Almeida, do Instituto de Energia do Centro Técnico Científico da PUC-Rio.

Nesta quinta-feira, a Petrobras anunciou mais um aumento no valor dos combustíveis. Horas depois, o presidente da República disse que "algo aconteceria na empresa" e decidiu suspender os impostos federais do diesel e do gás de cozinha. Hoje mais cedo, Bolsonaro reafirmou que haverá mudanças na empresa e o mercado já espera a troca da presidência.

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Como a movimentação dá a impressão de interferência política, há receio de a estratégia atual da empresa, que é bem vista por analistas, seja colocada de lado. Na tarde desta sexta-feira, as ações da companhia caiam mais de 7%.

A Petrobras importa e exporta combustíveis e derivados. Por isso, adota a política de paridade internacional para precificar os combustíveis. Com a disparada do petróleo neste começo de 2021, a empresa acompanhou os valores, elevando derivados.

Por trás das tensões entre Bolsonaro e o presidente da estatal, o professor Edmar Almeida, do Instituto de Tecnologia do Centro Técnico Científico da PUC-Rio, vê que o presidente da República está muito sucetível a pressão do público.

“O público geral acha que está a alcance da empresa vender combustível barato no Brasil e não entende que estamos em outro momento. Não existe espaço no caixa da empresa para usar ela como instrumento de política de preço. Ela tem acionistas privados e tem que respeitar governança. Tem que passar a mensagem clara que a política de preços não dá para passar pelo caixa da Petrobras”.

Edmar Almeida, Puc Rio

O atual modelo de precificação do combustíveis da Petrobras também é defendido pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), que também concorda com a venda de refinarias para que outros "players" dividam esse mercado.

"É importante lembrar que os derivados são commodities comercializadas internacionalmente, de modo que os valores negociados no Brasil deverão sempre guardar relação com o preço de paridade internacional. Assim, outro benefício importante trazido pela abertura do mercado é que as chances de um descolamento prolongado entre os preços praticados no país e os internacionais serão muito reduzidas, uma vez que a livre importação garante sempre a possibilidade de contestação do preço interno dos derivados", afirma o instituto em nota.

Edmar Almeida defende que a Petrobras e o governo federal passem uma mensagem correta de que a Petrobras não deve arcar com as oscilações da alta do valor do petróleo e do câmbio com seu próprio caixa. Para isso, o fim do monopólio no refino é uma forma que poderia garantir isso.

Com o objetivo de reduzir seu endividamento e focada na exploração de petróleo em águas profundas, a empresa vem se desfazendo de diversas frentes de negócios nos últimos dois anos, desde que o atual presidente, Roberto Castello Branco, assumiu a estatal.

A atual gestão entende que a vocação da Petrobras é retirar petróleo de águas profundas, tecnologia que ela domina frente a outros países.

Com isso, investimentos como o de refino devem perder espaço. A empresa pretende vender mais sete refinarias para levantar capital e para ter menos pressão política sobre seu nome, já que hoje ela é responsável quase totalmente pela produção de combustíveis no Brasil.

“A venda de refinarias é fundamental para educar o consumidor brasileiro de que a Petrobras não é feita para o governo usar a empresa para estabilizar preços. Isso foi feito entre 2010 e 2014 com custo desastrasoso para a a Petrobras”, opina o professor.

Ao vender as refinarias, além de aumentar seu caixa, a empresa dá espaço para outras empresas entrarem no mercado e dividir a responsabilidade pela precificação da gasolina e diesel, por exemplo, cumprindo o que determina a lei de 1997 que instaurou, pelo menos no papel, o fim do monopólio do setor no Brasil.

Até a venda da primeira das oito refinarias, a empresa mantinha 98% do refino de combustíveis do país. Os outros 2% são ocupados por empresas pequenas. Em falas à imprensa, o atual presidente da companhia já chamou a situação de “anomalia”.

Alvo de preocupação do presidente Jair Bolsonaro e de categorias como a de caminhoneiros, que vêm ameaçando uma nova paralisação nacional, o preço dos combustíveis pode se beneficiar do fim do monopólio, mas a relação não é tão simples.

É complicado falar de baixa nos preços causada pela entrada desses novos donos de refinarias. Isso porque o refino acontece de forma regional, já que o frete encareceria muito depender de refinarias que vendessem em outras regiões, mesmo que fossem baratas.

Além disso, o fim dos impostos federais para o diesel e para o gasolina são uma medida que tem prazo de validade. Como o Brasil vive uma situação fiscal difícil, principalmente devido à pandemia, com baixa arrecadação, é possível que o governo tenha que aumentar impostos em outra área.

A medida, de utilizar os impostos, para compensar a precificação e a autonomia da Petrobras seria positiva em uma cenário fiscal mais sustentável da economia brasileira.

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