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Balanços do terceiro trimestre trarão surpresas desagradáveis

Despesas financeiras maiores e influência do câmbio já devem causar estragos nos balanços das empresas brasileiras

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.

A safra de balanços do terceiro trimestre, que recentemente começou a ser divulgada, deve trazer surpresas desagradáveis sobre importantes empresas e setores da economia brasileira. A expectativa do mercado é de que a crise ainda não tenha feito estragos na economia real e as receitas das empresas continuem a apresentar crescimento vigoroso. Os efeitos da deterioração econômica nos Estados Unidos e Europa passarão a ser sentidos com força somente a partir deste quarto trimestre. A alta do dólar e a crise do crédito, entretanto, já devem ter elevado as despesas financeiras de diversas empresas entre julho e setembro, segundo analistas. As pesadas perdas com derivativos de algumas companhias, como a Sadia e Aracruz, seriam apenas a ponta do iceberg.

A operadora de telefonia fixa GVT dá uma mostra do que está por vir. O repique do dólar acarretou perdas financeiras de 63,3 milhões de reais entre julho e setembro, segundo o balanço da empresa divulgado nesta segunda-feira. Apesar do bom desempenho operacional - a base de assinantes e a receita líquida cresceram até mais do que esperava o mercado -, o resultado financeiro gerou um prejuízo de quase 10 milhões de reais no trimestre, contra lucro de 41,2 milhões de reais no mesmo período do ano passado.

Outra que sucumbiu ao novo cenário econômico foi a Klabin, a maior produtora de papéis para embalagens do país. A empresa saiu de um lucro de 178 milhões de reais no terceiro trimestre de 2007 para um prejuízo líquido de 253 milhões de reais nos últimos três meses. Segundo a empresa, os efeitos do câmbio sobre a dívida da companhia tiverem impacto sobre os resultados trimestrais. A desvalorização de 20% do real ante o dólar no terceiro trimestre gerou uma perda de variação cambial líquida de 381 milhões de reais. É importante lembrar que essa perda é só contábil e não tem efeito sobre o caixa. Além disso, o prejuízo líquido foi menor que o previsto pela Fator Corretora (290 milhões de reais).

Os analistas mais pessimistas já comparam as perdas das empresas brasileiras com o câmbio ao subprime americano. Na semana passada, a imprensa chegou a noticiar que 200 grandes empresas teriam sido prejudicadas pelo salto do dólar. A informação foi desmentida pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Já para o ex-presidente do Banco Central, Paulo Vieira da Cunha, atual sócio do fundo de hedge Tandem Global Partners, sediado em Nova York, as companhias brasileiras podem perder 60 bilhões de reais com instrumentos de derivativos - e muitas delas correriam o risco de ir à bancarrota com as apostas erradas contra o real, segundo declarou à agência de notícias Bloomberg.

Boa parte dessas perdas só serão conhecidas quando os balanços das empresas forem divulgados. O Portal EXAME conversou com analistas sobre suas expectativas para quatro setores da economia: papel e celulose, siderurgia e mineração, bancos e varejo. Veja abaixo as previsões para os balanços do terceiro trimestre:

Papel e celulose

O setor deve ser um dos que mais sentirão o impacto do câmbio nos números a serem divulgados. De acordo com a Fator Corretora, os compromissos atrelados ao dólar devem resultar em fortes ajustes nos balanços. Um dos reflexos será a queda dos resultados. Para as quatro empresas avaliadas pelo Fator - Klabin, Aracruz, VCP e Suzano -, a expectativa é que esses ajustes sejam o principal responsável pelos prejuízos trimestrais que deverão apresentar. Para a Suzano, as perdas líquidas serão de 127,7 milhões de reais e, para a VCP, de 375 milhões de reais.

A Aracruz será a grande prejudicada do setor, na avaliação da Fator. A empresa foi uma das principais vítimas das operações com derivativos de câmbio, montadas com a aposta de que o dólar seguiria sua trajetória de queda. Com a disparada da moeda americana, os instrumentos geraram o efeito contrário para a empresa. O resultado pesará sobre a linha final do balanço, no qual deve estar registrado um prejuízo líquido de 2,1 bilhões de reais, segundo a Fator.

Siderurgia e mineração

A forte demanda do mercado interno é o que deve sustentar os resultados do setor siderúrgico no terceiro trimestre, de acordo com Pedro Galdi, analista de siderurgia e mineração da SLW Corretora. Segundo Galdi, apesar de algumas restrições de crédito, as vendas de automóveis e de eletrodomésticos de linha branca continuaram elevadas, o que fomentou a produção de aços planos. Com isso, a CSN e a Usiminas não devem apresentar problemas de queda de faturamento. "Foi um trimestre tão bom que as siderúrgicas tiveram de reduzir as exportações para atender a demanda interna", afirma.

Se, do ponto de vista operacional, as duas empresas tendem a divulgar bons números, do lado financeiro, as atenções se voltarão previsivelmente para a CSN - uma das vítimas dos derivativos. Para Galdi, as perdas financeiras não deverão impactar tão fortemente o resultado líquido da companhia. O analista lembra, ainda, que o efeito a ser registrado é contábil, e não de caixa. Traduzindo: o dinheiro não saiu da empresa e não deve comprometer as atividades.

No segmento de aços longos, a Gerdau ainda deve se beneficiar do ritmo intenso da construção civil brasileira. O aumento da renda também estimula as vendas de pequenas quantidades de aço, como vergalhões, para reformas e pequenas obras, chamadas de "consumo formiga". Uma das maiores multinacionais do país, cerca de 30% a 40% da receita da Gerdau vem da América do Norte. Diante da crise americana, a dúvida é se essa fatia de mercado já pesará contra os resultados da companhia. O salto da moeda americana não deve pressionar as dívidas da empresa, porque ela também possui boa parte de seu faturamento atrelado ao dólar - um hedge natural. "O resultado financeiro da Gerdau deve ser bom", afirma Galdi.

Para a maior produtora de minério de ferro do mundo, os números do terceiro trimestre também não trarão grandes surpresas, segundo o analista. Uma das empresas listadas entre as possíveis prejudicadas por instrumentos de derivativos pela boataria do mercado, a Vale deverá apresentar um resultado financeiro positivo, na avaliação de Galdi. Isso porque, apesar de a mineradora possuir uma forte parcela de dívida dolarizada, decorrente sobretudo da compra da canadense Inco, boa parte de sua receita também é atrelada à moeda americana. Além disso, cerca de 40% dos 19,4 bilhões de reais captados na recente emissão de ações estão aplicados em dólar.

O analista observa, porém, que algumas siderúrgicas já estão reduzindo a produção, por conta da queda da demanda. Além disso, o preço do minério de ferro e do níquel está em queda. Esses fatores - sinais de que a economia real está freando - devem ser captados pelos números da empresa somente nos próximos meses. "O quarto trimestre pode vir mais fraco", diz.

Bancos

A redução do ritmo de crescimento da carteira de crédito deve ser o reflexo mais notável da crise mundial no balanço dos bancos brasileiros - sobretudo nas instituições de menor porte. Ainda assim, a queda não deve ser acentuada. Em agosto, por exemplo, as instituições apresentaram uma expansão média das carteiras de 32% sobre o mesmo mês do ano passado - algo bem distante de uma crise aguda de crédito. "As taxas de crescimento ainda estão elevadas", afirma Aloísio Lemos, analista do setor financeiro da corretora Ágora.

A retração da liquidez mundial, que, na prática, representa menos dinheiro para emprestar - e a taxas mais altas -, só deve aparecer nos balanços dos bancos brasileiros no próximo trimestre, segundo Lemos. "O encarecimento do crédito vai reduzir o spread e o volume de operações, mas não é nada que represente um problema", diz. A inadimplência dos tomadores de recursos também não preocupa o analista. "Apesar do ritmo forte de expansão da carteira, não vimos uma disparada da inadimplência".

Varejo

A crise também não ficará fortemente marcada nos balanços dos varejistas. O terceiro trimestre deve ser puxado ainda pela forte demanda interna. Embora sejam empresas que trabalhem com pequenas margens e necessitem constantemente de capital para financiar as vendas, a corretora Socopa não vislumbra nenhuma dificuldade para os números a serem divulgados nas próximas semanas pelas companhias.

Segundo a corretora, a crise ainda não chegou à ponta do consumidor final, e as vendas seguem aquecidas em diversos setores do varejo. A B2W, por exemplo, maior empresa de comércio eletrônico do país, as expectativas são positivas. A corretora baseia sua análise no ainda visível crescimento das vendas online no país. A companhia encerrou o primeiro semestre com uma situação confortável de caixa, o que lhe dá alguma vantagem num cenário de dinheiro escasso.

Para a Natura, o foco será o desempenho no mercado internacional, onde a empresa chega a registrar margens negativas, segundo a Socopa. Essas margens podem ser compensadas, neste trimestre, com a disparada do dólar, que favorecerá a conversão dos resultados para reais. Por isso, a corretora não espera uma queda do lucro no terceiro trimestre.

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