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As empresas por trás da contaminação das grifes

A "contaminação" das grifes A imagem é de uma locomotiva puxando vários vagões. "Atrás de um estilista de ponta há toda uma cadeia de fiações, tecelagens, malharias e confecções, que vão juntas", diz Paulo Skaf, presidente da Abit. Imagine uma pirâmide. O topo é ocupado por um grupo de estilistas e grifes que, apesar de […]

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h16.

A "contaminação" das grifes

A imagem é de uma locomotiva puxando vários vagões. "Atrás de um estilista de ponta há toda uma cadeia de fiações, tecelagens, malharias e confecções, que vão juntas", diz Paulo Skaf, presidente da Abit. Imagine uma pirâmide. O topo é ocupado por um grupo de estilistas e grifes que, apesar de pequeno, faz muito barulho com suas coleções nas melhores passarelas do Brasil e do mundo.

No meio da pirâmide, estão as empresas têxteis. A base é ocupada pelo grosso das 30 000 confecções espalhadas pelo país afora. O que quer a Abit? Fazer com que o sucesso

das grifes "contamine" os demais setores até a base da pirâmide. Em vez de concentrar-se no corpo-a-corpo com os supercompetitivos fabricantes de tecidos da Ásia, a Abit preferiu incrementar as chances de sucesso com outra estratégia. "A forma mais viável de dar rentabilidade ao setor é mediante a exportação de roupas feitas", diz Skaf. Daí o incentivo que os criadores de moda vêm recebendo da indústria, desde apoio financeiro para os desfiles até desenvolvimento de tecidos especiais para dar vazão a suas idéias.

Fazer moda significa agregar valor ao produto. Isso se faz transformando alguns metros de tecido em uma bela jaqueta -- e, de quebra, neutraliza a brutal concorrência dos asiáticos. Um quilo de fio de algodão cardado custa 1,15 dólar. Transformado em denim, passa a valer 6,9 dólares.

Uma calça jeans de cinco bolsos, fabricada com o mesmo quilo de fio de algodão, é exportada por 13,6 dólares. Se ela tiver um corte especial e receber elementos de um bom estilista, o preço no varejo pode bater nas alturas. Miele, por exemplo, está colocando uma calça jeans na Barneys de Nova York que vai custar 1 000 dólares.

Trabalho de Formiga

Afora o fato de serem marcas bem posicionadas no mercado brasileiro, o que têm em comum Ellus, Zoomp, Forum, e Inega? A resposta está na mineira Formiga, cidade de 63 000 habitantes, situada 200 quilômetros a oeste de Belo Horizonte. Barulho na pacata Formiga quase não se ouve. Mas é possível escutar o grito da moda ecoando forte nas máquinas de costura: grande parte da produção das marcas citadas acima, e de muitas outras, é costurada ali.

Estima-se que de lá saia um total de 700 000 peças de vestuário por mês -- às vezes se chega a 1 milhão de peças.

Não é de estranhar. Afinal, Minas Gerais tem tradição em têxteis e vestuário: a primeira tecelagem do país, a Cedro e Cachoeira, foi fundada no estado. Seus panos vestiam os escravos. Já a moda libertou a economia de Formiga. Tudo parece ter começado há aproximadamente 15 anos, quando Nelson Alvarenga, fundador da Ellus Jeans e natural de Formiga, resolveu ajudar a terrinha natal encomendando a facção, isto é, a costura das peças que enviava já cortadas de São Paulo. Até ali Formiga vivia do comércio, da agropecuária e da extração da cal. Hoje a indústria do vestuário é a que mais emprega na cidade -- cerca de 5 000 costureiras de mão-cheia, cujos salários giram em torno de 300 reais mensais.

O setor é a segunda maior fonte de receita de ICMS da cidade.

A fama das costureiras locais se espalhou rapidamente. Logo vieram a Zoomp, a Forum e muitas mais.

"O negócio das grandes confecções é cuidar da marca e do desenho", diz Paulo Rodrigues da Costa, presidente do Sindicato da Indústria do Vestuário de Formiga. "O nosso é produzir, o que é bom para ambos os lados." Essa estratégia, aliada à evolução da indústria brasileira da moda, obrigou a indústria de Formiga a evoluir também. A facção começou a dar espaço ao private label (PL). Nesse formato de negócios, as confecções só não criam os modelos. Tudo mais é feito ou contratado por elas. "Com o PL eu agrego valor à minha produção", diz Magno Pereira dos Santos, diretor da Zieyd Indústria e Comércio de Roupas. "A facção não permite grandes vôos." A Zieyd chegou ao PL por etapas. Depois de faccionar, ela investiu alguns poucos milhares de dólares numa máquina de corte. Depois disso, passou a modelar já usando um sistema CAD-CAM. A seguir, assumiu a lavação das roupas. Mais tarde, à medida que ganhava mais porte, a Zieyd passou a comprar os tecidos diretamente das tecelagens.

Há cinco anos, ela manufaturava cerca de 12 000 peças por mês. Hoje são 18 000. A Zieyd tem 12 clientes, entre os quais a Yes Brazil e a Guess. Santos, diretor da empresa, quer mais. Ele busca fortalecer-se para lançar uma rede de lojas e assim comercializar mais peças de sua própria marca, a N.Jack.

  • JOSÉ MARIA FURTADO
  • Licença para invadir o mundo

    Na próxima São Paulo Fashion Week, em janeiro de 2003, uma pequena fabricante de confecções do interior gaúcho vai lançar a coleção de jeans Alexandre Herchcovitch. Com demanda inicial estimada em 60 000 peças, que deverá crescer para 80 000 por ano a partir de 2004, a nova coleção sela um contrato de licenciamento inédito. A gaúcha JR Meneguzzo, de Erechim, cidade a 376 quilômetros de Porto Alegre, vai pagar royalties pelo uso da marca do estilista paulista. Herchcovitch criará as coleções e a Meneguzzo confeccionará os jeans, que serão distribuídos em pelo menos 200 novos pontos-de-venda no Brasil e no exterior.

    Em dois anos, a Meneguzzo espera aumentar em 11% sua receita anual, hoje na casa dos 25 milhões de reais. "O mundo está de olho na moda brasileira", diz Ricardo Meneguzzo, diretor comercial da empresa. "É sensacional nos associar a um dos nomes responsáveis por isso." Tocada por Ricardo e dois irmãos, a Meneguzzo emprega 300 pessoas em suas duas fábricas.

    Há 30 anos produzindo jeans, a empresa fundada pelo alfaiate José Rovilho, pai dos atuais sócios, lançou a marca Index em 1991.

    Há sete anos, os irmãos investiram 10 milhões de dólares numa nova fábrica moderníssima, toda computadorizada, com corte eletrônico e capacidade para produzir 6 000 peças diariamente. Os investimentos garantiram um tremendo salto de produtividade. Até 1996, uma costureira fazia oito peças por dia. Hoje faz 18. Para tentar ocupar a capacidade total da nova fábrica, a Meneguzzo começou a produzir marcas de terceiros, como Le Lis Blanc e Zion, e de estilistas como Mário Queiróz, Fause Haten e o próprio Herchcovitch. Outra opção foi abrir o caminho das exportações -- especialmente para Alemanha, França e Japão. "Quem trabalhar bem só terá a ganhar neste momento em que as portas do mundo se abrem para a moda brasileira", afirma Ricardo.

  • SUZANA NAIDITCH
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    Made in Piau

    Lembra do tempo em que muita gente boa comprava lindos sapatos no exterior pensando estar adquirindo um autêntico calçado italiano e se surpreendia ao ver gravado na sola o selo made in Brazil? Pois agora os brasileiros que forem aos Estados Unidos e cederem ao impulso de encher suas sacolas de compras com saias, jaquetas, bermudas ou jeans das badaladas grifes Gloria Vanderbilt e Guess estarão correndo o risco de chegar em casa com legítimos modelitos fabricados no Piauí. Neste ano, 450 000 peças deixarão o depósito da Guadalajara, fabricante de confecções de Teresina, para ser exibidas nas vitrines das butiques Guess. Outras 250 000, distribuídas por dez diferentes modelos, chegarão às prateleiras da Gloria Vanderbilt.

    Exportar não é exatamente uma novidade para a Guadalajara, dona da marca Onix Jeans. Criada em 1974 para abastecer a rede de lojas do Armazém Paraíba -- a empresa-mãe do Grupo Claudino, ao qual pertence --, chegou a confeccionar 1,2 milhão de peças para pesos pesados como a francesa Jou Jou e as americanas Calvin Klein, Ralph Lauren e Wal-Mart, em 1996. Com uma capacidade de produção de

    4 milhões de peças por ano, a empresa faturou 40,7 milhões de reais no ano passado e a estimativa para 2003 é chegar a 50 milhões. Desse total, 7 milhões de dólares virão do exterior.

    Para Flávio Germano Magalhães, diretor administrativo da Guadalajara, esses resultados devem-se à preocupação da empresa com a qualidade. Segundo ele, seus 1 720 funcionários passam constantemente por cursos de treinamento, e os executivos e estilistas da Onix Jeans freqüentam os salões e feiras internacionais em busca de novos equipamentos e das tendências da moda internacional. No entanto, essa bagagem não imuniza a Guadalajara diante de eventuais resistências em relação à produção nacional. Recentemente, por exemplo, a dona de uma butique do Rio de Janeiro, ao verificar que a nota fiscal que acompanhava uma remessa de Onix Jeans era do Piauí, simplesmente devolveu a mercadoria. "Foi puro preconceito, porque a qualidade de nossa produção é de Primeiro Mundo e aí estão nossas exportações para comprovar", diz Magalhães.

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