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O voraz apetite por orgânicos na indústria

Stephanie Strom © 2016 New York Times News Service Denair, Califórnia – A última vez que Wendell Naraghi tentou ganhar dinheiro com castanhas orgânicas, nos anos 1980, o fracasso foi retumbante. “A gente teve que parar porque basicamente ninguém me pagou. Não existia um mercado disposto a pagar mais por produtos orgânicos”, afirmou Naraghi, cujo pai […]

FAZENDA DE CASTANHAS ORGÂNICAS NA CALIFÓRNIA: as grandes indústrias estão pagando aos agricultores para converter suas propriedades / Max Whittaker/The New York Times

FAZENDA DE CASTANHAS ORGÂNICAS NA CALIFÓRNIA: as grandes indústrias estão pagando aos agricultores para converter suas propriedades / Max Whittaker/The New York Times

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Da Redação

Publicado em 26 de julho de 2016 às 14h42.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h39.

Stephanie Strom
© 2016 New York Times News Service

Denair, Califórnia – A última vez que Wendell Naraghi tentou ganhar dinheiro com castanhas orgânicas, nos anos 1980, o fracasso foi retumbante. “A gente teve que parar porque basicamente ninguém me pagou. Não existia um mercado disposto a pagar mais por produtos orgânicos”, afirmou Naraghi, cujo pai criou o enorme bosque de castanhas da família no Central Valley californiano nos anos 1940.

Atualmente, o problema é justamente o oposto: as empresas não conseguem comprar produtos orgânicos e sem transgênicos em volume suficiente para satisfazer o desejo dos consumidores. A demanda por esses produtos é muito superior à oferta, deixando agricultores como Naraghi em polvorosa para transformar toda a produção em orgânica – um processo difícil e caro. “Os clientes estão pedindo. E nós prestamos atenção nos nossos clientes”, afirmou ele, que está em processo de transformar 121 dos 1.214 hectares de plantação este ano.

O clamor por produtos orgânicos é tão intenso que alguns gigantes da alimentação, como a General Mills, a Kellogg e a Ardent Mills, estão ajudando a financiar a mudança. Recentemente, a General Mills, por exemplo, assinou um acordo para ajudar a converter cerca de 1.214 hectares de terra para a produção orgânica de alfafa e outros alimentos para animais. A Ardent oferece aos agricultores um valor extra pelo que é produzido em áreas que estão passando pelo processo de transição para o orgânico.

“Alguns dos nossos maiores compradores de farinha vieram até nós e perguntaram o que poderia ser feito. Eles tinham medo de não conseguir comprar farinha orgânica em nível suficiente para criar novos produtos, agora que estão aumentando sua presença no mercado de orgânicos”, afirmou Shrene White, diretora de grãos especiais da Ardent Mills, que pertence à Cargill e à ConAgra.

A quantidade de terra dedicada à produção de orgânicos nos Estados Unidos é mínima. Segundo os cálculos mais recentes do governo americano, em 2011, o total de terras orgânicas – incluindo pastos – representava menos de um por cento da produção agrícola dos EUA.

Porém, a demanda dos consumidores está acelerando esse processo de conversão. As vendas de produtos orgânicos aumentaram 11 por cento no ano passado, chegando a 43,3 bilhões de dólares, ou cerca de quatro vezes mais que o crescimento das vendas de produtos alimentícios comuns, de acordo com a Associação Comercial de Orgânicos. Essas vendas seriam ainda maiores caso a rede de abastecimento – especialmente de derivados de leite e grãos orgânicos – fosse capaz de acompanhar a demanda.

“Estamos vendo cada vez mais áreas passando pela transição, tanto entre novos produtores, quanto entre operações que já produziam orgânicos e desejam expandir as operações”, afirmou Kelly Damewood, diretora de políticas da CCOF, importante organização de certificação de orgânicos.

A difícil transição 

Ainda não se sabe se esses passos em favor da agricultura orgânica representarão um aumento nos preços para o consumidor. Uma análise feita no ano passado pela Consumer Reports revelou que, em média, o preço de produtos orgânicos era 47 por cento mais alto do que o de produtos convencionais – embora a organização destaque que a média foi afetada por produtos como carnes orgânicas, que com frequência são duas vezes mais caras que as convencionais.

“Quase todos os consumidores hoje dizem que querem mais orgânicos. Mas a razão para que as compras não sejam feitas é o preço”, afirmou John Foraker, presidente da Annie’s, empresa de produtos orgânicos comprada pela General Mills em 2014. A diferença de preço é um reflexo dos custos de produção mais altos: converter as terras para a produção de orgânicos – e manter a produção dessa maneira – não é apenas uma questão de plantar sementes orgânicas.

Os produtos de alimentos orgânicos não podem utilizar fertilizantes e pesticidas sintéticos, sendo obrigados a contar com práticas como a rotação de colheitas, plantio de culturas de cobertura e a produção de adubos compostados para enriquecer o solo e prevenir a proliferação de insetos e ervas daninhas. As regulamentações federais preferem o uso de sementes orgânicas, que são difíceis de encontrar, e proíbem completamente o uso de sementes geneticamente modificadas, micróbios e lodo de esgoto.

A depois disso, os produtores de orgânicos precisam traçar um plano de gestão com a agência de certificação e criar registros meticulosos para não perder o certificado. “A gestão de plantações orgânicas é muito mais complicada do as convencionais”, afirmou Tom Nunes, vice-presidente de operações da Nunes Co. em Salinas, Califórnia, a empresa por trás da marca Foxy.

Porém, Nunes afirmou que o maior desafio para se tornar orgânico são os três anos que os produtores são obrigados a dedicar à transição, de acordo com as regulamentações para produtos orgânicos, antes que os produtos possam ser vendidos com esse selo. “Você gasta mais, mas não recebe melhor por isso”, afirmou.

Muitas das grandes empresas começaram a trabalhar para diminuir os efeitos de alguns desses desafios. A Ardent’s planeja ajudar os agricultores, pagando mais por produtos cultivados em terras que estão passando pela transição de três anos, além de ajudá-los a escolher culturas de rotação que possam ser vendidas para suplementar a renda.

A Kashi, empresa especializada em cereais, desenvolveu um programa chamado Transição Certificada, para mostrar os produtos feitos a partir de ingredientes produzidos em terras que estão passando pela transição. “Queríamos que os consumidores que estão exigindo cada vez mais opções orgânicas tivessem ciência dos desafios enfrentados pelos agricultores que pretendem realizar a transição”, afirmou David Denholm, executivo-chefe da Kashi, uma unidade da Kellogg Co.

Diferentemente de outras empresas que querem garantir o fornecimento de produtos orgânicos, a Kashi não obriga os produtores a se submeterem a contratos de exclusividade em troca de apoio, preferindo pagar um pouco mais por alimentos cultivados em terras em transição.

“O que está acontecendo é uma integração vertical, na qual os agricultores firmam contratos de fornecimento de longa duração. Contudo, queremos ter um papel na democratização de alimentos orgânicos, disponibilizando-os para mais pessoas. Não acreditamos que a integração vertical da agricultura orgânica seja a melhor forma de fazer isso”, disse Denholm.

Denholm afirmou que, em vista das tendências atuais, cerca de 20 por cento das terras cultiváveis dos EUA poderiam se tornar orgânicas ao longo da próxima década, embora esteja se tornando cada vez mais difícil encontrar terras em boas condições para a realização da transição.

Há alguns anos, quando a Lundberg Family Farms, uma empresa que produz arroz e grãos orgânicos, quis aumentar em 5.666 hectares o total de terras orgânicas que cultivava, mas não havia mais terras orgânicas à disposição – pelo menos não a um preço que a empresa estivesse disposta a pagar.

A família acabou por adquirir 615 hectares em Knights Landing, Califórnia, de uma empresa de construção que planejava produzir brita no local, mas não conseguiu uma permissão do estado. Para enriquecer o solo e impedir a proliferação de pestes, os Lundbergs estão plantando milho, girassol, cártamo e feijão, e estão até mesmo tentando cultivar arroz em terra seca.

O campo estará pronto para a produção de orgânicos no ano que vem. No meio tempo, os Lundbergs assumem os custos adicionais de plantio e cultivo nas terras – o que levou Tim Schultz, diretor de pesquisa e desenvolvimento do grupo, a perder o sono algumas vezes.

“O mercado de orgânicos agora está crescendo com força, mas como posso saber hoje o que as pessoas vão querer em quatro anos, quando os primeiros produtos orgânicos produzidos aqui chegarão ao mercado?”, questionou Schultz.

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