Estas estátuas na Coreia do Sul estão enfurecendo o Japão
Coreia do Sul e Japão vivem uma crise diplomática impulsionada por um triste episódio da Segunda Guerra Mundial. Entenda
Gabriela Ruic
Publicado em 17 de agosto de 2017 às 06h00.
Última atualização em 17 de agosto de 2017 às 06h00.
São Paulo – Os ônibus que circulam por algumas rotas de Seul, a capital da Coreia do Sul , ganharam passageiras inusitadas nos últimos dias: estátuas em tamanho real de mulheres descalças, que trajam vestes típicas do país e descansam suas mãos no colo, como se aguardassem ordens que precisariam ser atendidas imediatamente.
A pose e o olhar não são à toa. Essas estátuas simbolizam as mulheres que ficaram conhecidas como “mulheres conforto”, as cerca de 200 mil de coreanas que foram forçadas a trabalhar como escravas sexuais durante os tempos da ocupação japonesa na península da Coreia.
As peças são um protesto realizado pela empresa de transporte Dong-A Transit e tem como objetivo relembrar ao sul-coreanos as atrocidades que essas mulheres viveram durante a Segunda Guerra Mundial. A iniciativa, informa o jornal The Guardian, foi autorizada pela prefeitura da capital do país e permanece até setembro, mas enfureceu o governo do Japão .
“Estamos preocupados que isso prejudique os esforços de relacionamento da Coreia do Sul e do Japão”, disse Secretário-chefe de Gabinete e porta-voz do governo japonês, Yoshihide Suga. “Pedimos que a Coreia tome as medidas adequadas”, terminou ele em declarações publicadas pelo jornal The Korea Times, sem precisar quais medidas seriam essas.
O tom duro do discurso se deve ao fato de o país considerar a questão encerrada do ponto de vista diplomático. Em 2015, os países firmaram um acordo que visava resolvê-la e que envolveu um pedido de desculpas formal por parte do Japão, bem como uma doação de quase 10 milhões de dólares para um fundo que ampara familiares das vítimas desse crime de guerra.
Mas, com a queda da então presidente Park Geun-hye e a ascensão ao poder de Moon Jae-in, atual presidente, o episódio voltou a causar tensão na relação entre os países. Jae-in, advogado especializado em direitos humanos, sinalizou ao longo da sua campanha pela presidência em 2016 que queria rever o pacto que foi articulado pela conservadora Park.
Até o momento, no entanto, Moon não dá sinais de que irá tratar disso tão logo, já que o tema entre os países é tão sério e grave, especialmente aos olhos do Japão, que vem sendo usado como moeda de troca no relacionamento político, econômico e até na segurança. Ameaçou, inclusive, a cooperação em outra questão sensível: a crise nuclear com a Coreia do Norte .
Para os sul-coreanos, no entanto, o episódio parece longe de esquecido e a maioria deles percebe o acordo firmado com o Japão como ruim. Segundo uma pesquisa de opinião conduzida pela Gallup e divulgada pelo The Japan Times, 70% da população da Coreia do Sul quer renegociar a tratativa.
Protestos
Os protestos na Coreia do Sul não são recentes. Em 1992, sobreviventes deram início a uma demonstração semanal que acontece em frente à embaixada japonesa em Seul. Artistas sul-coreanos desejavam construir um memorial em homenagem à essas mulheres, mas os planos foram sufocados pela pressão do Japão.
Em 2011, portanto, um grupo de artistas decidiu começar a colocar as estátuas em diferentes partes da Coreia do Sul e as tratativas de 2015 não se mostraram um empecilho para que os protestos continuassem. Muito pelo contrário.
Em janeiro de 2017, uma nova estátua ressurgiu, essa na cidade de Busan, mas também em frente à embaixada japonesa. Na ocasião, o Japão convocou os embaixadores sul-coreanos no país para que prestassem explicações e alegaram que o protesto violaria os termos do acordo.
“Qual parte da estátua de uma menina machuca o Japão? ”, questionou um dos artistas envolvidos na manifestação, “é uma mensagem de paz e pelos direitos das mulheres”, pontuou em entrevista à CNN. Para os japoneses, contudo, o monumento é dolorido o suficiente para causar uma crise diplomática.