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De onde o Banco do Brasil vai tirar dinheiro para comprar o Votorantim?

Mercado acredita que, sem aporte do Tesouro ou aumento de capital, o BB não poderá pagar em dinheiro a compra de parte do banco da família Ermírio de Moraes

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h34.

O mercado acredita que a compra da Nossa Caixa faz todo o sentido para o Banco do Brasil. Com apenas uma aquisição, o BB se fortaleceu em São Paulo, o estado mais rico do país, e voltou a brigar pela liderança do mercado bancário três semanas após perder a posição para o Itaú-Unibanco. Já entre os pontos negativos do negócio está o preço. O valor de 7,56 bilhões de reais pago pelo Banco do Brasil por 100% das ações da Nossa Caixa ficou acima do esperado por analistas. Além disso, o pagamento em dinheiro - ainda que parcelado - vai restringir a capacidade de manobra do BB nas conversas para a aquisição de outras instituições. Se o Tesouro Nacional não fizer um aporte de capital no BB, a instituição poderá empenhar, agora, no máximo 3,5 bilhões de reais em dinheiro em novas aquisições, segundo estimativa do banco Itaú. "É o suficiente para o banco continuar crescendo em 2008 e 2009, mas restringe bastante o espaço de aquisição de grandes instituições", diz Alcir Freitas, analista de bancos do Itaú.

A principal restrição do BB para aportar dinheiro nas próximas compras é o índice de solvência imposto pelo Acordo de Basiléia - que todos os bancos precisam respeitar. Conhecido como "BIS ratio", esse indicador deve cair de 13% para 12,1% com a incorporação da Nossa Caixa, segundo cálculos do Itaú. Para os bancos de países emergentes, o acordo da Basiléia estipula um índice mínimo de 11%. Para chegar nesse piso, o BB poderia empenhar no máximo mais 3,5 bilhões em aquisições.

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A quantia é pequena, se considerada a ambição do BB de retomar a liderança do mercado bancário. Uma das mais esperadas aquisições é a compra de uma fatia de 49% do Banco Votorantim, da família Ermírio de Moraes, conforme antecipou EXAME. O preço que o BB estaria disposto a pagar atinge 7 bilhões de reais, segundo o jornal Valor. "Em tese, o BB não teria caixa suficiente para incorporar um banco como o Votorantim hoje, se pagasse tudo em dinheiro", diz Freitas, do Itaú.

No limite

O BB encontra-se numa encruzilhada. O banco até pode reduzir seu índice de Basiléia para 11%, liberando recursos para novas compras, sem infringir nenhum acordo internacional. Mas isso não seria bem visto pelo mercado. Os bancos brasileiros costumam ser mais conservadores na observação desse limite. Vários apresentam um índice perto de 15%, o que indica uma exposição mais moderada ao risco. "O mercado não veria bem o Banco do Brasil se aproximar muito desse limite de 11%", afirma Kelly Trentin, chefe de análise da corretora SLW.

Desde que o banco federal perdeu a liderança do setor para o Itaú Unibanco, a cúpula do governo, puxada pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, não se cansa de repetir que o banco voltará ao topo do mercado. Mas a pressa em retomar a dianteira pode ter levado o BB a uma aquisição demorada para digerir e que, estrategicamente, limitará seus próximos passos.

Segundo analistas, para não infringir o Acordo de Basiléia, o BB talvez seja levado a se focar em aquisições menores, sobretudo de bancos estaduais. "Não vejo mais espaço para o Banco do Brasil dar uma tacada dessas", afirma Ricardo Tadeu Martins, gerente de pesquisa da corretora Planner, referindo-se a uma aquisição do porte da Nossa Caixa. "O BB deve se concentrar agora em bancos estaduais, que são menores", diz. Há oito dias, a instituição informou que está perto de concluir a aquisição do Banco do Estado do Piauí. Na operação, baseada na troca de ações, a fatia de 69% do governo piauiense foi avaliada em 81,7 milhões de reais. Outra instituição na mira do BB é o Banco de Brasília.

Modelo de troca de ações

A troca de ações, aliás, deve ser a saída para que o BB não desrespeite os limites de Basiléia. Esse modelo de negócios é o que prevaleceu nas fusões mais recentes do setor bancário, como a própria operação que uniu o Itaú e o Unibanco. O risco de diluição dos atuais minoritários do BB, em transações com trocas de ações, é pequeno, segundo os analistas, porque os bancos estaduais visados pelo BB não são grandes o bastante para causar distorções drásticas. Para Freitas, do Itaú, a diluição só seria relevante se a troca de ações ocorresse com um banco de porte razoável, e que fosse negociado com múltiplos superiores ao do BB.

Os minoritários do BB também poderiam ser diluídos se o banco federal promovesse uma emissão de ações para captar recursos e se fortalecer para cumprir a maratona de aquisições. Mas dois fatores restringem essa opção hoje. A primeira é básica: o mercado de capitais secou com a crise. A segunda é decorrente: os investidores iriam querer saber em detalhes que tipo de negócio o BB estaria planejando antes de aportar dinheiro na instituição.

De acordo com um relatório do Unibanco, outro modo de o BB melhorar seu índice de Basiléia seria segurar o pagamento de dividendos. Martins, da Planner, porém, não acredita que o banco adotará essa medida. "Não vejo muito problema nisso. Eles não devem reter dividendos", diz.

Ganha e perde

A aquisição da Nossa Caixa foi anunciada nesta quinta-feira (20/11), dia em que a Bovespa não funcionou devido ao feriado da Consciência Negra. Nesta sexta, no entanto, os investidores reagiram fortemente à notícia. Por volta das 15h35, as ações ordinárias da Nossa Caixa (BNCA3, com direito a voto) apresentavam alta de 23,39%, cotadas a 63,30 reais e objeto de 2.034 negócios. A disparada é puxada pelo prêmio que o BB embutiu na transação. O banco pagará 70,63 reais por ordinária, o que representa um prêmio de 37,7% sobre o fechamento de quarta-feira (19/11). Essa diferença é que está puxando os papéis neste pregão.

Já as ordinárias do Banco do Brasil (BBAS3, com direito a voto) caíam 10,66%, para 11,90 reais, com 4.930 negócios realizados. Os papéis estão apanhando por três motivos. Primeiro, porque o pagamento integral em dinheiro pela Nossa Caixa destoa do modelo de aquisições vigentes no setor - o de troca de ações. O comprometimento do caixa da companhia com as 18 prestações deve levar a uma diluição do lucro por ação de 3,6%, em 2009, e de 2,3% em 2010, segundo o Itaú. Outro motivo é que, apesar de ser um bom negócio, o BB pagou caro pela Nossa Caixa. A Planner, por exemplo, estimava um preço justo de 62 reais por ação - 12% menos que o valor acordado. Além disso, o BB sofre com a própria conjuntura. As ações do banco estão entre as mais líquidas da Bovespa, e por isso participam mais das oscilações do pregão. No mesmo instante em que suas ordinárias caíam 10,66%, o Ibovespa, principal indicador da bolsa paulista, recuava 4,72%, a 31.829 pontos.

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