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Wall Street perde para brasileiros em banco de investimento

Os estrangeiros enfrentam forte concorrência dos bancos brasileiros com maior capacidade para financiar operações e melhor relacionamento com os investidores

Para Itaú BBA SA, os empreendedores brasileiros estão vendo que não precisam de um banco estrangeiro para realizar operações (Wikimedia Commons)

Para Itaú BBA SA, os empreendedores brasileiros estão vendo que não precisam de um banco estrangeiro para realizar operações (Wikimedia Commons)

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Da Redação

Publicado em 5 de maio de 2011 às 12h18.

Rio de Janeiro e Nova York - Gerdau SA, maior siderúrgica do continente americano, escolheu três bancos brasileiros para coordenar emissão de R$ 5,53 bilhões em ações no mês passado. Os bancos americanos JPMorgan Chase & Co. e Citigroup Inc., que coordenaram outras operações para a empresa no passado, ficaram de fora. Quando o Magazine Luiza SA fez sua abertura de capital de R$ 925,8 milhões na semana passada, a rede varejista contratou o Banco Itaú BBA SA, divisão de banco de investimento da maior instituição financeira do País.

Bancos estrangeiros não foram convidados a participar. “É um sinal dos tempos”, disse Jean-Marc Etlin, vice- presidente da área de banco de investimento do Itaú BBA, que também trabalhou na oferta de ações da Gerdau, em entrevista em São Paulo em 19 de abril. “As empresas, os empreendedores brasileiros estão vendo que não precisam de um banco estrangeiro para atender às suas necessidades e realizar operações. Os bancos brasileiros são perfeitamente capazes de fazer mesmo as operações mais complexas.”

As instituições estrangeiras estão buscando ampliar seus ganhos com comissões de banco de investimento no Brasil, onde uma nova classe média e a alta de preços das commodities impulsionam uma das mais fortes taxas de crescimento econômico do mundo. Apesar de os negócios estarem crescendo para a maioria das instituições, os estrangeiros enfrentam forte concorrência dos bancos brasileiros com maior capacidade para financiar operações, melhor relacionamento com os investidores, executivos experientes e uma habilidade para prestar serviços que antes apenas os grandes bancos globais ofereciam.

Incomum

A força de instituições locais na área de banco de investimento no Brasil é incomum em mercados emergentes, disse Christopher Harland, chefe de América Latina para o Morgan Stanley, que tem 300 funcionários em São Paulo.

“Você não encontra muitos mercados com concorrentes tão fortes, bem capitalizados e arraigados”, disse Harland, que trabalha em Nova York.

No ano passado, o Produto Interno Bruto do País cresceu 7,5 por cento, a maior taxa em duas décadas, comparado a 2,8 por cento nos EUA e 1,3 por cento no Reino Unido, segundo o Fundo Monetário Internacional.

Comissões menores

Emissores brasileiros venderam uma quantia recorde de R$ 290,7 bilhões (US$ 184,8 bilhões) em ações e instrumentos de renda fixa nos mercados doméstico e global em 2010, comparado a R$ 107,2 bilhões no ano anterior, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, a Anbima.

As ofertas do ano passado incluem a emissão de US$ 70 bilhões em ações da estatal Petróleo Brasileiro SA, que foi a maior da história. Foram realizadas no Brasil 143 fusões e aquisições que movimentaram US$ 84,8 bilhões em 2010, a maior quantia desde 2006, segundo a Anbima.

As comissões de banco de investimento são mais baixas do que nos EUA -- normalmente 2,5 por cento para ofertas de ações, disse André Fernandes Berenguer, que comanda a área de Global Banking & Markets, do Banco Santander Brasil SA. As comissões médias para ofertas de ações nos EUA foram de 3,3 por cento em 2010 e 3,4 por cento este ano, de acordo com dados compilados pela Bloomberg. Os bancos no Brasil também dividem mais as comissões porque as empresas contratam mais instituições como coordenadoras.

Ainda assim, as comissões de bancos de investimento no Brasil somaram US$ 1 bilhão no ano passado, de acordo com dois coordenadores de operações, que não quiseram se identificar por não serem autorizados a falar publicamente.


BTG, Itaú

Bancos de investimento brasileiros -- incluindo Itaú BBA, Banco BTG Pactual SA e Banco Bradesco BBI SA, os três que coordenaram a venda de ações da Gerdau -- têm mantido suas posições nas ofertas de ações e dívida e em assessoria em transações, mesmo com os estrangeiros levando funcionários e expandindo operações na América Latina. O BTG, do bilionário André Esteves, que recomprou a instituição do UBS AG por US$ 2,5 bilhões em 2009, ficou em primeiro lugar no ano passado no ranking de assessoria de fusões e aquisições. Em 2009, o BTG estava em sétimo lugar, de acordo com a Anbima. A assessoria de imprensa do banco disse que os executivos não quiseram fazer comentários.

O Itaú BBA, divisão do Itaú Unibanco Holding SA de São Paulo, foi o número um na distribuição de ações e títulos nos primeiros dois meses do ano, de acordo com a Anbima. O Itaú foi primeiro em dívida e segundo em ações no ano passado. O Credit Suisse Group AG, segundo lugar em fusões e aquisições anunciadas no ano passado, é o estrangeiro que mais apareceu entre os cinco maiores coordenadores de ofertas de ações e dívida nos últimos cinco anos, segundo a Anbima. O banco de Zurique, que ganhou presença no Brasil em 1998 com a compra do Banco de Investimentos Garantia, o maior da área na época, liderou cinco das sete aberturas de capital realizadas este ano no País, de acordo com dados da Bloomberg.

Experiência

“Vender uma empresa conhecida como a Gerdau para investidores estrangeiros não é uma operação complicada”, disse José Olympio Pereira, 48 anos, chefe de banco de investimento da unidade brasileira do Credit Suisse, em entrevista em São Paulo em 15 de abril. “Agora, para fazer um IPO, vender uma nova ideia para o mercado a um preço que agrade a empresa e investidores, experiência e talento são necessários.”

Enquanto os bancos brasileiros ficaram com as cinco primeiras posições na oferta de dívida no ano passado e os três primeiros lugares na venda de ações, as instituições estrangeiras tiveram desempenho melhor em assessoria de fusões e aquisições, conquistando quatro das cinco primeiras colocações. O JPMorgan ficou em terceiro lugar, seguido por Morgan Stanley e Bank of America Corp. O Itaú BBA caiu para o nono lugar em fusões e aquisições. Em 2009, o banco ocupava a quinta posição e em 2008 o segundo lugar, de acordo com dados da Anbima. O Bradesco BBI, que foi terceiro em 2009, não ficou entre os 10 primeiros em 2010.

‘Toda a sua força’

O Goldman Sachs Group Inc. -- cujo economista-chefe Jim O’Neill, cunhou o termo BRIC para o grupo de mercados emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China -- não está entre os 10 primeiros em nenhuma categoria desde 2008, após uma sequência de três anos como principal banco em fusões no Brasil até 2005. Andrea Rachman, porta-voz do banco em Nova York, não quis comentar o assunto.

Claudio Berquo, 50 anos, chefe das operações de banco de investimento e gestão de ativos do JPMorgan no Brasil, disse que a instituição sediada em Nova York não tenta concorrer com o Itaú em todas as áreas. Em vez disso, o foco está fechado na operação de banco de investimento, especialmente em negócios transnacionais, e na gestão de fortunas de brasileiros. “Não queremos concorrer com o Itaú onde eles têm toda a força”, disse ele em entrevista em Nova York no mês passado. “O que o JPMorgan é nos EUA, eles são no Brasil.”

JPMorgan

O JPMorgan, que está no Brasil há mais de 40 anos, viu o tamanho do quadro de pessoal no País oscilar com a saúde da economia. A instituição não tem operação de varejo no Brasil, não oferece cartões de crédito nem tem agências, enquanto o Itaú tem 3.000. O JPMorgan emprega cerca de 630 pessoas no Brasil e planeja expandir o total para 1.000 dentro de dois anos e meio, disse Berquo, que trabalha para o JPMorgan desde 1994. O banco foi principal assessor na aquisição da Tam SA pela chilena Lan Airlines SA por US$ 3,7 bilhões, que criou a maior empresa aérea da América Latina e 11ª maior do mundo. O acordo, anunciado em agosto, ainda depende de aprovação das autoridades antitruste do Chile. O JPMorgan também assessorou a Gerdau na operação de US$ 1,6 bilhão em agosto para a conclusão da compra da Gerdau Ameristeel Corp., sediada em Tampa, Flórida, e segunda maior em unidades siderúrgicas na América do Norte.

A Gerdau não usou o JPMorgan para a captação com ações em abril porque os bancos brasileiros que a empresa escolheu como coordenadores a operação tiveram a sua “capacidade testada em outras emissões”, disse Osvaldo Burgos Schirmer, diretor de finanças em um e-mail.

“Os bancos escolhidos, como muitos dos seus pares estrangeiros com os quais também trabalha, têm forte presença no Brasil, conhecimento do setor do aço, inteligência de mercado, presença nos principais centros financeiros e longo histórico de relacionamento com a empresa”, disse ele.


‘Conectar o cliente’

Bancos estrangeiros como JPMorgan e Credit Suisse veem oportunidades à medida que mais empresas familiares como a Gerdau buscam investidores e negócios fora do Brasil, segundo executivos dos bancos.

“Uma das coisas que fazemos bem são negócios transnacionais”, disse Hans Lin, executivo sênior de banco de investimento para o Bank of America no Brasil. “Nossos concorrentes brasileiros não têm poder para conectar o cliente no Brasil a um alvo na Ásia ou um cliente na Ásia a um alvo no Brasil.”

Em outubro, o JPMorgan adquiriu uma participação majoritária na Gávea Investimentos Ltda., do Rio de Janeiro, por uma quantia não revelada, para expandir sua área de administração de recursos. O fundo, comandado pelo ex-presidente do Banco Central, Arminio Fraga, de 53 anos, administra cerca de US$ 6 bilhões para investidores de patrimônio elevado. O Credit Suisse fez uma aquisição parecida em 2006, com a compra do controle da Hedging-Griffo.
“Private banking é uma ótima fonte de negócios para a área de banco de investimento”, disse Berquo. “Se existe relacionamento na área de private banking, sempre haverá oportunidade para oferecer serviços para vender a empresa ou abrir seu capital.”

Alta do real

A valorização do real -- com ganho de 47 por cento em relação ao dólar desde dezembro de 2008 -- e o aumento do volume de negócios envolvendo empresas brasileiras tornou o custo com funcionários no País um dos mais altos do mundo, segundo os executivos.

“Existe uma falta de talento no Brasil porque todo mundo quer estar no Brasil”, Berquo disse. “Agora o País está se tornando a nova meca de private equity. Todo mundo está trabalhando com private equity no Brasil -- o Blackstone está lá, o KKR está lá, o Carlyle está lá, além dos locais que estão lá desde sempre. Então a concorrência por pessoal é difícil.”

Em março, o Citigroup tirou Andre Kok do Itaú BBA, onde ele trabalhou por seis anos, para tocar as operações corporativas e de banco de investimento no Brasil. Por volta de 75 por cento dos banqueiros sênior do Citigroup na América Latina são novos na empresa ou no cargo, disse Eduardo Cruz, chefe de banking para a América Latina.

Estudantes

“Você tem que contratar profissionais sêniors na região, e o melhor lugar para encontrar isso é na concorrência”, disse Cruz, que veio do Goldman Sachs em 2005.

O Morgan Stanley está recrutando estudantes diretamente nas faculdades. Lin disse que o Bank of America, sediado em Charlotte, Carolina do Norte, está contratando mais pessoal para as áreas corporativa, administrativa e de gestão de risco para acomodar um novo banco de atacado no Brasil que vai dobrar a capacidade de financiamento da instituição, cujo tamanho não foi divulgado.

“Teremos um apetite por grandes clientes”, disse Lin. O crédito para clientes importantes como a Vale SA, segunda maior mineradora do mundo por valor de mercado, “irá aumentar dramaticamente”, ele disse. O Bradesco BBI, divisão de banco de investimento do Banco Bradesco SA, sediado em Osasco e segundo maior banco do País por valor de mercado, tem contratado gente de fora, numa exceção à política de cultivar talentos internamente, disse Renato Ejnisman, diretor da divisão. A unidade se formou no final de 2006, quando Ejnisman, que tem doutorado em física pela Universidade de Rochester, chegou ao Bradesco vindo do Bank of America, onde trabalhou por oito anos.


‘Ombro a ombro’

“Queremos expandir nossa base de clientes e melhorar relacionamentos com a vantagem da forte presença do Bradesco entre clientes corporativos no Brasil”, disse Ejnisman. “Não temos a história que nossos competidores globais têm e mesmo alguns brasileiros com mais história, mas a gente se equipou para estar disputando ombro a ombro aqui e lá fora.”

O Bradesco tem a maior equipe de profissionais do Brasil para distribuir ativos brasileiros globalmente e identificar a demanda de clientes estrangeiros por operações envolvendo empresas brasileiras, disse Ejnisman. Ele destacou o papel do banco assessorando a Sompo Japan Insurance Inc., segunda maior seguradora do Japão excluindo apólices de vida, quando a empresa comprou uma fatia de 50 por cento da Marítima Seguros SA em 2009 por R$ 328 milhões. A Marítima contratou o JPMorgan.

“Quando a operação foi anunciada, todo mundo achava que a Bradesco estava do lado da Marítima”, disse Ejnisman. “Mas era o oposto, de fato nos estávamos assessorando os japoneses, e o banco global, a empresa local, em uma reversão da lógica que tínhamos ate pouco tempo atrás.”

Santander

Um banco que se considera global e ao mesmo tempo local é o Santander, o maior da Espanha, que expandiu a presença na América Latina na década de 1990.

A instituição de Madri comprou o Banco do Estado de São Paulo SA, o Banespa, por US$ 4,8 bilhões em 2001, pagando o triplo do valor oferecido pelo participante com o segundo maior lance no leilão de privatização. A compra da unidade brasileira do ABN Amro Holding NV em 2007 por 11 bilhões de euros (US$ 16,4 bilhões) catapultou o Santander para a lista dos três maiores bancos privados do Brasil, com R$ 376 bilhões em ativos, 54.000 funcionários e 2.395 agências em dezembro, de acordo com dados do BC. “O Santander é o mais internacional dos brasileiros e o mais brasileiro do internacionais”, disse Roberto Barbuti, 42 anos, chefe da divisão de ações da unidade de global banking do Banco Santander Brasil SA, em entrevista em São Paulo em 14 de abril. “Conseguimos estruturar produtos quando você tem que usar balanço aqui e lá fora. Em algumas áreas isso faz diferença.”

Vantagem temporária

A compra da unidade brasileira do ABN Amro pelo Santander impulsionou a consolidação entre a concorrência. No ano seguinte, o Itaú comprou o União de Bancos Brasileiros SA, o Unibanco, por US$ 12,5 bilhões e criou o maior banco do País e o 12º do mundo por valor de mercado. O acordo foi motivado em parte pelo Santander, que havia se tornado “um novo tipo de player”, disse o presidente do Itaú, Roberto Egydio Setubal, durante entrevista coletiva.

Desde então, o Itaú conseguiu mandatos para coordenar as maiores operações do Brasil, como a capitalização da Petroleo Brasileiro no ano passado e o IPO da EcoRodovias Infraestrutura Logística SA em março de 2010.

Barbuti disse que, apesar de o Itaú ter construído um banco de investimento formidável, o Santander tem vantagem em algumas áreas por causa de seu maior valor de mercado e, em alguns mercados como a Europa, onde tem mais experiência. “Nenhuma vantagem é perene, você tem que continuar trabalhando”, disse Barbuti. “Mas era uma vantagem claríssima há alguns anos atrás, que agora esta diminuindo.”

Etlin, de 48 anos, que saiu do UBS para ir para o Itaú em 2005, não vai deixar de pressionar.
“Esse trabalho de banco de investimento no Brasil é uma maratona”, disse Etlin. “No ritmo de uma corrida de velocidade.”

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