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Os juros estão no lugar errado, diz André Jakurski, fundador da JGP

Experiente gestor diz que juros deveriam estar em 6% ao ano ante uma inflação que vai a quase 4%; ele diz que o mercado está 'anestasiado' com a dívida

Para Jakurski, IPCA não é o indicativo da inflação real do país porque a cesta de consumo mudou na pandemia: "O BC está atrasado" (JGP/Divulgação)

Marília Almeida

Publicado em 27 de novembro de 2020 às 19h36.

Última atualização em 27 de novembro de 2020 às 21h55.

Para André Jakurski, um dos fundadores da gestora JGP, os juros reais em queda representaram algo benéfico para a economia quando a pandemia estourou, em março e abril. Caso os juros estivessem mais altos, a situação seria pior. Mas, na sua visão, o Banco Central está agindo com atraso. "Os juros estão no lugar errado", disse o experiente e prestigiado gestor no evento Investidor 3.0, organizado nesta sexta-feira, 27, pela casa de análises Empiricus.

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O equilíbrio entre juros e inflação, segundo ele, é de dois pontos percentuais para cima. "Esperamos uma inflação de 3,8% no final do ano. Então, a taxa Selic deveria estar em 6% ao ano, e não 2%."

O motivo para esse atraso do Banco Central é o olhar excessivo para o IPCA, que, segundo ele, não mede mais a inflação real. "Na pandemia, a cesta de consumo do brasileiro mudou, mas o IPCA continua a ter na cesta itens como passagens de avião, serviço que está em deflação. O IGP-M está batendo 20% no ano, e estimamos que o custo da família deve estar maior do que a inflação oficial, entre 8% e 10%. Então, os juros estão negativos."

Veja abaixo mais insights de um dos gestores mais experientes e bem-sucedidos do país durante o evento, no qual foi entrevistado por Felipe Miranda, sócio da Empiricus, e George Wachsmann, o Jojo, sócio-fundador da gestora Vitreo.

Crise de 2008 x pandemia

A diferença entre a crise de 2008 e a atual, segundo Jakurski, é que na anterior havia o consenso de que iria haver austeridade fiscal e inflação. Agora o pensamento é: pode ser que tenha inflação, mas prevalece a ideia de que não terá.

"As pessoas não estão nada preocupadas com o crescimento da dívida do país. Isso passou a ser mais aceitável do que no passado. A dos EUA está batendo em 130% do PIB, no Brasil chegando a 100% e a da Itália explodindo também. Há uma anestesia."

O gestor também cita um fenômeno específico da pandemia: a migração de ativos globais incentivados pela digitalização. "Isso fez com que empresas que trabalham na área tivessem rentabilidade maior que o resto. É o novo suplantando o velho e pode haver uma rotação na volta de uma certa normalidade."

Euforia na bolsa?

Para Jakurski, o mercado financeiro já está bastante adiantado na antecipação do futuro. "Nos mercados centrais os ativos já recuperaram bem seus preços. Não há um potencial gigantesco ainda. Acho que a festa foi boa, mas ainda vai ter festa. Estamos em um período sazonal bom agora, e os late comers vão incentivar a alta do mercado, mas não muito."

"Portanto, não vejo que a bolsa no Brasil necessariamente se esgotou. Estamos perto do nível de 2019, mas o mix de ações mudou bastante. Tem ações brasileiras descontando lucros fantásticos nos próximos cinco, dez anos. Mas tem de ver para crer, fazer uma seleção mais cuidadosa."

Tema do mercado

O mercado vive de tema, diz Jakurski, e o tema da vez são mercados emergentes, dólar fraco e rotação. "O investidor tem de navegar entendendo para onde está indo. Chega um momento em que o mercado erra, mas no começo é quase uma profecia autorrealizável. A hora de sair é que é o 'X' da questão. Não pode esperar pelo último momento, já que pode não haver liquidez para sair. Tem de vender enquanto está subindo."

Câmbio

Na sua visão, o câmbio ainda tem espaço para desvalorizar um pouco mais, mas não muito. "O real descolou bastante e vai ter de acompanhar um pouco o que aconteceu com outras moedas."

Crescimento do país

A estimativa da JGP para o PIB em 2020 é uma recessão de 4%, graças ao auxílio emergencial, um gigantesco programa fiscal que transformou dívida em PIB, define o gestor.

Em um país que não cresce muito, como Brasil, quem vai se dar bem? Segundo Jakurski, empresas que estiverem relacionadas à digitalização. "Elas vão ter oportunidades que outras não terão."

Risco fiscal

Para Jakurski, a tendência de gastar do governo continua. "Foi apenas amortecida por algum tempo. Ela não vai voltar a níveis do passado, mas está claro que governo e Congresso querem gastar. Vai ser difícil segurar. Até podem manter o teto dos gastos, mas podem fazer algo como fizeram com o Fundeb, e o mercado aceitar."

Para ele, o mercado financeiro dá ânimo e otimismo para o investidor. Mas a realidade é diferente. "As pessoas têm medo de um descompasso inflacionário. Nossa projeção da inflação é de 4%, um pouco acima da meta para o próximo ano. Dada a propensão de gastar dos governos, acreditamos que em 2021 haverá mais estímulos monetários e fiscais do que os necessários".

Navegando na crise

Questionado sobre como os fundos da gestora tiveram um bom desempenho na crise, o gestor apontou que à medida que o mercado foi registrando alta, a JGP foi vendendo posições em seus fundos. "Olhando no ano, estamos na posição mais leve que já estivemos. Temos posição em ações, long & short, algumas em moedas emergentes, nas quais vemos oportunidades operando contra euro e dólar."

Os fundos da JGP não aproveitaram a alta da bolsa americana em fevereiro. Mas a cautela foi recompensada quando a crise chegou. "Tivemos a percepção de que negócio ia piorar e ficamos livre para aproveitar oportunidades após a queda. Quem não se prepara fica arrumando o que está ruim".

Os fundos ganharam com câmbio, DI, bolsa e também ouro e prata. Agora, faz um alerta: compara a euforia na bolsa com o mercado em 2017 e 2018, quando houve uma queda abrupta do índice Vix, conhecido como "Índice do medo", que mede a volatilidade de opções sobre ações do S&P 500. "O mercado sobe e as pessoas ficam muito otimistas."

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